terça-feira, 18 de setembro de 2007

O insuportável preço da mediocridade


Com alguma ingenuidade - reconheço-o hoje - julguei ser possível dar conteúdo à ideia de "serviço público de televisão", única ideia que justifica a propriedade pública dos dois canais televisivos (já que a razão da neutralidade informativa a ninguém hoje convence e a garantia de pluralismo não é dever exclusivo das televisões públicas).
Há dias li, julgo que num dos jornais diários, que nos últimos 5 anos a RTP recebeu do Estado qualquer coisa como 1,2 mil milhões de euros .
Este número é o resultado de sucessivos aumentos no esforço que cada português faz para garantir a existência de uma televisão pública. Neste período (cinco anos) terá aumentado a taxa do audiovisual mais de 40%! E as indemnizações compensatórias, dinheiro alocado no Orçamento do Estado para remunerar o "serviço público" que teoricamente imporía sérias limitações à obtenção de proveitos, subiram mais de 50%!
Apesar destes aumentos a RTP continua a somar passivos.
Tenho hoje as mais profundas dúvidas sobre as vantagens do sector público português albergar uma televisão, com um canal público que seja. Não tanto pelo esforço que a todos exige ou porque as finanças públicas continuam de rastos. Mas sobretudo pelo que o Pinho Cardão testemunhou (desabafou?) aqui. Esperar-se-ia que o enorme custo de manter a RTP nas mãos do Estado tivesse como contrapartida uma programação melhor. Uma informação que não se pautasse pelo espectáculo pífio e deprimente, pelo sensionalismo e o imediatismo. Que fosse veículo de elevação do nível cultural dos portugueses.
Nada, porém, distancia a RTP (a 1, já que a 2, justiça seja feita, exibe alguma programação de qualidade) da SIC ou da TVI, em especial no que diz respeito à informação. As mesmas aberturas dos espaços informativos - sempre o que de pior tem a sociedade - , os mesmos alinhamentos, o mesmo padrão de entretenimento chocho, e sobretudo o mesmo alheamento de temas fundamentais para o nosso futuro colectivo e para a compreensão do mundo actual. A mesma aposta no telelixo, salvaguardadas excepções de raro bom gosto ou de elevado profissionalismo - que é justo reconhecer que o há na TV pública. A dificuldade de resistir ao voyeurismo dominante.

1200 milhões de euros seria, em qualquer circunstância, um montante astronómico face ao muito que há que fazer com os poucos recursos públicos. Mas assume uma proporção indecente em face da mediocridade que todo este dinheiro compra.

10 comentários:

  1. Caro JMFA,

    Um dia, há uns anos, alguém lançou a ideia que o espectro electromagnético não comportava mais que 4 canais. Estou quase certo que tal enormidade não teria nada a ver com o facto de os três concorrentes às duas licenças estarem ligados ao governo da altura, o de Cavaco Silva, mas sim a um qualquer devaneio marxista-leninista dos responsáveis de então. Mas o facto é que, passados estes anos, a ideia não só vingou como se tornou um pilar do mercado da comunicação social. Estou certo que o dia da liberalização será o dia em que todos teremos cabo de borla e, aí, o cabo "só vai poder ter 4 canais grátis".
    Mas o facto é que temos 4 canais. 4 canais não é, como a autoridade da concorrência poderia confirmar em 3 anos de estudos aprofundados, um mercado. Daí termos um(dois, mas um não é "comercial") canal do estado.
    Dos 2 privados, um é espanhol(como aqui se sublinhou durante algumas semanas) e o outro está em vias de ser. Será demasiado ter canais do estado? Não sei. Para já não me parece demais. A SIC e a TVI não são substancialmente diferentes da RTP, mas o contrário também é verdade. Ao fim do dia, dão-nos aquilo que nós pedimos. A qualidade é má? É, para mim, para si e, provavelmente, para muito mais gentemas não deve estar a defender que sejamos a comissão de definição de critérios qualitativos pela qual os nossos concidadãos se devem reger quando vêm televisão...

    Pois,... não foi só o governo do Guterres que nos deixou uma herança pesada. O escâdalo das licenças de emissão, quer de rádio quer de TV, que nos foi deixada pelo governo de Cavaco também nos vai afectar seriamente nos próximos anos. Falar em televisão sem pedir a liberalização das emissões, mandando para as urtigas as licenças, não me parece grande coisa porque há valores maiores a defender. Deixar de gastar dinheiro para pagar em falta de concorrência ou para estar a defender interesses estrangeiros não me parece grande solução. Quanto à qualidade, quando os nossos concidadãos quiserem, ela aparece. Por enquanto, estão distraídos a matar a Kate McCann.

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  2. Na senda do anterior post do Dº Pinho Cardão, com o título “Serviço Público de Televisão” este, vem alertar mais uma vez, para o mau serviço que a TV pública presta aos portugueses.
    Como comentei na altura – rir, nós rimos, mas pagamos para rir!.
    O facto é que esta situação dura há anos e, por conveniências dos vários actores do momento, parece-me que a mesma se vai manter indefinidamente.

    Assim, perante tal situação resta-nos, salvo melhor opinião, tomar a atitude de quem contribui (forçadamente) com uma esmola, sem olhar a quem!.

    Quantas vezes assistimos - às exigências, às reclamações, às reivindicações e, não raras vezes, às ameaças de boicote disto ou daquilo, de gente de aspecto vigoroso, cheia de saúde -, a quem o Estado, generosamente, deu uma casinha!?

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  3. Caros, como diria o Jorge Perestrelo "mas é disto que o meu povo gosta". Das TVI's e dos Correio's da Manha. De crime. De escandalo. Para preencher as suas vidinhas insignificantes. Anos e anos de analfebetização dá nisto: povos sem educação, sem cultura, sem critérios para discernir entre o bom e o mau; entre o correcto e o errado. Sem uma cultura de exigencia, de profissionalismo, de trabalho. Sem brio.

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  4. E tá tudo dito caro Almerindo!

    (Por acaso não é o presidente da RTP pois não? Senão deixa-va-lhe já umas dicas sobre a programação para o Natal :) )

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  5. Se o caro almerindo confirmar que é o presidente da rtp, leva já com umas cunhitas para encaixar as minhas sobrinhas que estão penduradas!

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  6. Caro Ferreira d'Almeida, apesar de tudo, acho que o canal 1 tem feito progressos, pelo menos prefiro ver esse a ver os outros (embora, em geral, evite ver todos). Por mim, apesar de corrir o risco de escandalizar o nosso amigo Pinho cardão, prefiro que haja uma televisão pública que nãopoderá deixar de ter uma programação minimamente concorrencial com as outras, sob pena de a factura ser ainda maior. Isto não quer dizer instrumentalizada ao poder político, note-se e sublinhe-se, não quero canais oficiosos sob a capa de canais públicos, mas que não vejo nenhum vantagem em privatizar tudo, isso não vejo, pelo menos podemos continuar a exigir que tenha um nível diferente dos outros e a reclamar quando ficam a milhas disso. Mas temos o direito de esperar isso deles, não creio que a solução para acabar com os encargos seja entregar tudo aos privados. Porque é que não se há-de ser capaz de fazer melhor, justificando o que lá se gasta?

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  7. Caros Ferreira de Almeida e Suzana:
    Contrariamente ao que se possa pensar, é possível possível, diria até, cada vez mais necessário, dar conteúdo à ideia de "serviço público de televisão", única ideia que justifica a propriedade pública dos dois canais televisivos, no dizer do Ferreira de Almeida.
    E tanto mais quanto o actual "serviço público" não se distingue do serviço privado. Para se ter telejornais no canal público a arrastarem-se por uma hora, no tempo nobre, praticamente com o mesmo alinhamento e os mesmos intervalos dos privados, de facto não vale a pena ter canal público. Se o tempo nobre é ocupado com concursos, alguns deprimentes, não vale a pena ter um canal público. Se, se, se...
    Poderia continuar.
    Para dar o mesmo ti+po de programação, de facto não vale a pena o canal público.
    Acontece que há outros conteúdos e, sobretudo, outros critérios de programação e de informação.
    Com os actuais critérios, é um desperdício de dinheiro, sem qualquer valor acrescentado.

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  8. Anónimo10:06

    Meus Caros Amigos:
    O post só pretendeu signficar que só faz sentido algo pertencer à esfera pública, sobretudo quando torna mais leves os bolsos dos cidadãos, quando em compensação isso se traduz num ganho para a comunidade.
    Honestamente, comparando as televisões que temos (que merecemos?) não sou capaz de dizer que o canal 1 da tv pública é qualitativamente melhor do que as restantes televisões. Então no plano informativo não o é objectivamente (salvo alguns momentos, fora do prime time em que, por exemplo, dá atenção ao País e não só aos escândalos fabricados para media alimentar; ou um programa de debate semanal que faz a grande diferença).
    É por isso pertinente que se questione o financiamento público. Se é para ser como as outras, e se porventura existem outras razões para manter a RTP na titularidade do Estado, então que seja o mercado a sustentá-la, que pugne pela sua sobrevivência como as outras o fazem.
    Há no entanto uma razão que, não me convencendo, pelo menos me sensibiliza que é a que a Suzana adiantou. É que mantendo-se pública, sempre podemos exigir que melhore. Sim, já não é mau...

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  9. Hesitei, seriamente, em entrar aqui com um comentario/opinião. O espaço é curto para uma verdadeira "discussão de ideias" que, para ser séria, levaria horas! Avanço pois alguns tópicos, com natural risco. Que que digam por exemplo que sou um defensor oficioso da RTP, que não sou, antes pelo contrário.

    1. A RTP é qualitativamente a melhor, em seu todo, no espectro televisivo; isto não significa que seja boa.
    2. Não há Informação de serviço público! Ou melhor, havia e há nos Estados totalitários. Informaçao/ jornalismo nem é publico, nem é privado. É bom, ou mau. E se o Jornalismo da RTP não é bom, e tem muito que se lhe diga, arrisco em dizer que é o melhor, num balanço total!
    3. Quando falamos de serviço público de TV, e dos seus custos, falamos de 6 canais ( RTP1, RTP2, Internacional, Africa, RTPN, RTPMemoria).
    4. No serviço público englobam-se responsabilidades de Cooperaçao com os paises de Lingua Portuguesa, delegaçoes de informação e cooperaçao, onde os privados, naturalmente por razões económicas não apostam, não gastam: - como Timor, Guiné, Moçambique, etc etc...Isto não é uma opção da RTP, mas uma questão de Estado. Porém, o custo é imputado à Empresa Pública, e este nas comparticipações do Estado.
    5. No serviço publico limita-se a publicidade a 6 min/ hora, quando os privados podem ir aos 12, e atingem os 14min.
    - no serviço publico englobam-se, por exemplo, manutenção de arquivos e responsabilidaes varias no apoio ao cinema e à produção portuguesa que, por muito que os privados publicitem o contrário, nada tem a ver com os custos da RTP;
    6. quando se fala de excepções na programaçao ou Informaçao da RTP, pergunto se as excepções são programas de debate semanais, grande entrevista, programas de debate c/ representaçao parlamentar, series historicas ou de época (não 2 ou 3 horas, mas várias, semanais)!!? Há desses programas em canal aberto, repito, canal aberto, regularmente,em algum canal privado?
    7. Deve o Estado admitir que, num imponderável qualquer do mercado, fiquemos com 2 ou 3 canais puramente comerciais,pertença de grupos estrangeiros? Num país tão pequeno como o nosso pode correr-se tal risco? Não será o Serviço Público de TV essa reserva?
    8. Há quem diga que deixemos o mercado gerir...!!! Pois, mas o mercado leva sempre à primazia do telelixo e do mais primário! O público não é exigente, e prefere um medíocre programa de entretenimento, a um qualquer programa de reflexão ou documental, ou a um entretenimento minimamente qualificado! Por mais que certas sondagens ou auscultações digam o contrário! Disso sou testemunha!Queremos defender-nos de tal?
    9. Li por aí que se deveriam dar hipoteses a outros operadores e/ou novos canais! Sabemos que, quando abriu o sector ao privado, e a primeira foi a SIC, houve uma enorme expectativa!!! A privada vinha, pela concorrência, trazer sangue novo. E trouxe, é verdade! Ate ao dia em que foi necessário pagar a primeiras factura e o dinheiro não chegava! Aí o mercado não respondia. A TVI, que aparecera pouco depois, nasceu e entrou, de imediato, em crise. A SIC naõ tardou a ir pelo mesmo caminho das dificuldades,quando a TVI, usando todos os trunfos perante o mercado pouco exigente,( como emblema os "célebres Big Brothers") começou a recuperar! Valeu que a RTP não foi o carrasco dessas privadas porque o Estado, pagando a RTP, salvava, vejam lá, as próprias privadas. Como acontece ainda hoje. Mas se mais algum canal surgir no mercado, alguem vai morrer. E se o mercado fôr, apenas, de 3 privadas as 3 entrarão, logo, na Rua da Amargura! Salve-se uma! Que o Estado salve uma!
    Por tudo isso acho que um empresa de serviço público tem de existir. Porque a TV continua a ser um meio essencial de cultura, comunicação, divulgaçao. E como diz a Suzana: ao menos havendo uma empresa pública vamos tendo hipotese de, por todas as vias, até a politica, exigir uma TV PORTUGUESA.
    Sei que ficou aqui uma amálgama de ideias e de razões. Bom era mesmo conversar sobre elas durante uma tarde. Só aí poderiamos esgrimir todos os argumentos, com mais rigor. Mas, fica um contributo. Simples e escasso, mas que tentei fosse o mais objectivo possível, mediante a factualidade que é o nosso país, o nosso mercado e a nossa cultura. Nada mais que isso.

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  10. Anónimo23:49

    Meu caro RuiVasco:
    Nunca hesite em comentar. Nestes ou outros assuntos, mas nestes especialmente.
    A polémica quando feita de troca de ideias é sempre boa e estimulante.
    Entendo muito do que argumenta, em especial o que faz da RTP uma televisão de serviço público para além da programação. Mas é sobre esta que emiti uma modesta opinião de consumidor. E volto a dizer que, honestamente, não vejo qualquer diferença substancial. E não vendo hoje qualquer diferença entre as estações não sei se o conceito é justificação para canais públicos directamente concorrentes com as tvs privadas. Vou mais longe. Em matéria informativa, se serviço público significa como diz "cultura, comunicação, divulgaçao" então há que reconhecer que a SIC e em especial a SIC Noticias, exibem produções algumas de nível bem superior aos da televisão pública.
    Quanto à necessidade de debater estes assuntos em forum que permita outro desenvolvimento das ideias, quem sabe se o 4R um destes dias não faz a surpresa de proporcionar esse espaço, fora do mundo virtual e com muito mais deafogo? Onde a presença do RuiVasco será, como se percebe pelo comentário, indispensável.

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