Sei de gente estimável, respeitada e informada, certamente muito bem intencionada, que defende com unhas e dentes a concentração da rede escolar em curso. Eu continuo a sustentar exactamente o contrário. Não me baseio em estudos, mas no conhecimento que julgo ter daquelas parcelas do País que cada vez contam menos. Com base nesse conhecimento, já aqui escrevi e noutras sedes defendi que o encerramento das escolas do 1º ciclo do interior de Portugal, é um dislate traçado a régua e esquadro, como são quase sempre traçados assim os mais rectos dislates. Um erro cometido contra as famílias, um erro cometido contra o território. Sei bem que as famílias e os territórios vítimas desta política de desertificação não são eleitoralmente relevantes, e isso explica muito do á-vontade com que estas decisões são tomadas. Lamego, a minha terra, é hoje notícia por ser a triste recordista no número de escolas encerradas. Em nome da racionalidade de um Estado que cada ano gasta mais do que no ano anterior, dá-se cabo do pouco que mantinha vivas as comunidades do interior. Em nome de que projecto de País?
Caro Ferreira de Almeida, que excelente pergunta essa com que termina o seu post. Quem me dera ve-la respondida com termos, em condições, com o rigor que advém do uso da boa ciência e melhor método na avaliação destas questões.
ResponderEliminarPortugal sofre dum grande mal (caso único na Europa) que é o de não ter cidades médias, ou seja, cidades com pelo menos 100000 habitantes que actuem como estruturantes do território. Embora haja algumas divergências nalguns autores e não haja uma definição fixada e universalmente aceite de cidades médias - nem sequer quanto a considerar-se apenas o factor população ou considerarem-se outros também -, o intervalo entre 100000 e 500000 habitantes é o mais generalizadamente aceite para cidade média e isto decorre da possibilidade de prestação duma série de serviços apenas ser possivel a partir dos 100000 habitantes entre outros factores. Precisamente esta falta leva a que não haja, não possa haver, uma efectiva estruturação do território Português com a consequente desertificação do interior e concentração das populações, maioritariamente, em Lisboa e Porto mas mais genericamente numa faixa litoral que vai de Setubal a Braga e Viana do Castelo. Agora, não podemos esquecer nisto tudo que Portugal Continental tem 10150000 almas das quais 4500000 nas duas Áreas Metropolitanas e, mais genericamente, 7 milhões numa faixa litoral de menos de 50km entre Setubal e Valença do Minho. O que nos deixa pouco mais de 3 milhões de almas para todo o resto do território continental. E aqui fica o grande problema: como se consegue efectivamente estruturar um território com tão pouca população em relação à sua dimensão e que, ainda por cima, está hoje em dia pulverizada? Ao não haver essa estruturação por via das cidades médias continua a haver a desertificação do interior. O problema não é o desaparecimento de pequenas aldeias e lugares. O problema, e grave, é a estagnação quando não mesmo definhamento de cidades com potencial para serem cidades médias e que serviriam para fixar populações no interior e até mesmo para permitir a existência de população nalgumas pequenas cidades, vilas e aldeias.
Gostava de comentar este post da mesma forma que comentei o anterior de Pinho Cardão.
ResponderEliminarJosé Mário
ResponderEliminarTambém já escrevi sobre este assunto aqui no 4R. Penso que ninguém saberá responder à sua pergunta. A resposta à pergunta está-nos a fazer muita falta e prende-se com o modelo de desenvolvimento que queremos para o nosso País. É necessária uma linha de rumo. Não quero acreditar que nos estamOS a confinar ao litoral.
O encerramento das escolas do 1º ciclo nunca poderia a meu ver ser tratado como uma medida de "régua e esquadro", a menos que se queira despovoar o interior do País mais do que já está. O efeito pode ser devastador em termos de coesão social e territorial e é mais uma machadada na já longa lista de medidas e efeitos que estão a provocar o empobrecimento e a desertificação do interior do País. É isto que queremos? Eu sei que não quero!
Esta é a perspectiva macro, mas num plano mais terreno esta medida vai afastar as crianças do meio em que cresceram e da convivência com a família e com a comunidade. Não creio que estes aspectos devam ser descorados, muito pelo contrário deveriam ser valorizados. A escola é um meio no caminho para a aprendizagem, mas os laços de afectos à família e à comunidade são fundamentais e, portanto, deveriam ser promovidos e acarinhados. Mas não!
Mas o que me causa muito espanto é a passividade dos Municípios, em particular, e de várias organizações da sociedade civil, como as associações de pais.
Que acordo assinaram os Municípios com o Ministério da Educação? Li algures que o dito acordo não foi cumprido por parte do Governo. É verdade? Se é, a minha incompreensão aumenta. Ou será que afinal também estão de acordo com a medida?
Tenho escrito sobre isto com alguma regularidade e tentei iniciar uma petição. Para mim a questão não é o encerramento de eswcolas com menos de 21 alunos. Dou isso de barato.
ResponderEliminarPara mim a questão é a de saber com base em que alternativa.
Se for para pegarem três aldeias vizinhas e concentrar miúdos para fazer uma escola com 35 alunos a uma distância (eu deveria dizer, a um tempo) razoável, pouca coisa a opor.
Mas fechar 17 para concentrar tudo numa escola com mais de 1500 alunos na sede de Concelho?
Francamente acho inacreditável.
Eu terminaria como acabei um post que fiz há um ano, mas isto é uma caixa de comentários de um sítio de respeito e portanto, só se quiserem ir ler:
http://ambio.blogspot.com/2009/08/em-louvor-de-thomas.html
henrique pereira dso santos
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ResponderEliminarObrigado, meus caros, pelos V. comentários.
ResponderEliminarEste post, motivado pelo encerramento das escolas mas que poderia ser escrito a propósito de outra qualquer medida de centralização/concentração de que o poder actual não tem sido parco, tem gerado, para além dos vossos, outros comentários de amigos leitores do 4R que ás vezes, à mesa do almoço ou por email, me fazem chegar as suas opiniões e sentimentos.
A maioria, confesso, compreende e aceita a política de encerramento de escolas, considerando-se não causa, mas consequência do despovoamento do interior e inevitabilidade das dinâmicas demográficas. Compreendo esse argumento, aliás na linha dos argumentos com que a vida e o futuro do País de comum se analisa por estes dias: tudo de reconduz à economia, àquela economia dos números. Ninguém aceita que haja deseconomias culturais, sociais, de felicidade individual ou das comunidades. E porque assim é, não acrescento mais ao que escrevi. Tão só anoto que nesta sociedade em que se reconhece direitos a todos, mesmo áqueles que não reconhecem os direitos de ninguém, não se aceita o direito - e o custo do seu reconhecimento - daqueles que por opção de vida preferem viver numa comunidade rural. Fica a minha convicção, que de pouco vale, contra a força do pensamento dominante que prefere viver num País sem projecto desde que isso saia mais barato.
Enquanto refletia nestas linhas, veio-me à memória o poema, belo, de Miguel Torga, que cantou o Pais profundo deste douro e trás-os-montes onde a rudeza é beleza e gerações e gerações de pessoas optaram por viver: São Leonardo de Galafura.
Fui procurá-lo e encontrei (maravilhas do infomundo!). Aqui o partilho:
São Leonardo da Galafura
À proa dum navio de penedos,
A navegar num doce mar de mosto,
Capitão no seu posto
De comando,
S. Leonardo vai sulcando
As ondas
Da eternidade,
Sem pressa de chegar ao seu destino.
Ancorado e feliz no cais humano,
É num antecipado desengano
Que ruma em direcção ao cais divino.
Lá não terá socalcos
Nem vinhedos
Na menina dos olhos deslumbrados;
Doiros desaguados
Serão charcos de luz
Envelhecida;
Rasos, todos os montes
Deixarão prolongar os horizontes
Até onde se extinga a cor da vida.
Por isso, é devagar que se aproxima
Da bem-aventurança.
É lentamente que o rabelo avança
Debaixo dos seus pés de marinheiro.
E cada hora a mais que gasta no caminho
É um sorvo a mais de cheiro
A terra e a rosmaninho!
Caro Ferreira de Almeida, o ponto fulcral aqui não são as escolas. Essas são consequência, não causa. A questão de fundo aqui é precisamente como evitar a desertificação do interior por forma a permitir que quem queira possa aí viver. Só que para isto ter-se-ia que responder à pergunta que deixa no seu post original: "Em nome de que projecto de país"? Uma coisa posso garantir-lhe, caro Amigo. Não é com a população totalmente pulverizada que se irá conseguir estancar essa desertificação.
ResponderEliminarComo sabem, não perco oportunidade de divulgar aquele pedacinho do País, que é meu por berço e afecto.
ResponderEliminarPara quem não saiba, Galafura é uma freguesia do Peso da Régua no território da qual se situa um dos miradouros para uma das paisagens mais arrebatadoras do douro. Qualquer motor de busca vos "atira" para fotos colhidas desse local. Vale a pena conhecer, nem que seja por foto.
Meu caro Zuricher, voltaremos ao assunto da "pulverização" da população, porque esta questão da rede escolar convoca outros aspectos que não facilitam o debate. É um assunto que considero da maior relevância, saber que em que modelo territorial pretende o País viver. Vejo pouco interesse nesse debate, devo confessar, apesar de supostamente ele dever ter sido feito aquando da discussão pública, e depois parlamentar, do PNPOT - Programa Nacional de Política de Ordenamento do Território (que, como sabe, vai muito na sua linha, do assentamento de uma rede de cidades médias no interior).
Caro JMFA,
ResponderEliminarSe calhar o primeiro passo é exactatamente acabar com os planos nacionais. Eu digo ao meus amigos que a solução do país passa por ter 22 AJ Jardins em guerra uns com os outros e que essa será a única maneira de se aproveitar o território.
Não me parece que exista alguma solução de aproveitamento do território que envolva passar 50% do PIB por Lisboa e depois redistribuir. Terão que ser as regiões (as 22, não aquela porcaria que andavam a discutir) a formar o seu orçamento nacional e não o contrário. O contrário vai resultar em mais depesa e mais centralismo. E quem fala de orçamento de regiões, fala de gestão de escolas, fala de gestão de hospitais, fala...
Vamos ver se é este ano que vou passar uns dias lá para a zona...Afinal, é só para isso que o país tem um interior, para passar uns dias.
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ResponderEliminarMeu caro Paulo,
ResponderEliminarNão sei se Galafura tem a escola condenada. Mas se tiver, não serei eu a pessoa indicada para lhe dizer qual o problema. Mas seguramente que os pais das crianças saberão dizer-lhe qual é.
Meu caro, não pode comparar realidades que não são comparáveis. Esse é um dos vícios de quem decide no conforto dos gabinetes de Lisboa. Não compare o sacrifício das crianças da capital ou das grandes cidades com as do norte do País, de uma qualquer recôndita aldeia que têm de ser deslocar 10, 15 ou 20 km no Inverno por estradas geladas, onde a deslocação é feita de madrugada que é noite cerrada, e o regresso feito pela tarde que noite cerrada é, quando se chega a casa sob temperaturas negativas! Todos os dias ou a minha mulher transportamos um dos nossos filhos para escola que fica a mais de 20 km da nossa casa, pelo transito de Lisboa. É penoso para ele? É, para ele e para nós. Garanto-lhe que o seria incomensuravelmente mais, se esses 20 km tivessem de ser percorridos pelas estradas e caminhos das zonas rurais de Lamego, de Vimioso, de Almeida ou de Gouveia...
O meu modelo, meu caro, é muito simples. Repousa na ideia, singela mas receio que cada vez mais utópica, de que o Estado tem a obrigação estrita de garantir a quem opta por viver fora das metrópoles, os mesmos índices de felicidade que garante a quem opta por viver nelas. Apoiando essas comunidades, concerteza. À custa dos nossos impostos, decerto, que não podem servir só para apoiar tudo o que se apoia, desde as seringas aos toxidependentes nas prisões, à renovação contínua das frotas de automóveis dos altos dignatários, à subsidiação das indigências e mediocridades até aos escandalosos deficites das empresas públicas parasitas e da clientela que vive à sua sombra! Porque bulas o Estado só deve prover ao bem público, ao bem-estar das pessoas, nas cidades?
Sabe, meu caro Paulo, tempos virão que esta concentração das populações no litoral, onde vivem já muito perto de 80% dos portugueses, se tornará de tal modo insuportável, que ainda veremos defender políticas de colonização do interior.
Caro Ferreira de Almeida, se bem me recordo o PNPOT associa cidades médias a cidades com mais de 10000 habitantes o que é manifestamente curto veja-se sob que prisma se vir. Para lhe ser totalmente franco eu olho para o PNPOT como um grande estimulo à litoralização senão mesmo à concentração das pessoas nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto.
ResponderEliminarConcordo plenamente com a imperiosa necessidade de colonizar o interior. Eu próprio, por personalidade e feitio, sou mais de meios pequenos do que de grandes cidades. Mas como se consegue suster a população no interior sem cidades-âncora? Que eu conheça, até hoje, solução para tal não foi encontrada. Um país que tem também em certas regiões bastantes aldeias e vilas é a Alemanha. Veja-se porém a realidade e o contexto em que existem. Antes de mais uma densidade populacional do total do território que é sensivelmente o dobro da Portuguesa. Em segundo lugar e mais importante, 90 e qqrcoisa % da população alemã está a menos de 1h duma cidade média, ou seja, duma cidade com mais de 100000 habitantes. A existencia precisamente dessas cidades médias aliada à existencia de massa crítica permite a existencia dos lugares pequenos.
Gostava muito que o território Português se estruturasse e se reduzissem as assimetrias. Mas assim dificilmente se chega lá. Para mais no contexto dum país pobre e a empobrecer cada vez mais.
Gostava muito que Portugal fosse pensado em termos globais.
Caro Zurucher, Portugal não é pensado em termos globais, dá um trabalhão,não tem efeitos políticos a curtissimo prazo e além disso ninguém ligava nenhuma, iam logo achar que era conversa de quem não queria resolver problema nenhum. Quantas vezes e quantos planos ficaram na gaveta? Felix Ribeiro disse há tempos numa entrevista que hoje já ningué,m quer saber de pensar muito largo, as pessoas só querem ser felizes, não estão para preocupações.Assim, vamos tendo cada vez menos filhos, vamos deixando os nossos jovens encher-se de cursos e ir embora, na melhor das hipóteses, e no fim enchemo-nos de tristeza por deixado que as coisas chegassem aqui.
ResponderEliminarPois é, cara Susana, pois é, dá muito trabalho pensar a largo prazo. Mas se se pensasse a largo prazo, se se fizesse planeamento de topo em condições e, claro, se se seguissem os planos, saber-se-ia, por exemplo nesta coisa das escolas quantas, onde, com que valências fariam falta, não hoje mas sim hoje, daqui a 5 anos, daqui a 10 e daqui a 20. E quem diz escolas, diz hospitais, dimensionamento de redes de electricidade, água e gás, afectação de forças de segurança e um longuissimo etc dado que todas estas coisas funcionam muito melhor e com muito melhor uso dos recursos tanto humanos como materiais quando são pensadas a seu tempo e em condições. Doutra forma faz-se apenas navegação à vista, para o imediato, fazem-se umas obras a contar com dia de amanhã, depois de amanhã destroem-se e faz-se outra coisa porque o anterior já deixou de ter serventia, constroem-se estradas mas ninguém sabe porquê nem para quê nem que benefícios vão tirar-se da sua existência e por aí fora.
ResponderEliminarÉ pena...
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ResponderEliminarPara quem gosta de apalpar antes de comprar, cinco exemplos práticos que explicam que o Estado fecha escolas por opção, não porque foi empurrado a isso.
ResponderEliminarhttp://ambio.blogspot.com/2010/08/encerrar-o-pais-aos-poucos.html
henrique pereira dos santos
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