segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Bancos Centrais deveriam estar reconhecidos a Donald Trump? Talvez, mas não...


1.     Já em anterior Post aludi à mudança de cenário macroeconómico (prospectivo), na sequência da vitória de D. Trump nas eleições para a Presidência dos EUA.

2.    Essa mudança acarretou alterações significativas sobre as expectativas quanto à inflação e induziu expressivas subidas das taxas de juro (yields) dos mercados de dívida, em particular de dívida pública.

3.    Numa avaliação objectiva, estaremos perante uma antecipação do cenário há muito almejado pelos Bancos Centrais das principais economias: inflação a caminho do objectivo de “quase 2%” e condições monetárias a caminho da normalidade, a começar pela quase certa subida das taxas directoras do FED já em Dezembro pf.

4.     Assim sendo, o efeito Trump – e designadamente a expectativa de uma política orçamental (“fiscal policy”) mais expansionista nos EUA, para suportar um amplo programa de renovação/recuperação de infraestruturas – acabará por prestar um auxílio considerável à concretização dos objectivos há anos afadigamente prosseguidos pelos ditos Bancos Centrais .

5.    Parece pois haver motivos para os Bancos Centrais poderem vir a mostrar-se reconhecidos a D. Trump, mas tal não deverá acontecer ("jamais"):

(i)               em 1º lugar os Bancos Centrais, se e quando considerarem atingidos os objectivos da sua política de enorme acomodação monetária (no caso do BCE altamente questionável, de resto, envolta em graves contradições), quererão guardar só para si os méritos desse feito, não reconhecendo a contribuição de terceiros por mais evidente que esta seja;
(ii)         em 2º lugar, esse reconhecimento estaria manchado de infidelidade aos sagrados princípios do "politicamente correcto", sujeitando-se às mais acerbas críticas por parte dos "opinion makers" do conservadorismo vigente. 
 

9 comentários:

  1. Anónimo11:36

    Caro Tavares Moreira, viria assim tão grande mal ao mundo se os bancos centrais se evaporassem e levassem consigo a política monetária? Adviria assim tão grande mal ao mundo se as taxas de juro de referência fossem fixadas pelos bancos entre si consoante o que percebessem ser o real risco da operação?

    Dada a evolução financeira mundial dos últimos 15-20 anos cada vez mais me quer parecer que se nos vissemos livres dos bancos centrais poderíamos voltar a ter capitalismo e economia de mercado novamente... Alguma forma teria que ser arranjada para as funções de emissor mas salvaguardando devidamente que a política monetária ficaria enterrada.

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  2. Caro Zuricher,

    Embora não partilhe da sua sugestão no sentido de se fazer o "delete" dos Bancos Centrais, não me custa reconhecer que a missão destes se tornou extremamente árdua após a crise financeira de 2008/2009, tendo vindo a acumular erros sobre erros (mais graves no episódio BCE).
    Ainda hoje encontrei declarações do Presidente do BCE incitando os governos da zona Euro a "stepping up" as reformas estruturais!
    Acelerar reformas estruturais, quando as que foram feitas nos últimos anos estão em recuo por quase toda a Europa do Euro, nomeadamente nos países de situação financeira mais frágil?
    Não duvidando das boas intenções de M. Draghi, fico com a impressão que o Senhor residirá, por agora, algures noutro planeta.

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  3. Eu concordo com o Zuricher, principalmente porque nem sequer é uma quest\ao de concordar ou não. Quando for para acontecer, e os triggers estão aí próximos com as eleições/refrendos nos maiores países da zona euro, acontecerá. Hoje ouvi a notícia de que o Banco de Portugal se prepara para multar 49 bancos portugueses por insuficiência de reporte. E eu só pensei "o que impede esses 49 bancos de criar um banco central ao lado e mandar o Banco de Portugal ir regular o tamanho da bica?" "O Euro?"

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  4. Caro João Pires da Cruz,

    Se tiver de acontecer um dia, que aconteça, mas pode crer que esse vai ser um dia em que muitos dos que hoje propugnam essa solução vão chorar amargamente quando defrontados com as consequências de tal ruptura...
    E note que não sou, como já terá percebido, um entusiasta das políticas dos Bancos Centrais, muito em particular da que o BCE tem protagonizado.
    Sendo certo que num primeiro momento (2012/2013) essa política (do BCE) fez sentido e até evitou o colapso do Euro, a verdade é que passou já muito tempo e nesta altura os efeitos negativos de tal política são, na minha perspectiva, bem superiores aos efeitos benéficos.
    Corremos o risco de que seja já tarde quando se aperceberem dos efeitos negativos...
    Mas pode ser que o efeito Trump faça antecipar a descontinuação desta política, o que seria um feliz evento.
    Quanto ás multas que refere, será que abriu competição com a EMEL e com a GNR que parece não terem tempo para mais nada senão aplicar multas?

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  5. Caro Tavares Moreira,

    Eu não sou contra os bancos centrais. Acho até que são tão importantes que deveriam ser privados. MAs algures no tempo se confundiu o banco central como bolsa/fonte de liquidez com banco central instrumento macro-económico. E a partir daí tem sido bacorada atrás de bacorada.
    E, na realidade, o que prende um conjunto de 50 bancos a um banco central? Porque não fazer outro ao lado, até pode ser com moeda não circulante como aconteceu no Brasil antes do Real.

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  6. Caro Pires da Cruz,

    Começamos a convergir na apreciação deste tema...
    Na minha análise, os Bancos Centrais não estão fadados para funcionar como locomotivas da economia, por este andar conduzirão a economia para um descarrilamento ou para uma mudança de via, entrando numa via reduzida.
    O BCE em especial, dadas as características específicas da zona Euro (bem diferentes dos EUA, do Japão e do Reino Unido), arrisca-se mesmo a arrastar a economia - ou talvez já tenha entrado, mesmo - para uma via não só reduzida mas também sem saída...

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  7. Anónimo13:54

    Caro Tavares Moreira, o problema é que os bancos centrais estão a assumir esse papel de "locomotivas da economia". Com os governos contentissimos por lhes endossarem essa responsabilidade. Não têm que assumir problemas muito maiores no imediato nem que fazer reformas impopulares. Claro que tudo isto é pão para hoje e fome para amanhã mas como a filosofia é o imediato serve perfeitamente.

    Teria a crise do subprime acontecido sem a resposta da Fed à crise asiática de 1998 e ao solavanco de 2000-2003? Nessa altura as taxas de juro de referência foram de 6% para 1% e, claro, começou a bolha a formar-se. Depois, no ciclo de subida o máximo que alcançou foi 5% e chegamos a 2008 e lá foi para 0%. Já teve uma subida de 0,25% e espera-se uma doutro tanto em Dezembro. Mas este actual ciclo duvido muito que volte a chegar aos 5% sequer. Entretanto ao longo destes anos, sempre que há um começar de desinsuflar seja no que for lá vai mais QE, lá vai mais um empurrão dos bancos centrais. Com isto tudo chegou-se ao ponto de que toda a economia reage não ao seu desenvolvimento mas sim de pernas para o ar. Dados económicos positivos fazem fugir os investidores e dados económicos negativos trazem valorização dos activos. E nem pensar em falar de acabar com os programas de estímulo. Já ninguém sabe o valor seja do que for, seja no que for tal o nivel de distorção em tudo. Os bancos centrais criaram bolhas em todas as classes de activos a tal ponto que os investidores tomam as suas decisões hoje em dia baseados na continuidade das políticas de estímulo, vistas como positivas, e não nas realidades fundamentais. Isto é o mundo de pernas para o ar.

    Houve ainda um problema adicional disto tudo. Normalmente não sou particularmente sensivel às desigualdades de rendimentos. O problema é que tudo isto ampliou tremendamente essas desigualdades. Não importa que muita da riqueza dos 1% seja apenas em papel e resultado apenas do valor dos activos detidos que estão em bolha. Isso é ignorado pelo público em geral. E, realmente, nessa óptica as desigualdades aumentaram tremendamente. Como digo, normalmente não é assunto que me ocupe muito o espírito. Porém já se chegou ao ponto onde essa desigualdade tem impactos sociais e este é precisamente o limite onde começo a olhar para o assunto.

    Ora, perante este cenário, não estarão os bancos centrais a ser maior causa de problemas do que de benefícios nos tempos que correm? Sim, claro que se se esfumassem os tempos imediatos seriam de fim do mundo a pontapé. Mas seria precisamente isso que abriria a porta à renovação tão necessária na economia mundial que está, essencialmente, a ser mantida em versão zombie ligado a balões de oxigénio.




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  8. Por isso os bancos centrais DEVEM ser privados. Se os governos querem gastar dinheiro, então emitem obrigações e os bancos centrais vão aceitando como coletaral enquanto a exposição do estado se mantiver num nível de baixo risco. Mas infelizmente, as pessoas dos bancos centrais percebem muito pouco de banca e ainda menos de risco. Estava ouvir a conversa do Carlos Costa esta semana para a perspectiva sobre o que aí vem ser muito negra, dado que o maior factor de risco do sistema - ele mesmo - estava a falar das asneiras que fez como virtudes. Uma catástrofe financeira em formação.

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  9. Caro Zuricher,

    As preocupações que exprime afiguram-se-me bastante compreensíveis.
    O excesso incomensurável e prolongado de um factor produtivo - sub judice, o capital - a preço de saldo, é seguramente gerador de distorções consideráveis no pricing de activos, nomeadamente das dívidas públicas, dos imóveis e também das acções (excluindo as do sector financeiro, em desgraça).
    Note que as taxas de juro do BCE (taxa das operações principais de financiamento) se situam praticamente em zero desde meados de 2014...e que, adicionalmente, o BCE tem vindo a influenciar deliberada e decisivamente o pricing das dívidas públicas (agora também da de algumas empresas que têm acesso ao mercado de capitais).
    Esta situação torna estas entidades viciadas/dependentes do ("addicted to") dinheiro muito barato, formando as suas decisões a contar com a manutenção ad eternum desta benesse...ao mesmo tempo que não sentem qualquer estímulo para promover as reformas estruturais, que naturalmente evitam ou mesmo revertem, e que o BCE, pateticamente, continua a proclamar como indispensáveis e urgentes, chegando a incitar os governos para que as acelerem (!!!).
    Por outro lado, a necessidade de encontrar alguma remuneração para os activos das carteiras dos investidores, sobretudo institucionais (o conhecido "yield hunting"), forçando a procura de activos de risco cada vez mais elevado, torna as carteiras altamente vulneráveis a uma modificação das condições do mercado.
    O FED já percebeu que isto não pode continuar, pelo que vai começando a alterar a sua política de taxas muito baixas, depois de ter descontinuado, já em 2015, a compra de activos em grande escala (o famoso QE).
    A alteração do cenário macro desencadeada pela vitória de Trump, por sua vez, fez com que a curva de rendimentos da dívida, pública e privada, tivesse sofrido uma alteração sensível, adquirindo uma inclinação maior, desde o prazo mais curto, 1 ano, até aos 30 anos.
    Na Europa e como não poderia deixar de ser, continua-se a dormir o sono dos justos, ninguém parece realmente preocupar-se com estas questões.
    O agravamento da dependência/viciação desta interminável política de excesso de oferta de dinheiro barato, sobretudo para os Estados Membros do Euro (com a infeliz excepção da Grécia) irá criar desequilíbrios crescentes, rumo a não sei o quê...mas, curiosamente, não consegue incentivar o investimento, torna-se visível que os investidores não confiam nos resultados desta política.

    Caro Pires da Cruz,

    Se hoje quem aparecer a sugerir a privatização ou tampouco a abertura do capital da CGD é imediatamente excomungado - a Caixa assim é que está bem, como se tem visto - aos proponentes da privatização dos Bancos Centrais poderá estar reservada a pena de degrado...cuidado, pois!
    Aproveite bem a Black Friday!

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