O nosso país não anda bem e tenho algumas dúvidas se alguma vez andou, tirando aqueles períodos ditos nobres e, mesmo assim, não sei!
É pobre e vai continuar a ser pobre. Todos os esforços feitos nos últimos tempos tem-nos empurrado um pouco para a frente, mas os outros também sobem e parece que cada vez se distanciam mais de nós. Resta-nos a consolação – pobre consolação! – de vermos que povos mais miseráveis sofrem desesperadamente para poderem sobreviver com o mínimo de dignidade. Face a estes até nem deixamos de ser um paraíso.
A vida, no seu contínuo trajecto, é repleta de pequenos acontecimentos que nos moldam e que nos fazem reflectir e até filosofar. A situação económica dos portugueses não é das melhores e tende a agravar-se. Em contraste, anunciam-se tantas e tão dispendiosas obras que é legítimo perguntar: valerá a pena desviar dinheiro para estas, quando falta dinheiro para outros tipos de investimentos em que a saúde, a protecção social, a educação, a investigação e a cultura deveriam ser prioritários?
Também tenho dúvidas sobre a forma como são feitas as distribuições do orçamento do estado por muitas instituições públicas. A lógica da poupança é relevante e deve ser respeitada como um sinal de respeito dos cidadãos. Mas, às vezes, as coisas são um pouco anedóticas. Vejamos o caso de um instituto tão importante como o INAG (Instituto Nacional da Água). As suas funções, como Autoridade Nacional da Água, são muito relevantes mas parece que não consegue cumprir com muitas das suas funções, argumentando falta de disponibilidade financeira. Claro que também está sujeito “democraticamente” aos cortes orçamentais, a par de outras instituições.
Coimbra, como qualquer outra localidade que tenha “água”, tem alguns conflitos com esta instituição, e sempre por falta de verbas. Após várias interpelações que fiz, enquanto Provedor do Ambiente e da Qualidade de Vida Urbana de Coimbra, acabei de receber respostas às mesmas. Uma delas, dizia respeito à limpeza das margens do rio Mondego, entre o Açude – Ponte de Coimbra e a Ponte de Santa Clara.
A reposta é curiosa e não resisto a transcrevê-la:
“Esta questão põe-se só relativamente à margem esquerda do rio, uma vez que na margem direita as margens são praticamente em paredão de alvenaria vertical.
A vegetação infestante que existe nos taludes em alvenaria da margem esquerda é constituída essencialmente por silvas. Este instituto não dispõe actualmente de meios para efectuar desmatações, quer físicos, quer financeiros.
No entanto de pouco serviria efectuar o corte das silvas pois, como não é possível serem arrancadas pela raiz sem danificar o revestimento de protecção do talude em alvenaria, rapidamente as silvas voltariam a crescer e ainda a robustecer-se, a não ser que se aplicassem produtos químicos, o que está fora de questão dada a sua localização. De salientar que esta questão é um aspecto essencialmente estético não ocasionando problemas ambientais.
Este instituto tem neste momento em fase de adjudicação uma prestação de serviços de trabalhos de “Vigilância, operação e manutenção”, no âmbito da qual poderão ser realizadas acções de corte das silvas periodicamente. No entanto, como atrás exposto, de pouco servirá dado que rapidamente as silvas se desenvolvem novamente.”
Bom, seguindo este raciocínio então não vale a pena limpar as matas, porque as silvas voltam a nascer. A não ser que, neste caso, por estarem perto da água, não corremos riscos de incêndio. Também me ponho a pensar se valerá a pena cortar o cabelo ou as unhas, porque vão crescer novamente. Ficamos feios, mas não passa de um problema meramente estético.
Afinal, limpar ou desmatar o país de “silvas ou quaisquer outros infestantes” – e são tantos, infelizmente, os responsáveis pelo estado a que chegamos – está votado ao insucesso, porque voltam a nascer. A minha dúvida é se não provocam mesmo problemas ambientais, porque problemas sociais provocam com toda a certeza...
Portugal país de silvas...
É pobre e vai continuar a ser pobre. Todos os esforços feitos nos últimos tempos tem-nos empurrado um pouco para a frente, mas os outros também sobem e parece que cada vez se distanciam mais de nós. Resta-nos a consolação – pobre consolação! – de vermos que povos mais miseráveis sofrem desesperadamente para poderem sobreviver com o mínimo de dignidade. Face a estes até nem deixamos de ser um paraíso.
A vida, no seu contínuo trajecto, é repleta de pequenos acontecimentos que nos moldam e que nos fazem reflectir e até filosofar. A situação económica dos portugueses não é das melhores e tende a agravar-se. Em contraste, anunciam-se tantas e tão dispendiosas obras que é legítimo perguntar: valerá a pena desviar dinheiro para estas, quando falta dinheiro para outros tipos de investimentos em que a saúde, a protecção social, a educação, a investigação e a cultura deveriam ser prioritários?
Também tenho dúvidas sobre a forma como são feitas as distribuições do orçamento do estado por muitas instituições públicas. A lógica da poupança é relevante e deve ser respeitada como um sinal de respeito dos cidadãos. Mas, às vezes, as coisas são um pouco anedóticas. Vejamos o caso de um instituto tão importante como o INAG (Instituto Nacional da Água). As suas funções, como Autoridade Nacional da Água, são muito relevantes mas parece que não consegue cumprir com muitas das suas funções, argumentando falta de disponibilidade financeira. Claro que também está sujeito “democraticamente” aos cortes orçamentais, a par de outras instituições.
Coimbra, como qualquer outra localidade que tenha “água”, tem alguns conflitos com esta instituição, e sempre por falta de verbas. Após várias interpelações que fiz, enquanto Provedor do Ambiente e da Qualidade de Vida Urbana de Coimbra, acabei de receber respostas às mesmas. Uma delas, dizia respeito à limpeza das margens do rio Mondego, entre o Açude – Ponte de Coimbra e a Ponte de Santa Clara.
A reposta é curiosa e não resisto a transcrevê-la:
“Esta questão põe-se só relativamente à margem esquerda do rio, uma vez que na margem direita as margens são praticamente em paredão de alvenaria vertical.
A vegetação infestante que existe nos taludes em alvenaria da margem esquerda é constituída essencialmente por silvas. Este instituto não dispõe actualmente de meios para efectuar desmatações, quer físicos, quer financeiros.
No entanto de pouco serviria efectuar o corte das silvas pois, como não é possível serem arrancadas pela raiz sem danificar o revestimento de protecção do talude em alvenaria, rapidamente as silvas voltariam a crescer e ainda a robustecer-se, a não ser que se aplicassem produtos químicos, o que está fora de questão dada a sua localização. De salientar que esta questão é um aspecto essencialmente estético não ocasionando problemas ambientais.
Este instituto tem neste momento em fase de adjudicação uma prestação de serviços de trabalhos de “Vigilância, operação e manutenção”, no âmbito da qual poderão ser realizadas acções de corte das silvas periodicamente. No entanto, como atrás exposto, de pouco servirá dado que rapidamente as silvas se desenvolvem novamente.”
Bom, seguindo este raciocínio então não vale a pena limpar as matas, porque as silvas voltam a nascer. A não ser que, neste caso, por estarem perto da água, não corremos riscos de incêndio. Também me ponho a pensar se valerá a pena cortar o cabelo ou as unhas, porque vão crescer novamente. Ficamos feios, mas não passa de um problema meramente estético.
Afinal, limpar ou desmatar o país de “silvas ou quaisquer outros infestantes” – e são tantos, infelizmente, os responsáveis pelo estado a que chegamos – está votado ao insucesso, porque voltam a nascer. A minha dúvida é se não provocam mesmo problemas ambientais, porque problemas sociais provocam com toda a certeza...
Portugal país de silvas...
Meu caro Professor, o problema do INAG é igual ao problema de todas as instituições que integram a orgânica do ambiente em Portugal: uma enorme distância entre o discurso político e a praxis.
ResponderEliminarBruxelas divulgou esta semana um estudo comparativo acerca dos investimentos no ambiente. Portugal, como se percebe mesmo sem qualquer estudo, está nos últimos lugares dos países comparados.
Achamos que são luxos a conservação dos nossos recursos naturias, a protecção das nossas paisagens, os cuidados com a diversidade biológica.
Outros consideram isso uma aposta elementar no futuro. Não por acaso esses estão no pelotão da frente, aquele pelotão onde o discurso político sempre nos situa mas que a realidade das coisas empurra bem cá para trás.
O tempo que assentou sobre os factos permite, com alguma serenidade, contar alguns episódios da minha episódica passagem pelo governo, período em que exerci a tutela, entre outros organismos, sobre o INAG e sobre o então Instituto da Conservação da Natureza. Na discussão do Orçamento do Ministério, as verbas mais difíceis de obter (aliás, magras e manifestamente insuficientes) foram, se bem me lembro, três. Uma, foi justamente a destinada à limpesa das linhas de água. As outras foram as destinadas às indemnizações devidas pelos prejuízos causados pelos lobos e para a segurança de barragens.
Há claramente dois modelos distintos - que não necessariamente antagónicos e insusceptíveis de harmonização.
Um, que é o que prevalece, tudo mede pelo produto, tudo submete ao PIB.
Outro, que olha para outros indices de que depende a qualidade de vida numa optica de sustentabilidade.
Quem opta pelo primeiro, naturalmente rejubila quando o PIB cresce umas décimas, ainda que o País se atole no mais denso silvado!
Como se diz na minha terra, assim vamos indo...
Uma nota final, esta de discordância com o meu Ex.mo Amigo.
Não creio que tenhamos sido condenados a ser pobres. Pelo menos se o fomos, a decisão não trnasitou em julgado e é reversível. Haja capacidade de ver.
Caro Professor Massano Cardoso:
ResponderEliminarNão há dúvida que esta resposta do INAG é esperta como as silvas!
Faço votos de que, no mínimo, percebam alguma coisas de recursos hídricos, porque de silvados não percebem nada! Até desconhecem que é debaixo deles, junto a cursos de água, que se protegem roedores portadores de doenças diversas…
Mas,infelizmente, gente como esta que julga saber tudo está espalhada por todo o lado, e quase sempre com poderes de decisão…
Caro Professor MAssano Cardoso e Dr. Ferreira de Almeida,
ResponderEliminarHá, por vezes, necessidades de limpezas das ribeiras mas há, muitas mais vezes, necessidade de explicar por que razão deve ser feita em concreto uma determinada limpeza de ribeiras ou margens de rios.
Se de facto estamos a falar de margens urbanas de rios que se acha que ficam feias com as silvas, pois eu também acho que não são uma prioridade para a gestão dos recursos hídricos. Podem sê-lo para a gestão urbana (muitas vezes tenho dúvidas) mas nesse caso que seja a gestão urbana a pagar essa gestão da margem.
Vale a pena atender ao facto de que a generalidade das artificializações das margens colocam problemas de gestão a sistemas complexos que necessitam de flexibilidade na sua envolvente como são os rios.
Quanto à referência à questão das indeminizações do lobo vale a pena ir um pouco atrás no tempo.
A lei de protecção do lobo é uma lei da Assembleia da República. Acontece que os Senhores Deputados atribuíram uma série de novas responsabilidades ao ICNB (e seus antecessores) sem que afectassem quaisquer meios adicionais para a sua execução. Quer numa norma geral da lei que identificasse a fonte de financiamento das indeminizações, quer todos os anos quando aprovam o orçamento do Estado (que é bom não esquecer que é uma responsabilidade dos Senhores Deputados). Mais tarde, no dia 5 de Junho de 1996 o Governo de então resolveu atribuir 10% das receitas da caça para este fim, embora não o explicitasse (a então Presidência do ICN tinha explicitamente afirmado que não iria fazer investimentos porque iria pagar as indeminizações aos pastores que nessa altura já chegavam aos cinco anos de atraso, por achar imoral usar o dinheiro da conservação para fazer infra-estruturas para os visitantes com o argumento de que dessa forma se perderiam investimentos comunitários ao mesmo tempo que forçava os mais pobres dos pobres a emprestar dinheiro ao Estado sem juros). Independentemente destes 10% não serem suficientes, como os montantes de dotações de funcionamento eram ridiculamente baixas (as dotações em orçamento de funcionamento eram abaixo das obrigações contratuais do Estado para com os seus trabalhadores do quadro) o ICNB acabou por usar essas taxas da caça como todas as outras receitas próprias pensando eu que sou o único que ainda se lembra da sua origem, o que se explica por ter sido também eu a fazer a proposta.
Do mesmo modo nunca em tempo algum foi criada uma área protegida com a dotação de recursos que ela naturalmente implica.
E sendo assim...
henrique pereira dos santos
Só duas notas ao que comentou, meu caro HPS. A limpesa das margens em troços urbanos não se faz só por razões de estética urbana. Faz-se também por razões de segurança. Estou de acordo que possam ser as autarquias a ocupar-se disso. Mas para que o façam é necessário que a lei proceda à translacção dessa responsabilidade com a necessária transferência de meios financeiros.
ResponderEliminarO que escreveu a propósito da indemnização dos lobos (não sabia da consignação das receitas da caça, o que me parece uma execelente ideia), aplica-se a quase todos os domínios das políticas ambientais e muito em especial no que respeita à conservação da ntureza e à protecção da biodiversidade. Fica sempre bem a qualquer governo acrescentar mais umas incumbências ao Estado. O problema chega na hora em que se percebe que essas incumbências têm um custos.
Caro Ferreira de Almeida,
ResponderEliminarQuanto ao primeiro comentário uma precisão de burocrata: eu falei em responsabilidade de pagamento o que não me parece que necessite de uma alteração legislativa. Seria talvez melhor que existisse mas é possível uma melhor definição de responsabilidades sem alteração da legislação.
Quanto ao segundo aspecto estou inteiramente de acordo consigo. Aliás é em parte por isso que há anos que defendo que a criação de áreas protegidas deveria ser competência da Assembleia da República. A outra parte é porque estamos a falar de um património nacional que deveria ser assumido pela Assembleia e não pelo Governo (como acontece, por exemplo, nos Estados Unidos há mais de cem anos, desde o primeiro Parque Nacional do Mundo que foi criado por decisão do senado americano).
henrique pereira dos santos