O primeiro dia do Programa em Boston começou com uma reunião no Beacon Hill Institute, um think tank sedeado nesta cidade e que faz parte da Suffolk University como Research Center.
Depois de vários think tank mais ligados aos democratas – que visitámos em Washington, D.C. – este foi o primeiro think tank mais "pró-republicano" que conhecemos. E a conversa com o Dr. Frank Conte, Director of Communications and Information Systems e os Professores Darlene C. Chisholm, Associate Professor of Economics, e David G. Tuerck, Executive Director, foi muito interessante.
Percorremos os problemas políticos dos EUA e da Europa, a era pós-Bush nos EUA (que será dramática, de acordo com os nossos anfitriões… porque, de acordo com o que nos expuseram, Bush é o melhor que têm…), a economia norte-americana, a economia europeia (e a França e a Alemanha em particular), a entrada dos países do Leste da Europa na União Europeia, o papel da fiscalidade na competição entre países (que veio mesmo a calhar e que não é nenhum fait divers, como o nosso actual Governo e, sobretudo, o Primeiro-Ministro, querem fazer crer...), a globalização e os seus problemas e virtudes, o papel das economias asiáticas (e sobretudo da China e da Índia), enfim – ocupou-nos desde as 10 até às 11:30 horas da manhã e foi bem proveitoso.
Depois, partimos em direcção à Northeastern University, onde, a partir das 13 horas tinha previstas três reuniões com Professores “da casa”.
Pelo caminho, e já perto da universidade, almoçámos num restaurante da cadeia Au Bom Pain, de fast food mas… francesa (que já conhecia) e que tem, sem dúvida, melhor qualidade do que a habitual fast food. Ah, por volta dessa hora fui informado das previsões de Primavera da Comissão Europeia e que, infelizmente, no que toca a Portugal, vieram confirmar as más notícias que OCDE, FMI e Banco dde Portugal já nos tinham transmitido há pouco mais de duas semanas...
Enfim, voltando aos EUA, a primeira reunião na Northeastern University foi com o Prof. Jean-Philippe C. Stijns, Assistant Professor, Department of Economics. Falou-se, essencialmente, das investigações mais recentes deste professor belga, há já alguns anos residente nos EUA, que têm versado (i) o efeito dos preços do petróleo nos países da OCDE e (ii) as diferenças que existem entre países em vias de desenvolvimento produtores e não produtores de petróleo.
Sobre o primeiro tema, o Prof. Stijns concluiu que a alta dos preços do petróleo se tem feito sentir mais na Europa do que nos EUA, que têm absorvido relativamente bem esta forte subida devido, sobretudo, à maior flexibilidade existente na economia e, em particular, no mercado de trabalho, o que permite um maior dinamismo na mudança de emprego da população activa, e uma maior adaptabilidade a novas condições económicas. Na Europa, já se sabe: a rigidez é muito maior, o que dificulta a absorção por parte da economia de choques como este da subida dos preços do petróleo.
Enfim, o Prof. Stijns referiu que não sabe como reagirão as duas economias a preços do petróleo em redor de USD 100 ou USD 150 mas, até agora, a economia americana tem, sem dúvida, lidado melhor com a situação.
Quanto ao segundo tema, o Prof. Stijns referiu que, apesar de tudo, existe evidência empírica que constata que o dinheiro do petróleo tem feito alguma diferença nos países em desenvolvimento que o têm, por oposição aos países que o não têm. Assim, por exemplo, sem petróleo, poder-se-ia esperar que uma Arábia Saudita estivesse na situação de um... Afeganistão , ou de um Iémen. Isto é, apesar de tudo, há diferenças positivas: por exemplo, nos países que têm petróleo, apesar de tudo, há algum investimento em educação; nos outros, quase nada. Podia ser maior esse investimento, é certo mas, mesmo assim, é uma situação positiva que, de outro modo (isto é, sem os recursos provenientes do crude), a avaliar pela realidade dos outros países, não se verificaria.
Depois veio ter connosco a Professora Maria José Luengo-Prado, Assistant Professor, que é espanhola (de Salamanca) e que já se encontra nos EUA há 9 anos.
Esta professora tem efectuado investigação na relação entre o boom do mercado de habitação e a evolução da poupança nos EUA e está agora, também, a efectuar o mesmo estudo em vários países da União Europeia, entre os quais Portugal (não tendo, por isso, ainda resultados). Relativamente aos EUA, o que a Professora Luengo-Prado referiu foi a diferença existente entre a mentalidade da actual geração mais activa (digamos entre 25 e 45 anos) e a faixa etária acima. Hoje, talvez porque não tenha passado pelas dificuldades de uma II Guerra Mundial ou pela Guerra Fria, pensa-se que o futuro há-de sempre trazer melhores dias e que, portanto, não é preciso poupar. A Professora Luengo-Prado tem a sensação que na Europa se passa o mesmo fenómeno (eu também acho…). Como, em acréscimo a esta forma de pensamento, ainda por cima houve um boom na compra de casa e nos preços do imobiliário (efeito quantidade e efeito preço), as pessoas vêem-se hoje como estando muito mais ricas – e, portanto, continuam a consumir sem se preocupar em poupar (e por isso o consumo nos EUA continua forte e a poupança a decrescer). Tudo isto foi testado pela Professora Luengo-Prado nos seus modelos, tendo ficado de me enviar por e-mail os seus papers. Claro que também foi testada a possibilidade do “rebentar da bolha” no mercado da habitação e, aí, naturalmente que os efeitos são perversos sobre a economia, mais ou menos consoante essa alteração seja encarada como permanente (ou mais duradoura), ou mais temporária pelos consumidores. Enfim, estou muito curioso para saber que resultados obterá a sua investigação neste tópico na Europa…
Finalmente, falou-se ainda um pouco da sua investigação do sistema do “cheque-educação”, a sua implementação nos EUA, e o estado da educação nos EUA, em Espanha e também em Portugal (onde eu aproveitei para dizer qualquer coisa).
A última reunião do dia foi com o Professor Kamran Dadkhah, Associate Professor, Econometrics, iraniano (vejam bem a coincidência!...), e já residente nos EUA há quase 30 anos.
Foi este professor que me advertiu para a carta que o Presidente Iraniano Mahmoud Ahmadinejad enviou ao Presidente Bush e que poderá ser um ponto de partida positivo (era inesperado, logo pode ser encarado como uma tentativa de reconciliação ou aproximação) para resolver a questão nuclear iraniana (tanto que trouxe o preço do petróleo para baixo de USD 69 por barril, em New York).
Este Professor começou por, brevemente, falar sobre a economia iraniana (aproveitando o facto de ele ter trabalhado no Development and Investment Bank of Iran e no General Economy Bureau, Plan and Budget Organization of Iran nos anos 70), que só se consegue “aguentar” devido ao petróleo e à alta que o "ouro negro" tem registado, e que é de tal forma centralizada que cerca de 80% da economia se encontra nas mãos do Estado (!). Dado que o Irão enfrenta noutros sectores de actividade a ameaça chinesa – como sucede na Europa ou nos EUA – cada vez mais se assiste ao encerramento dessas actividades (como os têxteis) e cada vez é maior a concentração no petróleo – sem o qual a economia iraniana nada é.
Falou-se, depois, no seu trabalho de investigação, que até Janeiro último esteve quase a 100% dedicado à finalização do seu livro Foundations of Mathematical And Computational Economics, segundo o autor, o sucedâneo do Fundamental Methods of Mathematical Economics do histórico Alpah C. Chiang (escrito nos anos 60, e por onde eu estudei, por exemplo). A grande e principal inovação é que este livro está todo preparado para o uso de poderosos programas matématicos que hoje existem e que permitem resolver primitivas, integrais derivadas, etc.
Aliás, no final da reunião, e perante a minha curiosidade no tópico (afinal fui assistente de Matemática na Licenciatura em Economia da Universidade Católica durante 7 anos!), o Professor Dadkhah levou-me ao seu gabinete e mostrou-me como funciona uma dessas poderosas ferramentas (acho que se chama Maple 1, passe a publicidade).
Voltando ao nosso meeting, falou-se ainda das alternativas energéticas ao petróleo – que, segundo o nosso interlocutor, qualquer uma que seja, por se encontrar num estado ainda verdadeiramente embrionário, não constitui uma real alternativa – e que, de facto, se se quer diminuir a dependência que hoje existe face ao crude (e ao poder que tal confere aos países que o produzem), tem mesmo que aparecer uma alternativa viável. Ah: o Professor Dadkhah está firmemente convicto de que essa fonte energética alternativa, quando aparecer, será necessariamente nos EUA… afinal, segundo ele, é onde tem aparecido a esmagadora maioria das inovações nos últimos largos tempos (logo se vê em que conta ele tem a Europa, por exemplo…).
Enfim, foram reuniões muito proveitosas e que tornaram o dia muito interessante e produtivo.
Por volta das 16 horas já estava de regresso ao hotel, onde aproveitei para colocar e-mails em dia e fazer trabalho para Portugal, para além de ter ainda descansado um pouco e… claro, de ter feito jogging antes do jantar – que hoje tornou a ser japonês, num restaurante ao pé do hotel.
Agora que já escrevi outro post para a Quarta República e completei o diário de hoje, e como já passa das 11 da noite, é altura de dormir, porque amanhã a alvorada é outra vez bem cedo, por volta das 7 horas.
Uma noite descansada a todos, é o meu desejo.
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ResponderEliminarRelativamente à abordagem feita pelo prof. Stijns das economias petrolíferas, gostaria de saber se as conclusões que ele tira vão no sentido de desmentir o efeito da Dutch Disease, ou antes de dizer que mais vale ter dutch disease do que não ter petróleo?
ResponderEliminarQual a posição do prof. Stijns relativamente à constituição de fundos de investimento financiados pelas receitas petrolíferas, destinados a
i) impedir que o afluxo de capitais leve a uma apreciação real excessiva e à consequente perda de competitividade do sector transaccionável não petrolífero; e
ii)garantir a justiça intergeracional na exploração do património natural?
Será que os seus dados empíricos apontam para a maiores benefícios sociais na aplicação imediata das receitas petrolíferas?
Tenho dúvidas que assim seja, e mesmo o caso da Arábia Saudita não me convence. Tanto mais que ele ilustra uma outra grande perversão da economia petrolífera: a perversão política.
Talvez o Miguel em Boston ouça falar em histórias de independência, de chá deitado ao mar, e daquela velha máxima americana: "no taxation without representation".
Pois na Arábia Saudita e restantes petromonarquias aplica-se ao contrário: "no representation without taxation". E enquanto os Saud não precisarem dos impostos dos seus súbditos, porque haviam de lhes chamar cidadãos?