sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Mercados estão, finalmente, connosco? Esperemos que sim, mas a ver vamos...

1. Tenho a percepção de que se começa a escrever um novo capítulo na história trágico-financeira da relação entre os Países Periféricos do Euro (PPE) e os abomináveis mercados cuja insaciabilidade e perversidade tanta indignação têm suscitado, nos últimos anos, na generalidade dos “media” lusos e num luzido escol de comentadores político-económicos nacionais que ocupam uma boa parcela dos tempos de emissão dos canais de TV e de rádio...
2. Com efeito, as notícias dos últimos dias dão-nos conta de uma considerável distensão nas relações entre os mercados e os PPE, a começar pelo sucesso da recentíssima operação de recompra de dívida lançada pela Grécia, que como já aqui explicamos recebeu um acolhimento quase amigo dos investidores, permitindo ao País e aos seus credores oficiais avançar afoitamente na implementação do 1º programa de ajuda financeira.
3. E hoje, as notícias dos mercados não podiam ser mais animadoras: (i) a começar na queda significativa das taxas de juro implícitas na cotação da dívida pública portuguesa e (ii) a continuar pelo sucesso das colocações de dívida dos Tesouros espanhol e italiano.
4. Relativamente à dívida portuguesa, verifica-se que a taxa de juro implícita na cotação das obrigações ao prazo de 10 anos, que tem vindo a ceder nos últimos tempos, caiu hoje para um nível inferior a 7%, sendo necessário remontar ao final de 2010 - vários meses antes da apresentação do pedido de resgate financeiro pelo anterior governo da República - para se encontrar uma taxa de nível idêntico.
5. Relativamente à colocação de dívida da Espanha, o respectivo Tesouro colocou hoje no mercado mais de € 2 mil milhões de dívida, aos prazos de 3 anos, 4,5 anos e 28 anos (!), tendo obtido procura suficiente às taxas de juro médias de, respectivamente, 3,358%, 4,2% e 5,89%, nos dois primeiros casos taxas inferiores às das anteriores colocações de prazo idêntico, no último caso sem antecedente comparável.
6. Quanto à dívida da Itália o panorama é semelhante, com uma colocação de € 3,5 mil milhões ao prazo de 3 anos, taxa de 2,5% (inferior à anterior) e de € 729 milhões para 2026, taxa de 4,75%.
7. Tanto no caso de Espanha como de Itália, estas notícias reforçam uma tedência que se tem observado nas últimas semanas, parecendo que os mercados não se deixaram impressionar muito (nada mesmo) com as manobras giratórias de Berlusconi...
8. Calculo que estes recentes desenvolvimentos constituirão motivo de dolorosa frustração para os incansáveis denunciadores dos malefícios dos mercados, que assim perdem uma motivação fundamental para continuar o seu bom combate (qual guerra santa) de extermínio das hordas mercantis...levando por arrasto, nesse afã destruidor/purificador, os não menos abomináveis neo-liberais, que se deixaram seduzir pelos encantos (?) dos mercados...
9. É evidente que ainda estamos vivendo tempos muito instáveis, nada garantido que esta “bonanza” na relação entre o mercado e os periféricos tenha características de longa vida. Em qualquer caso é algo a que já não estávamos habituados e que nos ajuda...
10. ...pelo que faço votos para que esta trégua nas relações entre os PPE e os mercados não seja para vigorar apenas na época natalícia que vivemos, inspiradora de gestos de boa vontade, mas que perdure e se prolongue pelo Novo Ano...por muito que isso custe aos que, devotadamente, combatem o neo-liberalismo...

22 comentários:

  1. "Embora seja inegável que o pessoal do mercado financeiro continua a ganhar dinheiro que nem bandidos – em parte porque, como sabemos, alguns são bandidos"
    Paul Krugman

    Paul Krugman é professor de Economia e Relações Internacionais na Universidade de Princeton e escreve regularmente para o New York Times. Krugman recebeu o Prémio Nobel de Economia em 2008.

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  2. Só queria entender até que ponto não serão estes "mercados" apenas os bancos que se financiaram no BCE aquando da disponibilização de duas tranches de 500 mil milhões há meses atrás.
    Ou seja, uma simples operação de cosmética orquestrada pelo BCE. E que tudo isto (o sucesso dos leilões) não passa de um processo de financiamento - do BCE - aos Países em dificuldades com um intermediário (bem pago) a meio: os bancos.
    Nada que não tenha acontecido em Portugal no ano que antecedeu a queda de Sócrates quando os bancos nacionais andaram travestidos de mercados em todos os leilões de dívida nacional.
    E que gizou este processo?
    Vitor Constâncio. E onde está ele agora? No BCE...
    Se for como escrevo (não sou especialista, nem perto disso) voltamos aos remendos. E a adiar o problema...
    O que não quer dizer que isso não seja necessário. Ganhar tempo é importante mas nunca perder de vista o que realmente interessa: a economia e os seus fundamentos.

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  3. Caro Gonçalo,

    Quem vendeu dívida, segundo o Post que redigi, foi a Espanha e a Itália, não foi Portugal...
    No caso de Portugal, referi-me apenas à cotação das obrigações em mercado secundário (compra e venda de dívida em "2ª mão")e respectiva taxa implícita (yield)...
    Se os bancos portugueses compraram dívida espanhola e italiana, nas colocações que referi,não sei, até admito que o tenham feito, mas não certamente dívida portuguesa...

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  4. caro Tavares Moreira,

    Os mercados estão satisfeitos com a operação de ajuda à Grécia de redução de juros, aumento de prazo e recompra de divida.

    Ficou demonstrado com esta operação que é possivel reduzir juros para 1%, dar diferente de juros, aumentar prazos para 20 anos e recomprar divida abaixo do par para reduzir a divida.

    Ou seja, a Alemanha não tem interesse nenhum em que a Grécia ou qualquer outro país saia do Euro.

    E está disposta a pagar a sua parte.

    Se a divida portuguesa (200 mil milhões incluindo parte do SEE) que paga um juro médio de 4% , pagasse 2,5%, teriamos uma redução de 3 mil milhões de juros.

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  5. Na verdade, não há dinheiro para a Saúde, tão pouco para Educação. Nenhum para o trabalho, mas em três meses a UE, como diz o Gonçalo, deu mais de um bilhão de euros aos bancos. Isto não é um governo dos cidadãos e para os cidadãos, isto é a tirania de uma oligarquia disposta a converter-nos em escravos. São muito poucos, mas tudo depende de nós próprios, estamos a tempo de escolher entre ser cidadãos donos dos nossos destinos ou súbditos obedientes e submissos.

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  6. O combate não é contra o neo - liberalismo mas contra a falta de ética social, o compadrio, a manipulação, a desumanidade e o esbulho. Felizmente que na social democracia ainda se ouvem vozes lúcidas como Pacheco Pereira. E no fim estaremos todos mortos. Notícia que gostei hoje de ouvir particularmente foi que um dos responsáveis da autónoma vai ser um dos responsáveis da avaliação da privatização da Tap e Ana.Porreiro, pá, porreiro!

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  7. “Mercados estão, finalmente, connosco? Esperemos que sim, mas a ver vamos…”
    Os mercados financeiros nunca estiveram nem nunca deixaram de estar connosco. Os mercados, movem-se por outros interesses e conveniências e estão-se nas tintas para as consequências negativas que a sua actuação possa provocar aos países.

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  8. Isso são péssimas notícias para Portugal. Se chegar a hora da república ir livremente ao mercado sem que o limite do gasto esteja estabelecido, lá vamos nós outra vez. Se há coisa que temos que aprender nesta crise é em meter um açaime nos gastos da república. Nunca Portugal esteve tão bem como agora e uma vez paga a dívida seremos um "tigre". Agora os parasitas que estão todos à espera de poder ir ao mercado com o meu aval têm que ser travados antes do mercado abrir.

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  9. Caro Paulo Pereira,

    Admitamos que a sua poupança de juros até está correcta e que os nossos credores são finalmente sensíveis aos seus argumentos e decidem, simpaticamente, baixar as taxas juro, oferecendo-nos os ditos € 3 mil milhões.
    Posso saber qual seria sua prioridade para a aplicação desses € 3 mil milhões?

    Caro PAS,

    Responsável da autónoma? Tem a certeza de que se trata mesmo dessa e escola, não estará a fazer confusão?

    Caro Tonibler,

    Não deixo de lhe dar razão, a isso se chama risco de "moral hazard", assunto a que os alemães, e com razão, atribuem bastante importância.
    Mas aí terá que ser a velha Troika a corta pela raiz, oxalá isso aconteça, doutro modo creio que iríamos voltar ao mesmo velho hábito do desperdício militante, era só uma questão de tempo...

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  10. Gonçalo, suponhamos que os mercados são os bancos, que se financiaram com €500B a 3 anos no BCE. Agora, um ano depois, estão a emprestar a Espanha e a Itália €5.5B com prazos entre os 3, os 14 e os 28 anos. Em que é que os €500B a 3 anos são um factor decisivo?

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  11. Caro Tavares Moreira,

    Nao passariamos a ter 3B€ "para gastar", nao seriamos era obrigados a gastar 3B€ em juros (nao sera despesa primaria mas e despesa!).

    Talvez assim fosse possivel parar um pouco para pensar, em vez de cortar "a bruta" os 4B€ de que se fala para cumprir o defice em 2013.

    Quem sabe, ate talvez com algum respiro na sociedade fosse possivel começar a crescer...!

    (peço desculpa pela grafia, mas o meu comutador "perdeu" os acentos)

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  12. "os 4B€" dee que fala o Jorge Lucio Não são 4 bilhões mas 4 mil milhões, isto é 4.000 milhões.
    O que o BCE emprestou à banca
    em 21 de Dezembro de 2011, foram 529.531 milhões de euros a juros de 1% a três anos, acrescentando a 29 de Fevereiro uma nova oferta de 489.200 milhões.
    Qualquer coisa como mais do que 13 vezes o empréstimo da troika a Portugal.

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  13. O empréstimo do BCE aos bancos daria para pagar de uma só vez a totalidade das dívidas públicas da totalidade dos países resgatados, Grécia, Irlanda e Portugal e ainda sobrariam muitos milhares de milhões de euros.

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  14. Dia 12/11, às 03:00, Pedro Braz Teixeira escreveu no seu blogue «Abelhudo» o que abaixo transcrevo. Já está desactualizado o que escreveu?
    «A crise do euro continua a desenrolar--se, com quase só más notícias.
    A Grécia tinha-se comprometido a concluir um programa de recompra da sua dívida pública até sexta-feira passada. Este programa era, por um lado, muito difícil de concretizar, porque a parte mais importante desta dívida está na mão de investidores estrangeiros. Mas por outro era muito importante, porque dele dependia o recebimento de uma nova tranche da troika, adiada desde Junho.
    Entretanto o prazo foi adiado para ontem à hora de almoço, mas à hora a que escrevo ainda não há “fumo branco”. Pode tratar-se de mais um mero adiamento, mas temos de convir que não é um bom sinal.»

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  15. A crise do euro continua a desenrolar--se, com quase só más notícias.

    A Grécia tinha-se comprometido a concluir um programa de recompra da sua dívida pública até sexta-feira passada. Este programa era, por um lado, muito difícil de concretizar, porque a parte mais importante desta dívida está na mão de investidores estrangeiros. Mas por outro era muito importante, porque dele dependia o recebimento de uma nova tranche da troika, adiada desde Junho.

    Entretanto o prazo foi adiado para ontem à hora de almoço, mas à hora a que escrevo ainda não há “fumo branco”. Pode tratar-se de mais um mero adiamento, mas temos de convir que não é um bom sinal.

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  16. Caro Anonymus,

    Admito ter-se tratado de um problema de fuso horário, o que ditou a notícia algo atardada de Pedro Braz Teixeira - uma pessoa e uma opinião respeitável, aliás.

    Caro Jorge Lúcio,

    Muito bem, os € 3 mil milhões não seriam para gastar, na sua opinião, estamos de acordo!
    Eu prefriria aproveitar essa almofada para reduzir a tributação sobre a produção, e/ou investimento e/ou a poupança...
    Mas para já estamos num exercício de suposições, não temos qq almofada, nem de € 300 milhões, quanto mais de € 3 mil milhões!

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  17. Dr. Tavares Moreira
    Não escrevi que quem vendeu dívida foi Portugal. Escrevi países em dificuldades...
    Fiz sim, uma comparação da situação com os meses finais de Sócrates. E apontei o elemento comum: Constâncio, à altura no Banco de Portugal, agora no BCE.

    Nuno Cruces
    Realmente os bancos não teriam interesse nenhum em financiar a dívida de Portugal ou da Grécia. Nem qualquer dívida deste tipo, direi eu, depois do que aconteceu (perdão) à Grécia.
    Simplesmente, terão sido "coagidos" a fazer isso pelo ... BCE, a troco de (mais) liquidez e outros negócios compensadores. Um pouco de juros aqui,mais um spread acolá. De forma a compensar o risco. E as perdas espetáveis.
    Constâncio...

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  18. Caro Gonçalo,

    A forma como se expressa sugere que Portugal não pertence à categoria "países em dificuldades", o que seria excelente se fosse verdade!
    Mas compreendo a sua linha de raciocínio bem como a referência ao "elemento comum", matéria sobre a qual me dispenso de elaborar, prefiro remeter para um livro que editei há pouco mais de 3 anos e que terei muito gosto em fazer-lhe chegar se é que ainda o não leu...

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  19. Países em dificuldades - obviamente - incluindo Portugal...

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  20. Caro Dr. Tavares Moreira,
    Também gosto das suas sugestões de diminuição da carga fiscal, ou de apoio à produção. São seguramente mais inteligentes do que apenas pagar juros.
    Agora claro que estamos numa fase de "suponhamos", pelo menos enquanto da parte do Governo apenas existir um "yes, Brussels".

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  21. Caro Gonçalo,

    Nesse caso...

    Caro Jorge Lúcio,

    Talvez se possa mesmo dizer uma fase de "supônhamos"...
    Permita-me todavia que lhe diga que se tudo se resumisse a dizer "yes, Ms. Brussels" ou "no, Ms.Brussels" - sem outras consequências que não as de nossa escolha - estaríamos como em "Alice Wonderworld"...

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  22. Caro Tavares Moreira,

    Aplicaria 3 mil milhões da seguinte forma :

    a) 51/3 % na Redução do IRC e da TSU para as empresas dos sectores transacionáveis.

    b) 1/3 % na Eliminação da sobretaxa do IRS

    c) 1/3 na recompra de divida que esteja com juros mais altos

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