sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

A crise da Europa...na retórica da desculpabilização, claro!

1.A “retórica da desculpabilização” (RD), a que aqui me tenho referido, consiste numa técnica de propaganda, intensamente utilizada pelos nossos dirigentes governamentais nos últimos meses, visando atribuir a causas externas a responsabilidade pela dramática situação económica e financeira com que o País se defronta.
2.Ao atribuir a responsabilidade a causas externas, os utilizadores da RD tentam desviar a atenção dos cidadãos incautos da verdadeira causa dessa dramática situação: a acumulação de graves erros de política económica ao longo dos últimos anos, significativamente ampliados nos últimos seis...
3.A referência sistemática à crise (económica) da Europa tem sido um dos “cavalos de batalha” ultimamente mais utilizados pela RD: a crise portuguesa, segundo a RD , não passa de uma consequência e um reflexo da crise da Europa e, muito em especial, da zona Euro…
4.O PM, cultor exímio da RD (catedrático), acrescentou-lhe há dias uma nova e riquíssima ideia: segundo ele, a Europa passa por uma “crise sistémica” – expressão que tem a enorme vantagem de nada significar e de ninguém entender – e nós não somos mais do que vítimas dessa mesma “crise sistémica”…
5.Pois bem, na edição do F. Times da última 6ª Feira (14 do corrente), em notícia de 1ª página, foi dada uma grande ajuda à RD, ao explicar a mudança de tom adoptada pelos responsáveis do BCE na sequência da divulgação de uma taxa de inflação de 2,2% na zona Euro em Dezembro de 2010 - pela primeira vez, ao fim de mais de 2 anos, acima de 2%.
6.Segundo o F. Times, a mudança de tom dos responsáveis do BCE reflecte um certo nervosismo decorrente (i) da ROBUSTEZ da recuperação global da economia da zona Euro, a despeito das crises da dívida que atingiram a Grécia, a Irlanda e Portugal e ainda (ii) da aceleração da inflação nas economias emergentes…
7.Aqui temos pois a crise económica da zona Euro bem caracterizada pelo F. Times como “ROBUSTEZ da recuperação económica…a despeito das crises dos 3 países periféricos…
8.É então a ROBUSTEZ da recuperação económica da Europa que, segundo a RD, nos tem arrastado para o estado de penúria em que nos encontramos e que dia a dia vai conhecendo novos episódios nesta nova diplomacia de mão-estendida…
9.A verdade é que a charlatanice militante assentou arraiais entre nós e não vejo sinceramente como sair disto…

14 comentários:

  1. O problema parece-me residir na vontade súbita de tanto o sector privado, como o público estarem em simultâneo a querer reduzir as suas dívidas.
    Ora bem, sabemos que isto não pode suceder em simultâneo e que, caso suceda, é o descalabro completo.
    O Caro Dr. Tavares Moreira, recua 6 anos na cronologia... penso que esteja a reinar com o pessoal, mas pronto, faz de conta que acredito na sua convicção.Seja como for, sabemos também que a origem de toda esta crise está no endividamento e no crescimento dos bancos, que acabou por se tornar demasiado, face à desvalorização sobretudo do sector imobiliário. É claro que muitos outros factores lhe estão associados.
    Neste momento, existe um cúmulo de dívidas que todos estão a querer saldar... muitos com um único recurso... a insolvência, o que deixa os bancos "agarrados".
    "Agarrados" por diversos motivos, mas básicamente, porque os seus devedores, não têm onde "o" ir buscar, para lhes pagar e... austeridade, que parece ser a palavra de ordem, pode ser o afundanço total.
    Destas crises, já sabemos por experiência, o que costuma resultar. Seja como for... quem acaba por pagar a crise, são sempre os mesmos; aqueles a quem foi prometido o paraíso, a quem foi pintada uma paiságem delirantemente fácil, a quem foram abertas as portas douradas que dávam acesso ao crédito. Como se costuma dizer em povolês: era tudo à fartazana... agora o corpinho é que vai pagar... porque aqueles que benificiáram, e acomularam ou reforçaram as grandes fortunas... esses continuam a ssobiar para o lado e a fingir que estão a apreciar a paisagem.

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  2. Anónimo20:07

    Caro Tavares Moreira, como resultado precisamente do que diz no seu ponto 5, o início dum ciclo de subida das taxas de juro pelo BCE não estará longe. Todos sabemos os efeitos disso em Portugal. Tem o meu caro Amigo algum palpite para qual vai ser a expressão de imensa elevação intelectual usada nessa altura para explicar os problemas gravissimos que se colocarão?

    Entretanto referência particular ao ponto 9. Concordo plenamente e direi mais, assentou arraiais, mais do que com o beneplácito, com o desejo dos eleitores.

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  3. Caro Bartolomeu,

    Não se surpreenderá se lhe disser que partilho em grande porcentagem as suas considerações críticas no tocante à responsabilidade pela situação crítica a que chegamos: os próprios bancos (de retalho) têm uma responsabilidade não negligenciável certamente...
    Quanto à questão dos últimos 6 anos, repare que analiso este período como oportunidade perdida - os problemas já eram muito agudos há 6 anos, certamente.
    Se então tivesse havido lucidez nas opções de política, poderíamos estar hoje melhor.
    Como não houve lucidez e se insistiu no erro, com particular convicção, refira-se, estamos hoje em situação desesperada...
    Há 15 anos os erros ainda tinham alguma emenda, não estavamos sujeitos à camisa de forças do Euro...
    Há 10 anos, quando entramos no Euro, passou a ser proibido errar pois os custo dos erros de política aumentaram exponencialmente...
    Há 6 anos, continuar a errar tornava-se atitude suicidária...mas foi precisamente o que aconteceu!
    Agora e muito sinceramente, eu não sei como vamos sair disto...não acredito absolutamente nada na capacidade dos agentes em exercício para corrigirem o que quer que seja deste gravíssimo problema...
    A estratégia resume-se a tentar sobreviver - mais uma semana, mais um mês, a ver se o cutelo não nos cai sobre a cabeça - como de resto já se percebeu com a prática sistemática da diplomacia de "mão estendida"!

    Caro Zuricher,

    Também admito que não tenhamos de esperar muitos meses para ver o BCE subir as taxas de intervenção...mas para nós, o mais delicado cenário é o BCE descontinuar as medidas excepcionais de apoio a determinados sistemas bancários...esse é manifestamente o pior cenário, chamar-lhe de "stress" será uma leve brincadeira...
    inteiramente de acordo com o seu último parágrafo, claro, embora dizer "os eleitores" talvez seja generalizar em demasia...
    Diria, para ser mais justo, "uma parte do eleitorado com especial gosto para ser enganada"...

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  4. Caro Dr. Tavares Moreira, passado um tempo, não digo longo, mas já considerável a ler atentamente os seus interessantíssimos e pedagógicos textos, seria um evidente sinal de estupidez da minha parte, se não conseguisse ainda formular um pensamento que não fosse de alguma forma, coincidente com o do Mestre.
    Mas, existe sempre uma possibilidade de o disciplo divergir do caminho do Mestre, na tentativa, não de o desrespeitar, mas sim de experenciar outros caminhos e testar novas soluções.
    E o nosso país precisa tanto de uma solução concreta e efectiva, como um asmático necessita de ar.
    Não vou voltar a referir-me à questão do tempo que passou, nem das opções erradas que foram tomadas. Quanto a isso, não ha remédio. Aquilo que é importante, no meu ponto de vista, é não continuar a "martelar" nos mesmos erros. É absolutamente necessário que se olhe a actualidade com olhos de hoje, mesmo que não se possua a capacidade de antecipar o futuro.
    E no presente, caro Dr. Tavares Moreira, é importante é fundamental pensar em primeiro lugar, na estabilidade e na sustentabilidade dessa estabilidade.
    Não conhecemos outra forma de o fazer, que não seja, através da concertação e do trabalho, abandonando a fórmula do - mais estado - mais despesa - mais impostos. Esta fórmula, já todos perceberam que só tem gerado falências e consequentemente desemprego, diminuição de receitas, aumento de dívida.
    É um modelo a abandonar, já!
    Resta-nos o empreendedorismo e a vontade de fazer, as quais em minha opinião só se alcançam com confiança entre todas as partes.
    É um processo difícil, que requer muita perseverança, com mudanças radicais também, sobretudo a nível da forma como o governo actua.
    Quer seja Cavaco Silva, ou outro qualquer o Presidente da República Portuguesa, a partir de amanhã, é fundamental, é vital que exerça o seu débil poder de intervenção, com muita acutilância e clareza, sem dúblias intervenções, sem hesitações e sobretudo que intervenha, que seja um verdadeiro representante dos interesses do povo que o elege e da nação a que preside.

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  5. Caro Bartolomeu,

    Não posso e não quero deixar de enaltecer o seu renovado espírito de esperança na ultrapassagem da dramática situação para que a incompetência dos dirigentes nos lançou!
    Sem esperança, não há vida dirá e tem toda a razão...
    O grande problema, para tomar a sua interessante ideia de a partir da próxima 2ª Feira sermos capazes de encontrar um novo rumo, é que tb a partir de 2ª Feira as nossas dívidas colectivas (pública + privada) continuarão a crescer, os juros a agravar-se, os desequilíbrios económicos fundamentais persistirão...
    A ultrapassagem destes problemas requer uma radical mudança de política - incluindo algumas ideias expressas no seu comentário - e uma perspectiva de médio longo prazo na definição/aplicação das políticas económicas.
    Nem uma nem outra coisa estão neste momento asseguradas, navega-se à vista, sob o comando errático e basicamente ignorante das agências de comunicação, procurando apenas sobreviver...
    Compreendo e muito aprecio a sua msg de esperança, mas, como diz o outro, não há omoletas sem ovos...

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  6. É como diz, caro Dr. Tavares Moreira.
    O futuro está inalterávelmente por fazer e, compete-nos, encarregarmo-nos dessa tarefa... se o quisermos ter.
    ;)

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  7. Ciclópica a tarefa que propõe,meu Caro!
    À altura dos grandes homens...porque não locar a lanterna do velho Diógenes, o Cínico, para tentar descortinar essa rara espécie neste País em afunilamento acelerado?

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  8. Caro Tavares Moreira

    Quando lhe escrevo este comentário já os resultados da eleição de domingo estão definidos.
    Nesse sentido, esperemos que termine esta fase de "faz de conta", da política de "telenovela" e a política económica de "aguenta que estamos no bom caminho".
    As conclusões óbvias do artigo do FT são preocupantes: acentua-se na zona euro, uma preocupante divergência de crescimento entre os seus membros.
    Cada ponto precentual de diferença entre o crescimento médio do "norte" e o "sul", retira, pelo menos seis meses aos do sul para chegarem aos do norte.
    A contagem decrescente já começou e, no fim do corrente trimestre vamos avaliar se teremos perdido seis meses de prazo de ajustamento. Isto é, se temos seis ou apenas cinco anos e meio para "arrepiar caminho".
    O resto, como muito bem diz, não passa de RD.
    Cumprimentos
    joão

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  9. tenho pensado nisso, caro João: estamos agora engajados, muito mais do que no passado quando essa expressão começou a ser utilizada, numa Europa (zona Euro, para ser mais preciso) a 2 velocidades: os países do centro e do norte, com crescimento sustentado e situação financeira estável, e os periféricos, sobretudo os PIG's, em recessão quase contínua e lutando por uma sobrevivência financeira cada vez mais difícil de assegurar...
    Isto começa a ser, de facto, uma zona monetária bem pouco recomendável, tanto para uns como para outros...

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  10. Como se passa neste últimos trinta anos, desde 25/04/74, Caro Tavares Moreira, evitamos ou lateralizamos as questões.
    A dívida soberana sempre foi um assunto político económico; esta moda anglo saxónica de trocar sa ordem, apenas contribui para obnubilar a questão e, o que é péssimo, baralhar completamente a realidade.
    A presente união monetária, como muito bem o sabe, ou é analizada pelo suporte político e "vendida" com um custo económico ou, caso invertamos os termos, deixa de ter justificação.
    Agora estamos como as gravidezes indesejadas e comunicadas tardiamente: já não podemos abortar sem sérios riscos e assim, como dizem os françeses há que "faire avec". Infelizmente, as "elites" do sul ainda não perceberam que podem negociar mas isso, supõe enfrentar a terrível verdade e "contá-la" ao eleitorado.
    Normalmente, os capitães de navios que são originários do sul da europa, costumam abandonar o navio primeiro....
    Cumprimentos
    joão

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  11. Caro João,

    Como eu compreendo bem agora as recorrentes reservas do então Presidente do Bundesbank, Karl Otto Pohel, quando se discutia, no seio do Delors Committee, a que tive o gosto de pertencer, o projecto de criação da união monetária euripeia...
    Os alemães alimentavam uma reserva, que às vezes parecia mórbida, sobre a consistência futura da união monetária...
    E se não fosse o ímpeto europeu do então Chanceler Helmut Khol - a cujo entusiasmo se deve em última análise esta criação - não teríamos hoje união monetária...
    Os alemães, percebe-se agora,até tinham alguma razão...embora se possa dizer que durante bastante tempo, após a introdução do Euro, se deixaram adormecer "à sombra da bananeira" acreditando que os "profligáticos do sul" estavam a fazer o que lhes competia...
    E bastaria terem prestado alguma atenção à evolução das economias do sul - no nosso caso concreto o insustentáevl desequilíbrio externo - para perceberem que a zona Euro iria ter sérios problemas...

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  12. Caro Tavares Moreira
    Apenas um comentário breve, dado que, o tema que sugere, exigiria mais tempo e outro local.
    O actual modelo económico anglo saxónico na versão norte americana tem subjacente( podemos "ler" como escondendo) um projecto político que visa o domínio total.
    Ainda que possa estar equivocado, o modelo renano, na versão actual da Alemanha, pretende o poder mas sem domínio total; a história recente e a "localização" geográfica assim o impõe.
    É por isso que, considero que existe espaço de manobra para negociar um novo quadro; naturalmente, que o preço final terá de ser tomado em linha de conta.
    A continuramos por esta via vamos ( o projecto europeu) terminar como os irmãos siameses: irremdiavelmente unidos mas, odiando-nos de morte.
    Não será isso que deseja a versão norte americana do modelo anglo saxónico?
    Cumprimentos
    joão

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  13. Caro João,

    Não estou tão cero da conclusão/dúvida que deixa no final do seu comentário...
    Lendo com atenção a última edição do Economist, cuja linha editorial anglo-saxónica certamente não contestará, até me parece poder concluir-se em sentido contrário - quando advoga que, sem mais perda de tempo, se avance na reestruturação das dívidas da Grécia, Irlanda e Portugal, não deixando arrastar penosamente a actual situação...
    Situação que, arrastada penosamente até 2013 por hipótese, acabará sempre em reestruturação de dívida, não há volta a dar-lhe, só que com custos muito maiores para os países envolvidos...

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  14. Caro Tavares Moreira
    O fundamentalismo financeiro anglo saxónico na versão norteamericana, originou uma década perdida na Amérca Latina e, no final os "Brady bonds"; outra grande realização desta corrente foi a crise asiática de 97/98.
    Se esta corrente fosse a dominante na europa, nós, junto com os restantes PIGS penaríamos durante algum tempo, o suficiente para, não apenas permitir a recapitalização dos credores, como obter uma margem confortável. O resultado final, neste quadro seria a dominância incontestável da Alemanha. Ora não parece ser esse o sentido,aliás, as últimas informações apontam para que se vá para uma restruturação de dívida sem o admitir; não se trata do parto sem dor mas, do café sem cafeína. (Veja, caso não o faça já, o site eurointelligence).
    O ponto que desejaria enfatizar é que não sei até que ponto so nossos polítcos compreenderam que existe uma janela de oportunidade para renegociar as condições; o preço será, entre outros, uma mudança de comportamentos, atitudes, hábitos, filosofias com um custo desigual para os actores nacionais. Ora, no nosso caso, essa desigualdade de sacrifícios é que não quer ser assumida pelos actores políticos.
    O tema dá para mais e ficará para outra ocasião.
    Cumprimentos
    joão

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