A desvalorização da política tem que ter as suas consequências, é inevitável. Há muito tempo que muito boa gente por esse mundo fora, sobretudo desde que as dificuldades aumentam na Europa e no Mundo, vem alertando para que a política não pode ser empurrada pela porta fora, por muitos progressos técnicos que se tenham verificado em diferentes campos do saber chamados à governação. Dessa confusão nasce muitas vezes a desconsideração de uma e de outra, da ciência e da política. Tal como aconteceu na medicina,por exemplo, que teve, para progredir, mas sem a substituir, que se aliar a outras áreas do saber, deixando de haver “sábios” para haver equipas onde confluem conhecimentos de psicologia, de higiene, de sociologia, de informática, de estética, de família, de muitos outros, também a politica teria que deixar de estar sustentada em iluminados invocando o poder divino, a inspiração, ou a força, para conduzir os países e os povos nos seus destinos. O que aconteceu, porém, foi que o progresso técnico, talvez pelo estreitamento dos saberes a que a especialização e a complexidade de cada tema conduz, talvez pelo deslumbramento do conhecimento mensurável quase de imediato, foi empurrando a política para um cantinho obscuro, desprezada na formação, diminuída na sua importância, vilipendiada nos seus agentes, tantas vezes pelos seus próprios agentes, e gerou-se uma moda arrogante, sobretudo na Europa mas também nas eleições para organizações internacionais, que considerou que um bom, mesmo um excelente técnico, substitui com vantagem um “político”, para logo a seguir se clamar por um “bom político”. Ora, a ciência, o conhecimento técnico e a política não se excluem nem se anulam, e, tal como noutras áreas de actividade, completam-se, suportam-se mutuamente e daí deverá resultar um exercício de poder mais esclarecido, decisões mais fundamentadas e maior confiança das populações. Mas a política é uma arte muito difícil, tanto mais difícil quanto mais complexo o ambiente e a amplitude das decisões, como todos os profissionais que lidam com pessoas dentro de organizações, ou simplesmente no consultório ou no escritório, devem saber. Quantas vezes a mesma solução dá resultados completamente diferentes se for aplicada em diferentes empresas? Quantos debates nas administrações, depois de ouvidos os departamentos das áreas, para decidir se o que lhes apresentam é bom ou é mau para a empresa, mesmo que outras tenham decidido assim? Todas estas decisões, sobretudo se forem complexas, implicam opções “políticas” ou seja, a consideração de um conjunto de factores que um cálculo técnico, abstracto, inteiramente certo, não apreende. O marketing é fundamental na política, a geografia também, a História sem dúvida, a economia, o direito, as relações internacionais, quanto maior é o reflexo e o impacto da actividade, maior a dimensão da sua vertente política. Não há mal nenhum em constatar-se que uma solução técnica não responde às exigências da política, há antes todo o mérito em que a abordagem de uma seja testada pela abordagem da outra, isso não retira nem qualidade à análise técnica, nem fundamento à decisão política, o que acontece é que o contrário pode aniquiliar as duas. Não é a política que tem que ser afastada, ou invectivada, nem a teoria científica que tem que ser ignorada, do mesmo modo que não serve de nada olharmos para uma estatistica, para uma média ou para um progresso sem sabermos o contexto, as parcelas ou o ponto de onde se partiu. Tal como noutros campos de conhecimento, estuda-se, compara-se, analisa-se e procura-se, a cada momento, evitar o erro e que o resultado seja o melhor, aliando política, com toda a dificuldade que ela implica, e é mesmo muito grande essa complexidade, à ciência da matéria em causa. É assim que se progride na ciência e na técnica e em política também. Pode haver muita gente que não acredite nisto, ou que queira ignorá-lo mas, como dizia Galileu, “no entanto, ela move-se”.
Tal como a ciência, seja de que ramo for, não pode ser feita por ignorantes, muito menos a nobre política que preconiza pode ser feita por aprendizes ignorantes.
ResponderEliminarTanto mais que a prova da «exactidão» em política é muito mais difícil de obter e de medir do que em ciência.
E desde há demasiados anos temos estado entregues a principiantes ignorantes (ou lunáticos, veja-se o filósofo parisiense, mas o mal é bem anterior), e pior, não se vislumbra nada de tranquilizador que nos dê esperança.
BE e PCP (esqueçam), PS (anedotas), CDS (o tacticismo pode matar), PSD (tomado por gente menor, os que se aproveitam têm sido, continuam a ser, postergados).
Quem nos acode?
«Foge cão que te fazem barão, mas para onde se me fazem conde»?
Era uma frase muito popularizada na monarquia liberal.
«Mutatis mutandis», a sua essência aplica-se hoje à nossa situação.
E tão necessitados que estamos de muito melhor do que temos.
Que se Lixe a Troika! Queremos a Nossa Vida de Volta
ResponderEliminar.
Pois queremos. Ou melhor, queríamos ...
Mas, tal não é possível.
Pois já não nos emprestam dinheiro para isso.
1.Indignação, sim. Ninguém tem que gostar daquilo que nos impõem. Quando isso é duro e difícil. Mesmo quando não há alternativa melhor. Mas gostar? Apanhar e calar? Não. Gaspar foi longe de mais. No que anunciou insensivelmente. Mas muito mais, naquilo que disse sobre a submissão e aceitação dos portugueses.
Não. Até poderemos aceitar. E poderemos até entender - se for melhor explicado. Mas, decididamente, não gostamos.
2.Mas, voltemos à realidade.
Se há toda a legitimidade para manifestar a incomodidade, não há nenhuma legitimidade para dizer que não queremos, sem apontarmos uma qualquer alternativa válida.
Pior ainda, quando alguns dos que se colam à dinâmica destas manifestações são os mesmos que nos conduziram a isto.
Pelo que eu aproveito e também mosto a minha indignação às "cigarras" que nos dirigiram nos últimos anos e que, irresponsavelmente, viveram e nos fizeram viver na ilusão de que éramos ricos. E que fizeram isso, pedindo emprestado. Aquilo que agora teremos que pagar, em sofrimento. Afinal não somos ricos. Somos... assim assim (pois há muito pior, nesse Mundo).
De acordo, em termos gerais, com o post da Dr.ª Susana. Mas, analisando a situação, as recomendações do PR e as reacções desencadeadas e visíveis na unanimidade de comentários e nas manifestações pelo país, sinto-me a reviver um episódio de pura teimosia, ocorrido na AR, na votação de lei importante(creio que Prof Massano e Dr Pinho Cardão eram deputados, então). E receio bem que o que se passou com a comunicação de Passos Coelho seja uma repetição, quiçá, mesmo, um ajuste de contas tardio, do então lider da JSD, com o então PM, hoje PR. O que me deixa uma terrível sensação de mal estar sobre o "político" e a sua capacidade de levar a bom porto a missão para que os portugueses o mandataram...
ResponderEliminarCara Suzana,
ResponderEliminarGalileu é um excelente final. É curioso ter acabado com aquele que foi limitado pelos parasitas que aproveitavam a ignorância do povo. Tal como os "rendistas" que hoje esperneiam com a solução técnica, os "doutores das duas leis" que condenaram Galileu sabiam que ele tinha razão, mas também sabiam que seria mais proveitoso para eles que o condenassem.
O seu texto, que em termos factuais, está perfeito, omite o custo dessa submissão. Ainda hoje os povos de maioria católica são mais pobres a atrasados que os outros. Com a movimentação dos "doutores das duas leis" na defesa das sua rendas como se viu na sexta-feira, o caminho será o da fragmentação.
Como comentava num post do Prof. M. Cardoso, o fim do estado português que agora se afigura como inevitável será um marco na história de toda a humanidade. Tal como na selecção natural, os menos dotados são eliminados e, como se viu ontem, esse papel cabe-nos a nós.
Sim, nós precisamos de ser enganados para adoptarmos a solução correcta. Merecemos desaparecer na evolução do mundo.
No texto só faltou referir que um bom político por si só não faz boa política. A boa política está umbilicalmente ligada à cidadania.
ResponderEliminarA Srª Drª Suzana Toscano não é de opinião que a degradação da política é uma consequência directa da degradação do carácter de quem a exerce?
ResponderEliminarExemplo: quando assistimos a sessões de esclarecimento e a comícios de Pedro Passos Coelho antes de ser eleito PM, criticando e insurgindo-se contra as decisões do anterior governo, classificando-as de desastrosas, de inadequadas, jurando que nunca teriam sido aquelas as suas opções se fosse governo, jurando que nunca agravaria impostos, taxas moderadoras na saúde e que nunca reduziria o valor das reformas, tão pouco retiraria o subsídio de férias e o 13º mês aos funcionários, nemm agravaria os impostos... muitos de nós pensámos que aquele político possuia uma personalidade íntegra e, depois de tantos troca-tintas que passaram pelo poder executivo do nosso país, não seria possível que outro cara-de-pau, viessae a suceder-lhes.
Como afinal viemos a confirmar; tudo é possível em política, tudo é mutável e tudo é escamoteável, desde que se possua a arte e o engenho para levar a cabo, acções de pura arte representativa e prestidigitadora.
Sem querer retirar à política e a quem a exerce - ainda - com sentido de responsabilidade e alicerçada num carácter de elevado espírito de enobrecimento e de reabilitação daquilo que outros por inércia, por inépcia, ou por pura e simples incompetência deixaram ruir, tenho-a na conta de um circo, mas, de um circo barato, de um circo onde os números de trapésio são falíveis, as graças dos palhaços, de tão batidas e repetidas, provocam-nos sono, dormêncoia, as feras amestrada, estão todas a cair da tripeça, o leão já só quer que não chateiem, o elefante abana a tromba para quebrar o tédio e os ursos amestrados, a única coisa que faz com que movam os gordos cús, é o doce oferecido pelo tratador.
Uma tristeza franciscana, cara Drª...
Suzana
ResponderEliminarA política, como diz, é uma arte difícil, requer múltiplas competências, diferentes olhares, muita articulação e coordenação. Mas requer também uma permanente actualização e conhecimento da realidade. E não menos importantes são o bom senso, a prudência e a habilidade. E o que verificamos é que estas características estão a tornar-se uma raridade. Ignorá-lo é um erro. Mas já estamos tão habituados que achamos normal. Outro erro.
Caro UmZeroàEsquerda essa degradação vem de uma sistemática desvalorização da função e das pessoas que a exercem, alimentaram-se durante muitos anos populismos baratos, não só cá, também noutros países, ao mesmo tempo que a exposição pública dos cargos e a devassa a que estão sujeitos faz com que a maioria das pessoas com carácter e brio não quieram sujeitar-se a isso, sobra o patriotismo ou o espírito de dedicação a causas, mas, lamentavelmente, mesmo essas não têm qualquer reconhecimento. Os custos de uma vida política honesta e plena são elevadissimos, por muito politicamente incorrecto que seja hoje afirmá-lo. Mas o facto é que não há quem queira e possa, tendo os requisitos para isso.
ResponderEliminarCaro Gonçalo, esse slogan "que se lixe a troika" não é, manifestamente, o melhor para a causa. Mas a gravidade da situação não impede, antes impõe, que se escolham criteriosamente as medidas quenos hão-de conduzir à libertação, nem tudo o que é austeridade serve, nem rejeitar os sacrifícios hoje nos poupará a mais sacrifícios amanhã.
Caro Tonibler, a frase vem a propósito da negação do que é evidente e do atraso que pode causar essa negação para o progresso que se pretende. O que é evidente, neste caso, é aimpossibilidade de levar à prática uma proposta, o que conduz a que se possa levar muito tempo até que haja receptividade a outras propostas talvez menos cientifiamente aconselhadas mas provavelmente exequíveis. Não partilho da sua ideia de que somos atrasados, acho que até somos muito civilizados, como povo, em ralação a muitas coisas, depende de nos quererem fazer um dia suecos, outro holandeses, nos intervalos americanos e finalmente burundis.Assim não há povo que resista, de facto, nem Estado.
Caro Ilustre mandatário, sem dúvida, mas a cidadania não se decreta, estimula-se e dá-se espaço para que se exerça, pelos vistos vamos sabendo exercê-la, assim a boa política acompanhe.
Não sei se é um problema de carácter, caro bartolomeu, o facto é que quando uma candidata disse a verdade do que iria acontecver perdeu as eleições para quem propôs ilusões. As pessoas não gostam que lhes tirem as esperanças e os portugueses, em particular, gostam de ter quem tome conta deles e lhes poupe preocupações, mesmo quando, na sua sabedoria, reconhecem no íntimo que estão a pedir o impossível.Mas leva muito tempo a acomodar passar-se de ilusões totais à austeridade pura e dura, leva vários governos até as pessoas deixarem de acreditar em ilusões.
Sem dúvida margarida, dois erros bem graves e não serve de nada depois apontar o dedo.
Cara Suzana,
ResponderEliminarGalileu Galilei usou de uma vantagem tecnológica para descobrir algo que estava escondido à vista desarmada, as fases de Vénus. Quando um povo segue um empirismo básico, merece ser miserável. E ser dirigido por miseráveis.
Caro Tonibler, Galileu tinha a certeza científica do que dizia, não se baseava em estudos que variavam de 0 a 100 de um ano para o outro, conforme as variáveis a considerar... e, mesmo assim, as pessoas tiveram medo da revolução que tal descoberta iria provocar. Não fui ocnfirmar, mas tenho a ideia de que passaram décadas até a demonstração dele colher o apluso da comunidade científica e não apenas dos miseráveis, mas corrija-me se estiver errada (está à vontade :))
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