O Pinho Cardão já se referiu aqui ao assunto da recusa do Governo em receber Dalai Lama em chocante contraste com a abertura em relação a Mugabe.
Não resisto a algumas notas adicionais que têm que ver com a ideia de que a hipocrisia nas relações internacionais é lei, e que por isso não impressiona a atitude das mais altas individualidades. É até considerada, de comum, de grande sensatez e de irrepreensível responsabilidade.
Recordo, julgo que a propósito, alguns factos.
Yasser Arafat, então presidente da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), visitou Portugal pela primeira vez em 1979 e foi recebido oficialmente pela então primeira-ministra, Maria de Lourdes Pintasilgo.
Voltou em Novembro de 1993, e foi acolhido com grande pompa e circunstância pelo Presidente Mário Soares.
Não era chefe de qualquer Estado mas o líder de um movimento que pugnava pela criação de um Estado.
Isso não impediu os mais altos dignatários do País de o receberem, considerando até que estavam com esse gesto a contribuir para a paz, para a segurança internacional e para a defesa dos direitos humanos.
A diferença destes comportamentos em relação a Dalai Lama não tem somente a ver com os tempos. Os tempos são de facto outros, mas a questão é exactamente a mesma.
A diferença está entre o que separa o poder da China e o poder de Israel.
Uma nota mais.
Mais cedo do que imaginei, venho aqui louvar a intervenção correcta e corajosa de Ana Gomes. Ontem, entrevistada por uma das TV´s insurgiu-se contra a atitude do Governo do PS a que pertence, recordando que foi Portugal que, pioneiro, junto da ONU dinamizou um movimento de condenação da República Popular da China contra a violação dos direitos do Homem.
Revelou que nessa altura os diplomatas portugueses e seguramente o Governo foram alvo de pressões por parte da China. Considerou-as normais no jogo das diplomacias e dos interesses internacionais. E concluiu o que está à vista: não foi a firme atitude de Portugal na defesa de valores fundamentais que prejudicou as relações com a China até hoje.
E concordo com a asserção conclusiva de Ana Gomes: um Governo que não se dá ao respeito, não espere que venha a ser, no futuro, alvo de respeito.
Essa sim, deveria ser uma regra da realpolitik.
Se calhar o Arafat teve um tratamento melhor que o Dalai Lama, tal como o Mugabe, porque eles são mais... contundentes na defesa daquilo em que acreditam.
ResponderEliminarSe calhar porque, ao contrário do Dalai Lama, eles usam os métodos do terrorismo e assassinatos de inocentes para defender a sua concepção do Estado... e a esses temos de perdoar (quem não se recorda da história com as FP25? Os condenados foram só os que se arrependeram e colaboraram. Os instigadores continuaram ao fresco!).
Esta é a mentalidade de um país fraco e facilitista... é a mentalidade de "este é inofensivo para nós portanto estamos a... nas tintas para ele! Aquele(s) podem causar problemas, então vamos ser compreensivos e ajudá-los a ver a luz!".
Ou seja é a mentalidade do - para não criar problemas olha para o lado e assobia enquanto eles passam que não é nada connosco!
Permita-me que utilize palavras que fazem o título do seu post:
ResponderEliminarPenso que é mais " a ilusão de que com cobardia se compra respeito".
Esta saída da Drª Ana Gomes veio mesmo a calhar.
Caro JMFA,
ResponderEliminarO conceito de Realpolitik, no âmbito das Relações Internacionais, implica a defesa dos interesses de um Estado seja por que meio for e da aplicação deste conceito resulta, normalmente, um jogo de soma zero (i.e. para um ganhar, o outro tem de perder).
Ora, aplicando este mesmo conceito ao Estado Português na sua relação com o Dalai Lama, o que nós temos é uma verdadeira estupidez quase tão grande como aquela em que o Ministro Manuel Pinho foi dizer, lá para os Chineses, que a mão-de-obra em Portugal era baratinha. Portugal não tem Realpolitik na prossecução da sua política externa porque para se poder usufruir deste conceito tem de se ter duas coisas: 1- Poder; 2- Dinheiro. Nós não temos nem uma coisa, nem outra.
Assim, se por um lado eu até posso compreender porque é que não há uma recepção oficial ao Dalai Lama, visto tratar-se de um chefe de Estado no exílio cuja recepção implicaria o reconhecimento tácito das pretensões Tibetanas chocando, obviamente, com os interesses da China. Por outro lado, essa questão poderia ter sido ultrapassada reconhecendo-o, simplesmente, como autoridade religiosa e dizendo que uma coisa não tem nada a ver com a outra (esta é uma das vantagens da hipocrisia das R.I). Além disso, o respeito pela diversidade cultural é uma das prioridades da U.E para 2007-2013 (caso contrário não estariam tão interessados em integrar a Bósnia na União).
Neste sentido, e eu não gosto mesmo nada da Dra. Ana Gomes, acho que - desta vez - a senhora tem toda a razão.
Inteiramente de acordo, caro Anthrax
ResponderEliminarÉ um bom texto, esse, caro Anthrax.
ResponderEliminarOntem, de facto, parece-me que, pela primeira vez, concordei com a Drª Ana Gomes!...
ResponderEliminarÉ a minha formação base a falar, meus queridos amigos, nada mais... ah sim, e o princípio da razoabilidade também falou.
ResponderEliminarCaro Antrax,
ResponderEliminarFaço das suas as minhas palavras:
"Ssscelente,Ssscelente!
:)