O que parece é que nos tornámos especialistas em problemas, não sei se já repararam mas uma das expressões que mais se ouve é "é complicado". Descreve-se um acontecimento, e "é complicado", faz-se uma reportagem na rua e as pessoas acabam sempre com a frase "é complicado" pergunta-se aos alunos se o exame correu bem e eles hesitam, procuram as palavras e lá vem "é complicado". A síntese da moda centra-se no problema, na dificuldade, e nunca na solução que possa antever-se. De certa forma, não se fecha o assunto, fica assim em suspenso o desfecho, ser "complicado" desculpa que ainda se esteja assim, sem saber, sem decidir, mas permite que se acentue uma angústia em relação a quem deveria vir em socorro do aflito mas que o deixa ali, na complicação, tão enredado na circunstância negativa que levou à notícia e sem saber como há- de sair dela.
Ouvir a comunicação social com todo o vasto leque de quem se quer pronunciar sobre o que nos vai afligindo mostra de facto esta nossa incongruência. Sorvemos avidamente as notícias, especamos em seguida a ver e ouvir tudo o que nos possa trazer alguma luz e nicles, é só os problemas, vistos de todos os ângulos, de todas as motivações, expostas as suas sombras mais sombrias e as suas luzes mais encadeantes, ao fim de umas horas os problemas aumentaram e tornaram-se inevitavelmente insolúveis, tantos e tais são os seus cambiantes e as armadilhas que escondem as hipotéticas soluções. A conclusão é sempre segura: faça-se o que se fizer, é sempre "complicado" mas, a não se fazer nada, então aí a parada sobe e pode ser mesmo "criminoso". O desporto nacional parece ser, por esta ordem, o de dar a conhecer o problema (informar), seguido da demorada explicação do mesmo, sua génese, extensão, consequências, culpados, vítimas, etc., (análise e comentário) segue-se uma fase menos agitada enquanto se aguarda que alguém se lembre de arriscar um movimento na direcção da solução (alívio, durante a qual cada um espera o momento de poder vir a terreiro dizer que tinha razão) e, finalmente, o movimento, qualquer que ele seja ou mesmo que não seja mas que podia muito bem ter sido (informar de novo). Aí, haja Deus, renovam-se e acrescentam-se os "complicados". Se a decisão é prudente e dá azo a movimentos sequenciais, aqui d'el rei, que devia ter sido definitiva e não dar quaisquer hipóteses ao problema. Se, pelo contrário, é decisiva, ai, ai, como é que se sabe se não teria sido melhor de outra maneira? Nesta fase, o écran enche-se de corajosos, de arriscados, de duvidosos, de elaborados, de argumentativos, de uma miríade de gente que teria sido bem capaz de escolher a decisão certa desde que não fosse a que foi tomada. De repente, o problema está na decisão, seja ela qual for, em tudo o que certamente comporta, comportaria, comportará, talvez, mas, porém, todavia, contudo, desde que, complicações evidentes que, claro, as decisões alternativas evidentemente não comportariam. Desde que não fossem tomadas, claro. Reconheçamos: é complicado!
Subscrevo.
ResponderEliminarA democracia em Portugal é entendida como um regime de confronto permanente entre os diferentes interesses partidários onde não há lugar para qualquer consenso. Mesmo quando se trata de consensualizar uma estratégia
perante o exterior.
Um consenso que, quanto ao relacionamento com a UE, existiu durante muito tempo entre os três partidos governantes.
Há, em todo o caso, que reconhecer que Passos Coelho é muito culpado desta situação de crispação da política portuguesa por ter desligado o PS daa suas corresponsabilidades na execução do documento que o governo anterior negociou e o trio assinou com a troica.
Seria bom que soubesse agora aproveitar a oportunidade das negociações do compromisso pedido pelo PR para emendar os erros cometidos. Se encravar no primeiro pilar com a questão das eleições no próximo ano deitará tudo a perder.
Salvo melhor opinião.
«A síntese da moda centra-se no problema, na dificuldade...»
ResponderEliminarNunca vi nem ouvi, como agora; tantas opiniões e tantas soluções avulso, para os biliões de problemas que todos identificam em toda a parte e a abranger tanta gente, desde os que têm por missão encontrar as soluções para os mesmos, até aos que, não fazendo parte dos "incritos", para dentro deles se atiram voluntáriamente.
As dificuldades, numa realidade destas, devem ser em número,tantas quantos os problemas e uma terça parte das cabeças que os criam, os divulgam e opinam sobre a sua solução.
Uma equação extremamente difícil.
Suzana
ResponderEliminarTem toda a razão, a palavra "complicado" é utilizada para não resolver problemas. Este entendimento foi banalizado. Quando alguém diz que é "complicado" associamos logo à ideia de que o problema, o assunto, o projecto ou o acordo não se resolve ou não se faz.
Quem quer resolver alguma coisa o melhor é utilizar a palavra "complexo". Um problema ou o que estiver em causa pode ter um grau de complexidade ou dificuldade elevado, mas não tem que ser carimbado com o rótulo "complicado".
Especialidade lusa:
ResponderEliminarComplicar as coisas simples, digo eu há anos.
Falta de alguma coisa: reflexão, experiência, liderança?
Sempre a reinventar a roda,
caso orgânica governamental 2011.
Digo o mesmo: é complicado.
ResponderEliminarE é ainda mais complicado porque vivemos num tempo em que são muitos os que gostam de estar ao lado do problema e parecem não ser suficientes os que desejam vencer as complicações ficando do lado das soluções. Complicado, Suzana, complicado...