Realizaram-se ontem as eleições presidenciais norte-americanas, que
terminaram com a recondução de Barack Obama. Devido ao facto de ser Membro do
Parlamento Português, e por uma questão de respeito institucional, não me quis
pronunciar sobre as minhas preferências neste acto eleitoral antes de ele se
realizar num país de que muito gosto e que muito admiro – os EUA.
Nada me move contra Mitt Romney – aliás, na minha área de formação, a
economia, tradicionalmente, sempre me senti muito mais próximo do pensamento
republicano do que democrata… Mas nestas eleições a minha preferência ia para Obama – pelo que me
congratulo com a sua vitória.
Eis, resumidamente, porquê:
- A escolha não era entre um “socialista” (Obama) e um “democrata-cristão” (Romney) como muitas vezes nos querem fazer crer. Não. Nos EUA não compreendem – nem sonham sequer!... – o que na Europa consideramos ser “social-democracia”, quanto mais “socialista". Apesar de não gostar da dicotomia “esquerda-direita” e de raramente a utilizar, para facilidade de exposição, creio não andar longe da verdade se disser que a visão de economia e sociedade de Obama (e do Partido Democrata dos EUA) se situa, digamos, à direita do CDS…
- Mas então e o Obamacare, a reforma da saúde que Obama levou a cabo – não foi introduzir um “Serviço Nacional de Saúde” nos EUA? Não: ter uma cobertura universal de saúde não significa necessariamente a existência de uma rede pública de hospitais com todos os encargos que lhes estão associados. O que Obama introduziu nos EUA, e que existe em diversos países europeus (como Alemanha, Áustria, Bélgica, França, Holanda, ou Suíça), é a obrigatoriedade de um seguro de saúde individual, privado e obrigatório, ficando o Estado com o cargo de financiar o seguro dos contribuintes que, comprovadamente, não podem suportar essa despesa. Para além de dar uma maior liberdade de escolha às famílias no acesso aos cuidados de saúde, esta opção é também menos onerosa para os cofres públicos – porque não implica a existência de hospitais públicos. Note-se que, quando Romney foi governador em Massachusetts criou, nesse Estado, um sistema semelhante. Portanto, por aqui, não são de esperar grandes diferenças entre os dois.
- Na política externa, as diferenças entre os dois candidatos parecem não ser grandes; no entanto, Obama parece ser mais equilibrado em temas sensíveis como a procura da paz no Médio Oriente (Irão, Israel, Palestina…) ou as relações comerciais com a China (que Romney considerou ser um “país manipulador de moeda”, uma dispensável provocação que poderia desencadear uma guerra com a qual todos perdem). E desenganem-se os europeus: o nosso Continente continuará, com Obama (como aconteceria se o eleito tivesse sido Romney), a não merecer a atenção prioritária de outros tempos por parte dos EUA, que se manterão muito virados para o Pacífico, por força da importância crescente da Ásia no mundo. Se o consulado económico de Obama não foi famoso, a forma como lidou com a crise foi, apesar de tudo, e em minha opinião, muito diferente – para melhor – do que a estratégia europeia (que bem conhecemos…).
- Obama ajudou a evitar uma depressão nos EUA (veja-se os resgates à General Motors ou à Chrysler, a que se juntou a política expansionista do Fed) – mas vai agora ter que lidar, juntamente com o Senado e a Câmara dos Representantes, com o problema do endividamento público (o “abismo orçamental”, fiscal cliff), que atinge níveis incomportavelmente crescentes – já acima de 100% do PIB, com défices anuais próximos de 10% – e que precisa de ser travado… Contudo, era difícil de perceber como o conseguiria, uma vez que pretendia baixar muito os impostos (favorecendo de forma desproporcionada os mais ricos) e aumentar, ao mesmo tempo, a despesa com a defesa – o que, de acordo com a revista The Economist, acrescentaria cerca de USD 7 biliões ao défice nos próximos 3 anos…
- A verdade é que, em termos de política orçamental, os EUA não podem continuar a gastar cerca de 40% do PIB e a arrecadar, em impostos e contribuições sociais, cerca de 26%... Logo, cortes de impostos, com o nível de carga fiscal e esforço fiscal actuais, precisam de ser seleccionados e direccionados, ao mesmo tempo que a despesa precisará de ser reduzida. E também aqui alinho mais com Obama: na despesa, cortes nos enormes gastos com a defesa estarão na primeira das prioridades; nos impostos, foi o actual Presidente que se comprometeu a reduzir a taxa máxima de IRC nos EUA de 35% para 28%, propondo, ao mesmo tempo, para compensar, a eliminação de várias excepções, deduções e isenções para as empresas. Um movimento na linha do que desde há (tantos…) anos venho defendendo: baixar taxas de imposto e reduzir, ao mesmo tempo, deduções, excepções e isenções. Numa palavra: simplificar o sistema fiscal e torná-lo mais competitivo e atractivo – também para aumentar a (fraca) competitividade e atractividade fiscal (dos EUA) face a outros países do G7 (eis um “choque fiscal” que muito gostaria de ver aplicado em Portugal…). E sim, no que toca ao IRS, o sistema americano precisa mesmo de se tornar mais progressivo – leia-se, os “ricos” têm mesmo que pagar mais impostos nos EUA (como, entre outros, defende, por exemplo, o conhecido multimilionário Warren Buffet.
- Obama tem a grande vantagem de já sabermos com o que contamos. Quanto a Romney, apesar das conhecidas gaffes cometidas durante a campanha, era um candidato muito estimável... mas com um “pequeno-grande” problema: uma parte muito considerável do actual Partido Republicano que o rodeia é, para mim, assustadoramente (ultra)conservadora em múltiplas áreas (incluindo sociais, económicas, ambientais, religiosas e em temas de consciência e liberdade de cada um). Falo de quem?... Por exemplo, do cada vez mais influente Tea Party.
Talvez por estas razões; talvez só por algumas delas; talvez por outras que aqui não
apontei, não deixa de ser igualmente revelador que figuras próximas dos republicanos, moderadas e que muito aprecio, como o ex-Secretário de Estado (de George W. Bush) Colin Powell, ou o actual Mayor de New York, Michael Bloomberg, apoiaram
Obama…
Moral da história: acompanho os americanos na escolha que fizeram. O Mundo
em que vivemos não está para aventuras e, entre escolher o que já se conhece (e
que, em minha opinião, não foi negativo), e o desconhecido (e que, confesso, em
parte me assusta), tudo ponderado, penso que foi importante a vitória de Obama.
E não, definitivamente, não é da continuidade de um “socialista” na Casa Branca
que estamos a falar...
...e desses números nunca consigo perceber o que é do orçamento federal, o que é consolidado. Mas independentemente disso, estamos a falar desses números de contas públicas num conjunto de estados onde as garantias sociais são, para ser meiguinho, diversificadas. Ou seja, para cada americano as garantias, como a educação e a saúde, que existem mudam demasiado. O que não deixa de ser curioso num país que publicita que não deixa ninguém para trás nas ruas de Mogadiscio e larga-os aos magotes nas ruas de Atlanta ou Nova Orleães, tal como anda a desarmar as pessoas nas mesquitas de Bagdad e armá-las nas Igrejas de Memphis.
ResponderEliminarMesmo assim, se falarmos de esquerda e direita até diria que o Romney é mais esquerda que o Obama.
Caro Tonibler,
ResponderEliminarOs números que apresentei são consolidados (vieram da base de dados da Comissão Europeia e são comparáveis com a realidade da Europa).
Já agora, explique-me lá porque razão acha que o Romney é mais à esquerda que o Obama (e eu não gosto da dicotomia esquerda-direita)?...
Não concordo nada com a sua análise!Como estou em desacordo com muitas das suas teorias,expendidas na AR por vezes mais perto das que nos brindam os "queridos"bloquistas/socialistas!E até lhe digo mais:pelo que tenho ouvido da sua parte,em que parece estar tão perto das críticas absurdas da sua mentora, a tal "velha" e "bruxa" até há dias para o PS, pois dizia eu,até fico surpreendido que.face às suas tomadas de posição,ainda o vou ver a substituir "a pitonisa" pacheco pereira, esse crápula e réptil invertebrado,cujo escopo não é mais do que minar o partido que deveria pura e simplesmente expulsá-lo!
ResponderEliminarMeu caro Albérico, não acha que o insulto nada acrescenta às ideias que quis partilhar connosco, só as desvaloriza?
ResponderEliminarQuase 300 anos de Inquisição (1533-1821) e mais 48 de Censura salazarenta deixam marcas.
ResponderEliminarA cada pontapé numa pedra arriscamo-nos a ver saltar um alberico.
We, all have dreams!!!
ResponderEliminar«Fly with me to a land of dreams- ... there, on a distant shore by the winds of dreams, thrue a'n open door. You may Know him... if... you may dream.»
But... are you sure you know his policy?
http://www.youtube.com/watch?v=QAMYOLiFXPQ
;)
O problema do GOP é pegar num eventual moderado de MA e transformá-lo aos olhos de todos, e ao longo de 27 debates nas primárias, num radical.
ResponderEliminarO candidato necessário para ganhar o GOP, as posições necessarias para ganhar o GOP, não ganham os USA em 2012, e naturalmente não colhem na UE.
Mitt mostra não ter espinha dorsal ao reverter posições, mas o GOP mostra pouca inteligência num sistema em que basta ganhar por pouco em casa, se com isso forem obtidas vitórias tangenciais fora.
Mesmo neste contexto, o GOP não permite que moderados chegem moderados ao boletim de voto.
Caro Miguel,
ResponderEliminartambém não gosto, queria dizer "no sentido dos gastos do estado" e não no geral onde, obviamente, o Romney representa a maior colecção de bárbaros e desvairados que este mundo já conheceu que desde o criacionismo, à "vagina inteligente que conhece o violador" para proibir o aborto, passando pela proibição da masturbação, defendem de tudo.
Agora, sendo números consolidados, são gastos que os europeus são incapazes de entender sabendo que não existe a garantia de saúde para todos nos estados todos, nem educação para todos. Os gastos são todos para os milhões de membros das forças armadas cujo valor económico está por provar e no qual o Romney se propunha a investir mais 8 submarinos (se bem me lembro, o que é uma fórmula nossa conhecida para a desgraça, não sei se foi por isso que meteu o CDS ao barulho :)))... ).
Por isso, via muito mais um Seguro(p.ex.) a apoiar alguém que gosta de estoi..., perdão, investir dinheiro no estado como o Romney que um Obama que pretende passar um serviço que se quer público para o sector privado.
Caro Nuno Cruces, obrigado pelos seus comentários, com os quais concordo. É uma pena que o GOP esteja assim...
ResponderEliminarJosé Mário, obrigado pelo apoio face ao comentário recebido: penso que não era preciso chegar àquele ponto. E não vale a pena dizer mais nada...
Caro Tonibler, ok, percebi o seu ponto e não deixa de ter uma certa razão... Um abraço.
ResponderEliminarGostei muito do teu post, Miguel e da explicação que deste para nos sentirmos satisfeitos com a vitória de Obama, concordo contigo. E é difícil de perceber por cá que essa tal distinção esquerda/direita lá não faz sentido, aliás a palavra "socialismo" é tão detestável que o próprio Obama, na 1ª eleição, teve que esclarecer que não era socialista e que quem andava a dizer isso queria lançar a confusão. Mas não é só essa a diferença, basta ver como decorreu a campanha, como fazem campanha, como é um dever cívico escolher, como os americanos olham o seu país e as suas responsabilidades. Ao pé da deles, as democracias europeias são umas molengonas desdenhosas.
ResponderEliminarCara Suzana, olhe que não... Outro dia ouvia um sujeito que concorria ao congresso estatal sozinho(!!) que defendia a proibição do aborto porque "o corpo das mulheres violadas rejeita os espermatozoides do violador, as que dizem que foram violadas não foram, estão a mentir" E, como concorria sozinho, o animal ganhou ontem. Aquilo é uma realidade gigantesca para a nossa escala, deve ter de tudo.
ResponderEliminar14 triliões de dívida publica e ainda há economistas a defender o Obama! Galamba afinal não está sozinho!
ResponderEliminarSenhor JPRibeiro:
ResponderEliminarE pior, desses 14 triliões 20 foram criados pelo Obama, não foi?
É que o bicho recebeu um superavit de 6 trilões, do G. W. Bush, e, se isso não bastasse, e numa época de florescimento da economia mundial (e da Ocidental em particular, por exemplo, a GM não conseguia produção para satisfazer tanta procura), de paz o Iraque, no Afeganistão, etc., aquele macaco conseguiu esta proeza digna de um qualquer Galamba.