1. Entre a panóplia de instrumentos que a comunicação social tem vindo a agitar como solução para a eventual derrapagem no cumprimento do défice orçamental de 2012 (e em 2013 como forma de compensar a jurisprudência do T. Constitucional), aparece sempre o cenário do agravamento de impostos – se é sobre o consumo, sobre os rendimentos, sobre o capital e seus rendimentos, nem se percebe bem...
2. Deixo desde já expressa a minha firme opinião de que quaisquer medidas que nesta altura se traduzam numa ainda maior transferência de recursos de agentes económicos privados para o Estado serão irracionais, significando um retrocesso no almejado objectivo de reequilibrar a economia portuguesa - objectivo primacial do PAEF – pois tenho a noção de que o Estado tenderá necessariamente a redistribuir esses recursos duma forma que se traduzirá em mais consumo, mais importações.
3. Noutra perspectiva, confesso grande dificuldade em entender como é que um agravamento de impostos, nesta “altura do campeonato”, quase a terminar o 3º trim/2012, poderia colmatar uma derrapagem do défice este ano.
4. Com efeito, os IR (S e C) estão liquidados e pagos, com base nas taxas estipuladas no OE, o mesmo acontecendo com o IMI bem com impostos extraordinários como aquele a que os bancos estão sujeitos (extraordinário em 2011, novamente em 2012, se continuar em 2013 deixará de ser extraordinário).
5. Quanto ao IVA (que representa 70% da receita dos indirectos), mesmo que fosse decidido um agravamento este já não teria qq efeito em 2012, a respectiva arrecadação iria cair em 2013...
6. Assim, das poucas soluções que restarão, uma seria ressuscitar um imposto extraordinário e retroactivo (inconstitucional) sobre os Rendimentos do Trabalho, do tipo do que foi aplicado no final de 1983 por um governo chefiado por um conhecido arqui-inimigo das políticas neoliberais...
7. ..ou então, num plano de maior sofisticação, poder-se-ia conceber a criação da figura da “ameaça de tributação” que consistiria em anunciar, tão cedo quanto possível, um agravamento do IVA para Janeiro de 2013, tendo como resultado uma antecipação de despesas de consumo nos últimos meses de 2012, sobretudo de bens duradouros, ajudando à recuperação da receita do IVA no corrente ano...se depois o IVA seria ou não agravado, ver-se-ia.
8. Em suma, esta coisa do aumento de impostos revela-se mesmo meio obscena...
Se calhar também poderiam antecipar os proveitos do encerramento do estado, descontados à taxa das obrigações alemãs, multiplicados pela probabilidade de ocorrência no horizonte temporal relativo. Assim seria possível mandar todo o governo para casa, porque o orçamento estaria equilibrado com a probabilidade sempre a subir.
ResponderEliminarPelo menos assim ninguém teria a coragem de perguntar ao ministro das finanças o que é que afinal ele ainda não percebeu?
Não o fazia tão optimista, caro Tonibler: admitir que o encerramento do Estado, numa óptica de liquidação, iria gerar algum excedente...
ResponderEliminarSabemos que estar aberto gera défice. Isso temos a certeza.
ResponderEliminarCaro Tavares Moreira,
ResponderEliminarVejo-o a subscrever, implicitamente, a tese de que existe uma derrapagem orçamental. Nas receitas, sem dúvida (embora com a hipótese de alguma recuperação no segundo semestre?), mas muito compensada na despesa e, eventualmente, na reprogramação do QREN.
Assim sendo a derrapagem parecer-me-ia menor que 0,5%.
É de uma derrapagem deste nível que fala ou de mais que isto?
henrique pereira dos santos
Caro Henrique Pereira dos Santos,
ResponderEliminarEu não subscrevo nada, por enquanto, no que concerne à dita derrapagem: tive o cuidado, como terá reparado, de me referir apenas ao que tem sido a agitação na comunicação social.
Estive a analisar as contas orçamentais até Julho, pela leitura do boletim da DGO e confesso-lhe que o panorama me pareceu não direi confortável mas bem menos dramático do que por aí consta.
Não estarei assim muito longe da sua avaliação, embora a execução do último trimestre do ano nos possa reservar algumas surpresas (positivas ou negativas).
Em todo o caso, estou nesta altura mais focado na evolução das contas externas pois é aí que, em minha opinião, se vai jogar, mais do que em qq outro tabuleiro, o sucesso ou insucesso do PAEF.
E nesse domínio, devo admitir que em Agosto próximo possamos pela primeira vez, depois de mais de 15 anos,testemunhar um equilíbrio da soma das balanças de bens e serviços com o exterior.
Se assim for, uma "derrapagem" do saldo orçamental de 0,5 , de 0,8 ou mesmo de 1%, será pouco ou nada significativa em minha opinião.
Estou mais descansado.
ResponderEliminarÉ que eu não sou economista, não percebo grande coisa de finanças públicas, mas não gosto que me ponham a pensar o que os outros pensam.
E por isso fiz aqui uma folha excel, com uns números dos boletins de execução mensal tratado de forma primária e manhosa, e por mais voltas que dê não consigo ver os números que por aí andam.
Também me pareceu que a situação era confortável, mas passo o tempo todo a ouvir respostas que me dizem que nenhum economista diz o que eu digo e eu tenho de me reduzir à minha insignificância.
Agora fico um bocado mais confortável.
E no resto também estamos de acordo.
henrique pereira dos santos
Caro Henrique Pereira dos Santos:
ResponderEliminarTambém penso que o meu amigo está a pensar bem. O que não é novidade, embora por vezes possamos discordar.
Acontece que 99% das opiniões emitidas pelos sábios pensadores mediáticos ou são pura propaganda, ou são eivadas de pressupostos ideológicos, ou não têm sustentação técnica, ou são um puro meio de exibição balofa.
Por isso, o melhor é pensar pela própria cabeça, como o meu amigo faz. E eu também.
Caro Tavares Moreira:
Excelente post e excelente análise. E excelente comentário de resposta ao Henrique Pereira dos Santos,quando o meu amigo diz que "... estou nesta altura mais focado na evolução das contas externas pois é aí que, em minha opinião, se vai jogar, mais do que em qq outro tabuleiro, o sucesso ou insucesso do PAEF.E nesse domínio, devo admitir que em Agosto próximo possamos pela primeira vez, depois de mais de 15 anos,testemunhar um equilíbrio da soma das balanças de bens e serviços com o exterior.
Se assim for, uma "derrapagem" do saldo orçamental de 0,5 , de 0,8 ou mesmo de 1%, será pouco ou nada significativa em minha opinião".
É isso mesmo.
Eu percebo o que o caro Tavares Moreira quer dizer com as contas externas. Mas essas não vão determinar nada do sucesso do programa porque o programa não se destina a sanear o país. O único problema que o país tem chama-se estado e lá porque o país se vai safando apesar do estado não quer dizer que não se resolva o problema porque esse vai continuar lá como se fosse um furúnculo. Nós temos que ter superavit comercial e impor ao estado um volume de despesa baixo.
ResponderEliminarCaro Henrique Pereira dos Santos,
ResponderEliminarVeremos como se comporta a receita fiscal nos próximos meses, uma vez que se vem assistindo a uma recuperação, nomeadamente no caso do IVA, que representa mais de 40% da receita fiscal total (e que em Julho, como terá reparado, estava ainda a cair, em termos acumulados, mas a um ritmo cada vez menor, de -1,1%).
Quanto à despesa, em especial a despesa primária, é mais do que desejável que continue bastante contida, assegurando a realização do objectivo de redução.
Caro Pinho Cardão,
Tal como o meu amigo, pelos vistos, também dou muito poco credito a esta imensa fauna de borboletas opinantes sobre economia e assuntos diversos, que pululam nas comunicações sociais e raramente acertam uma previsão, incluindo sobre factos passados!
Caro Tonibler,
Pode mesmo crer que o grande objectivo do PAEF é o reequilíbrio da economia - o saneamento do País, como lhe chama - e, nessa perspectiva, a redução dos défices públicos, sendo muito importante certamente, não deixa de ser instrumental.
Por isso é que digo se o défice for de 5 ou 5,5% do PIB (este ano) mas a economia for capaz de se reequilibrar, o essencial será atingido.
É claro que não podemos, de todo, retirar o pé do travão da despesa pública, nos anos mais próximos, como pretendem os anti-liberais, pois isso seria a "morte do artista".
Quanto à conclusão final do seu comentário, até estamos de acordo.
Caros Tavares Moreira e Pinho Cardão,
ResponderEliminarMuito obrigado pelas explicações.
O comportamento do IVA, previsível (embora com o risco de todas as previsões) desde o primeiro trimestre é exactamente uma das razões que me levam a dizer que a situação é relativamente confortável: não só o primeiro trimestre da execução tem o efeito de base do desfasamento entre entrada em vigor das taxas e cobrança (o que só por si indicia um segundo semestre bastante mais folgado, mesmo que continue longe do previsto), como o que me diz quem tem uma porta aberta é que janeira e fevereiro foram meses terríveis, mas daí para a frente a coisa tem-se vindo a compor na facturação (o INE confirma uma queda no consumo cada vez menos acentuada).
E tudo isto me parece bastante lógico: as pessoas assustaram-se, puseram travão a fundo no consumo para diminuir dívida e constituir poupanças (a taxa de poupança aumentou de forma rapidíssima) mas à medida que se sentem mais confortáveis voltam paulatinamente a níveis de consumo mais próximos dos que tinham antes de se assustarem a sério.
Veremos e muito obrigado
henrique pereira dos santos
Completamente de acordo; a economia ressuscitaria (e com ela as receitas fiscais) com simples expectativas positivas do lado da diminuição dos impostos e uma verdadeira lei de compromissos do estado com os cidadãos de que o estado não gastará mais que aquilo que os agentes económicos lhe poderão em cada momento dar. De outro modo todo este esforço de ajustamento servirá zero para o futuro (a memória curta dos portugueses encarregar-se-à do resto!)
ResponderEliminarCaro Henrique Pereira dos Santos,
ResponderEliminarDe uma forma geral, a análise que nos apresenta neste seu comentário afigura-se correcta.
Caro Pedro Almeida Sande,
Ora exactamente, é esse o papel da chamada Lei dos Compromisso, a Lei nº8/2012, de 21 de Fevereiro, a qual determina que as entidades sujeitas a disciplina orçamental não possam assumir compromissos de despesa que ultrapassem os fundos disponíveis.
Mas, como terá reparado, há para aí uma ruidosa vaga de protestos contra esta Lei, que o team Rosa veio hoje mesmo qualificar como um GARROTE!
Não vamos a lado nenhum com estas mentalidades obssessivamente agarradas à despesa pública! Comportam-se como toxicodependentes!
Existem casos que mostram que a lei dos compromissos está claramente mal feita e, até, revela algum amadorismo infantil do lado do governo. Refiro-me, por exemplo, a coisas cujos compromissos são positivos em termos net (há compromisso de despesa porque há compromisso de receita) como projectos europeus de investigação em que a participação de Portugal tem um cash flow bastante positivo. Agora para um funcionário público é mais "fácil" assumir o prejuízo dos outros que o seu erro....
ResponderEliminarClaro que percentualmente, estes casos são pouco significativos, mas são aqueles que fazem a diferença entre fazer um trabalho de qualidade e não.
Caro Tonibler,
ResponderEliminarConfesso alguma dificuldade em entender a questão que coloca, quando atento na redacção das sub-alíneas (i) a (vii) da alínea f) do artigo 3º da Lei dos Compromissos, que explicitam o conteudo de "fundos disponíveis".
Em especial, a sub-alínea (vi) diz o seguinte: "As transferências ainda não efectuadas decorrentes de progrmas e projectos do QREN cujas facturas se encontrem liquidadas, e devidamente certificadas ou validadas".
Posso, em acréscimo, mencionar o artigo 4º da mesma Lei, o qual admite adicionar aos "fundos disponíveis", a título excepcional, outros montantes desde que autorizados por membros dos governos central, regional ou autarquico.
Não examinei nenhum caso em concreto, por isso tenho de admitir que subsistam algumas dificuldades, mas com esta redacção...
O QREN não se aplica às universidades e institutos de investigação que trabalham para projectos europeus, por exemplo. Mas mostra aí um bom exemplo de qualidade. Qual a diferença entre compromissos com net positivo fora do QREN ou dentro do QREN? Porque é que o legislador foi falar em QREN? Imagine-se que um laboratório do estado tem um compromisso de uma universidade americana de pagar uma análise de isótopos e para isso precisa de comprar um reagente qualquer periodicamente durante 3 anos.
ResponderEliminarEu não digo que essa lei não deva existir. Aliás, não deveria existir outra coisa. Mas são estes 'gliches' que depois servem de arma de arremesso. Qual foi a necessidade de falar em QREN? Depois, o título excepcional toda a gente sabe para que serve... digamos que para quem não faz outra coisa na vida senão leis destas, apresentar uma coisa com esta qualidade é sempre de criticar. Sei, por exemplo, que andam não sei quantos reitores atrás do ministro das finanças para resolver esta porcaria há semanas e os contratos a irem...
Caro Tonibler,
ResponderEliminarSe não me engano muito, os casos que refere têm cabimento nas demais sub-alíneas da alínea f) do artigo 3º...numa leitura/interpretação minimamente inteligente.
Todavia, quando intervêm burocratas no exercício de tais interpretações, aí o caldo entorna-se por completo e talvez esteja aí a origem dos problemas que menciona.
Em meu entender, para a aplicação duma lei com estas características, que me parece imprescindível dado o caos que vai na gestão financeira de milhares de serviços públicos, deveria existir um conselho (com duas ou três pessoas, não mais, com experiência de gestão, não mangas de alpaca) com poderes para derimir as dúvidas de aplicação ou, em casos limite, proporem ao Ministro as soluções para os casos de dúvida.
Essa dos reitores andarem atrás do Ministro para resolver casos de dúvida, não lembra ao diabo!