sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Cautela com os optimismos, ainda que compreensíveis..

1.O Ministro das Finanças e creio que também na sua esteira o PM lançaram, ontem e hoje se não erro, a ideia de que 2012 será um ano de viragem, de que constituirá o final de uma etapa de contracção da economia e de partida para uma fase de recuperação bem como da esperada abertura dos mercados financeiros ao risco português depois de mais de 2 anos de “secagem”.
2.Compreendo perfeitamente que estes membros do Governo, dada a pressão brutal da agenda de trabalho a que se estão sujeitos bem como a extremíssima dificuldade das tarefas que tiveram e continuam a ter de enfrentar – para não falar da tremenda pressão mediática que enfrentam diariamente - procurem valorizar qualquer sinal positivo que o mercado proporcione, interpretando-o como sinal de uma mudança mais fundamental da economia...
3.No caso das declarações de optimismo do Ministro das Finanças, elas derivam do facto de o Tesouro português (IGCP) na última 4ª Feira ter conseguido colocar dívida pública de prazo superior a 6 meses, pela primeira vez desde Abril de 2011 quando o País, vítima de uma governação que esteve próxima do delírio absoluto, se viu forçado a solicitar um resgate financeiro à EU e ao FMI – concretamente dívida ao prazo de 11 meses e com bastante sucesso.
4.Não deixo de reconhecer que se tratou de um acontecimento positivo que, a confirmar-se, pode marcar uma fase de transição em que o Tesouro/IGCP terá possibilidade de se afoitar um pouco mais no recurso a operações de mercado e, quem sabe, reduzir o recurso em 2012 aos empréstimos da Troika o que lhe permitiria deixar até uma almofada estratégica para 2013...
5.Mas, infelizmente e quase em simultâneo, os juros implícitos (yields) da dívida pública portuguesa de prazos mais longos – 2 anos em diante – começaram a agravar-se e têm continuado a agravar-se atingindo hoje valores “record” da era do Euro, o que não deixa de constituir motivo de preocupação quanto à efectiva confiança dos investidores.
6. É certo que este agravamento terá explicação, que pode estar nos efeitos (i) de contágio da situação periclitante em que a Grécia se encontra - sendo que Portugal se encontra logo a seguir na “linha de fogo” - e também (ii) da revisão em baixa do “rating” da nossa dívida pública, que a atira para baixo do “investment grade”, forçando muitos institucionais a desfazer-se de dívida nacional...
7....mas também mostra que os sinais positivos como aquele que motivou a reacção dos governantes devem ser recebidos com bastante cautela e que não se pode LER neles mais do que aquilo que efectivamente são – positivos sem dúvida, mas apenas do momento, ainda não, infelizmente, conclusivos...
8.Seria bom que pudéssemos falar já de uma fase de viragem, mas parece preferível deixar esse comentário para mais tarde; esse momento chegará, por certo, mal de nós se assim não fosse, mas convirá que o cenário se clarifique um pouco mais, sendo ainda cedo para expressar certos optimismos...lá para o 3º trimestre, talvez, e se tudo correr bem...até lá há que continuar a trabalhar, com afinco...

10 comentários:

  1. Caro TM,

    O ponto 8 é um gaguejo...

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  2. Caro Tavares Moreira:
    Muito bem. Convém recordar sempre que "cautela e caldos de galinha..."

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  3. Um individuo caído na miséria e que calçava 42 só ficou com um par de sapatos 38 que não teve outro remédio se não passar a usar .
    Imagine-se o sacrificio !
    Até que um belo dia conseguiu outro par ,desta vez um 39 .Foi uma melhoria ? Foi . Um ponto de viragem ?
    Bem depende ,porque se o coitado julgar que vai voltar a calçar o seu numero ,muito vai ter de penar .
    manuel.m
    PS :
    Desculpem mas hoje estou dado a metáforas .E já agora ,Portugal voltar ao Mercado em 2012 com estes juros ? Não será "wishful thinking" ?
    É verdade que o Autor no ponto 5 cai na realidade ,e ela é bem triste.

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  4. E a instabilidade social? Com cada vez mais desempregados em situação de anomia e sem qualquer subsídio (e há muito quem ponha a cabeça na areia sobre este problema fundamental da nossa sociedade! Já alguém pensou o que significa 1.000.000 de Portugueses sem dinheiro nem para comer? Qual será a sua reacção futura? Atirar-lhes com a polícia e forças armadas? Só para lhe dar uma nota da realidade, caro Tavares Moreira, ontem soube que com a genial introdução por parte do Mota Soares da exigência dos 5% de pagamento de comparticipação à segurança social por parte de empresários que detenham recibos verdes com uma ligação superior a 85% à sua entidade, muitas destas entidades (até por uma questão de sobrevivência) estão a exigir a estes funcionários que se "desvinculem" dos recibos verdes e passem a empresários em nome individual.

    Isto é o Portugal real que nós conhecemos e que quem está no comodismo dos gabinetes desconhece. É com estas medidas que Portugal vai singrar?

    Tendo experiência como economista mais de empresa do que como economista de macro agregados, custa-me perceber como se quer agiornar os Portugueses para a batalha da sobrevivência através da produtividade, com medidas contrárias a todos os catálogos de motivação e boas práticas empresariais. O problema de Portugal sempre me pareceu ser querer resolver o problema "(d)nas finanças" sem o resolver primeiro nas empresas. É que querer despedir por improdutividade sem estabelecer um modelo de flexigurança, fará com que o benchmark seja o país que a Margarida reproduz (é a culpa do estado do jardim botânico da crise?)... e isto já nem para falar do golpe fatal de cavaco Silva, cujas declarações sobre indigência própria são uma bomba na força anímica das pessoas (o que dirão, destas elites, pessoas que têm 200€ por mês face a 40 vezes mais o PR). São estas as elites "de estadistas e humanistas" que vão regenerar Portugal?

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  5. Conversa recente com um divorciado de uma médica.
    A médica trabalha num hospital.
    Não lhe é permitido trabalhar fora, não podendo recorrer a recibos verdes (que seriam taxados).
    Solução: dois part time sem qq registo e ou controlo.
    Deve faltar mais um diploma da AR.

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  6. ...o que significa que o mercado que está a comprar no primário não é mercado nenhum. O que não é necessariamente mau, pelo menos pode ser que as autoridades financeiras do euro (????) entendam que a ida do mercado à divida dos estados não vai acontecer nunca mais, pelo menos com as coisas como estão.

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  7. Caro Pinho Cardão,

    Pois é, convém nunca esquecer os caldos de galinha: esta gente da política está de tal modo pressionada que não tem tempo para essa indispensável e tradicional receita...

    caro Manuel,

    O autor deste Post não pode cair na real pela razão simples de que nunca dela saiu...podia mostrar-lhe, se tiver interesse nisso, dezenas de artigos publicados no D. Económico, entre 2000 e 2003, bem como em intervenções na A.R. entre 2002 e 2004, em que anunciava a inevitabilidade daquilo que, desgraçadamente, nos está agora a acontecer...
    Nessas diversas intervenções escritas e orais, pugnei, até ao limite, por uma mudança radical de política que,salvo no curto consulado de M.F.L., nunca chegou a verificar-se, com as dramáticas consequências a que agora assistimos...

    Caro Pedro de Almeida Sande,

    Poruqe será que os representantes do mundo empresarial nas reuniões da chamada "concertação social", supostamente conhecedores dos problemas que aqui suscita, parecem não se preocupar com esses mesmos problemas que nem tampouco os referem (pelo menos publicamente, claro, não sei se o fazem em surdina)?

    Caro Tonibler,

    Desta vez o meu amigo engana-se pois segundo estou informado (e sabe que nestas coisas não vou apenas em conversas de jornais) foi mesmo mercado, duro e puro, quem comprou dívida pública portuguesa neste último leilão...
    Mas é óbvio que tem todo o direito de se enganar, não fique nada preocupado...

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  8. Caro Tavares Moreira,

    eu não me importo nada de me ter enganado desde que perceba porquê e se perceber significa que aprendi mais uma coisa. Porque é que as pessoas vão ao primário comprar uma coisa que está muito mais barata no secundário? O BCE ou o fundo estão a garantir estes títulos e os outros não?

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  9. Caro Tonibler,

    No primário da última semana foi vendida dívida de curto prazo (até 1 ano), representada por Bilhetes do Tesouro (BT's), que não é transaccionada em bolsa.
    A dívida transaccionada em bolsa é representada por obrigações, de prazos (aquando da emissão) iguais ou superiores a 2 anos e essas oferecem efectivamente taxas de juro bastante mais elevadas!
    Existe ainda um mercado secundário ("over-the-counter") por grosso de BT's, em que as taxas de juro alinham pelas do primário.
    Espero ter sido claro, se não fui, diga sff.

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  10. Caro Tavares Moreira,

    Ah, o prazo e os juros antecipados... Assim já faz algum sentido, obrigado.

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