Ontem escrevi um pequeno texto sobre o comportamento pouco deontológico de nutricionistas que, descaradamente, promovem produtos alimentares do Continente. Quanto ao papel da "princesa do nada", nada tenho a dizer, é alguém que sabe vender a sua imagem, e cada um vende o que pode ou que lhe dá na real gana. Quanto a isso fico com as minhas impressões, que valem o que vale, às tantas nada, mas é coisa não chamada para aqui.
Escrevi o texto num destes interessantes e modernos gadgets, que, com um simples toque de um dedo, permitem obter pequenas maravilhas. Oferecem processadores de texto capazes de duas coisas, corrigir o que escrevemos, o que é muito bom, como induzir a escrever o que entendem, e aqui a porca torce o rabo. Explico, ao digitar as primeiras letras de uma palavra o processador do texto antecipa-se oferecendo a mais indicada, a fim de poupar tempo a escrevê-la na totalidade. Por vezes estamos de acordo, outras vezes não. Apesar de habitualmente escrever como deve ser as palavras, o processador acaba por impor as suas caso me distraia. Claro que há forma de as recusar, bastando para isso estar atento e carregar com a ponta do dedo no X da oferta e mandar às malvas a pretensa ajuda. Foi o que me aconteceu ontem. Escrevinhei o texto e, em vez de escrever espectador, escrevi espetador. Hoje, de manhã cedo, e um pouco estremunhado pela falta de descanso nocturno, li o comentário de AF. Confesso que a princípio não compreendi muito bem, o que é natural, mas, depois de uma segunda, ou terceira?, leitura alcancei o ponto, tinha escrito mal a palavra "espetador". O comentário é interessante, sem dúvida, mas despertou uma reação da minha parte algo meio intempestiva, o que é perfeitamente natural em pessoas emotivas. De qualquer modo, entendi que devia suavizar a minha reação com um daqueles sinais em que se utilizam os " smiles" ou coisa parecida, neste caso acho que foi um piscar de olho, ;).
Mas vamos ao que importa, ao ler e compreender o objetivo do comentário ao meu erro/lapso, comecei a ouvir o silvo de um protótipo de uma colher de pau gigante, inacabada, pois, e com cinco pequenos orifícios, em vez da concavidade que deveria ter, a tombar, pouco delicadamente, nas minhas mãos, impulsionada, magistralmente, pela besta do meu professor da escola primária, que, à boa maneira de outros tempos, "sabia", como ninguém, educar os miúdos com "porrada" da grossa. O silvar da menina dos cinco olhos - será que os "cinco olhos" eram uma forma de evitar que se partisse na sua atividade pedagógica, encontrasse menos resistência ao ar, ao mesmo tempo que representavam as cinco quinas nacionais? -, aliado ao latejar das mãos, a gritarem de dor, foram, matinalmente, desencadeadas pela leitura do comentário. Ao fim e ao cabo uma forma de reflexo pavloviano, mas negativo, claro, porque não salivei de prazer, antes pelo contrário. Irrita-me profundamente estes corretores de texto, indutores de palavras que não desejo e que escapam, algumas vezes, ao controlo. Nem imaginam as "induções" que tenho recebido à medida que escrevo este pequeno desabafo. Estou farto de corrigir. Que chatice! Tem de haver uma forma de eliminar estas ajudas. Vou ver se consigo. Esta coisa de andar a corrigir o corretor tem muito que se diga.
E assim, graças à publicidade televisiva, acabei por relembrar certos acontecimentos do passado e dissertar sobre o presente.
Confesso que começo a divertir-me com as minhas atitudes, lapsos e erros. Até já consigo rir-me de mim próprio. Há quem diga que quem o consegue é porque está no bom caminhão (caminho, se faz favor!). Irra, estou farto de entrar em conflito com este sacana do processador de texto! Nem imaginam as vezes que já alterei as palavras que não queria escrever. O pior é se na revisão final não conseguir detetar alguns erros, mas se não conseguir, paciência, pelo menos está publica e antecipadamente explicado o meu erro/lapso.
Que alívio, :)). Acho que é assim que se dá uma gargalhada eletrónica!
Afinal o sacana do processador de texto parece que tinha a sua razão:(latim spectator, -oris)
s. m.
1. Aquele que assiste a espetáculo.
2. Pessoa que presencia algo. = TESTEMUNHA
3. Aquele que observa algo. = OBSERVADOR
Confrontar: expetador ou expectador.
» Grafia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990: espectador
» Grafia no Brasil: espectador."
(Dicionário Priberam da Língua Portuguesa).
Caro Professor
ResponderEliminarO que é que de grave lhe pode acontecer, se não ADOPTAR o novo acordo ortográfico?!
Eu com 56 anos não adopto. É a minha forma de protesto contra um acordo ortográfico neo-colonizador!
Caro Professor Massano Cardoso,
ResponderEliminarPeço desculpa pela irritação matinal causada pelo meu comentário. Não era, obviamente, a minha intenção! De resto, penso que isso fica claro no segundo comentário que fiz ao seu artigo, assim como a hipótese que logo coloquei sobre o corrector ortográfico e que veio, pelos vistos, a revelar-se correcta. :)
Aliás, pouco tempo depois de ter submetido os tais comentários, dei por mim a pensar "ehhhh ... AF, estás a ficar igualzinho a um qualquer grammar nazi !" (expressão usada na net para rotular aqueles indivíduos que parecem ter prazer em corrigir os erros dos outros comentadores, mesmo quando é evidente tratar-se de lapsos)
Leio sempre os seus textos com gosto, e considero-os invariavelmente excelentes no conteúdo e na forma. É só que ... estas coisas do novo acordo, especialmente essa dos espetadores ... não sei, é um bocado inexplicável, deixa-me irritado. :)
Eu não sei qual o gadget que o professor usa para escrever e editar, mas possivelmente há uma forma de desligar o "auto-complete" das palavras. É uma opção. Eu desligo sempre.
E para finalizar, caro Professor, quer ver exactamente ao que me refiro quando falo da ambiguidade desnecessária introduzida por estes acordos? Repare: no ante-penúltimo parágrafo deste seu novo texto, lê-se " Esta coisa de andar a corrigir o corretor tem muito que se diga."
E está certíssimo (ia escrever correctíssimo, mas já nem sei se deva!) Pelo novo acordo, a grafia é essa
( http://www.priberam.pt/dlpo/dlpo.aspx?pal=corretor )
Mas ... mas ... corretor não era aquele tipo que nos tratava dos seguros???? E que vejo eu ... pelos vistos a grafia já foi alterada em 1990!!! Estou cada vez mais confuso! Corrijam-me ... ou correctem-me! :D
Fenix.
ResponderEliminarNada. Consigo ler livros em português antigo e já ocorreram vários acordos entretanto. Ao fim de meia dúzia de páginas estou à vontade. Mas não podem ser muito antigos. Os do tempo do D. Dinis já são difíceis.
Caro AF
ResponderEliminarNada de especial. Afinal até deu pano para mangas para os opositores ao novo acordo :). Estou convicto de que algo semelhante terá ocorrido com os anteriores acordos, penso. Gostaria de ouvir as opiniões dos entendidos a este propósito.
Caro Professor Massano Cardoso,
ResponderEliminarE, para além do pano pra mangas, teve ainda a virtude de o fazer "experimentar" os smiles! (emoticons é o termo mais correcto)
Ao contrário do que se possa pensar, que são modernices trazidas pelos computadores, há registos do uso destas coisas desde as últimas décadas do séc. 19, pelo menos!
Emoticon (Wikipedia)
Melhores cumprimentos! :-)
Caro Doutor.
ResponderEliminarSobre os produtos milagrosos que fazem com que emagrecemos comendo muito, e outras maravilhas, leia o número de Outubro da Revista Science et vie. Tirando as gorduras insaturadas e o Omega-3, o resto é treta, incluindo os adoçantes e a Danone é a campeã mundial dos rótulos mentirosos.
Este texto é o máximo, fartei-me de rir, tenho o mesmo problema de passar a vida a "discutir" com o corretor ortográfico, várias vezes cou ao dicionário confirmar e em geral empatamos, pode-se escrever de duas maneiras, ou então ele "interpreta" o sentido errado e também tem razão, como me aconteceu há dias com "iminência" ou "eminência". As máquinas têm sempre razão? Não sei, mas que são teimosas, são :)
ResponderEliminar"Corretor" é o intermediário financeiro, aquele tipo que nos compra e vende as acções na Bolsa. O Pedro Caldeira, por exemplo, era um corretor cheio de estilo, até ao momento em que teve de passar por um processo de correcção.
ResponderEliminar"Espetador" é o tipo que espeta qualquer coisa em qualquer sítio, por exemplo, um ferro no lombo do touro.
"Detetar" talvez seja retirar uma ou mais tetas.
Mas sim, o Acordo Ortográfico é uma coisa muito divertida.
O Orçamento de Estado para 2012, para além de nos revelar que as famosas “gorduras” do Estado são afinal os salários da função pública e as pensões dos reformados, constitui um manancial de coerência no que respeita à aplicação do Acordo Ortográfico.
ResponderEliminarNo blog Bic Laranja é revelado um trabalho de paciência de Francisco Manuel Valada que encontrou várias pérolas no texto do OE 2012, deixando estes dez exemplos :
EXEMPLO 1
caráter acomodatício – Página 9
carácter universal e extraordinário – Página 30
EXEMPLO 2
setor bancário a nível europeu – Página 107
sector dos transportes ferroviários – Página 85
EXEMPLO 3
(excepto receita de privatizações) – Página 99
Títulos exceto ações – Página 96
Acções e outras participações – Página 157
EXEMPLO 4
Aquisição líquida de activos financeiros – Página 99
ativos e passivos financeiros – Página 157
EXEMPLO 5
pela interacção dos seguintes factores – Página 76
da interação dos seguintes fatores desfavoráveis – Página 70
EXEMPLO 6
DESPESA EFECTIVA – Página 69
despesa efetiva – Página 69
Permita-se-me um aparte: na mesma página… Curioso…
EXEMPLO 7
Habitação e serviços colectivos – Página 79
Habitação e serviços coletivos – Página 189
EXEMPLO 8
Protecção do meio ambiente e conservação da natureza – Página 189
proteção do meio ambiente e conservação da natureza – Página 189
Permita-se-me outro aparte: na mesma página… Curioso…
EXEMPLO 9
os contratos efetivamente celebrados – Página 134
começará a ser efectivamente paga nesse ano – Página 75
EXEMPLO 10
duas ópticas de contabilização – Página 53
numa ótica de contabilidade nacional – Página 53
Perdão : o nome é Francisco Miguel Valada.
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