segunda-feira, 17 de setembro de 2007

A loucura da montanha russa em que vivemos...

A loucura colectiva em torno do caso da pequena Maddie não é um fenómeno único ou isolado. Mas em lugar de pararmos para pensarmos o que vai mal neste mundo apelidado de “moderno”, o que vemos é a alimentação de histerias colectivas em torno de circos de emoções e mediáticos. Um fenómeno assustador, impróprio para cardíacos, do tipo montanha russa!
Por isso, a propósito do caso Maddie pensei em partilhar uma reflexão que admito um pouco “teológica”, que foi suficientemente “louca” para parar e pensar por breves minutos.
Vivemos uma época em que o mundo parece enlouquecer, em que o quotidiano assume uma velocidade vertiginosa, em que as incompreensões e o egoísmo se tornaram traços banais, em que a inveja e a competição conduzem os homens por caminhos perigosos, em que a coesão das células familiares e dos grupos e comunidades locais vão dando lugar a uma cada vez mais impressionante dispersão familiar e social. É uma época em que os homens se tornam mais solitários e talvez mais perdidos, em que escasseia o tempo para pensar, em que os valores e as referências se estão a desvanecer, em que a verdade é cada vez mais a mentira, em que a tolerância deu lugar a uma ambição desmedida e em que os homens querem viver mais depressa a vida. É também uma época fascinante pelo progresso derivado das descobertas científicas e dos avanços tecnológicos, mas também aterradora se olharmos para os milhões de pessoas vítimas da violência causada pelas guerras e pelo poder ou pelas brutais desigualdades naquilo que são as condições mais elementares de uma vida digna.
Por tudo isto, e muito mais que poderíamos escrever para além desta pequena amostra que os meus olhos observam, a verdade é que muitas pessoas sentem a necessidade de parar, pensar, reflectir e escutar na mira de encontrarem alguma serenidade, tranquilidade e resposta para as suas interrogações no meio deste mundo turbulento. No fundo, as pessoas procuram na “espiritualidade” um contraponto ao “material” que perseguimos e que nos persegue na complexa sociedade em que nos inserimos, cheia de contradições e dificuldades.
Refiro-me àquela espiritualidade que nos ensina a sermos pessoas mais afectuosas, mais calorosas, mais compreensivas e mais tolerantes. A intensidade desta procura apresenta-se naturalmente com múltiplas matizes, sendo que parece razoável aceitar que há medida que vamos avançando na idade a força desta espiritualidade vai estando mais vezes presente e vai ocupando aos poucos parte do lugar do “material”. Também é natural que assim seja porque afinal a experiência da vida, a maturidade e o conhecimento acumulado permitem-nos observar a vida, a nossa e a dos outros, com mais paixão mas com aquele distanciamento que a sabedoria e os sentimentos mais nobres deixam que aconteça.
A responsabilidade dos mais velhos é, nestas circunstâncias, ainda maior. Ensinar aos mais novos essa espiritualidade significa transmitir-lhes a mensagem de que os valores são importantes. As gerações mais velhas poderiam ter um papel importante na “terapia” da loucura do mundo em que vivemos!

8 comentários:

  1. Cara Margarida, apesar de prestar a máxima atenção a tudo o que escreveu e de corroborar à quase totalidade das suas reflexões e convicções, a minha atenção fixou sobretudo o seguinte trecho da sua escrita, "a verdade é que muitas pessoas sentem a necessidade de parar, pensar, reflectir e escutar na mira de encontrarem alguma serenidade, tranquilidade e resposta para as suas interrogações no meio deste mundo turbulento. No fundo, as pessoas procuram na “espiritualidade” um contraponto ao “material”.
    Observo com frequência nas sexta-feiras à tarde, filas de pessoas à porta dos pontos de registo dos boletins dos concursos de Totoloto e Euromilhões. Pergunto-me frequentemente se todas aquelas pessoas, desejam efectivamente receber o prémio, ser "bafejadas" pela sorte e passar a possuir muito dinheiro. Pergunto-me, se fosse possível colocar aquelas pessoas entre a prespectiva de receber o prémio ou alternativamente, receber a garantia de estabilidade social, que lhes garantisse o emprego, a saúde a habitação, a educação e a reforma, por qual optariam verdadeiramente.
    Corremos todos atrás de quimeras, é verdade cara Margarida. Alguns, penso eu que por inépcia, por não terem a clarividência necessária para identificar as alternativas, outros, talvez por inercia, é-lhes mais fácil seguir pelo carreiro e ir tirando proveito das migalhas que as restantes formigas vão deixando cair. Outros ainda porque estão convictos que ha que retirar proveito das situações e que os "lorpa" devem ser explorados até à última gota.
    A verdade, essa famigerada ilusão, é que fomos invadidos e cercados por um espartilho, a que eu chamo o consumismo orientado. Na nossa sociedade, não se consome somente aquilo de que se necessita, mas sim e também aquilo que nos impele a sociedade a consumir. A nossa sociedade não produz para o consumo, mas sim para satisfazer um consumo que a publicidade provoca. Cada pessoa compra mais coisas do que efectivamente necessita e gasta com isso mais dinheiro do que possui dos seus rendimentos. Isto tudo porque somos uma sociedade de consumo desordenado, unicamente à procura do lucro e não da utilidade, baseada numa economia capitalista, mercantil, de concorrência e de luta, que visa retirar de cada um, um determinado valor que se designa por lucro. Até aqui tudo mais ou menos bem, seria melhor se no final, esse lucro fosse empregue na verdadeira melhoria das condições sociais gerais.

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  2. Drª Margarida Aguiar,

    Acho que a sua reflexão não é assim tão teológica; É antes, a meu ver, o quociente entre o que seria desejável e o indesejável, para uma fruição o mais feliz possível da caminhada deste lado, de todos nós.

    Permita-me ainda que lhe diga: as suas “pausas” contribuem, também, para as minhas reflexões.

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  3. Caro Bartolomeu
    Estou até em crer que uma boa parte das pessoas que estão nas filas para comprar a sorte não fazem a mínima ideia do destino das receitas dos jogos. Seria muito mais bonito se a participação nesses jogos fosse movida por um sentimento de solidariedade.
    É verdade que as pessoas compram muito além das suas necessidades. Vivemos uma época de consumo e desperdício. O grande problema é que vivemos para consumir e quando assim é entra-se numa espiral de loucura que acaba por trazer muita desgraça.

    Caro invisivel
    A imagem de quociente é perfeita. Mas a dificuldade está em saber o que colocamos no numerador e no denominador e qual a proporção em que o fazemos. O perigo é quando fazemos a divisão e o resultado vem zero ou infinito.

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  4. ...Que o numerador sejam composto por todos os "seus desejos".

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  5. Cara Margarida, o tempo hoje tem uma dimensão que nunca teve, resultado do progresso, que nos permite andar a toda a velocidade, ver mil coisas num espaço curto que dantes levaria anos ou uma vida inteira. Esse mesmo progresso na comunicação permite-nos saber ao segundo o que se passa em todo o lado, as mil e uma coisas que estão disponíveis para comprar, enfim, os horizontes alargaram-se tanto como a nossa capacidade para cobiçar tê-las, visitá-las, saber. Resulta tudo numa vertigem, como diz, parece que é tudo fugaz, não há tempo para saborear, para fruir, logo se parte para o momento seguinte. Com a idade, até porque essa capacidade de sofreguidão diminui, começa-se a dar valor a menos coisas, mas a coisas seleccionadas. E também a valorizar o tempo e a reflexão. O carrocel desacelera...Sem dúvida que o convívio entre gerações é essencial, para que não se percam referências, para que algum equilíbrio subsista, mas também para que os mais velhos continuem, através dos novos, a saber que outras coisas chegaram, que há novas coisas para aprender. Cada época da vida tem o seu encanto! Gostei muito do seu post,nem sempre temos o tal momento de pausa para pensar nisso...

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  6. Diz a Drª Suzana,
    (…) Com a idade, até porque essa capacidade de sofreguidão diminui, começa-se a dar valor a menos coisas, mas a coisas seleccionadas. E também a valorizar o tempo e a reflexão. O carrocel desacelera...Sem dúvida que o convívio entre gerações é essencial, para que não se percam referências, para que algum equilíbrio subsista, mas também para que os mais velhos continuem, através dos novos, a saber que outras coisas chegaram, que há novas coisas para aprender. Cada época da vida tem o seu encanto! Gostei muito do seu post,nem sempre temos o tal momento de pausa para pensar nisso (…)

    E eu digo:

    Vou reter deste comentário, a serenidade e a ausência de conflito, com que a autora encara, como muito bem diz a Drª Margarida Aguiar, a “loucura da montanha russa em que vivemos”.
    Permita-me ainda que lhe diga: acho que este comentário é uma grande ajuda para uma reflexão este tema.

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  7. Cara Margarida
    Antes de mais, em termos pragmáticos, gostei francamente do comentário do " Bartolomeu" a quem apresento os meus cumprimentos. É verdade tudo quanto diz, na certeza porém que eu sou dos tais que meço exactamente pelo " sofrimento", a qualidade de vida que digam o que disserem, está cada vez mais "alta" para uns e cada vez mais baixa para outros. É uma miséria social aquilo que relata, mas é verdade!

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  8. Suzana
    É verdade que cada época tem o seu encanto. Acrescentaria que cada idade tem o seu encanto, assim como tem os seus sonhos e as suas ilusões. Seria bom que todas estas diferenças pudessem viajar serenamente lado a lado, mas ao lado da montanha russa...

    Caro MaiKinho
    Seja muito bem vindo nesta pausa repousante. Aqui no 4R escrevemos, lemos, falamos, ouvimos, escutamos, conversamos, discutimos, aceitamos, discordamos, reflectimos e sonhamos com muita serenidade, procurando o distanciamento da montanha russa.
    Apesar da "...loucura da montanha russa em que vivemos..." é sempre possível reflectir sobre a simplicidade da vida. E com toda a serenidade...

    Caro antoniodasiscas
    "A loucura da montanha russa em que vivemos..." é causadora e arrasta muito sofrimento. Seria bom que os Homens pensassem mais nisto porque o progresso está realmente muito mal distribuído. É o que faz a loucura!

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