Acabou o estado de graça da Dra Joana Marques Vidal, a até agora discreta Procuradora Geral da República. Isto porque, dando execução a deliberação do Conselho Superior do Ministério Público, ousou dar orientações para que os senhores procuradores que dela hierarquicamente dependem se abstenham de comentar publicamente processos que tenham entre mãos. A reação dos media foi de imediato a que se colhe do título do Jornal de Notícias, apelidando a ordem de serviço de "lei do silêncio". No comentário à notícia numa das TV, um jornalista-comentador amplia o escândalo, e com supina ignorância e o habitual atrevimento que a falta de conhecimento sempre aguça, opina que em matéria de transparência, com esta "lei", Portugal recua anos e distancia-se dos países que têm como regra a publicidade dos processos em investigação.
De pouco valerá à Dra Joana Marques Vidal vir a terreiro explicar que o esclarecimento sobre o andamento de processos (de objetivo interesse público) não afasta o dever de reserva dos magistrados, dever de cujo cumprimento depende por um lado a eficácia da justiça, por outro a defesa de direitos elementares dos cidadãos e, não menos importante, constitui garantia de que a justiça do Estado não é substituída pela justiça feita no pelourinho impedioso dos pasquins. Os assuntos da justiça interessam aos media na medida exata que lhes permita exibir o escândalo, a desonra, a dor, mesmo daqueles que durante a investigação deveriam ver intacto o respeito pelos mais elementares direitos de personalidade, pela sua imagem, pelo seu bom nome, a sua honra e dignidade, pois são inocentes até ao julgado tornado incontroverso. Deste princípio basilar também é feito o Estado de Direito, embora seja por muitos considerado filho de um Deus menor e incómodo, pois embaraça o que faz vender jornais e revistas e atrai a publicidade de que se faz o negócio das televisões.
Vêm aí tempos difíceis, Senhora Procuradora Geral. Os títulos e os gritos histéricos que hoje leu e ouviu são só o começo. Previna-se.
a escumalha que se intitula jornalista
ResponderEliminarnão passa de fabricante de escândalos
para fornecer à maledicência enquanto esta não pagar imposto
se a Senhora fosse de esquerda tinha apoio imediato
dizia um Brasileiro que esta é a verdadeira 'idade media'
O que eu nunca percebi é porque é que as fugas de informação não são devidamente investigadas e, caso provenham dum magistrado do mp ou judicial, o responsavel não seja punido, no mínimo, com expulsão da carreira.
ResponderEliminarSinceramente sempre me fez muita confusão essa coisa em Portugal de que o segredo de justiça é letra morta e os jornais sabem sempre tudo o que querem saber.
Enquanto o PGR não conseguir aplicar a lei, punindo os promotores de fugas ao segredo de justiça, continuará a "bandalheira" a que muitos chamam transparência. E enquanto não for possível punir os media por publicarem matéria vedada por lei, continuarão os julgamentos populares. Acontece que, pelos vistos, o reino da PGR continua a ser dos condes, viscondes e barões e até de algumas marquezas. Sem qualquer respeito pela raínha de Inglaterra, claro está!
ResponderEliminar"E enquanto não for possível punir os media por publicarem matéria vedada por lei,..."
ResponderEliminarDiscordo, António.
E discordo porque não pode evitar-se a divulgação de uma informação punindo o divulgador, por serem incontáveis, e portanto, incontroláveis, os meios de divulgação.
Mas já concordo inteiramente (e já o anotei em tempos no meu caderno de apontamentos) que o procurador do Ministério Público reponsável por um processo em segredo de justiça deve garantir a inviolabilidade dessa situação.
Ocorendo uma fuga de informação, o procurador deve ser responsabilizado e demitido das suas funções, e da função pública, se a importância do caso o justificar.
É por demais evidente que o ministro Machete foi desatrado na entrevista que concedeu em Luanda. Mas as relações entre POrtugal e Angola encontravam-se já infectadas por fugas de informação oriundas do Ministério Público.
Que se peça a demissão de Machete, concordo.
Que se deixe passar em branco, mais uma vez, o vício de passador do Ministério Público, é sintoma de que a justiça continua em Portugal a brincar à cabra cega.
"Dar orientações" a quem a desorientação é gratificante não chega.
A lei deveria expressamente cometer aos procuradores a responsabilidade de guardiões do segredo de justiça dos processos a seu cargo, estabelecendo as sanções correspondentes ao seu cumprimento.
Ou estão os agentes da justiça acima da lei?
ResponderEliminarEmenda.
"A lei deveria ... correspondentes ao seu incumprimento."
Meus caros, a minha nota não tinha que ver com o segredo de justiça, nem - creio - foi esse o motivo da orientação dada pela Sra PGR, mas sim o dever de os senhores magistrados guardarem reserva sobre os processos de que estão encarregados. A mesma regra é imposta aos advogados pelo seu estatuto, e já aqui lamentei que estes não tenham tento na língua, a começar pelo sr. Bastonário.
ResponderEliminarCaro Ferreira de Almeida, parece-lhe que se aqueles que se dedicam a essas patifarias soubessem que sendo descobertos, como mínimo, eram expulsos da carreira ou, no caso dos advogados, inibidos do exercício da profissão, como mínimo. E depois, claro, multas brutais (valores enormes que forçariam os condenados a ter que vender os seus bens e a declarar-se insolventes), indemnizações aos prejudicados e, em casos mais graves, penas de prisão, parece-lhe que sabendo que arriscavam algo deste calibre continuariam alegremente a papaguear tudo o que lhes apetece sem o mais minino respeito pelo dever de reserva e pelo sigilo a que estão obrigados? Quer-me parecer que pensariam duas vezes...
ResponderEliminarDevia ser uma questão de formação, o facto de ter que ser dada esta orientação é, só por si, um sinal de como tudo está mal e confundir esta orientação com a lei do silêncio também mostra bem como se interpretam hoje as liberdades. Enfim, é assustador.
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