sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

TGV

A Dr.a Manuela Ferreira Leite (MFL) veio definir a oposição do PSD aos projectos de investimento público de rendibilidade não demonstrada ou de rendibilidade negativa mais que certa, nestes incluido o TGV. Saúda-se esta clarificação.
Como era de esperar, o embaraço do governo foi notório, e expresso, logo nos noticiários da manhã, pelas declarações inflamadas do ministro Mário Lino. O mal estar no partido da situação foi acentuado com a dolorosa declaração do guru João Cravinho que qualificou de ruinoso o investimento na linha Lisboa-Madrid.
Sem surpresa, o senhor Ministro das Finanças veio agora tentar desdramatizar dizendo que a coisa não tem impacto em 2009, pelo que a líder do PSD tinha suscitado "uma falsa questão".
Falsa visão é aquilo que o Ministro Teixeira dos Santos quer transmitir, procurando fazer passar a ideia de só haveria problema se o impacto financeiro se fizesse sentir neste ano. O ex-ministro Cravinho e administrador do BERD já se encarregou de explicar que não é assim como o ministro diz.
Aliás, o ministro das Finanças não responde a MFL. Quer dar a ideia de que o faz, desviando-se da questão numa técnica muito experimentada pelos actuais governantes.
A questão, como MFL bem a colocou, está no impacto que tem no futuro o envolvimento de vultosos meios públicos que deveriam reverter a favor de políticas que estimulassem a produção. Está no aumento do endividamento que o projecto (se avançar...) vai provocar, uma vez que a taxa de incorporação de importações é elevadíssima. Como é elevadíssimo o comprometimento de recursos públicos, ao contrário do que tenho ouvido da boca de alguns responsáveis do PS.
Recorde-se o essencial do modelo para perceber a falácia do governo e de quem o apoia quando se refere aos meios a envolver.
O troço do TGV Lisboa-Madrid actualmente em fase de negociação, entre Poceirão e a fronteira com Espanha (Caia), foi colocado no mercado com base nos seguintes pressupostos, que a crise actual provavelemte desajustou:
(a) subsídio ao investimento de cerca de 137 milhões de euros.
(b) 60 milhões de euros de subsidiação à linha convencional de mercadorias, do Porto de Sines até Caia, em parte paralela à de AV, mas incluída na parceira em concurso.
(c) 600 milhões de euros de fundos comunitários.
(d)componente de investimento privado não superior a 47% do encargo total do investimento.
(e) 50% do investimento inicial (fase da construção) garantidos por fundos públicos.
(f) 1/3 dos pagamentos à futura concessionária ocorrerão logo na fase da construção, estando a adjudicação está prevista para o 3º trimestre de 2009.
Mas o impacto do consumo de recursos públicos sem retorno é agravado pelos quase certos deficites de exploração ao longo da vida do projecto. Sobre isso, remeto para o que o Pinho Cardão aqui escreveu.
Só acrescento que, baseando-se o modelo de remuneração na disponibilidade da infra-estrutura, pouco peso terão as receitas de exploração. E sendo assim, pouco importa o número de passageiros (que aliás, nos primeiros anos, salvo erro, pelos cálculos fantásticos da RAVE, andarão pelos 6 milhões e picos/ano).
Perante estes dados, alguém tem dúvidas que, para além do benefício ficar muito aquém do custo, o peso na despesa pública só deste projecto, na próxima legislatura, será enorme? E é compatível a aposta em investimentos de rendibilidade negativa com o prometido crescimento económico já em 2010?

11 comentários:

  1. Falta agora perceber-se o que é a rentabilidade de um investimento público e, principalmente, a rentabilidade de quem...

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  2. Anónimo23:46

    Compreendo a objecção. Mas concordará que, pelo menos, nestes casos (e em especial nesta conjuntura) seja legítimo exigir que os projectos se paguem a si próprios durante a sua vida, ou que se evidencie que outros ganhos económicos ou sociais compensam o diferencial entre o custo e o retorno económicos efectivos.

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  3. Caro Ferreira de Almeida:
    Muito bem.
    Querer fazer neste momento o TGV é megalomania louca e completa irresponsabilidade.
    O que sabemos do TGV é pouco, mas esse pouco chega para reprovar liminarmente o projecto.
    Diz-se que perdemos fundos. Não sei se é verdade. Mas, se o fosse, uma negociação não permitia recuperá-los?
    Por que é que o Governo não diz estas duas ou três coisas simples:
    -quanto é que custa o investimento a cada português?
    -quanto é que irá custar a cada português a manutenção da via?
    -quanto é que irá custar a cada português a exploração do TGV, mesmo que nele nunca viaje?
    -qual o valor da incorporação nacional e estrangeira?
    -que responsabilidades os portugueses assumem nos project finance ou, indirectamente, nas parcerias?
    -qual o verdadeiro e real benefício?
    -onde vai arranjar 9.400.000 passageiros por ano? Número quase igual ao dos portugueses...

    Quando e se responder a contento e de forma esclarecedora, poder-se-á compreender se os loucos somos nós ou louco está o Governo.

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  4. Caro JMFA,

    Se eu construir uma autoestrada exactamente ao lado da A1 e destruir a A1, tenho a certeza absoluta que o investimento se pagará a si próprio, quanto mais não seja porque a necessidade da A1 continua lá. No entanto, o país iria à ruína.

    Investimento público é educação, saúde e segurança. O resto não vale nada porque, se valesse, estava feito ou, melhor, ninguém precisava de me pedir nada para o fazer. Eu posso construir um projecto fantástico sem valor económico nenhum a dar um lucro fantástico, basta obrigar as pessoas a pagar-me. Não há, em NENHUM dos projectos anunciados pelo Lino, um único que tenha qualquer valor económico. Unzinho para servir de amostra. Por isso continuo sem entender a fixação no TGV.

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  5. Anónimo00:23

    Caro Ferreira de Almeida, fez a pergunta mais interessante em todo este contexto. Será que Portugal conseguirá ter ganhos economicos e sociais que compensem as perdas financeiras globais do projecto? É que essa é a realidade em Espanha, França, Alemanha, etc. Mas são economias e mobilidades muito diferentes.

    Entretanto em Espanha as declarações de Manuela Ferreira Leite já estão a dar bastante brado dados os compromissos assinados entre os dois países para as ligações Vigo - Porto mas, e muito em particular, Lisboa - Madrid. Sobre o tema pronunciaram-se hoje Anton Louro do PSOE, Andres Ayala do PP e Francisco Rodrigues do BNG (Bloco Nacionalista Galego). Para Espanha, se Portugal não construir a linha até à fronteira do Caia, ao haver um menor número de comboios a usar a linha daí a Madrid haverá sensiveis alterações às projecções feitas para o retorno do investimento feito nessa linha.

    Vejamos as cenas dos próximos capitulos. Com jeitinho, com jeitinho, ainda acabamos com um comboio de alta velocidade muito bonito... mas sem passageiros porque o dinheiro para pagar a passagem foi confiscado pelo Estado sob a forma de impostos.

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  6. Caro Drº Ferreira de Almeida:
    O seu post revela a preocupação que as pessoas de bom senso têm sobre a matéria nele versada. Por isso os meus singelos parabéns.
    Permita-me, caro Drº Pinho Cardão, que elogie o seu comentário porquanto, o mesmo indica de forma muito perceptível, mesmo para os leigos como eu, os critérios de ponderação que deviam assistir a todas as decisões sobre investimentos públicos que comprometam gerações futuras, excluindo-se obviamente, todos os investimentos que pela sua natureza tenham a ver com a “sobrevivência” do próprio Estado que, na sua essência, são alguns dos que o caro tonibler muito bem exemplifica: - “Investimento público é educação, saúde e segurança.”
    Caro Drº Ferreira de Almeida:
    Quanto mais leio e mais controvérsia observo sobre estas matérias, mais eu penso que o melhor para o País seria que todos os investimentos públicos em que os custos transitem para as gerações futuras, deviam ser aprovados por maiorias qualificadas. A isto chamo eu: responsabilidade. E não me venham argumentar que isso diminuía os poderes dos governos…
    Agora o que não é normal, o que não é digno, e o que não é legítimo, é um pai deixar como herança dívidas aos filhos…

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  7. Caro JMFAlmeida

    Um "pequeno" comentário.
    andamos todos a falar do financiamento e da futura rentabilidade do projecto, por aquiolo que conheço do projecto posso garantir-lhe uma coisa já: não estamos a falar de TGV, mas sim de Alta Velocidade, (veja o plano espanhol e confirme a asserção);
    com o actual traçado, tal como está delineado, uma viagem até Madrid não se fará em menos de 3.5 horas e meia, logo sem poder concorrer com o avião:
    Com uma velocidade máxima de 220 hora, e um traçado que tem uma extensão de +/- 650 kms, não vamos ter TGV para Madrid, mas os cacerenho e os habitantes de badajoz, vão ter uma linha de comboio moderna a um preço muito atractivo.
    Seremos uns parceiros simpáticos neste negócio.
    Cumprimentos
    João

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  8. Anónimo13:40

    Caro João, a linha Lisboa - Madrid terá uma velocidade máxima de 350km/h do lado Português e de 300km/h do lado Espanhol, conforme a descrição do projecto em ambos os lados da fronteira. Recomendo-lhe que veja melhor o plano para o traçado em Espanha. Tem troços onde vai junto à linha antiga - aí sim a velocidades menores - e variantes com velocidade de até 300km/h ou pouco acima.

    Uma linha para 220km/h não seria Alta Velocidade mas sim Velocidade Elevada, conforme a definição de ambos os termos pela UIC. Velocidade Elevada refere-se a linhas para velocidades até 250km/h e Alta Velocidade para velocidades iguais ou superiores a 250km/h como é o caso presente.

    TGV (Train à Grande Vitesse) é o nome dos Comboios de Alta Velocidade em França.

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  9. Anónimo15:55

    Meu caro João,
    Zuricher já deu alguns esclarecimentos em relação ao que comentou. Pode confirmá-los no sitio da rave (www.rave.pt).
    Já agora, o tempo estimado para uma viagem Lisboa-Madrid em AV (se prefere este acrónimo a TGV, de resto, sim, mais rigoroso) é de 2h e 45m entre estes dois pontos.
    Este tempo de viagem torna a utilização do comboio competitiva em relação ao avião (para além de outras vantagens comparativas a contabilizar, como por exemplo efeitos positivos inegáveis do ponto de vista ambiental). Se juntar os tempos de espera (check in, controlos à saída e à chegada) e adicionar o conforto que um comboio proporciona em relação ao avião, não resta qualquer dúvida quanto a este aspecto. Pelo menos para mim que numa situação de competição entre estes dois modos, escolheria sem qualquer hesitação o comboio.
    Quanto ao argumento que avança de que o eixo Lisboa-Madrid vai favorecer sobretudo a ligação entre pontos no terriório espanhol, embora o entenda, não o subscrevo porque não me parece nem ponderoso nem decisivo.
    Em primeiro lugar porque isso também sucede com Portugal. Este eixo, se concretizado, vai colocar o centro-alentejo, em concreto a cidade de Évora, a pouco mais de 30 minutos da capital.
    Mas não adiro ao seu ponto de vista sobretudo porque as fortes objecções ao investimento não são desta ordem, mesmo que valessem (que salvo o devido respeito, não valem no quadro da opção pela integração europeia que fizémos) razões "nacionalistas".
    Note o meu caro João que o objectivo de tornar, através de um transporte terrestre, de massas, rápido e cómodo, a fachada atlântica mais competitiva à escala europeia, é um objectivo que suponho ninguém contrariará. O nosso problema, agravado com os sucessivos alargamentos da UE, é o da periferia. Reduzir a nossa localização periférica e aproximar Portugal ao centro da Europa, é algo a que devemos ambicionar.
    Por isso eu não sou contra a componente da rede de AV que permita prosseguir este objectivo. Entendo-a até melhor do que o eixo Lisboa-Porto em AV que nada vai acrescentar, sobretudo se se melhorassem as condições de exploração da linha do Norte.
    Bem ao invés. A divergência com a escolha do Governo é de outra índole. O que continuo a não entender é a prioridade, na actual conjuntura, dada a um projecto de elevadíssima taxa de incorporação de bens e equipamentos importados e, de acordo com uma observação séria e despreconceitusosa do seu modelo financeiro, de retorno económico e social mais do que duvidoso.
    João Cravinho qualificou-o de ruinoso. E parece sê-lo, de facto, quando um País cujo endividamento externo vai chegar este ano perto dos 70% do seu produto, perto de uma situação de deflação com efeitos de arrastamento para baixo da economia, opta por apoiar projectos de rendibilidade negativa, com impactos severos sobre o futuro, sem que essa negatividade esteja garantidamente compensada por efeitos positivos do ponto de vista social ou outros.
    Pela minha parte aplaudiria o comboio de AV para Madrid e daí para o resto da Europa, se um dia pudesse ser executado esse projecto sem que isso significasse o sacrifício de outras opções mais ingentes (apoio à competitividade, ao tecido empresarial produtor de bens transaccionáveis, por exemplo).
    Infelizmente não vejo o debate sobre a oportunidade do investimento a ser feita nesta base. E é pena, porque mais uma vez se corre o risco de as posições serem uma espécie de disputa clubistica...

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  10. Caro Zuricher e F Almeida

    Sem prejuízo de uma confirmação posterior, pedia-lhes que verificassem qual será a velocidade média, real, que poderá ser alcançada, mais o nº previsível de paragens que a linha mamis directa vai ter.
    Verificarão que o tempo médio de viagem não poderá ser inferior a 3.00 a 3.30
    Nem me preocupo em questiornar o mercado potencial que vai servir,nem o que irá gerar.
    Da mesma forma que não lhe passa pela cabeça que o "nosso" TGV não pare, obrigatoriamente em Évora, não vejo como o TGV "deles" não pare, pelo menos em Talavera, Cáceres e Badajoz. É fazer contas e verá que, até à fronteira não consegue diminuir para menos de 45 minutos o tempo total rreal gasto.
    Acha que consegue, com os dados que são dados, "gastar" apenas 1h 45m em Espanha?
    Cumprimentos
    joão

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  11. Na imprensa Espanhola andava um sururu dos diabos há uns meses atrás porque a velocidade de ponta entre Madrid-Badajoz não seria os 300km previstos mas os 220-250km. Sendo que em Espanha existem percursos de maior distância sem paragem percebe-se dificilmente que as velocidades em Portugal sejam superiores.

    Uma coisa é a velocidade permitida pela linha e pelo comboio, outra é a velocidade alcançada pelo TGV que unirá as duas capitais, no actual modelo de paragem em várias cidades.

    Outra questão: como contabilizam as externalidades positivas do projecto, p.e., como atractor de investimento extrangeiro na área dos serviços e da industria? Está nas vossas contas sobre o carácter ruinoso do projecto, ou são factores simplesmente descartados?

    É que se estiverem atentos ao que se está a passar em Évora, verão vários investimentos que estão as ser captados pelo facto de se perspectivar uma ligação ferroviária de alta velocidade com paragem em Évora. Se analisarem o que se tem passado em cidades Espanholas que beneficiaram de ligação recente ao TGV verão fenómenos semelhantes (Zaragoza, Segovia, Barcelona, Málaga, só para citar algumas).

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