sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Certificados de Aforro (CA): alteração de política impõe-se...

1. Soube-se que em Janeiro do corrente ano prosseguiu a redução do stock dos CAs, que já vem do início do ano transacto, tendo-se verificado uma diferença negativa, de € 47 milhões, entre as subscrições (€ 59 milhões) e os resgates (€ 106 milhões).
2. Aparentemente, o ritmo de saída está a acelerar, uma vez que em 2009 se tinha verificado uma saída líquida de e 327 milhões - média mensal de € 27,25 milhões.
3. A explicação para este fenómeno, para além das dificuldades de financiamento por que passam as Famílias de um modo geral, está certamente na decisão, tomada há pouco mais de um ano, de alterar a política de remuneração dos CAs, reduzindo significativamente a sua atractividade...
4. Nessa altura foram alteradas as regras de remuneração que o Tesouro tinha acordado para os aforradores da Série B, determinando assim uma mudança de regras básicas “em pleno jogo”, com as consequências que são fáceis de adivinhar...e foi criada uma nova Série – C - que passava a estar disponível para subscrição.
5. Acontece que a remuneração desta nova Série C é estabelecida em função da Euribor a 3 meses (média dos últimos dez dias anteriores ao início de cada mês), aplicando-lhe um factor 0,85 e somando um prémio de permanência de 0,25% durante o 1º ano.
6. Com base nesta fórmula, a remuneração dos CA subscritos durante o mês de Fevereiro agora a findar foi de 0,824% e para Março será inferior, de 0,815% salvo erro.
7. Enquanto isto sucede, o Tesouro emitiu muito recentemente obrigações a 10 anos, pagando 4,8% e obrigações a 5 anos, pagando 3,5%, em qualquer dos casos destinadas em grande parte a investidores não residentes.
8. Não podemos esquecer que os CA são um instrumento de aforro de longo prazo, em princípio para durar 10 anos, conforme de resto se pode deduzir de o prémio de permanência assumir valores crescentes: 0,25% no 1º ano; 0,5% no segundo ano; 0,75% no 3º ano; 1% do 4º ao 7º ano; 1,25% no 8º ano; 1,5% no 9º ano; 2,5% no 10º ano.
9. Nesta perspectiva não se entende a ABISSAL diferença entre as taxas que são pagas na dívida representada por obrigações do Tesouro e a remuneração oferecida aos subscritores de CA – de 4,8% para 0,815%...
10. Nem também se entende que a remuneração de um instrumento de poupança de longo prazo esteja indexada a uma taxa de mercado a 3 meses...porque não indexa-la às taxas da dívida representada por obrigações do Tesouro de prazo equivalente, por exemplo?
11. E ainda menos se entende tudo isto quando nos damos conta da extrema gravidade da insuficiência de poupança dos residentes, evidenciada pelo enorme desequilíbrio entre o que produzimos e o que gastamos....que nos arrasta dolorosamente para os Balcãs...
12. Conclusão: alteração da política de remunerção dos CA impõe-se, sem demora.

10 comentários:

  1. Por acaso, no mesmo dia em que saiu a notícia da última colocação das OT's estava também a notícia do decréscimo do volume dos certificados de aforro e pensei "então não é melhor fazer passar a dívida pela intermediação dos bancos, ficando estes com o prémio de risco da república"? E ainda há quem conteste a afirmação do primeiro-ministro quando disse que parte do défice foi para defender os bancos...
    Por isso é que acho bem que sejam os economistas, como o Sr. Prof. Ministro das Finanças, a tratar destas coisas, porque são bons em contas e percebem muito de economia.

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  2. Caro Dr. Tavares Moreira, não estará a explicação para a interrogação que coloca no ponto 9, na "mira" de aliciar o aforro daqueles que sendo portugueses, trabalham e residem no estrangeiro(?!)
    Aquela gente do tesouro são uns ratos de celeiro, finos como o coral...
    A ingenuidade das gentes, leva a que acreditem na pele de cordeiro com que o lobo se disfarça...

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  3. Caro Tonibler,

    Seus raciocínios mantêm a marca inconfundível de uma mente inquieta e em permanente busca da verdade...notável exercício de exegese financeira.
    Bem vistas as coisas, o Estado ganha em reembolsar CA que custam 1 ou 2% ao ano e em emitir obrigações que vencem 4,8%, é apenas uma questão de apurar o raciocínio e de nos deixarmos de álgebras obscuras, do passado...
    Não é isso, caro Tonibler?

    Caro Bartolomeu,

    Frio, muito frio desta vez...não creio que os nossos emigrantes tenham a ver com este negócio, mesmo nada, nada, nada..
    Serão outros não residentes, por certo....

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  4. Caro Tavares Moreira:
    O tratamento a que foram sujeitos os Certificados de Aforro e os Aforradores dá conta da ligeireza dos actos do Ministério das Finanças. Esse tratamento foi explicado numa base tecnocrática, todavia falsa e mal apreendida, como o meu amigo por várias vezes já referiu.
    O resultado é o que se vê. O Governo paga mais caro a dívida e beneficia os subscritores de OTs, porventura maioritariamente estrangeiros (não sei ainda qual a parte subscrita por nacionais), em detrimento do pequeno aforro nacional. Nem vale a pena comentar mais.

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  5. Corrija-me se estou errado, mas a álgebra, caro Tavares Moreira, é do tipo "quando rebentar, já não estou cá".

    Se colocar a dívida nos CA, qual o volume de transferências do exterior na estatística do BdP? Pois, zero! Mas se colocar nas OT's, vou ganhar algum PIB porque estou a aldrabar as contas (eu, os ministros não aldrabam...) com as transferências. Em termos de dívida pública, entram os dois da mesma maneira.
    Portanto, ou me engano, ou está-se a roubar o país para as contas saírem bem ao seu gestor. O tipo de coisas pelo qual prenderam o senhor da Enron.
    Mas como não percebo muito destas coisas de contas, posso estar errado.

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  6. Caro Tavares Moreira

    "9. Nesta perspectiva não se entende a ABISSAL diferença entre as taxas que são pagas na dívida representada por obrigações do Tesouro e a remuneração oferecida aos subscritores de CA – de 4,8% para 0,815%...
    10. Nem também se entende que a remuneração de um instrumento de poupança de longo prazo esteja indexada a uma taxa de mercado a 3 meses...porque não indexa-la às taxas da dívida representada por obrigações do Tesouro de prazo equivalente, por exemplo?"

    Para isso não poderia ser permitido resgatar os certificados de aforro de 3 em 3 meses. Para fazer comparações entre taxas (p.ex. 4,8% para 0,815%) teria de calcular a taxa implícita para o mesmo prazo incluindo os prémios de permanência.

    No entanto concordo consigo. Estamos a contrair dívida externa quando poderíamos obter financiamento interno mais barato e ainda remunerar melhor as poupanças internas dos portugueses.

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  7. Pinho Cardão dixit...está dito!

    Caro Tonibler, não me parece que seja esse o ponto...a decisão de ""castigar" os aforradores foi tomada em época bem anterior ao encarecimento da dívida colocada em mercado.
    Talvez vivessem na ilusão de que poderiam substituir os CA por dívida menos ou igualmente onerosa...pura ilusão, como se vê, perdem os aforradores e perde o País...

    Caro Alex,

    Não discordo do que refere quanto às comparações de remuneração, mas eu não disse que a remuneração dos CA tinha de ser igual à das OT a 10anos, faça-me essa justiça...
    Eu sugeri que a remuneração fosse indexada à das OT, a prazo comparável aquele que se pretende para a permanência dos CA...
    Talvez deva acrescentar que antes destas alterações, o tempo normal de permanência dos CA não seria inferior a 10 anos, apesar da possibilidade de resgate...
    Se a remuneração for atractiva, como deveria ser a nosso juízo, combinando TJ e prémio de permanência, o resgate passa a ser um fenómeno isolado, muito pouco frequente...
    E não é intenção do emitente que os CA (Série C) permaneçam até ao 10º ano?

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  8. Caro Dr. Tavares Moreira,

    Considero muito pertinente o seu post. A gestão que é feita desse instrumento financeiro (CAs) revela miopia, falta de visão sistémica e um pervertido sentido de justiça financeira.

    1) MIOPIA: Ao oferecer um rendimento baixo, o Tesouro está a desaproveitar uma fonte importante de financiamento, uma vez que os CAs se dirigem a um segmento claramente diferente do das OTs; numa altura de grandes dificuldades de financiamento da República.

    2)FALTA DE VISÃO SISTÉMICA: Uma taxa atractiva nos CAs estimularia a poupança interna, contribuindo para atenuar o outro grande problema da economia portuguesa: o défice externo privado.

    3)PERVERTIDO SENTIDO DE JUSTIÇA: A diferença ABISSAL - como diz - entre as taxas de remuneração dos CAs e das OTs corresponde a uma forma de repressão financeira sobre os aforradores que não sabem ou conseguem aceder às OTs.

    Como nota final, gostaria de dizer que, por questões de arbitragem, é indiferente indexar a taxa de cupão a um indexante de curto, médio ou longo prazo. Aliás, a República tem emissões de longo prazo a taxa "flutuante".

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  9. Dr. Tavares Moreira
    Relativamente ao PERVERTIDO SENTIDO DE JUSTIÇA referido pelo Dr. Brandão de Brito acrescentaria que a assimetria de informação explicará porque é que ainda há aforradores investidos em CA.
    Quer-me parecer que o factor refúgio que caracteriza este tipo de produto, em particular em momentos de perturbação financeira, e que o factor liquidez que lhe está associado não são suficientes para explicar um spread tão "abissal" entre as taxas de remuneração dos CAs e das OTs.

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  10. Caros Dr. Brandão de Brito e Margarida,

    Registo vosso substantivo contributo para a discussão deste tema, com um acervo de comentários de grande interesse.
    Compreendo bem a questão do indexante suscitada pelo Dr. Brandão de Brito.
    Acontece que, por razões bem conhecidas de política monetária, os indexantes de curto prazo encontram-se a níveis historicamente baixos, criando uma inclinação anormal da curva de rendimento.
    Assim, a utilização de um indexante de curto prazo, nas actuais condições, teria de ser compensada por um factor de multiplicação maior que 1 ou por prémios de permanência bem mais elevados nos primeiros anos - ou as duas coisas combinadas.
    Nas condições actuais, 60% da yield média das OTs a longo prazo é bem melhor do que 100% ou mesmo 150% da média da Euribor a 3 meses.
    Admito que haja outras soluções, é questão de pormos a imaginação a funcionar, sendo certo que o produto deve, na m/ perspectiva, apresentar regras de retorno claras e simples.

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