Em jovem, tive a oportunidade de ver o filme “2001 Odisseia no Espaço”, devia andar no primeiro ano da faculdade. Recordo a dificuldade em comprar o bilhete, mas consegui um, no pior sítio possível, na primeira fila, no último lugar do lado esquerdo. Como é curioso a memória mostrar-se tão fresca com estes momentos, talvez tenha sido devido ao torcicolo que apanhei e que me perturbou durante alguns dias, porque para poder ver todo o ecrã, já que o filme era “panorâmico”, fui obrigado a fazer um esforço dos diabos.
A parte inicial do filme, sob o tema, “Assim falou Zaratustra”, de Richard Strauss, provocou-me um calafrio intensificado pela simbologia do monólito negro e o comportamento dos nossos antepassados, pré hominídeos, a revelarem a futura faceta humana, a violência, base da sobrevivência e marca de água que ainda perdura.
Se “2001” me marcou, mais mossa me fez o “2010”, como ponto de passagem para o futuro, para a emergência de novas existências e de novas esperanças, como o aparecimento de uma nova estrela, de um novo sistema solar dentro do nosso. Uma explosão. É isso, ainda 2010 vinha longe, muito longe, e eu associava-o a uma explosão, a uma nova existência. Talvez por isso, no primeiro dia de 2010 me tenha lembrado de tantas coisas, e comecei a analisar o que me faltava ainda por fazer. Uma boa data para começar a contagem decrescente, atento ao momento da partida, à procura de novos mundos...
Sentado, tranquilamente, a ver televisão sem a ver, lembrei-me de um convite que me fizeram há alguns anos para proferir uma conferência sobre a polypill, como meio de prevenir doenças degenerativas do foro cardiovascular. Uma mistura de várias substâncias cujos efeitos estão bem documentados. Sendo assim, há quem preconize o seu uso como forma de prevenção primária. É aqui que se discute se vale ou não a pena o seu uso. Há quem diga que sim e há quem diga que não, porque as doses utilizadas são subterapêuticas. No fundo, o que o ser humano pretende é viver com saúde o máximo de tempo possível, usando tudo o que a sua rica imaginação concebe produzir.
Recordo-me de ter feito uma apresentação interessante, e meio problemática, que despertou a atenção dos presentes. Ao terminar apresentei algumas fotografias de John Coplans, fotógrafo britânico, entretanto falecido aos 83 anos, que tinha passado os últimos vinte anos a captar imagens do seu corpo, à medida que envelhecia. Curioso ver as diferentes imagens ao longo do tempo. O artista quis demonstrar que existe uma arte de envelhecimento, traduzida na estética dos anos a passear pelo seu corpo, e, também, na forma como o mesmo deve ser encarado. Com naturalidade, com beleza e sem medos.
Não sou fotógrafo, mas registo, também, uma necessidade crescente de “fotografar” os meus últimos anos de vida, não através das modernas máquinas digitais, ao alcance de qualquer um, mas pelo velho processo da escrita. Não sei o que Coplans pensou quando tinha, praticamente, a minha idade. Presumo que estaria recetivo a aceitar as alterações que, entretanto, iam surgindo. Eu não sou tão otimista quanto Coplans. Posso aceitar o que irá acontecer como natural, mas tenho dúvidas se o farei com naturalidade. A ansiedade, filha dos acontecimentos, muitos dos quais incontroláveis, assusta-me. Olho, penso, questiono e só encontro uma forma de resolver o problema, escrever. Quem sabe se não conseguirei encontrar um pouco de tranquilidade, abafar a ansiedade e, até, encontrar alguns restos da beleza, a forma mais sublime de justificar a existência.
Não nego que haja uma arte de envelhecimento, mas também é preciso envelhecer com arte. É aqui que reside o cerne da questão. Terei arte, ou serei, apenas, vítima da arte?
Talvez um dia destes reapareça para dar a resposta...
A parte inicial do filme, sob o tema, “Assim falou Zaratustra”, de Richard Strauss, provocou-me um calafrio intensificado pela simbologia do monólito negro e o comportamento dos nossos antepassados, pré hominídeos, a revelarem a futura faceta humana, a violência, base da sobrevivência e marca de água que ainda perdura.
Se “2001” me marcou, mais mossa me fez o “2010”, como ponto de passagem para o futuro, para a emergência de novas existências e de novas esperanças, como o aparecimento de uma nova estrela, de um novo sistema solar dentro do nosso. Uma explosão. É isso, ainda 2010 vinha longe, muito longe, e eu associava-o a uma explosão, a uma nova existência. Talvez por isso, no primeiro dia de 2010 me tenha lembrado de tantas coisas, e comecei a analisar o que me faltava ainda por fazer. Uma boa data para começar a contagem decrescente, atento ao momento da partida, à procura de novos mundos...
Sentado, tranquilamente, a ver televisão sem a ver, lembrei-me de um convite que me fizeram há alguns anos para proferir uma conferência sobre a polypill, como meio de prevenir doenças degenerativas do foro cardiovascular. Uma mistura de várias substâncias cujos efeitos estão bem documentados. Sendo assim, há quem preconize o seu uso como forma de prevenção primária. É aqui que se discute se vale ou não a pena o seu uso. Há quem diga que sim e há quem diga que não, porque as doses utilizadas são subterapêuticas. No fundo, o que o ser humano pretende é viver com saúde o máximo de tempo possível, usando tudo o que a sua rica imaginação concebe produzir.
Recordo-me de ter feito uma apresentação interessante, e meio problemática, que despertou a atenção dos presentes. Ao terminar apresentei algumas fotografias de John Coplans, fotógrafo britânico, entretanto falecido aos 83 anos, que tinha passado os últimos vinte anos a captar imagens do seu corpo, à medida que envelhecia. Curioso ver as diferentes imagens ao longo do tempo. O artista quis demonstrar que existe uma arte de envelhecimento, traduzida na estética dos anos a passear pelo seu corpo, e, também, na forma como o mesmo deve ser encarado. Com naturalidade, com beleza e sem medos.
Não sou fotógrafo, mas registo, também, uma necessidade crescente de “fotografar” os meus últimos anos de vida, não através das modernas máquinas digitais, ao alcance de qualquer um, mas pelo velho processo da escrita. Não sei o que Coplans pensou quando tinha, praticamente, a minha idade. Presumo que estaria recetivo a aceitar as alterações que, entretanto, iam surgindo. Eu não sou tão otimista quanto Coplans. Posso aceitar o que irá acontecer como natural, mas tenho dúvidas se o farei com naturalidade. A ansiedade, filha dos acontecimentos, muitos dos quais incontroláveis, assusta-me. Olho, penso, questiono e só encontro uma forma de resolver o problema, escrever. Quem sabe se não conseguirei encontrar um pouco de tranquilidade, abafar a ansiedade e, até, encontrar alguns restos da beleza, a forma mais sublime de justificar a existência.
Não nego que haja uma arte de envelhecimento, mas também é preciso envelhecer com arte. É aqui que reside o cerne da questão. Terei arte, ou serei, apenas, vítima da arte?
Talvez um dia destes reapareça para dar a resposta...
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminar(Será que o filme estreou na véspera de algum exame? :))
ResponderEliminarEu não vi o filme mas posso dizer Also Sprach Zarathustra apareceu a narrar as andanças e ensinamentos de um filósofo que se "auto -nomeou" de Zaratustra (após a fundação do Zoroastrismo). Por outro lado, assinalou o movimento positivo da filosofia de Nietzsche, ao qual se chamou filosofia do meio – dia. " E o Grande Meio-Dia é quando o homem está a meio do seu trajecto entre o animal e o super-homem e exalta como a sua maior esperança o seu caminho para o anoitecer, pois é esse o caminho para uma nova manhã" …(Nietzsche, F. (1998). Assim Falava Zaratustra (Castro, P. A. de, Trad.). Lisboa:Relógio D’Água, p.90). Bem o John Coplans é polémico pelos seus self portraits, mas cá para mim ele acreditava no eterno retorno do Nietzsche (mais um referência narcísica http://tocandosemtocar.blogspot.com/search?q=Nietzsche ).
(somos todos trespassados pela herança da arte, o que não se opõe, necessariamente, à criação artística).
No fim da sua vida, Einstein declarou: «se eu soubesse, tinha-me feito canalizador».
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