quinta-feira, 29 de agosto de 2013

A celebração


Não há talvez melhor retrato de um povo do que participar numa festa de família. Por estranhas voltas do destino pertenço agora, por afinidade, a uma família grega e esta, por afinidade, passou a pertencer à minha família. A cerimónia religiosa que celebrou o casamento foi mista, católica e ortodoxa grega e a festa que se seguiu juntou por algumas horas os núcleos mais próximos de cada um dos lados. Os dois sacerdotes, o católico e o grego ortodoxo, que se propuseram de imediato fazer a celebração conjunta, destacaram de modo simples e comovente a importância e a responsabilidade de levar a par a aceitação das duas formas de celebrar a Fé e de respeitar os ritos e crenças de cada ou, por outras palavras, dois modos diferentes de dizer a mesma coisa. Na aparência tão distintos, os símbolos querem afinal significar os mesmos valores, sublinhar as mesmas responsabilidades e fazer prometer o mesmo caminho, o amor e a compreensão, o respeito e a fidelidade, na alegria e na tristeza, até que a morte separe o que Deus uniu.
A beleza do ritual ortodoxo grego é imensa, e divide-se em duas partes, a celebração do noivado, ou promessa, e o sacramento do matrimónio. Na primeira, depois de o sacerdote abençoar as alianças sobre o altar, os padrinhos (koumbaros/a) trocam-na três vezes nos dedos anelares dos noivos, simbolizando a força da união do casal. Seguem-se as quatro fases da sagração do matrimónio: as orações do sacerdote, durante as quais os noivos mantêm as mãos unidas; a coroação, ou "stefana", em que o sacerdote coloca duas coroas brancas, unidas por uma fita, na cabeça dos noivos, simbolizando que são agora o rei e a rainha da sua casa e família, e os "koumbaros" trocam as coroas três vezes, simbolizando a Santíssima Trindade. As coroas ficam a unir os noivos até ao fim  celebração. Segue-se a benção da taça com vinho, da qual cada noivo deve beber três vezes, em invocação das Bodas de Canaã e símbolo da partilha futura de alegrias e tristezas, sendo também um voto de harmonia no futuro. Por fim, há a dança cerimonial, expressão da alegria e dos primeiros passos na vida que ambos prometem seguir em conjunto. Nesta dança, o sacerdote guia os noivos, seguidos pelos padrinhos, em três voltas ao altar, após o que lhes retira as coroas e os  abençoa, lembrando-lhes que a partir de agora devem seguir juntos toda a vida. Sobre o altar, na bandeja com o Evangelho, as coroas, as alianças e o cálice, está também a "koufeta", que são amêndoas brancas espalhadas com abundância, símbolo da pureza e da fertilidade,  que são depois oferecidas a todos os que assistiram à cerimónia, cumprindo a tradição popular grega. As amêndoas são amargas e doces, numa mistura resistente e indivisível, e fazem-se votos para que os noivos encontrem na sua vida mais doçura que amargura mas que a ambos respondam unidos pela força do seu amor, tal como a "koufeta" simboliza.
A alegria presente em toda a cerimónia fez daquele um momento mágico, em que o amor uniu dois jovens, duas religiões, duas culturas e uma extraordinária boa vontade de todos os que contribuíram para este momento perfeito.

9 comentários:

  1. Parabéns para a Suzana e marido e as maiores felicidades para o novo casal.
    Além do mais, ter agora um grego portas adentro é de um enorme conforto: é que já está habituado às restrições...

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  2. Singela e encantadora descrição. Um belo ritual que imaginei em toda a extensão. Os rituais têm uma força muito própria, e eu fiquei encantado com este. O que posso dizer mais? Sinto que também estive presente. É isso, "obrigou-me" a participar na cerimónia. Os meus parabéns a todos, especialmente aos noivos. E, no futuro, faça o favor de descrever "outros", sim, porque vai haver outros...

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  3. Muito obrigada, foi realmente um dia muito feliz, seguido de muitos outros dias de permanente convívio entre as famílias porque muitos ficaram por cá para conhecer o nosso lindo País. Os gregos são frugais em muitas coisas mas são exuberantes nas suas manifestações (felizmente só vi as de alegria :)) e sabem fazer uma festa só com a sua presença e têm um profundo sentido de família. Oxalá o futuro melhore a situação deles e a nossa, também temos em comum um êxodo dos nossos jovens, daí os caminhos cruzados que levam aos portos mais imprevisíveis. Disseram-me num local que organiza bodas que no último ano 40% dos casamentos aí festejados foram entre portugueses e outras nacionalidades, está visto que continuamos a conquistar o mundo :)

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  4. "está visto que continuamos a conquistar o mundo"

    É uma perspectiva reconfortante para mim. Cá (lá) de casa um saiu para Oriente, outra saiu para Ocidente. Por isso é que volta e meia mudo de fuso. Se Maomé não vai à montanha ...

    Muitas felicidades para os noivos. Parabéns para os pais.

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  5. Anónimo09:54

    Isso é que é verdadeiro ecumenismo!
    Obrigado por passar para este lado parte da alegria que se percebe que viveu. E as maiores venturas ao casal.

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  6. Suzana
    A cerimónia religiosa que nos descreveu é bela e tem realmente uma simbologia muito intensa. Muitas felicidades para os noivos e muitas alegrias para os pais.

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  7. Dá para imaginar a cerimónia, parece ser um tanto mais impressiva do que a nossa. Muitas felicidades.

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  8. Uma delícia a sua descrição, cara Suzana, fascinante mesmo!
    Os Noivos ficaram duplamente abençoados: por isso, os melhores augúrios de uma vida cheia de venturas, que seja a continuação, "sine die", desta tão bela cerimónia!

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