terça-feira, 22 de janeiro de 2008

O Défice de 2007, a Economia, os Impostos e as Eleições

O resultado preliminar da Execução Orçamental de 2007, ontem divulgado pelo Governo, deixa claro o embuste que foi criado à volta das contas públicas de 2005, sendo agora também evidente que o retrato previsto pela “Comissão Constâncio” não correspondia à verdade. E aqui reside o pecado original: todos tomámos como real a situação orçamental de 2005, os famosos 6.83% de défice. Só que não o era. E, assim, contra o que inicialmente se tinha pensado, o défice de 4.6% do PIB previsto para 2006, afinal ficou em 3.9%. E o défice de 2007, inicialmente previsto em 3.7% do PIB, afinal, não ficará nem em 3.3% (objectivo revisto em Março de 2007); nem tão-pouco em 3% (valor inscrito no Orçamento para 2008), mas sim bem abaixo: ao que parece, em redor de 2.5%!...

É um bom resultado – mas atenção, os números ontem divulgados mostram que foi a receita (que ficou em mais de 1400 milhões de euros acima do orçamentado no Estado, e em quase 1000 milhões na Segurança Social), a grande responsável por este feito. Porque o problema de fundo da despesa pública portuguesa, que se situa na despesa pública corrente e, em particular, nas despesas com o pessoal (onde reside o famoso “monstro”, e que ficaram mais de 340 milhões de euros acima do orçamentado), não foi atacado – o que é a confissão de que o PRACE está, infelizmente, muito longe de atingir os objectivos inicialmente traçados.

Mas o resultado ontem adiantado prova também que existia, de facto, margem de manobra mais do que suficiente para que a proposta de baixa de impostos imediata (descer o IVA de 21% para 20% e o IRC de 25% para 22%), apresentada pelo PSD em Março de 2007, pudesse ter sido acolhida. Assumindo tudo o resto constante, esta proposta, com efeitos na segunda metade do ano passado, custaria cerca de 500 milhões de euros – ou cerca de 0.3% do PIB. Logo, mesmo considerando esta opção, o défice de 2007 poderia situar-se abaixo de 3%... não colocando em causa a consolidação das contas públicas (que deve ser feita, preferencialmente do lado da despesa), o objectivo do défice para 2008, e com efeitos positivos sobre a economia nacional – que bem precisada está, como sabemos (veja-se o crescimento económico em baixa e o desemprego em alta, por exemplo)…

Porém, como é evidente, se o Governo tivesse aceitado a proposta então apresentada, depois não teria margem para, lá mais para o fim de 2008, propor uma baixa de impostos que terá efeitos em 2009… ano de eleições!... Assim, por motivos eleitoralistas e uma obsessão sem limites pelo défice público (onde anda o PS do passado?!...), é a economia portuguesa que continua sufocada com impostos, a ver a vida económica das regiões fronteiriças (mais desfavorecidas) a passar-se para Espanha, a assistir à deslocalização de empresas para a Europa de Leste… É que tão ou mais importante que reduzir o défice público, é recuperar a economia. E na verdade, pelo caminho que levamos, corremos o risco de um belo dia acordarmos, termos o défice reduzido e… não termos economia. É pena que o Governo não tenha percebido isto. Ou melhor – que o tenha percebido, mas que não actue quando o devia ter feito, e apenas quando lhe interessa, em ano de eleições. O que só posso qualificar como lamentável.

6 comentários:

  1. Anónimo19:32

    Caro Miguel,

    Gostaria de saber porque é que quando fala de baixa de impostos para as empresas nunca fala nas prestações para a SS.
    Poucas são as PME’s que conseguem viver com o nível das prestações para a SS, poucas são as PME’s que arriscam contratar pessoas com as responsabilidades que adquirem face à SS; poucas são as PME’s que cumprem a lei por impossibilidade financeira, com todas as distorções decorrentes.

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  2. Caro Agitador,

    Muito obrigado pelo seu comentário. Não sou um defensor da descida das contribuições sociais por duas razões:
    1. Tal afectaria as contas da nossa Segurança Social que, como se sabe, não tem propriamente um futuro desafogado...
    2. Portugal é um país trabalho-intensivo, isto é, utiliza mais intensivamente o factor trabalho do que o factor capital. E isso tem-nos sido fatal. Desde logo porque é nos países que mais utilizam o factor capital que o crescimento económico tem sido maior; depois porque utilizamos mais intensivamente o factor produtivo em que somos menos eficientes (vide a baixa qualificação dos nossos recursos humanos e a correspondente baixa produtividade). Logo, a "receita" é atrairmos mais capital. Daí a descida do IRC... Uma descida das contribuições para a Segurança Social icentivaria ainda mais a utilização do factor trabalho... sem a correspondente entrada/atracção de capital!... Mas em relação a esta razão, se me permite, sugiro a leitura do meu texto de hoje no "Jornal de Negócios", que poderá encontrar com facilidade no site www.jornaldenegocios.pt.

    E são estes os motivos pelos quais defendo a baixa do IRC (e também do IVA, por outrs razões) e não das contribuções para a Segurança Social.

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  3. A minha alma está parva!...
    Como ando com as leituras atrasadas, só agora li no último Expresso que, de acordo com informações prestadas pelo próprio Ministério das Finanças, as “receitas extraordinárias” de 2006 ascenderam a mais de 2.121 milhões de euros, a saber: antecipação de impostos sobre o tabaco(300 milhões), vendas de património(439 milhões), dividendos extraordinários e antecipados(REN-60 milhões), dividendos extraordinários (GALP-124 milhões, recuperações de créditos líquidas de adicionais da operação de titularização(1.198 milhões).
    Estas receitas extraordinárias equivalem a 1,4% do PIB!...
    Não foram essas receitas extraordinárias, que Sócrates e os Socialistas tanto criticaram a Manuela Ferreira Leite, e o défice seria 8.176 milhões de euros, correspondentes não a 3,9%, mas a 5,3% do PIB.
    Este valor é superior ao valor apurado para 2004, era Bagão Félix Ministro das Finanças, que foi de 5,2%, não incluindo receitas extraordinárias(2,9% com receitas extraordinárias)!...
    Perante este quadro, e por muito que custe à propaganda e comentadores oficiais, conclui-se que não melhorámos nada em relação a 2004, o que até a mim me espantou, e que o progresso no défice não se deveu à contenção da despesa.A segunda conclusão, já sabia; quanto à primeira, a minha alma ficou parva…
    (Pinho cardão no quartarepublica)

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  4. Na verdade o Défice real de 2006 não foi de 3,9% mas tão só de 5,3% do PIB se entrarmos em linha de conta com as receitas extraordinárias. Assim aos fictícios 3,9% haverá que juntar o valor em percentagem do PIB das receitas extraordinárias, a saber: antecipação de impostos sobre o tabaco (300 milhões), vendas de património (439 milhões), dividendos extraordinários e antecipados (REN-60 milhões), dividendos extraordinários (GALP-124 milhões, recuperações de créditos líquidas de adicionais da operação de titularização (1.198 milhões), o que dará, tudo somado 1,4% e assim para valor real do Défice, 5,3% do PIB.
    Mas este já de si valor astronómico do Défice (superior ao de 5,2%, com receitas extraordinárias, de Bagão Feliz em 2004) foi obtido em situações muito diferentes das de 2004.
    Se quisermos fazer o exercício de comparar o Défice de 2004, último ano de gestão PSD/CDS com o de 2006, haverá que acrescentar ao valor do Défice de 2006 as “outras receitas extraordinárias” como sejam o aumento de dois pontos percentuais do IVA (19% para 21%) e que traduz uma receita de 0,45% do PIB, o valor arrecadado com todos os outros aumentos de impostos que o governo de Sócrates impôs, as “receitas” provenientes dos aumentos das taxas moderadoras e de todos os outros Cortes Sociais, encerramento de maternidades, SAPs, etc que, estimando por baixo daria 0,5% do PIB e assim, tudo somado, encontraríamos para o Défice real de 2006, obtido em condições idênticas às de 2004, o valor astronómico de 6,72%.

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  5. As receitas provenientes dos impostos Directos e Indirectos arrecadadas pelo governo PSD/CDS em 2004, somaram 28.389 milhões de euros. Em 2007 estas receitas, dos mesmos impostos, totalizaram 34.557 milhões de euros. Uma diferença portanto de 6.168 milhões de euros. Este montante representa 4,6% do valor do PIB de2004.



    Isto significa, muito simplesmente, que o Défice real de 2004 (com todas as receitas extraordinárias) que ascendeu a 5,2%, seria reduzido para apenas 0,6% do PIB se pudesse contar com igual montante de receitas de impostos que hoje é cobrado aos portugueses. Sem contarmos sequer com as múltiplas receitas extraordinárias das desorçamentações e venda de património praticado pelo governo de Sócrates ou ainda as receitas provenientes dos cortes sociais que impôs aos portugueses constata-se, quanto elevado é o grau de desgovernação económica deste País e quanto falaciosa, mistificadora e miserável é a campanha que apresenta como grande triunfo do governo a redução do Défice em 2007 para 2,4% do PIB.

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  6. Olá, olá, bom dia.

    Devo dizer-vos que "vocezes" dão-me cabo do juízo! Põe-se a falar de percentagens para cá e percentagens para lá e a luzinha - que se acende por cima da minha cabeça - fica acesa, mas não está ninguém em casa!

    Seja como for, percebo lindamente o que o Agitador está a dizer. É praticamente impossível para uma pequena empresa passar à fase seguinte enquanto a situação fiscal e contributiva se mantiver como está.

    Mesmo com algumas limitações, compreendo também o que o Miguel diz sobre a questão do trabalho-intensivo e a história do capital, só que por muito que se queira as pequenas empresas não têm dinheiro para pagar trabalhadores qualificados. Eu sou um trabalhador qualificado, mas algum dia alguém me oferecesse um mísero ordenado de 750,00 € ou 800,00 € líquidos, eu agarrava nos meus brinquedos e ía brincar para outro lado. À excepção das grandes empresas, que até nem são os maiores empregadores em termos de sector privado, os pequenos não podem pagar 1500,00 € por 1 empregado qualificado, quanto mais pelo número que eles efectivamente precisam para fazerem crescer uma empresa.

    De qualquer forma, eu também vou passar pelo jornal de negócios para ver qual é a relação (ou não) entre as contribuições sociais e a não entrada de capital... assim de repente pareceu-me adequado.

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