Um dos maiores erros políticos do Governo de Santana Lopes consistiu, em minha opinião, em fazer aprovar o Orçamento para 2005 já depois de o ex-Presidente Sampaio ter anunciado a dissolução da A.R.
Recordo-me ainda de uma dramática reunião do Grupo Parlamentar do PSD já no final de 2004, na qual chamei a atenção, de forma veemente, para os enormes riscos de tal opção.
Em linguagem simples, tal opção seria equivalente, na minha perspectiva, a “oferecer o ouro ao bandido”.
Em vão!
Insistiram na ideia, segundo os seus arautos com fundamento na necessidade de dar ao País uma imagem de responsabilidade e de credibilidade…O País saberia, com certeza, retribuir esse gesto nas eleições que se seguiriam…
Foi o que se viu.
Com o Orçamento aprovado, ficou a vida do novo Governo (o actual) imensamente facilitada: depois de acusar o documento aprovado de todas as falsidades e omissões, o Governo só teve de chamar uma equipa de Cozinheiros - liderada pelo “Cozinheiro Chefe” que já havia sido contratado por Durão Barroso e Ferreira Leite em 2002 para rectificar o cozinhado orçamental de 2001 – com vista a refazer o documento, acrescentando-lhe toda a despesa que fosse possível encontrar na dispensa, nos armários, nas arrecadações, no quintal dos vizinhos, etc.
Assim foi possível chegar a um “excelente” défice de 6,83% do PIB, bem temperado com azeite e vinagre, tendo servido de pouco os protestos indignados do anterior Ministro das Finanças, Bagão Félix, que pretendeu demonstrar que a operação era (e era mesmo) pouco séria do ponto de vista técnico-culinário.
Passaram 3 anos e pareceria recomendável e do mais elementar “fair-play”, antes de se dar por arrematada a redução do défice ao “plafond” de 3% estabelecido pela União, que as contas fossem objecto de uma intervenção culinária semelhante à que foi realizada em 2005, para se obter um resultado comparável.
É bem possível, usando método equivalente, que o défice de 2007 subisse para 4% do PIB ou até mais, se dermos crédito às chamadas de atenção do Tribunal de Contas para o crescimento das desorçamentações em 2006 que por certo tiveram continuidade – “carry over” e novas operações – em 2007.
Acontece que o “Cozinheiro Chefe” contratado em 2002 e 2005 já veio felicitar o Governo, em termos estridentes, para o grande feito da redução do défice de 2007 ao “plafond” europeu...mesmo em versão antecipada, sem necessidade tampouco de saber o que vai ser a execução dos últimos 4 meses do ano (e para quê, se o défice está encontrado?).
Assim, a sugestão de nova revisão do défice, com aplicação de receita idêntica à de 2005, esbarra aparentemente na dificuldade de o “Cozinheiro Chefe” estar publicamente comprometido com o serviço do défice de 2007, sendo-lhe difícil (nesta altura) oferecer os seus préstimos para modificar o produto...
Mas não será de excluir que, perante uma alteração das circunstâncias, dentro de um a dois anos esse mesmo “Cozinheiro Chefe” possa vir a mostrar-se disponível para presidir a mais uma operação culinária de rectificação de défices, concluindo a final que os de 2007, 2008, etc, bem vistas as coisas também deixaram muita despesa na dispensa e demais compartimentos.
Quem já serviu a dois senhores não pode sempre servir a um terceiro?
Caro Tavares Moreira,
ResponderEliminarLeio este seu "post" e não posso deixar de ficar ainda mais confuso com o que leio nos comentários feitos à volta deste Orçamento.
Eu, que nunca me perdi nos meandros da administração pública, pasmo como é que gente que deveria ser minimamente responsável não quer acertar uma coisa que, para mim, ingénuo me confesso, seria, se a honestidade de processos assim quisesse, uma coisa muito simples: definir critérios e conceitos obrigatórios na contabilização das contas públicas.
Por várias vezes já, escrevi nas minhas palavras cruzadas,que me pareceu (e parece) indigno o papel a que se prestou Vitor Constâncio.
Se Vitor Constâncio tivesse feito jus ao prestígio que o aureolava deveria ter rejeitado a incumbência. Poderia, isso sim, e teria prestado um serviço ao país, se se tivesse disponibilizado para participar, em tempo útil, na definição de critérios e conceitos, a partir dos quais todos poderiam intrepretar (sem sofismas nem habilidades) as contas públicas.
Assim continuamos a assistir com frequência que enjoa às bolandas em que andam as contas públicas em Portugal.
Desorçamentar, por exemplo, passou a ser uma forma original de orçamentação e ninguém vai poder fazer nada contra isso. Pelos vistos.
Bem visto, caro Rui.
ResponderEliminarO Orçamento é mesmo uma caldeirada, onde cada cozinheiro mete a colher e onde cada vez mais custa a distinguir a qualidade do peixe!...
Esta história da redução do Défice para 3% em 2007 é uma grande patranha.
ResponderEliminarÉ que não é crível que num ano o governo consiga descer o Défice real de 5,3% para os 3% do PIB.
Pois é, é que o Défice real de 2006 não foi de 3,9% mas de 5,3%. Querem ver como, então aqui vai (bem haja Pinh Cardão);
Aos fictícios 3,9% haverá que juntar o valor em percentagem do PIB das receitas extraordinárias, a saber: antecipação de impostos sobre o tabaco (300 milhões), vendas de património (439 milhões), dividendos extraordinários e antecipados (REN-60 milhões), dividendos extraordinários (GALP-124 milhões, recuperações de créditos líquidas de adicionais da operação de titularização (1.198 milhões), o que dará, tudo somado 1,4% e assim para valor real do Défice, 5,3% do PIB.
Mas este já de si valor astronómico do Défice (superior ao de 5,2%, com receitas extraordinárias, de Bagão Feliz em 2004) foi obtido em situações muito diferentes das de 2004.
Se quisermos fazer o exercício de comparar o Défice de 2004, último ano de gestão PSD/CDS com o de 2006, haverá que acrescentar ao valor do Défice de 2006 as “outras receitas extraordinárias” como sejam o aumento de dois pontos percentuais do IVA (19% para 21%) e que traduz uma receita de 1,1%% do PIB, o valor arrecadado com todos os outros aumentos de impostos que o governo de Sócrates impôs, as “receitas” provenientes dos aumentos das taxas moderadoras e de todos os outros Cortes Sociais, encerramento de maternidades, SAPs, etc que, estimando por baixo, muito por baixo, daria 0,5% do PIB, e assim tudo somado encontraríamos para o Défice Real de 2006, obtido em condições idênticas às de 2004, o valor astronómico de 6,9%%.
Quanto À meta dos 3%, aconselho ver o sketch do Gato Fedorento referente (abrindo este link, é a 4a pelicula da direita. Vale a pena).
ResponderEliminarOrçamento após Orçamento, a borrada continua na mesma. Não se corta na despesa.
Até quando vamos ter q esperar q empresas publicas mal geridas sejam privatizadas? Até quando os ministros vao ter uma quantidade tal de assesores que nem eles proprios sabem para que servem? Até quando vamos ter que aguentar com obras megalómanas (Otas, TGVs, etc...)? Até quando o Governo cira condições para os privados absorverem o desemprego, ao invés do "Estado social"?
Saudações Republicanas
Meus Caros Comentadores,
ResponderEliminarTudo o que dizem terá o seu fundamento, com certeza, mas não esqueçam o rasgado elogio do Cozinheiro Chefe ao défice de 3% PIB em 2007 muito antes mesmo deste estar apurado!
Não há nada como ser um grande Cozinheiro Chefe, para adivinhar o resultado e a qualidade do cozinhado, quando este ainda está ao forno!
Ou então, uma fé inquebrantável em quem nos governa!
Em qualquer dos casos é bonito e revelador de uma independência modelar, à "prova de bala", capaz de resistir a qualquer forma de pressão política.
Caros Tavares Moreira,
ResponderEliminarO Cozinheiro Chefe deve estar perto de acertar, pela primeira vez, uma previsão sem ser dois meses depois dos factos ocorridos. Está bem, o défice de 3% não se pode dizer que seja facto( é mais como o Natal, é aquilo que um homem quiser) mas, bolas, andam aqueles modeladores de regressões todos há carradas de anos em busca de um numerozinho que batesse lá perto e agora, que quase lá estão, o homem tinha que festejar. É um golo na própria baliza mas, bolas, não deixa de ser um golo!