1. É por demais conhecida o belo poema “Oh Mar salgado, quanto do teu sal são lágrimas de Portugal!” no Mar Português, do enorme Fernando Pessoa.
2. Recordei-me deste poema quando assisto aos acesos debates entre incumbentes e oponentes – agora alargado ao Governo espanhol que, não sei porque carga de água resolveu entrar numa discussão tipicamente pré-eleitoral que respeita aos lusos apenas(?) – acerca da incandescente questão do “para-arranca” TGV.
3. Tipicamente à portuguesa esta querela em torno do TGV: em lugar de se aduzirem razões objectivas, tanto quanto possível, acerca dos méritos e deméritos do projecto - não esquecendo certamente as importantíssimas vertentes do endividamento requerido pela sua execução e do uso alternativo desses recursos na fase de vacas “esquálidas” em que nos encontramos - eis que nos vemos envolvidos num contencioso verbal “de proporções outrora impensáveis” para usar a frase de antigo Ministro, um velho académico, quando defrontado com os problemas do ensino.
4. Um dos aspectos mais interessantes seria certamente conhecermos os esperados “cash-flows” líquidos gerados pelo TGV, nas suas diferentes etapas...como se deve fazer em relação a qualquer projecto cujo investidor tenha algum respeito pelo dinheiro que investe, sobretudo em relação aqueles que consomem imenso capital como é manifestamente o caso...
5. Conhecendo os “cash-flows” e o custo do capital, poderíamos ficar com umas ideias acerca do Valor Actual Líquido (VAL) do projecto e perceber se os capitais a investir, sobretudo os que tivermos de obter a crédito, são bem ou mal gastos...será subversiva, esta forma de pensar?
6. Já aqui assinalei em tempos - aproveito para repetir - que entre nós se criou a ideia pacóvia de que no investimento só conta a fase de execução...pelo que a utilidade económica e social dos projectos se deverá medir pelo consumo de capital que impuserem...assim, quanto maior melhor! 7. Chegamos onde chegamos em boa medida graças a esse conceito “manhoso” de investimento...
8. Nalguns caso, como no presente, acrescenta-se o inevitável “interesse estratégico” - fórmula muito útil sobretudo porque dispensa mais considerações e quase ninguém percebe o que significa, é domínio reservado de alguns auto-iluminados.
9. Creio que por este andar nunca iremos saber nada acerca dos cash-flows do(s) TGV’s, pelo que a questão do VAL do projecto acabará, como o resultado da gigantesca epopeia dos descobrimentos, por se perder na escuridão do tempo...ficando assunto para os poetas do futuro!
10. Deixem-me pois parafrasear Fernando Pessoa, dizendo: Oh TGV, TGV, quanto do teu VAL serão lágrimas de Portugal?
11. Tem a palavra, obviamente, o consagrado Manuel Brás!
Dr. Tavares Moreira
ResponderEliminarEstamos em Portugal! VAL? TIR? Rendibilidade económica? Valor social?
Por cá não há o hábito de os decisores políticos fazerem avaliações custo/benefício de projectos, medidas e políticas públicas. Assim a margem de discricionariedade política aumenta e a responsabilização política esfuma-se, como convém. É este o problema.
No fim, o resultado é o desnorte quanto ao rumo a dar ao País, é o desperdício de recursos e tempo, é o permanente para - arranca político, é a descredibilização da política e é a falta de esperança de que entremos nos “carris”!
Caro Tavares Moreira,
ResponderEliminarSendo essa uma boa métrica do projecto, certamente se colocaria o âmbito resguardado ao ponto do VAL ser fantástico. Construir uma A1 a 3 metros da actual, destruindo a actual tem um VAL bastante positivo. Basta isolar a construção e a destruição, assumir que as portagens pagam a festa e temos um projecto maravilhoso. Claro que o que está por debaixo de custo de oportunidade para o país é monstruoso, mas isso não interessa nada. Para o TGV estou certo que lá se arranja um âmbito suficientemente apertado, com um pressupostos bem engendrados, para que o VAL dê um milagre à sul-americana.
Eu quero que me dêem tudo menos VAL's. Eu só quero a resposta a uma pergunta "Se é economicamente tão bom, porque é que precisam do meu dinheiro para isso?"
Agora, tirando a questão económica da coisa, gostava de lembrar que de alguma maneira se disse que o primeiro-ministro de portugal andava feito com os espanhóis em prejuízo do país e que este respondeu que a chefe da oposição também. Um pequenino detalhe que merecia alguma atenção das pessoas, acho eu...
Caro Dr. Tavares Moreira:
ResponderEliminarAgradeço o repto. Aqui vai a merecida resposta, entitulada "Adpatação pós-TGV do genial Fernando Pessoa..."
O imenso mar salgado
cheio de desventuras,
deixa o povo fatigado
com tamanhas tonturas.
Na questão incandescente
com espanhóis à mistura,
o VAL não é displicente
para analisar a factura.
Neste caso exemplar
não há bom casamento,
a sabedoria popular
não é um vil pensamento .
A grande velocidade
para o país descarrilar,
é tal a loquacidade
que não param fabular.
Com os melhores cumprimentos.
Correcção à última quadra:
ResponderEliminarA grande velocidade
para o país descarrilar,
é tal a loquacidade
que não pára o fabular.
Caro Tavares Moreira
ResponderEliminarO seu post apenas corrobora o que se vai tornar uma evidência: o projecto não resiste a uma análise mais fina.
Reagan dizia que um projecto que não pudesse ser explicado em três/quatro frases não era um bom projecto.
Melhor do que o Manuel Brás não é possível, pelo menos é simples e explica tudo
Cumprimentos
joão
Caro Tavares Moreira:
ResponderEliminarDe facto, o VAL de nada vale na actual conjuntura.
Dantes, oferecia-se bacalhau a pataco, que alguém haveria de pagar as postas. Agora, que o tempo é mais tecnológico, as promessas são feitas a alta velocidade e ninguém sabe quem as irá suportar.
Quanto custa o investimento na linha e quem o suporta?
Quanto custa o equipamento e quem o suporta?
Quanto vai custar a exploração, quais os proveitos e quem vai pagar o défice?
A que preço as infraestruturas da linha são colocadas ao serviço dos operadores?
Como se vão processar os fluxos financeiros ao longo do tempo?
O VAL é de modo a valer a pena ou não?
E se o VAL é negativo, a quanto monta?
E como se faz o "mix" rentabilidade financeira negativa, investimento estratégico? Isto é, qual o preço do investimento estratégico?
Assim, coisinhas simples que eu gostava de ver respondidas.
Caso contrário, o TGV será apenas uma fèzada para gáudio de uns tantos...
Meus Caros Margarida, Tonibler, Pinho Cardão e João,
ResponderEliminarPonhamos de parte as nossas críticas, exigências e pessimismos em torno do virtuoso projecto TGV - não esquecendo que o pessimismo não cria empregos - e rendamo-nos à poesia multifacetada, de intervenção política e social do nosso amigo Manuel Brás que tão bem sintetiza a problemática em análise!
Mas em tempos o nosso ainda primeiro-ministro não afirmou em plena AR que estava tudo na net? Eu não encontrei, mas certamente por falta de habilidade, mas devem estar lá todos os estudos que respondem não só à questão do VAL como às dúvidas colocadas por Pinho Cardão. A quem me souber indicar como se chega lá dou um doce.
ResponderEliminarAdmito que esteja enganado, caro Freire de Andrade.
ResponderEliminarAcesso a essa informação só mesmo por TGV, parece-me, o que nos conduz a um clássico problema de petição de princípio - ou não será?