Na edição on-line desta manhã do laborioso DE, há duas notícias que poderão surpreender os leitores, sobretudo os menos familiarizados com a nova filosofia informativa adoptada pelos nossos principais “media”:
- A primeira, refere-se ao comportamento negativo das Bolsas: “A praça nacional está em forte queda, acompanhando a tendência mundial”, logo a seguir “Depois de ontem terem sido divulgados indicadores nos USA que mostram que a crise do mercado hipotecário de alto risco norte-americano pode afectar o crescimento da maior economia do mundo”;
- A segunda, cita uma passagem de entrevista com o Professor da Universidade de Princeton, Ricardo Reis, com apenas 27 anos de idade, referido pelo jornal como “nova estrela da economia nacional”, na qual o Prof. R. Reis tem estas ousadas afirmações “Num mês, não se falará mais nesta crise do crédito”, acrescentando “É uma crise de liquidez e não financeira”.
Confesso a minha própria perplexidade face a duas notícias tão divergentes.
A final em que ficamos - quem tem razão, os mercados financeiros ou o Prof. R. Reis?
Com toda a sinceridade, por razões de interesse pessoal mas não só, desejo que a profecia do Prof. R. Reis se materialize.
Mas confesso algumas/muitas dúvidas.
Parece-me quase impossível que esta crise – mesmo que seja uma simples questão de liquidez, como opina R. Reis – não venha a afectar a actividade económica não financeira.
Esta mesma opinião já aqui expressei no início da crise, há mais de 3 semanas.
É aliás isso que começa a emergir dos primeiros indicadores qualitativos pós-crise, mais avançados, que medem a evolução da confiança dos consumidores e dos empresários para os próximos meses.
Nomeadamente nos USA e na Alemanha, é visível a oscilação desses indicadores, para valores bem mais baixos do que os registados antes da eclosão da crise.
E é assim que as economias abrandam, cumprindo o seu ciclo: começam sempre pela redução das expectativas.
Relativamente às ousadas declarações do Prof. R. Reis, dois comentários finais:
1º) Oxalá venha a ter toda a razão, que Deus o ouça;
2º) A certeza que temos é que desta crise do crédito já se fala há quase um mês - se for necessário mais um para deixar de se falar, será o “match” perfeito.
Dr. Tavares Moreira
ResponderEliminarSerá que estamos todos a falar da mesma coisa? Crise de liquidez, crise financeira e crise da economia real têm definições universalmente indiscutíveis?
Tenho alguma dificuldade em perceber, talvez devido aos meus rudimentares conhecimentos de economia, que uma subida mais acentuada das taxas de juro (provocada pela crise financeira associada ao mercado de sub-prime) não tenha impacto na economia real!?
Não sei se estaremos perante uma crise, no verdadeiro sentido da palavra, mas que o aumento das taxas de juro deverá ter um impacto negativo na economia, com um efeito de abrandamento, parece-me inquestionável.
Não me atrevo, no entanto, a dar palpites sobre a dimensão do impacto.
Caro Tavares Moreira,
ResponderEliminarNão tenho nenhumas pretensões em contrariar os prognósticos do jovem professor e também faço votos de que ele acerte na "mouche". Contudo, porque acompanho as perspectivas de Nouriel Roubini (http://www.rgemonitor.com/blog/roubini), que já aqui tenho referido, receio que haja optimismo excessivo da parte do nosso compatriota.
O último "post" de Roubini, de 27/8, e que hoje já contava com 205 comentários, muitos dos quais extensos, prossegue na mesma linha de advertência de que a crise não vai ser ultrapassada tão depressa.
Cito o início do referido "post"
"There is now a growing realization that the turmoil in financial markets in the last few weeks is not just due to a liquidity crunch but it is more importantly related to serious credit problems: bankrupt and/or distressed homeowners, bankrupt mortgage lenders, distressed homebuilders, some distressed highly leveraged financial institutions and even some over-leveraged parts of the corporate sector. Liquidity problems and crunches can be solved with liquidity injections by central banks. But more severe credit problems of borrowers cannot be resolved with monetary policy. Rather if the distress of borrowers need to be addressed sometimes fiscal solutions – like financial support of distressed mortgage borrowers – needs to be considered".
Margarida,
ResponderEliminarConfesso-lhe que comungo das suas dúvidas.
Dizer que a crise é apenas de liquidez e não financeira é uma distinção subtil que obviamente depende da acepção mais ou menos lata em que se usarem essas expressões.
Tenho dificuldade em fazer essa distinção: tal como vejo o problema, a crise não é só de liquidez - se assim fosse, as injecções sucessivas de liquidez, em grande escala, pelos Bancos Centrais, teriam resolvido o problema por inteiro.
E não teríamos assistido à ocorrência de sérias dificuldades em Bancos, tanto nos USA como na Alemanha, mais expostos ao risco do mercado hipotecário.
Podemos talvez dizer que essa crise financeira não é generalizada, na medida em que afectou muito pouco o sector não financeiro e por isso as Bolsas, apesar do acréscimo de volatilidade, mostram sinais de grande resistência (sector bancário o mais atingido).
No que se refere à dimensão do impacto do fenómeno no ritmo de crescimento económico, tanto nos USA como na Europa, tb considero prematura qq avaliação, sem prejuízo de considerar que esse impacto será visível dentro de um ou dois meses.
Conclusão e moral desta história: a Margarida sabe de economia bem mais do que confessa.
E já que assim é, porque não arrisca o seu vaticínio quanto à próxima decisão do BCE?
Ainda se aceitam apostas...
Rui Fonseca, mui distinto Comentador,
ResponderEliminarJá verifiquei que meu Amigo segue com a maior atenção setes problemas e dispõe de excelentes fontes de informação pelo que, pela minha parte, nada tenho a acrescentar ao que comenta.
Limito-me a sugerir-lhe a leitura (se não a fez já) do interessante artigo de Barak Obama na edição de hoje do F. Times, em que apresenta algumas proposta de "policy" para responder a esta crise.
Curiosamente do staff de consultores de Obama faz parte um distintíssimo economista português, António Sampaio e Mello.
Atenção por isso nos devem merecer as futuras posições de Obama em matéria económica.
Dr. Tavares Moreira
ResponderEliminarSou uma seguidora da prudência. Por isso não posso estar mais de acordo com a sua perspectiva e vou seguir à recta o seu conselho: "No que se refere à dimensão do impacto do fenómeno no ritmo de crescimento económico, tanto nos USA como na Europa, tb considero prematura qq avaliação, sem prejuízo de considerar que esse impacto será visível dentro de um ou dois meses".
Fazer previsões é uma tarefa cada vez arriscada e confesso que estou um bocado "destreinada". Mas aqui vai a minha aposta: o BCE vai manter inalterada a taxa de juro.
Ainda por cima estou a apostar sem saber qual é a penalização para quem não acertar!? Espero que o castigo não seja grande...
Caro Tavares Moreira,
ResponderEliminar"laborioso DE"?
Cara Margarida,
É essa a aposta certa, pelo que não precisa, tal como eu, de se preocupar com o castigo.
não duvido que ricardo reis seja inteligente .mas parece-me uma promoção descarada, um "upa upa " nos jornais para ganhar notoriedade fácil.Qual a biografia de Ricardo Reis ? Zero!
ResponderEliminardesconfio muito destes gurus de plástico, que vivem no campo ( ele o disse ) longe da realidade..
Margarida,
ResponderEliminarSeja bem vina à "turma" dos que se dispõem a arriscar!
A final, esta vida, sem qq risco, que sentido faz?
Acresce que a sua aposta é de sinal idêntico à minha - BCE vai deixar inalteradas as taxas directoras quando reunir de hoje a uma semana.
A penalidade, para quem perder, é partilhar a conta de um almoço, com o(os) ganhador(es) na Churrasqueira do C. Grande: como vê, o risco financeiro da aposta é bastante limitado, bem menor do que seria num investimento em derivados dos sub-prime loans.
Para já, os apostadores são Tonibler, C. Monteiro e Bruno Simão (Marquês da Praia).
Bruno Simão apostou na descida, C. Monteiro na subida e os restantes na manutenção.
Há grande ansiedade nos bastidores do 4R quanto ao resultado deste jogo!
Falta saber se Pinho Cardão também participa. Há dúvidas (sabe demais, talvez...).
Tonibler,
Laborioso acha mal? Preferia impagável? Respeitável? Venerável? Inefável? Essa expressão é inspirada no brocardo latino "Laborando, vinces...".
Caro Tavares Moreira,
ResponderEliminarSempre achei que o DE muito útil, mas só na sua versão em papel. Sendo mais espesso que as listas telefónicas, embrulha melhor as castanhas. Por outro lado, a sua utilização do outro lado sai prejudicada face à lista telefónica e a outros papéis mais macios. Tudo isto levaria à atribuição ao DE de vários adjectivos. Agora, "laborioso", não estou a ver...
Então não havia de participar?
ResponderEliminarVou pelo empate!...
Os media colocarem Ricardo Reis como o futuro grande economista, a mim diz-me pouco. A partir do momento em que os media elogiam e bajulam o Joe Berardo, estamos quase nos USA, "the land where everything is possible".
ResponderEliminarEspero também que R.R. esteja certo, contudo, são mais as noticias veículadas para desmentir tais afirmações. Ainda hoje, nas primeiras páginas do "laborioso Público", era citada uma reportagem que falavam do sério abrandamento imobiliário. Nele, realçava-se a queda da procura neste sector. E uma coisa é certa. A bolha imobiliária rebentou.
Visto que estamos a menos de um mês, vinha sugerir que se fizesse um post, acerca das directas no PPD/PSD.
Saudações Republicanas
Pinho Cardão,
ResponderEliminarAinda bem! Seja bem vindo ao mundo dos apostadores em taxas de juro!
Espero bem que com este reforço de peso os que apostam no "empate" (nem sobe nem desce)venham a ganhar...C. Monteiro que se vá preparando...
Tonibler,
Permito-me notar que no dicionário de língua portuguesa, entre outras significações, "laborioso" tb significa "penoso", "custoso".
André All-garvio,
R. Reis jogou forte, com estas audaciosas declarações, o que o distingue dos economistas cinzentos e oficialistas que dominam os nossos media e que nunca são capazes de uma previsão arriscada...e por isso defendem sempre, por exemplo, o status quo fiscal.
Devo confessar que, por esta primeira amostra, gostei bastante de R. Reis.