sábado, 10 de novembro de 2007

Pessoas idosas: podemos fazer melhor!

A comunicação social deu quinta-feira grande cobertura ao caso do encerramento de um lar de idosos em Valongo. Os media preocupados em vender a notícia, em mediatizar um caso de polícia e à procura de mais um “crime”, concentrou o essencial da sua reportagem à porta do Tribunal de Valongo onde deu entrada a proprietária daquele estabelecimento para ser presente a um juiz, que, depois de largas horas de interrogatório noite dentro, acabaria por a deixar sair em liberdade, fixando-lhe o pagamento de uma caução de 5.000 € e decretando a suspensão da actividade de exploração do lar. Tudo acompanhado pelas televisões em directo!
Muito mais importante que um directo no Tribunal, teria sido aproveitar o facto para informar a opinião pública sobre o que se passa por esse País fora com os lares e outro tipo de estabelecimentos que acolhem pessoas idosas e sobre como é que o Estado regula e fiscaliza a sua actividade, sobre como previne e actua em relação a estabelecimentos ilegais e quais as políticas que prossegue para assegurar com efectividade a segurança e a qualidade de vida das pessoas que aí encontram uma morada para os seus últimos anos de vida. Mas não! Para quê?
Muito mais importante que transmitir em directo a leitura por um auxiliar do Tribunal das medidas de coação impostas à proprietária, teria sido saber da vida das pessoas idosas alegadamente mal tratadas naquele estabelecimento. Mas não! Para quê?
A história infeliz das pessoas idosas deste lar de Valongo, e de milhares de muitas outras – anónimas, esquecidas, indefesas, silenciosas, vítimas de violência física e psicológica – deveria justificar algum “dispêndio” de tempo a pensarmos sobre os erros cruéis que a sociedade de hoje comete ao esquecer-se que as pessoas idosas são seres humanos e não fardos. São pessoas que no final das suas vidas mereciam ser acolhidas e incluídas na sociedade preferencialmente através de soluções de proximidade familiar e cultural, respeitando o seu passado e valorizando a dimensão afectuosa.
Deveríamos promover soluções que privilegiassem o apoio familiar, designadamente o apoio domiciliário. Sucessivos governos, e este governo não escapa, fizeram apostas fortes em investimento em lares residenciais para pessoas idosas, fomentando a sua vida longe das suas famílias.
A par desta política de “quantidade”, a qualidade, como vem sendo habitual em muitos domínios das nossas políticas públicas, foi deixada para segundo plano, criando campo para abusos e aproveitamentos indevidos dos dinheiros do Estado e da condição de vulnerabilidade das pessoas idosas.
A qualidade da prestação de serviços sociais, que o Estado deve promover, regular e fiscalizar, é um factor fundamental para a concretização da equidade e da justiça social. Compete ao Estado assegurar que as pessoas que apresentam fragilidades sociais e económicas, e portanto diminuídas na sua capacidade para se imporem e defenderem, têm acesso a serviços capazes de satisfazer com elevada protecção e bem estar as suas necessidades e carências e que os dinheiros públicos são correctamente utilizados.
O que não é admissível é que o Estado continue a financiar as instituições de solidariedade social através de um subsídio per capita igual para todas, não descriminando positivamente as instituições que prestam serviços de maior qualidade. Incentivar a qualidade é uma parte do caminho para assegurar que as pessoas idosas acolhidas em instituições têm uma vida digna. É um aspecto que embora tenha uma dimensão material, não deixa de contribuir positivamente para não agravar as carências afectivas que normalmente andam associadas à vida nos lares, a que acrescem os problemas próprios do envelhecimento.

6 comentários:

  1. Diz V. Exa.:
    "A qualidade da prestação de serviços sociais, que o Estado deve promover, regular e fiscalizar, é um factor fundamental para a concretização da equidade e da justiça social. Compete ao Estado assegurar que as pessoas que apresentam fragilidades sociais e económicas, e portanto diminuídas na sua capacidade para se imporem e defenderem, têm acesso a serviços capazes de satisfazer com elevada protecção e bem estar as suas necessidades e carências e que os dinheiros públicos são correctamente utilizados."

    Subscrevo inteiramente este seu seu ponto de vista.
    Se o estado (a segurança social?) cumprisse esta obrigação, não assistiamos a casos que nos ferem a alma!

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  2. Cara Margarida
    Todos os seus textos têm ultimamente abordado e ainda bem que há alguém a fazê-lo, assuntos que se prendem com a falta de sentido humanitário que o estado revela nas suas relações com o cidadão comum. Creio que este comportamento se pode assemelhar ao capitalista selvagem, que para se dar ares de protector dos desvalidos e dos desfavorecidos, dá dinheiro,mas não dá calor,não dá assistência amiga, não dá um pouco de si próprio.O estado, esse conceito político-social,inventado "para nos integrar a todos", cumpre, quando cumpre,mas não ampara, não protege e não acarinha ; é hibrido, é frio, é egoista!.

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  3. É verdade, Margarida, há um longo caminho a percorrer...e a pressão é cada vez maior, a procura de apoios cresce muito mais depressa do que a capacidade, política ou económica, de garantir as soluções adequadas a proporcionar uma velhice digna.

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  4. Caro invisivel
    Aponta muito bem que o Estado não cumpre com as suas obrigações. Também neste domínio o Estado falha tremendamente nas suas funções de regulador e fiscalizador. Mas a sociedade falha também pela sua insensibilidade e frieza.
    Com o justo reconhecimento pela actividade de grande qualidade que prestam algumas instituições e grande admiração pela generosidade e pela humanidade das pessoas que aí trabalham, temos muitos apelidados "lares" da terceira idade que são verdadeiras "prisões" ou depósitos de gente, como lhes queiramos chamar.

    Caro antoniodasiscas
    Ás vezes é mesmo de capitalismo selvagem que estamos a falar. Mas o Estado não dá o que tem por obrigação dar e as pessoas estão cada vez mais egoístas e oportunistas. Há muitas instituições que sob a capa de "não lucrativas" lucram com a solidão, despojando dos seus bens as pessoas idosas que "contratam"...Uma vergonha!

    Cara Suzana
    Apesar da procura ser superior à oferta e estarmos sob a pressão terrível do envelhecimento da população, deveríamos parar para pensar: repensar as políticas públicas de apoio à terceira idade, incluindo o modelo de apoio social. Porque embora saibamos que muitos dos nossos pensionistas vivem com magríssimas pensões, o que estas pessoas mais precisam são de apoios em relação às coisas mais essenciais que os afligem, a saúde, a alimentação, a segurança, o aconchego de um canto para estarem,... O Estado não paga afectos, estes são as pessoas que têm ou não para dar. Aqui é a sociedade que temos vindo a construir, na qual incluo os planos da educação e da formação como fundamentais, que precisa de reposicionar os seus valores...

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  5. Anónimo20:21

    Os lares e o infantários tém algo de comum._O início e no fim da vida do cidadão, momentos especialmente frágeis, são desprezados pelo estado.

    Não precebo!! Dá ideia de falta de estratégias, de critérios politicos que orientem a vida do país com visão intergeracional.

    Lá estão dois sectores em que o estado devia marcar presença. Infantários e lares de idosos. Deveria no mínimo criar os espaços e concessionar a exploração. Nestas situações em que a igualdade de tratamento deveria ser garantida (no nascimento e na velhice) a presença do estado garante mais eficácia na obtenção desse objectivo do que a regulação, a fiscalização e a atribuição de verbas a organismos privados.

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  6. Caro Agitador
    Num ponto estamos totalmente de acordo: há deficiências na visão estratégica relativamente a políticas públicas de protecção e de incentivos à natalidade, ao envelhecimento activo e modelos de integração, organização e financiamento dos apoios sociais à primeira infância e à velhice.
    Num outro ponto não estamos de acordo: o Estado não deve marcar presença como prestador de serviços; do meu ponto de vista não tem essa vocação; o importante é que tenha uma visão política estratégica, promova , regule e fiscalize as actividades.
    Deixo-lhe esta pergunta: será que o Estado teria capacidade para administrar as 2.261 respostas sociais que integram a Rede Social (números de 2006, constantes da Carta Social)? Este número é globalmente deficitário, assim como é insuficiente em cada categoria de resposta (creches, lares de idosos, serviço de apoio domiciliário a idosos).

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