Em 29 de Agosto último, referi aqui declarações de Ricardo Reis, (muito) jovem Professor da Universidade de Princeton, em entrevista ao D. Económico, na qual o jovem Professor arriscava uma surpreendente profecia: dentro de um mês não se falará mais da crise dos mercados financeiros.
Acrescentava o Professor R. Reis que a crise de que então se falava diariamente era apenas monetária, não verdadeiramente financeira, pelo que seria de muito curta duração e os seus efeitos rapidamente se desvaneceriam.
É claro que para os laboriosos “media”, preocupados como estavam em encontrar suporte para a tese oficial de que a economia portuguesa em nada seria afectada pela turbulência dos mercados, a profecia do jovem Professor caía como “sopa no mel”.
O entusiasmo com a profecia foi ao ponto de Ricardo Reis ter sido logo apelidado de “nova estrela da economia nacional” entre outros epítetos.
No post então editado “Crise financeira: Ricardo Reis versus mercados”, mostrei surpresa por tão ousada profecia mas, como é evidente, não quis deixar de conceder ao Professor Reis o benefício da dúvida, esperando, com então referi, que a sua profecia se cumprisse.
Passaram os 30 dias da arriscada profecia, já lá vão mais 40 dias e a crise não só não passou como se mostra actualmente bem mais grave do que então se suspeitava.
Nos últimos dias assistimos a uma quase hecatombe nos resultados dos maiores bancos americanos, com destaque para a gigante Merrill Lynch, que de um golpe apenas foi obrigada a reconhecer perdas de USD 8 mil milhões decorrentes da desvalorização de activos hipotecários e seus derivados.
Outro gigante, o Citigroup sofreu também perdas elevadíssimas.
Em ambos os casos a situação foi considerada de tal modo grave que os seus Presidentes executivos foram forçados a resignar – no caso da Merrill Lynch com uma modesta (para os padrões portugueses, claro) indemnização de USD 160 milhões...
O pânico instalou-se nos mercados e a cotação das acções dos bancos, tanto nos USA como na Europa tem sofrido pesadas perdas.
Assiste-se a uma novo episódio de aversão ao risco, caracterizado pelo downgrading de extensas áreas de risco financeiro até agora tidas por muito seguras – por exemplo as obrigações municipais e estaduais nos USA.
Podemos assim concluir que a crise, além de monetária como referia Ricardo Reis, é também financeira e bastante profunda.
Resta saber quais serão as suas implicações no comportamento das economias dos países mais afectados por esta nova fase de aversão ao risco.
Quererão os laboriosos "media" habilitar-nos com nova profecia para nos tranquilizar?
Anjos ou Deuses
ResponderEliminarAnjos ou deuses, sempre nós tivemos,
A visão perturbada de que acima
De nos e compelindo-nos
Agem outras presenças.
Como acima dos gados que há nos campos
O nosso esforço, que eles não compreendem,
Os coage e obriga
E eles não nos percebem,
Nossa vontade e o nosso pensamento
São as mãos pelas quais outros nos guiam
Para onde eles querem
E nós não desejamos.
De: Rcardo Reis (heterónimo de Fernando Pessoa)
Muito a propósito, caro Bartolomeu, muito a propósito!
ResponderEliminarTenho aliás notado que anda muito inspirado, ultimamente...não quer arriscar uma profecia, neste caso?
Caríssimo Dr. Tavares Moreira, crê ser possível arriscar seja o que fôr, relativamente a matéria sujeita naturalmente a tão diferentes e imprevisíveis influências?
ResponderEliminarEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarCaro Tavares Moreira,
ResponderEliminarNão sei, não. Para a generalidade dos comentadores a coisa está entre o cinzento claro e o preto.
As perdas reconhecidas pelas instituições financeiras – 20 mil milhões de dólares – é apenas a ponta de um iceberg que atingirá as centenas de milhares de milhões de dólares.Mas esta é uma parcela ínfima dos valores que estão em jogo não só em hipotecas sub prime mas também near prime e prime, para onde a vaga de incumprimentos se está estender. E que se espraia pelos cartões de crédito, crédito para compra de automóvel, etc.
Ouvem-se estas notícias e não podemos deixar de reparar para o nosso umbigo. Para concluir que também à volta dele circulam estas ameaças.
Com a dívida externa que já atingimos em Portugal onde vão os bancos arranjar imaginação para continuar a subir degraus de dois dígitos?
E se perderem a passada irão escorregar pela escada abaixo?
Caro Rui Fonseca,
ResponderEliminarPara quem tem subido degraus de 2 dígitos existem, face a uma alteração de circunstâncias como a que estamos a testemunhar, várias alternativas:
- Subir degraus de 1 dígito;
- Estacionar;
- Descer degraus de 1 dígito;
- Descer degraus de 2 dígitos;
- Escorregar pela escada abaixo.
Meu Amigo foi logo para a última opção: convenhamos que será um tanto pessimista, não acha?
Caro Bartolomeu,
Não quer mesmo arriscar um pouco? Não é de opinião que a vida sem qq risco fica algo sensaborona?
Caro Tavares Moreira,
ResponderEliminarNão optei, perguntei.
Fico na expectativa da sua opinião.
Caro Dr. T. Moreira, qualquer prognóstico que pudesse emitir, basear-se-ia unicamente, na tosca opinião infundada de um leigo nesta matéria. Longe, longíssimo dos conceitos que orientam (desorientam) a alta finança mundial.
ResponderEliminarMas se o caro Dr. me desafia para brincar aos banqueiros, assim como quem atira fisgadas a pardais, eu dir-lhe-hei simplesmente, que na minha opinião já não ha formulas que consigam manter os níveis dos resultados a que as finanças e os investimentos mundiais se habituaram. No meu ponto de vista, insisto, resta à finança europeia e americana estar atenta ao desenvolvimento da finança asiática e aos jogos de poder económico que se irão desenrolar a partir daí.
Depois... bem depois resta-nos rezar, mas rezar com muita fé mesmo, e pedir ao altíssimo para que não expluda um conflito mundial entre uma coligação china/rússia/india e os países do médio oriente, detentores da produção mundial de petróleo.
Parece-lhe apocalíptica esta visão?
Rui Fonseca, meu Caro,nem pela cabeça me passou atribuir-lhe uma opção, nem a si nem a mim compete neste contexto optar...
ResponderEliminarO que eu disse, simplesmente, foi que das 5 opções de correcção de tiro que se oferecem aos bancos, na singela escala que elaborei, meu Amigo foi para a última e tb a mais "dramática"!
Se quer a minha opinião dir-lhe-ei que a muito curto peazo irão para a opção 1 (até pelo efeito da inércia de crescimento) e, lá para o 2º semestre de 2008, vão eatacionar.
Mais longe, não arrisco por agora.
Caro Bartolomeu, bem dizia eu que o Senhor tem andado inspirado...e pelos vistos continua...
As suas considerações, proferidas em estilo apocalíptico, tocam nalguns dos problemas mais agudos da geopolítica económica do nosso tempo! Bem observado!