sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

O BPP e as aberrações de um Estado máximo

Claro que sou um defensor da economia de mercado e da iniciativa privada e é óbvio que nada tenho contra as grandes, médias ou pequenas fortunas, desde que legitimamente adquiridas e eticamente aplicadas. Defendo também um Estado mínimo, única forma de assegurar, com eficácia, por si, ou através de outrem, os serviços essenciais à colectividade. Um Estado máximo, como o que temos, dispersa-se e perde-se, não os assegura, nem os regula.
O Estado interveio no Banco Privado Português. É um banco “privado”, no sentido próprio da actividade bancária: gere fortunas e patrimónios, especula com participações sociais, envolve-se em actividades de risco elevado, de forma a assegurar resultados supranormais, para si e para os seus accionistas e depositantes. Em sã economia de mercado, retirando daí os benefícios, também não pode deixar de arcar com os prejuízos.
Dada a natureza da sua actividade, a saída da crise deveria equacionar-se no contexto do mercado. A intervenção do Estado, tomando os riscos que o mercado não quis assumir, pode traduzir-se, a prazo, na entrega de fundos correspondentes aos valores garantidos. Dinheiro de impostos, arrecadado dos contribuintes em nome do interesse público, assim colocado ao serviço de interesses privados, pior ainda, de um pequeno grupo de interesses privados.
Se o BPP não soube medir os riscos e fez uma gestão desastrada dos fundos à sua guarda, condenável é acção do Estado em colocar em risco dinheiros públicos para cobrir o prejuízo nos dinheiros privados. Aberrações de um Estado máximo, do facilitismo de um Governo que o fortalece e de uma opinião pública que o aceita. Um exemplo acabado de má utilização de fundos públicos, nossos. Claro que assim não há impostos que cheguem.

14 comentários:

  1. Sem dúvida, caro Dr. Pinho Cardão.
    É esta talvez a altura própria para que seja o cidadão a xegir a retirada do sigilo bancário, de forma a serem conhecidos os nomes e cargos dos "grandes" clientes do BPP. Talvez desta forma, ficassem mais "compreensivos" os motivos que levam o estado a intervir e a entregar valores que somente se encontram à sua garda e gestão.
    E que não nos venham com a conversa fiada que visam o relançamento da economia...
    So espero que a D. Branca tenha "Lá" a alminha em descanso.

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  2. Anónimo14:34

    Gostava de saber, no futuro, que desculpas vão apresentar os nossos políticos ao "mexilhão" do costume, para subir impostos, pedir mais sacrifícios ou até, aplicar coimas sobre incobranças ridículas. Para estes nunca haverá perdão. Acho que a paciência dos cumpridores e honestos começa a perder-se ...

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  3. Anónimo14:52

    Não posso estar mais de acordo, Pinho Cardão. É exactamente esta a minha perspectiva.
    Julgo que foi ontem que no Parlamento Paulo Rangel dirigiu ao ministro das finanças a pergunta que se impõe fazer: se as garantias que o banco tinha para dar não foram suficientes para o mercado, como o podem ser para o Estado?
    Por outro lado, torna-se claro que as dificuldades porque passa o BPP não teriam, se agravadas, efeito contaminatório. Por isso percebe-se mal a intervenção num pequeno banco de gestão - ao que me dizem - de grandes fortunas e não de pequenas ou médias poupanças, essas sim, merecedoras de tutela

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  4. Caro Pinho Cardão

    O seu comentário tem sentido de estivéssemos em Espanha ou nos EUA.
    Aí, há mais populações e os circulos são menos fechados.
    O BPP foi salvo porque pertençe e um clube e esse clube ajuda os seus membros.
    Senão, como compreender o modo como o Eng J Gonçalves, depois de tudo o que se sabe de algumas da suas decisões, pode manter-se incólume?
    Ou como explicar a apertada supervisão levada a cabo pelo BdP ao BPN?
    Não vem mal ao mundo esse comportamento, nem me dou ao trabalho de perorar sobre o mesmo, desde que fosse mais transparente nos acordos e nas justificações.
    De todos os modos, pelo menos no BPP a culpa não ficou solteira e, nesse sentido e retrospectivamente, a apresentação do panegírico ao Dr João Rendeiro mais pareçe uma acção pífia.
    Cumprimentos
    João

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  5. Caro Pinho Cardão,

    Nenhum dos argumentos que usa para o BPP é menos válido para o BPN ou para o BCP (que, deixemo-nos de eufemismos, é um banco intervencionado).
    Portanto, ou bem que aceitamos que as intervenções sejam à vontade do político, ou não. Se sim, pois bem, confiemos que a informação que o político tem, justifica a intervenção. Por outro lado, não há fundos do estado envolvidos, há uma garantia que é remunerada, diga-se, a um preço um pouco exagerado.

    Parece que a intervenção é para salvar os mesmos que aparecem nas AG do BCP, nos camarotes da Luz e de Alvalade, nas discotecas de Albufeira, nos comentários da TV, etc...? Isso parece. Mas contra isso, batatas.

    Caro JMFA,

    A pergunta do Paulo Rangel é uma daquelas em que se compreende porque é que temos que aguentar ministros assim - a oposição ainda é pior! Basta compreender um bocadinho do mercado interbancário para se ter logo a resposta. Os bancos não podem penhorar os activos de outros sem que se reuna a assembleia de credores, seja decretada a falência, etc...e depois os bancos não podem emprestar a um banco em situação de default sem que provisione de acordo que pode ser logo de 100%, isto é, vai dos activos directamente aos custos. Logo, não poderia acontecer sem garantia do estado e este fez-se remunerar por isso.

    Resultado da pergunta: afinal, ainda bem que o outro é ministro e este não.

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  6. Caro Bartolomeu:
    Tanto como a dos grandes clientes, ter-se-á feito sentir a pressão de grandes bancos internacionais que detinham créditos sobre o BPP e costumam financiar ou intermediar operações da República Portuguesa.

    Caro Mitespossidentterram:
    As desculpas ou os argumentos para aumentar impostos é o mais fácil que há: o combate ao défice, a "necessidade" de investimentos públicos para relançar a economia, a crise, etc, etc. Enfim, o Governo agrava o défice e, no fim, não tem pejo em pedir dinheiro para desagravar o que agravou. Contando com a fraca memória dos povos.

    É verdade, caro Ferreira de Almeida. Aliás, a posição do governo na matéria foi cheia de contradições. Primeiro, deu sinal de não intervenção, ao negar o risco sistémico, isto é, de contaminação do sistema; depois, ao admitir que esse risco existia. Mas sem o explicar nunca. Afinal, é fácil dispor do dinheiro dos outros; mais ainda, o governo considera que o dinheiro público é dele.

    Caro João:

    Como sabe, uma coisa é o apoio dado pelo Governo a um Banco em crise, e aos seus accionistas e depositantes, e outra coisa, completamente diferente, é a punição dos responsáveis pela gestão, caso tenham agido com culpa ou dolo, que compete ao poder judicial.
    Independentemente da eventual condenação destes,o que é certo é que, no caso BPP, os accionistas e depositantes já foram premiados pelo Governo. Arrecadaram lucros, no bom tempo, e minimizam o risco e o prejuízo em tempo de crise.
    Era a este aspecto de negação de uma sã economia de mercado que me referia.
    O poder executivo errou. O poder regulador e judicial ainda tem o benefício da dúvida.

    Caro Tonibler:
    Pois tenho que discordar do meu amigo.
    Não há qualquer semelhança com o BCP, nem mesmo com o BPN, dada a diferente natureza das operações dos bancos envolvidos, como muito bem sabe. Aliás, nos EUA, o governo deixou cair o Lehman, banco de investimentos, e apoiou bancos universais em dificuldades.

    Por outro lado, diz que o Estado assegurou garantias. Pois sim, mas as mesmas que os bancos privados recusaram para dar o apoio solicitado.
    Ainda em comparação favorável com o BPN, e tanto quanto se sabe, os accionistas do BPP não estão ameaçados de verem o seu capital nacionalizado. Sorte, em ser accionista e investidor do BPP. Azar, em ser do BPN.

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  7. Caro Pinho Cardão,

    Os bancos privados (ou não) não poderiam assumir exposições sobre o BPP sem a garantia do estado porque as normas internacionais obrigam-nos a que essa exposição esteja coberta a 100% por capitais próprios (seja na forma de provisões ou não) uma vez que o banco tinha entrado em default. Logo, só o estado poderia, por via da garantia, assegurar a sobrevivência do banco.

    A natureza da carteira do banco é um detalhe. É um banco. Nos Estados Unidos os bancos de investimento não são bancos. Cá são.

    Quanto à questão do BPN e BPP, estou na mesma, se damos o poder ao político de decidir, pois, ele decide de acordo com aquilo que acha. Eu até sei que o Crédito Agrícola tinha lá carradas de dinheiro enterrado. Se calhar umas quantas dezenas de caixas de crédito agrícola seriam uma boa razão. No BPN ninguém queria lá pôr dinheiro, aqui formou-se logo um sindicato de sanguesugas que vai atrás da carteira do private.
    Sei lá eu os contornos todos. Há uma razão para o político poder decidir - existem demasiados factores em jogo para se fixar uns quantos. Não podemos vir depois condenar o político porque decidiu mais por uns factores que por outros. Acho eu...

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  8. Vejo-o muito tecnocrático, caro Tonibler!...
    Perante as nulas explicações do governo, tudo se pode especular. Mas a realidade é que se tratou de mais um ataque à sã concorrência e a uma saudável economia de mercado.
    Um prémio aos bancos credores, que não mediram o risco, aos accionistas, que deixaram a administração investir com risco elevado, aos depositantes que tinham taxas supranormais, etc, etc. Em suma, capitalismo à custa do Estado. Esse capitalismo não vale!...

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  9. Anónimo22:10

    Pois é, Pinho Cardão. O nosso Amigo Tonibler está estranhamente tecnocrático. Com os espiões que vão espreitando para este blogue, não me admiraria que um destes dias andassem atrás da verdadeira identidade do Toni para o colocar à frente de mais um banco intervencionado.
    Pelo menos estou de acordo com ele no comentário que fez ao meu próprio comentário. Entende que ainda bem que o ministro das finanças o é, e eu não o sou. Ora, eu também acho isso (já não sei se o Paulo Rangel acha o mesmo, mas não me custa a imaginar que não ambicione o lugar)

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  10. Caro Pinho Cardão,

    Se assumirmos que os bancos não deveriam sofrer intervenções do estado, então o problema nunca se tinha colocado. Nem o BPP, nem o BPN, nem ninguém.

    Caro JMFA,

    Eu estava a lamentar o ministro que temos. E a lamentar que a oposição que temos continue a dar a impressão de que este ministro é a frigideira.
    Quanto ao lugar no banco intervencionado, não devo ter idade suficiente para a judiciária me prender.

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  11. Caro Ferreira de Almeida:
    Creio que o grande e apropriado lugar do Toni era mesmo Governador do Banco de Portugal!...

    Caro Tonibler:
    Meditando bem,e com grande mágoa, não consigo arranjar justificação para eu próprio o seguir nessa sua ilustrada opinião. Paciência...

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  12. Esse sim era um bom emprego! Para esse até compro um óculos com 20 dioptrias

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  13. Estes salvamentos são como mel para os gestores: não precisam de se preocupar com a qualidade do seu trabalho. Daqui a um ou dois anos vão aparecer a gerir outra coisa qualquer e, ao fim e ao cabo, o BP até já nem precisa de regular nada.

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  14. Anónimo22:54

    Já percebi que o Tonibler também viu um fantástico cartoon intitulado "ensaio sobre a cegueira".
    Vale-nos esta capacidade genial de caricaturar e de nos rirmos com o que dá vontade de chorar...

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