Uma excelente tarde de praia terminou com uma breve paragem no barzinho que convida a entrar, mesmo ao fim da ladeira empedrada que sobe íngreme desde a areia até à estrada. O dia tinha sido quente e a esplanada estava cheia, com as mesas tão juntas que os grupos quase não se distinguiam. Ao nosso lado estava um grupo de cinco jovens adultos, tipo atlético, vindos da praia, que começaram uma animada discussão por causa da cor morena das pessoas ainda a época balnear mal se estreou.
- É que somos mouros, dizia um, tu não sabes que os portugueses são todos mouros?
- Mouros? dizia outro, não, que eu saiba nós descendemos do D. Afonso Henriques, e ele não era mouro, era português!
- Ai isso é que era, antes dele era só mouros, por isso ele não podia ser português, diz lá como é que ele podia ser português se nem existia Portugal?
E começaram uma acesa discussão, cada vez mais baralhados porque nenhum conseguia descobrir o enigma do que seria Portugal antes do D. Afonso Henriques, um desconfiava que já cá havia pessoas, dizia ele que os mouros, o outro teimava que se não houvesse portugueses então não havia Portugal, e ninguém à volta daquela mesa deslindava o mistério da origem do 1º Rei de Portugal, apesar de um ter arriscado timidamente que havia umas histórias com os espanhóis mas que lhe parecia que isso tinha sido só em 1380, talvez só aí é que tivessem passado a chamar-se portugueses…
Como já estavam à beira de se insultar, resolvi intervir para contar de forma muito simples a história do D. Afonso Henriques, dos seus pais, do Egas Moniz, das lutas com Castela, do Tratado de Zamora e, claro, uma brevissima referência ao povoamento do território até essa data gloriosa.
Os rapazes ouviram-me perplexos e, já ia eu a falar da conquista do castelo de Lisboa quando um me interrompeu timidamente:
-Ó senhora, ó senhora, desculpe lá, mas para saber isso tudo… é professora de história?
Eu ri-me. – Não sou, não, para saber isto basta ter andado na escola primária, talvez tenha é estado com atenção nas aulas…
- É pá, disse o outro, eu ia perguntar o mesmo, para saber isto tudo…! Mas olhe, ó senhora, eu até tive história na escola, até me lembro da stoura ter falado numa batalha em que se puseram umas lanternas nas ovelhas para o inimigo pensar que éramos muitos e que ganhámos por causa disso, como vê até prestava atenção! Mas agora isso dos pais do D. Afonso Henriques não me lembro, de certeza que não dei!
Reconheci que sim, para não o ofender, que há imensas histórias fantásticas ao longo da nossa História e que se eles lessem umas coisitas sobre isso eram capazes de gostar, já que eram tão interessados no assunto.
Não sei se seria a moleza daquela tarde morna, mas vim muito impressionada com a absoluta incapacidade daqueles jovens de raciocinar sequer sobre os mais básicos conhecimentos da História do nosso País. Não sei se seriam capazes de fazer o teste de matemática e de ter uma nota razoável, mas palavra que senti vergonha de ouvir aquela conversa em voz alta, nem sequer tinham a noção do grau de ignorância que demonstravam, e eram vários!
- É que somos mouros, dizia um, tu não sabes que os portugueses são todos mouros?
- Mouros? dizia outro, não, que eu saiba nós descendemos do D. Afonso Henriques, e ele não era mouro, era português!
- Ai isso é que era, antes dele era só mouros, por isso ele não podia ser português, diz lá como é que ele podia ser português se nem existia Portugal?
E começaram uma acesa discussão, cada vez mais baralhados porque nenhum conseguia descobrir o enigma do que seria Portugal antes do D. Afonso Henriques, um desconfiava que já cá havia pessoas, dizia ele que os mouros, o outro teimava que se não houvesse portugueses então não havia Portugal, e ninguém à volta daquela mesa deslindava o mistério da origem do 1º Rei de Portugal, apesar de um ter arriscado timidamente que havia umas histórias com os espanhóis mas que lhe parecia que isso tinha sido só em 1380, talvez só aí é que tivessem passado a chamar-se portugueses…
Como já estavam à beira de se insultar, resolvi intervir para contar de forma muito simples a história do D. Afonso Henriques, dos seus pais, do Egas Moniz, das lutas com Castela, do Tratado de Zamora e, claro, uma brevissima referência ao povoamento do território até essa data gloriosa.
Os rapazes ouviram-me perplexos e, já ia eu a falar da conquista do castelo de Lisboa quando um me interrompeu timidamente:
-Ó senhora, ó senhora, desculpe lá, mas para saber isso tudo… é professora de história?
Eu ri-me. – Não sou, não, para saber isto basta ter andado na escola primária, talvez tenha é estado com atenção nas aulas…
- É pá, disse o outro, eu ia perguntar o mesmo, para saber isto tudo…! Mas olhe, ó senhora, eu até tive história na escola, até me lembro da stoura ter falado numa batalha em que se puseram umas lanternas nas ovelhas para o inimigo pensar que éramos muitos e que ganhámos por causa disso, como vê até prestava atenção! Mas agora isso dos pais do D. Afonso Henriques não me lembro, de certeza que não dei!
Reconheci que sim, para não o ofender, que há imensas histórias fantásticas ao longo da nossa História e que se eles lessem umas coisitas sobre isso eram capazes de gostar, já que eram tão interessados no assunto.
Não sei se seria a moleza daquela tarde morna, mas vim muito impressionada com a absoluta incapacidade daqueles jovens de raciocinar sequer sobre os mais básicos conhecimentos da História do nosso País. Não sei se seriam capazes de fazer o teste de matemática e de ter uma nota razoável, mas palavra que senti vergonha de ouvir aquela conversa em voz alta, nem sequer tinham a noção do grau de ignorância que demonstravam, e eram vários!
Cara Susana,
ResponderEliminarMas olhe que eu arrisco que numa ronda à malta que fez a mesma escola primária que nós o resultado não seria muito diferente.
Às vezes, em grupos de "adultos", quando a coversa vai para coisas da história, tenho surpresas semelhantes. E olhe que não é com os que se ficaram pela 4ª classe!
A diferença, porventura, é que os adultos aprenderam a controlar a espontaneidade!...
Vá lá, pelo menos sabem quem foi o Afonso Henriques!
ResponderEliminarA culpa está à vista de todos. Os rapazes são os menos culpados.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarImagine um jovem professor nos idos dos anos 70 do século passado, dobrado o cabo do 25 de Abril, que recebe ordens estritas de ignorar, no ensino da História de Portugal, tudo o que não fosse a gloriosa gesta dos movimentos económicos e sociais que ficavam bem na "fotografia" do espírito revolucionário em curso. Quem tiver dúvidas de que tão voluntarista opção programática era generalizada, passe os olhos pelos manuais de então.
ResponderEliminarAqueles que, no meio de tantos e tão difíceis conteúdos, conseguiam dar aos incrédulos jovens a outra face da nossa História lá o iam fazendo, para felicidade das suas plateias de alunos, mas sob o olhar carrancudo e inquiridor dos colegas PREC. O resultado aí está: a História de Portugal é uma disciplina mal amada, de fracos resultados académicos, e o conhecimento de gerações de jovens adultos é aquele que teve a (des)dita de comprovar.
Mas há uma esperança: os "especialistas" da nossa praça inventarão uma qualquer reforma de fachada, para que tudo mude, ficando mais ou menos na mesma. Isto porque, "felizmente", os iluminados da (nossa) pedagogia são todos iguais, e, como as baterias do coelho, eternizam-se nas alcatifas da decisão, governe o PS ou o PSD.
Prazer em lê-la, como sempre. Cumprimentos.
Suzana
ResponderEliminarÉ confrangedor o nível de ignorância dos nossos jovens. É o resultado do nosso brilhante sistema de ensino.
Estes rapazes devem ter tido resultados positivos nas provas de conhecimento e certamente que deram uma ajuda para as fantásticas estatísticas do "sucesso" escolar...
Caro SC e Paulo, admito perfeitamente que o mal seja bastante generalizado, mas o que me impressionou nem foi o facto de eles não se lembrarem de nomes ou datas mas sim o de não terem qualquer referência na cabeça, fosse temporal, fosse social ou cultural, a história é simplesmente um buraco negro...
ResponderEliminarCara Crack, que grande prazer em revê-la por aqui!Realmente o exemplo que dá pode explicar muita coisa, em educação os efeitos projectam-se para o futuro, nunca se vê juntos a causa e o efeito e já agora creio que, quanto à História, ainda se sentem uns vapores do PREC! Cumprimentos amigos também.
Margarida, a profunda ignorância destas matérias tem reflexos muito graves quanto à compreensão dos problemas do País e impede que as pessoas façam os seus juízos críticos sobre muitas propostas e muitas expectativas que se vão criando, por isso me custa mesmo muito a admitir que alguém pudesse, em consciência, falsificar a aferição do sucesso escolar...Pode até parecer que sim, mas por mim não quero acreditar, se pusermos tudo em causa ficamos completamente deprimidos.
Grave, muito grave mesmo é insistir na diabolização dos professores como a senhora assessora do Sr. Presidente da República aqui vai fazendo, de forma tão leviana e tão irresponsável. Lamentável, mesmo lamentável é NUNCA a ter ouvido ou lido a defender um sistema de educação mais exigente e a defender a dignidade profissional dos professores. Nem a sra. nem o Presidenta da República. Isso sim é muito lamentável! Depois não pode é lavar as mãos.
ResponderEliminarCorrigindo a gralha: Presidente e não Presidenta como é óbvio.
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