quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Depois do DUBAI, a Grécia?

1.Em interessante artigo publicado na edição do F. Times de 30 de Novembro, um dos seus habituais articulistas, Wolfgang Munchau, coloca a interrogação citada em título: será a Grécia o próximo caso de “quase-default”, a exemplo do que acaba de se passar com o DUBAI?
2.A situação financeira da Grécia, membro desde 2000 da zona Euro, apresenta com efeito aspectos muito preocupantes: um défice orçamental em 2009 que poderá chegar a 13% do PIB, dívida pública a caminho de 135% do PIB, dívida externa bruta – pública + privada – da ordem de 150% do PIB em final de 2008.
3.A agravar esse cenário, uma apreciação real da taxa de câmbio de 17% desde 2006, sugerindo uma perda de competitividade a ritmo assustador, contribuindo para uma sucessão de défices externos superiores a 10% do PIB por ano.
4.A questão orçamental da Grécia adquiriu novos contornos após mudança de governo, há cerca de 2 meses - até então a Grécia reportava ao Eurostat um défice em trono de 4% do PIB…e, de repente, o novo governo descobre que o défice não era esse, mas mais do triplo desse…
5.Munchau sustenta que a União Europeia não estará disposta a dar o seu apoio às finanças gregas, aplicando a regra do “no bail-out” consagrada em Maastricht, preferindo que a Grécia entre em “default” a criar um precedente pouco honroso de dispensar apoio a um membro do Euro manifestamente relaxado.
6.Para que a EU se dispusesse a apoiar a Grécia, seria necessária a aplicação de um programa tipo FMI (que nós conhecemos bem em 76/77 e em 83/84), envolvendo a adopção de drásticas medidas de austeridade…coisa que, segundo Munchau, o novo governo grego não parece disponível para assumir, até porque concluiu há pouco tempo uma campanha eleitoral em que prometeu exactamente o oposto da austeridade...
7.Para já, o novo governo grego parece apostar numa redução do défice em 2010 de cerca de 13% para pouco menos de 10% do PIB…mas ao que parece à custa do que chama “combate à evasão fiscal”- onde é que já ouvimos isto?.
Medidas de redução da despesa não estarão previstas ou serão irrelevantes, pelo que o objectivo em causa corre sério risco de incumprimento.
8.Munchau ironiza dizendo que “o combate à evasão fiscal é sempre o primeiro item na lista de acções dos governos em desespero financeiro”…e que certamente vamos assistir a uma enorme pressão dos dirigentes europeus sobre a Grécia e o seu governo no sentido de esquecer as promessas eleitorais e enfrentar o “monstro” orçamental com drásticas medidas de redução da despesa.
9.Um belo exemplo de como a qualidade de membro do Euro é susceptível de funcionar como incentivo ao laxismo financeiro, ano após ano, na convicção de que o endividamento externo pode crescer indefinidamente…como se o facto de a dívida ser denominada na moeda comum a tornasse, como por magia, inexigível…
10.Um caso a seguir com a maior atenção…nos próximos meses e anos, reforçando a oportunidade de uma séria reflexão em torno dos nossos próprios problemas financeiros e económicos…bem vistas as coisas, não estamos a anos-luz da Grécia, pois não?…

18 comentários:

  1. Ainda que numa situação não tão grave, estava a ler e a pensar " Onde é que eu já vi uma coisa parecida?". De qualquer modo, acho que já estivemos mais longe de atingir os patamares da Grécia. Eu penso que a UE deveria ter pulso firme para dar o exemplo, como se diz em direito penal, a prevenção geral! Se não houver mão firme, em breve o resto dos PIGS, caminham para o mesmo abismo financeiro, o que não seria nada agradável para o panorama económico-financeiro da europa.

    Acho que mais tarde ou mais cedo, estes países com as contas absolutamente desgovernadas como um camião descontrolado, serão vítimas dos seus próprios erros e terão o orçamento de Estado a ser feito em Bruxelas , pelo comissário para os assuntos económicos!

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  2. Alguém dizia, há uns tempos atrás, que não estava excessivamente preocupado com a "chuva" de auto-estradas, TGV e NAL, já que não iria haver dinheiro para as concretizar.

    Os gregos mostam-nos, à evidência, que existe(!!) ainda um pequeno espaço a percorrer em direcção à catástrofe. Deve ser esta a razão optimista que justificou os acenos de discordância do Sr. Governador do BP ao mesmo que ouvia o Presidente da República a estabelecer a estreita ligação em Portugal que existe entre o défice orçamental e o crescimento da dívida externa. É nisto que Sócrates acredita.

    Mas talvez precisemos mesmo que, durante uns tempos, a Sra. Merkel, via BCE, imponha algumas regras a este e a outros burgos.

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  3. Como disse o nosso primeiro-ministro, a entrada em vigor do Tratado de Lisboa é um renascer da união europeia. Se os alemães souberam ler a coisa, isto queria dizer "Vamos lá esquecer estas coisas da dívida e do défice e venha lá o fundo social europeu outra vez...". Senão souberam ler, azar o deles....

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  4. Anónimo04:45

    Caro Tavares Moreira, permita-me a ousadia de aludir à expulsão da Grécia e, por arrasto, de Portugal da moeda única por não cumprirem anos a fio os critérios do deficit orçamental e da dívida pública. É viavel pensar em tal possibilidade ou parece-lhe uma hipótese meramente académica?

    De caminho, o caro Tonibler está plenamente convencido de que os Alemães vão aceitar, e com um sorriso nos lábios, sustentar Portugal!

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  5. Verdadeiramente preocupante esta situação; ainda mais que Portugal sempre foi um país que andou perto da Grécia em termos de contas: eles eram os últimos e nós estavamos mesmo atrás.
    Importante também será saber se os nossos números estão correctos, não vá aparecer um novo governo e dizer que ainda estamos mais fundo no poço... funcionará a supervisão? (ou será como a bancária?!)
    Mas é bom que alguém nos lembre destes problemas, visto que andamos todos entretidos com "escutas", gripes "faraónicas" e demais "lixos"...
    Cumprimentos

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  6. Anónimo09:11

    Hum...boa pergunta a de Zuricher.

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  7. Caro Tavares Moreira

    Adenda ao Post:

    O Presidente do ECOFIN, Sr JUncker, escreveu uma carta ao Ministro Grego da Economia, informando que a Grécia devia equilibrar as finanças, abrir alguns sectores à concorrência externa, congelar os salários dos funcionários, aumentar a competitividade da economia; estas são algumas das medidas propostas. A alternativa é apenas uma: caso não proceda a essas medidas, não terá a ajuda dos Estados Membros, em caso de aperto.
    A carta, datada da última quinta foi publicada ontem na imprensa grega.

    Desde que entrámos no euro andamos esquecidos que estamos numa união e que, como todos os outros membros, as nossas acções são objecto de escrutínio, e de escrutínio profissional. Não somos pequenos para sermos esquecidos, nem para nos "perdoarem" as falhas ou o "mais ou menos".
    A economia grega é muito parecida com a nossa, mas não é igual. Os problemas são semelhantes e as políticas que seguiram similares.
    Os estrangulamentos parecidos e a taxa de propensão para o imobilismo é semelhante.
    A diferença é que está num estádio mais avançado dos problemas...
    Dito isto, a economia grega é o nosso futuro em directo e ao vivo; por isso, nada melhor seguir o que lhe (à economia grega) vai suceder, bem assim como vai ser tratada pelos seus parceiros do euro.
    Era importante seguir as lições que os meios financeiros internacionais vão retirar do emaranhado em que se encontra o Dubai...
    A época do "demasiado grande para falir" pode estar a terminar, tanto para as empresas, como para os países.

    Cumprimentos
    joão

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  8. Caro Tavares Moreira

    Sem dúvida que a economia grega é muito parecida com a nossa. Embora neste momento mais apertada com as dívidas, terá no entanto uma estrutura produtiva um bocadinho melhor e mais diversificada que a nossa, o que significará que com as medidas correctas, por iniciativa própria ou por imposição de Bruxelas, seja mais viável encontrar a luz ao fundo do túnel.
    Só não vejo é como nos poderemos safar quando chegar a nossa vez. De tantos anos a vivermos com o cinto apertado, apertá-lo ainda mais será ... estrangular-nos.Que temos para exportar para inverter a situação ? Auto-estradas, painéis solares, magalhanes ? Know-how de supervisão do BdP ou do sistema judicial ? Nem sequer berlindes !
    Cordialmente

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  9. Adenda bem humorada:

    No Dubai ainda existirá um processo de amenizar a crise : vender a preço de saldo os luxuosos apartamentos.
    E por cá ? Nem vendendo o pacote conjunto de S. Bento, AR, Jerónimos, Torre e Palácio de Belém, mais a sede do BdP como bónus publicitário, alivia coisa que se veja.

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  10. Caros André e Eduardo F,

    Nesses comentários adivinha-se a ideia de transformação do estatuto de alguns países do Euro para um regime de protectorado financeiro da UE...não parece totalmente descabida, resta ver como vai decorrer a primeira experiência, da Grécia, para percebermos se "vale a pena" essa transformação ou se deveremos fugir dela quanto antes (admitindo que ainda temos condições para encetar a fuga...).

    Caro Tonibler,

    Esse infatigável optimismo que revela em relação à generosidade financeira dos Germans seria um grande conforto para todos nós...
    O problema é que isso nos pode induzir a maiores cometimentos financeiros, a contar com essa generosidade futura.
    Sabe que me faz recordar uma resposta que recebi do antigo embaixador do Brasil em Portugal, Dário de Castro Alves, a uma observação minha acerca do (então excessivo) endividamento do Brasil: "Minino, o Brasil está sacando sobre o futuro...".
    Será que também poderemos continuar sacando sobre a generosidade futura dos Germans?
    Tem a palavra Tonibler...

    Caro Zuricher,

    A exclusão do Euro a que alude parece-me, com os dados actualmente disponíveis, uma hipótese muito remota embora não totalmente descartável.
    Na minha perspectiva o maior problema não é todavia esse, mas o de vivermos na ilusão de que um dia os nossos problemas se resolverão como que por encanto...enquanto a situação se vai degradando continuamente em direcção ao modelo grego...

    Caro João,

    Sempre precisas e justas as suas análises...os gregos levam com efeito alguns anos de avanço, mas a dinâmica que nos move presentemente aponta certamente na mesmíssima direcção, restando saber quantos anos mais serão necessários até ganharmos a "agregação" - 2, 3, 4?

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  11. Ora bem: Muda um Governo e descobre-se que afinal as contas públicas do Estado eram uma trafulhice. O BCE, pelos vistos, estava a dormir. Percebe-se que Constâncio seja falado para ir para lá. Com as qualificações que tem, ainda chega a Governador.

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  12. Caro JMG,

    Não é ao BCE que compete verificar os défices dos Estados-Membros mas sim a um organismo da União chamado Eurostat...
    O que se constata é que se tem tornado relativamente fácil aos Estados-membros ocultar partes importantes dos seus défices orçamentais - recorda-se do caso português com o défice de 2001, em que a estimativa oficial era de 2,2%, já depois de duas revisões, e acabou em 4,4% do PIB?
    No caso da Grécia o erro parece bem mais grosseiro, pois o défice passa de cerca de 4% para cerca de 13% do PIB...
    A esta luz, a Comissão Europeia terá certamente que rever a forma como o Eurostat recolhe e trata a informação de cada Estado-Membro, passando a realizar uma auditoria bem mais aprofundada das respectivas contas públicas.

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  13. Este comentário foi removido pelo autor.

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  14. Paulo

    Permita-me discordar do seu comentário, no que à Grécia se refere.

    Também nós temos uma "extrema esquerda" que tendo representação parlamentar não pode, de facto, ser governo. Na prática essa situação inviabiliza qualquer consenso alargado, essencial em épocas de crise como a que vivemos.
    Recordo-lhe que, em dez anos, essa "extrema esquerda" duplicou o a sua representação, se juntar a esse facto o aumento da abstenção, o actual regime tem ( nas palavras de Jaime Nogueira Pinto) quase a mesma representatividade que o Estado Novo, quando alcançou mesma idade: 35/40%.
    Por outras palavras, o efeito prático da representação parlmentar da nossa "extrema esquerda" equivale à representação não parlamentar grega.

    A Grécia tem três problemas complicados e explosivos (isto de andar a lamuriar não ajuda em nada e faz-nos perder a perspectiva):

    a) Credibilidade. As instituições gregas que concorrem para auditar as contas e suportar as políticas tem a mesma seriedade que as declarações dos nossos primeiro ministros quando anunciam que não vão aumentar os impostos; no mínimo dá vontade de rir, no máximo exasperam.
    b) A pirâmide etária nas faixas produtivas,é quase igual; como a economia não cresce e o mercado laboral é rígido, o jovens sofrem muito mais e têm menos saídas.
    c) A relação das forças da ordem e a população e vice versa, só é comparável (com adaptações) à situação experimentada pelas forças norte americanas no Iraque.

    Os próximos meses vão ser muito, mesmo muito complicados para o Governo grego que vai estar entre Sila e Caribidis.
    Comparado com o que experimenta o nosso Governo, qualquer governante grego acha que os seus colegas portugueses estão no Club Med.

    Cumprimentos
    joão

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  15. Caros Paulo e João,

    Sigo com todo o interesse vossa troca de comentários, parecendo-me que, no que ao caso da Grécia se refere ele vale, para além de outros aspectos muito atractivos para os comantadores - veja-se a página inteira que a edição do F. Times de ontem lhe dedicava - como elemento pedagógico.
    Creio que vamos todos aprender muito com o desenvolvimento do caso da Grécia ao longo de 2010.
    E seria importante que esse contributo pedagógico nos convença, finalmente, a modificar radicalmente as opções de política económica.
    Se assim não for, o exemplo da Grécia será apenas o filme antecipado da nossa propria experiência futura.

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  16. Diabo, Dr. Tavares Moreira, que me estragou o arranjinho tão laboriosamente construído. Bom, mas o BCE faz previsões económicas? Se sim, então Constâncio fica lá bem, difìcilmente se engana em mais de 200% nas previsões que faz. Só há um problema: o BCE não é suposto ser independente de governos? Neste ponto Constâncio teria que se habituar.

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  17. Este comentário foi removido pelo autor.

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  18. Caro Paulo

    Basicamente estamos de acordo, se bem que o ângulo de análise diverso.
    Quanto à questão que coloca no final, neste contexto não altera em nada o precurso de ambos os países.
    Como diz, estamos (Grécia e Portugal) no mesmo plano inclinado, apenas divergimos no local da pendente.
    Na má situação em que nos encontramos, podíamos aproveitar para, com os erros dos outros, evitar os nossos (atitude que Bismark preconizava).
    Mas (tal como sucede com a Grécia) somos uma sociedade politicamente bloqueada e com um conjunto de disfuncionalidades que, na hora do aperto vão actuar contra nós.
    Na nossa história já experimentámos momentos maus e "aterragens" forçadas. Estamos cá,ao fim de 900 anos e, retrospetivamente, nada indica que não vamos estar outros 900.
    Agora que, desta vez vamos aprender e cresçer, disso não tenha dúvida.
    Cumprimentos
    joão

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