domingo, 29 de julho de 2012

Silêncios

A tarde de domingo já vai a meio. Chega o momento do ritual. Subo a encosta, palmilho velhas calçadas e não me cruzo com ninguém exceto com os meus pensamentos, cada vez mais silenciosos, cada vez mais tristes. Um silêncio debaixo do sol não é habitual, o silêncio só gosta de se manifestar sob o calor da lua, mas há momentos, a meio da tarde de domingo em que a lua e o sol se confundem. Momentos de silêncio. Sento-me a seu lado e só oiço o seu silêncio, um silêncio que perturba quem ouve e sente o estrebuchar de vidas. Hoje, naquele quarto mais pessoas foram visitar os seus, numa obrigação ou devoção, chamem-lhe o que quiserem, porque o rei e o senhor daqueles espaços é o silêncio, silêncio de almas que há muito abandonaram o corpo e o silêncio dos que sabem que ainda têm alma. Calados, todos. Um ou outro bocejo, como se o silêncio de corpos sem alma ainda fossem capazes de contagiar os sobreviventes. Olhar para um ponto distante e imaginário à espera de não sei o quê, algo que quebrasse o silêncio. Coçar a face como se os pelos crescessem mais depressa provocando prurido silencioso. Cabeças cabisbaixas, como se quisessem manifestar algum respeito pelo silêncio divino. Tanto silêncio. Não aguentei tanto silêncio e saí. Procurei um banco num espaço cheio de silêncios. Procurei sons. Ouvi o vento, um pardal e um cão a ladrar ao longe. O resto só o silêncio consegue ouvir. Eu não consigo, mas gostava de ouvir, talvez porque não tenha chegado a hora do meu silêncio.

2 comentários:

  1. Era nessa altura que eu procurava o silêncio no interior de um templo, fora do horário da liturgia, quando os santos, o Cristo crucificado... e Sua mãe, se encontram, como que a fazer um intervalo para descançar do turbilhão de vozes angustiadas que lhes pedem auxílio, de vozes iradas porque não receberam o auxílio pedido, por vozes felizes, agradecendo as graças pedidas.
    E sento-me perante eles, observo-lhes os rostos serenos, as imágens imóveis, testemunho de que foram quem foram.
    Fico assim por tempo indeterminado, não penso sequer no tempo, não noto, se entra ou sai alguém, simplesmente não oiço, vejo somente e espero sentir, para compreender.
    Nunca compreendo, confundo o que sinto, mas a serenidade do local e das figuras que o habitam, contagiam-me. E pergunto, pergunto sempre... porquê e para quê?
    Quando saio, por fim, trago atravessada na garganta a pergunta que nunca encontro coragem para fazer, talvez porque íntimamente perceba que não devo perguntar a reposta, mas sim, procura-la.
    Quem sou... quem somos?

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