Ó homem, conhece-te a ti mesmo e conhecerás os deuses e o universo
(Inscrição no oráculo de Delfos)
As pitonisas de Delfos faziam profecias que eram consideradas verdades absolutas. É claro que exigiam decifração, os oráculos sempre gostaram de enigmas que punham à prova a inteligência dos intérpretes e, sobretudo, que livravam de responsabilidades os conselhos dados a quem se lhes dirigia. Os oráculos nunca se enganam, senão os deuses entrariam em descrédito.
O reboliço interpretativo que o relatório da avaliação da troika provocou lembra em tudo o oráculo das pitonisas de Delfos, convidando a um exercício cabalístico a que todos se dedicam entusiasticamente, acabando por discutir as interpretações de uns e de outros porque o texto todas acolhe e corrige. O País está melhor? Sim, está. O País melhorou? Hum, a ver vamos, há muito para andar. As exportações cresceram? Sim, foi notável. As exportações são a prova do bom caminho percorrido? Depende, depende mesmo muito. As reformas foram feitas? Sim foram. As reformas não foram feitas? Pois, há que fazê-las e muito mais. Os impostos são altos? Sim, altíssimos. Os impostos devem descer? Não, nem pensar. A retoma precisa de consumo? Sim, precisa, mas cuidado com as importações. A austeridade pode abrandar? Não, mas cuidado com as clivagens sociais. O programa foi um sucesso, Portugal está em risco, grandes sacrifícios, sacrifícios maiores. Tudo depende de tudo e não se percebe de que é que afinal depende.
Os novos oráculos são muito parecidos com os antigos, querem ficar para a História sem se comprometer com o rumo dos homens para a ir construindo. Mas não os dispensam dos seus conselhos cabalísticos, que cada um decifra conforme lhe interessa, invocando a sabedoria dos deuses fingindo desconhecer-se a si próprios.
Acho que não são parecidos, cara Suzana. Os oráculos clássicos eram três ou quatro, muito seleccionados, e destes só ao de Delfos era reconhecida a mais alta autoridade. Agora, há oráculos por todos os cantos das rádios, jornais e televisões, e só masoquistas é que podem ouvir. Porque ninguém de bom senso lhes reconhece autoridade.
ResponderEliminarSuzana
ResponderEliminarEm quem se pode acreditar? Toda a gente fala sobre tudo, com muita propriedade, com a verdade absoluta na ponta da língua. Os que hoje fazem determinadas afirmações, amanhã negam-se a si próprios com todo à vontade. Já é normal. Mas não é normal, uma sociedade não pode viver numa permanente instabilidade, imprevisibilidade, insegurança e falta de confiança. Não há oráculos!
Sou da mesma opinião do Dr. Pinho Cardão. Além dos motivos que o caro Dr. P C refere, acrescento ainda, que os oráculos de hoje, não mascam folhas de louro, nem snifam os vapores de enxofre que se escapavam do solo vulcânico onde se achavam instalados... talvez alguns dos atuais, fumem umas ervas... ou cheirem uns riscos de pó mas... não é a mesma coisa, nem tão pouco lhes proporciona a mesma "moca".
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