Vai de mal a pior a minha sina quando contacto os serviços públicos. Ontem foi o que se viu. Em Janeiro, aqui, ali e acolá, contei as peripécias rocambolescas de três pedidos de cartão do cidadão no espaço de um mês, da multa que tive que pagar por terem roubado o primeiro, da não validação do segundo pelo facto de os serviços me terem fotografado com óculos, quando o deviam ter feito sem esse apêndice e da nova requisição.
Pois bem, recebi hoje uma cartinha cheia de códigos, o da morada, o da autenticação, o da assinatura digital e o do cancelamento, e em que me avisavam que o terceiro cartãozinho estava à disposição na Loja do Cidadão. Lá fui, de imediato, em busca do almejado documento. Tirada a senha, esperei, durante 70 minutos, a minha vez. Logo que me chamaram, e devidamente sentado, entreguei o aviso, o funcionário foi buscar o cartão a uma caixa e tratou de o introduzir na ranhura de uma máquina para o desbloquear e validar.
-Não lhe posso dar já o cartão, disse-me. Não pode? Porquê, se recebi o aviso para o levantar? É que o cartão não foi ainda desbloqueado. Vai dar-me o seu contacto, e nós vamos chamá-lo na altura oportuna...Está a brincar comigo! Já perdi demasiado tempo, há dois meses não pude levantá-lo porque um colega seu tirou a fotografia com óculos, esperei agora mais de uma hora... Telefone para os serviços, para solucionarem o assunto!...Não está nas minhas mãos…Se não está, chame o seu Chefe...
Pois bem, recebi hoje uma cartinha cheia de códigos, o da morada, o da autenticação, o da assinatura digital e o do cancelamento, e em que me avisavam que o terceiro cartãozinho estava à disposição na Loja do Cidadão. Lá fui, de imediato, em busca do almejado documento. Tirada a senha, esperei, durante 70 minutos, a minha vez. Logo que me chamaram, e devidamente sentado, entreguei o aviso, o funcionário foi buscar o cartão a uma caixa e tratou de o introduzir na ranhura de uma máquina para o desbloquear e validar.
-Não lhe posso dar já o cartão, disse-me. Não pode? Porquê, se recebi o aviso para o levantar? É que o cartão não foi ainda desbloqueado. Vai dar-me o seu contacto, e nós vamos chamá-lo na altura oportuna...Está a brincar comigo! Já perdi demasiado tempo, há dois meses não pude levantá-lo porque um colega seu tirou a fotografia com óculos, esperei agora mais de uma hora... Telefone para os serviços, para solucionarem o assunto!...Não está nas minhas mãos…Se não está, chame o seu Chefe...
E lá fui conduzido à Coordenadora. Repetiu-me o mesmo discurso, teria que voltar quando me telefonassem, e até me dispensavam da bicha, seria logo atendido…Mas isto acontece muita vez ou foi uma excepção? É normal acontecer…Então o caso é mais grave. Quem é o responsável? Não há!...É o sistema!...O sistema, qual sistema? O sistema informático...
Ah, é o sistema!…E já falou com o Chefe do sistema? Sabe... Acontece que o sistema por vezes atrasa, tem avarias...Não podemos fazer nada…Claro, se o culpado é o sistema, não pode ser sancionado, a não ser com uma marretada!... Mas eu, eu, o que é que posso fazer? Pode reclamar no livro amarelo…Para quê? O livro não faz parte do sistema?
Já com pouca reacção, a Coordenadora voltou a assegurar-me que me chamariam em breve e seria atendido de imediato!...
E cá estou mais uma vez sem o desejado cartão!…
Mas que raio de sistema!…Agora com o pomposo nome de Instituto dos Registos e do Notariado!...Cujo Presidente, ele próprio, assinou a carta para levantar um cartão que os seus serviços não validaram para poder ser levantado!...Que praga de serviços públicos!...
Ah, é o sistema!…E já falou com o Chefe do sistema? Sabe... Acontece que o sistema por vezes atrasa, tem avarias...Não podemos fazer nada…Claro, se o culpado é o sistema, não pode ser sancionado, a não ser com uma marretada!... Mas eu, eu, o que é que posso fazer? Pode reclamar no livro amarelo…Para quê? O livro não faz parte do sistema?
Já com pouca reacção, a Coordenadora voltou a assegurar-me que me chamariam em breve e seria atendido de imediato!...
E cá estou mais uma vez sem o desejado cartão!…
Mas que raio de sistema!…Agora com o pomposo nome de Instituto dos Registos e do Notariado!...Cujo Presidente, ele próprio, assinou a carta para levantar um cartão que os seus serviços não validaram para poder ser levantado!...Que praga de serviços públicos!...
Caro Pinho Cardão,
ResponderEliminarAgradeço a boa demonstração do que eu dizia no meu comentário ao seu post anterior:
uma coisa é o funcionário que está à sua frente não fazer o que deve, e isso acontece, vezes demais, sem dúvida (sem retirar a responsabilidade individual é evidente que isso resulta de uma falata de cultura de serviço público pela qual se deve responsabilizar quem é responsável, os generais);
outra coisa é o facto de que o funcionário, tal como Pinho Cardão, ser vítima da incompetência de terceiros.
Neste caso não vale pena responsabilizar os soldados mas sim os generais.
Uma vez li alguém da gestão dizer que com as regras de gestão que existem na administração o que é estranho não é que funcione mal, o que é estranho é que ainda funcione.
Quantos deputados olharam seriamente e com conhecimento para essas regras?
Todos os dias, mas rigorosamente todos os dias, o código do procedimento administrativo é violado nas mais pequenas coisas (reuniões sem actas, despachos sem fundamento, etc.).
Quantos dirigentes conhece que tenham sido demitidos por isso?
E quantos governantes?
henrique pereira dos santos
Não posso concordar integralmente com o nosso amigo Henrique, na medida em que já me sucedeu num balcão da mesma "Loja do Cidadão", começar a ouvir os funcionários que estavam a atender, referir que não podiam satisfazer os pedidos de abates de viaturas porque o sistema estava em baixo e que teriam de voltar noutra altura. Ao chegar a minha vez, a funcionária que me atendeu leu o impresso que já levava preenchido e sem olhar para mim referiu-me o mesmo que já tinha dito aos anteriores clientes. Mantive-me calado a olhar fixamente para ela, nos olhos, á espera que me chegasse a inspiração para delicadamente lhe fazer sentir no íntimo que se do lado de dentro do balcão se encontram robôs, do lado de fora encontram-se utentes cuja vida não se reduz a esperas infinitas em filas para no final voltar para casa com O rabo entre as pernas e as orelhas caídas.
ResponderEliminarJuro, não cheguei a abrir a boca, pois para minha surpresa a senhora retirou um impresso de uma gaveta e começando a escrever, disse-me: Bom, para o senhor não ter de voltar cá, vamos fazer isto manualmente e fica despachado.
Não sei se o alívio abafou a revolta, mas pronto, por esta escapámos, eu, ela e os serviços.
Com certeza há situações concretas em que há responsabilidade concreta dos funcionários.
ResponderEliminarMas esse não é o verdadeiro problema. O verdadeiro problema é a chefia que sabe que as coisas se passam assim e fecha os olhos. O verdadeiro problema é a falta de exigência das pessoas, quer as que são mal atendidas e não reclamam, quer as das que ouvem a reclamações e não as consideram importantes.
O problema menor são os funcionários concretos que se limitam a dançar de acordo com a música (e com certeza que têm a responsabilidade de o fazer, mas só essa).
henrique pereira dos santos
Caro Henrique Pereira dos Santos:
ResponderEliminarNão se pode cobrir o sol com uma peneira, nem negar que muitos serviços públicos funcionam pessimamente, voltados para eles, não para o cidadão. Claro que também há serviços públicos bons ou muitíssimo bons, mas esses são uma minoria e a excepção que justifica a regra.
No episódio que relatei, não tenho nada contra as pessoas que me atenderam: foram correctas e procederam diligentemente. A própria Coordenadora fez questão de recomendar à secção que todos os dias se visse se o cartão já estava validado para me chamarem.
Mas o serviço público é constituído por todos os procedimentos, desde a requisição do cartão até à sua entrega. E funcionou mal, quando me tiraram fotografia com óculos, devendo ser sem eles, o que levou à anulação do cartão e a um novo pedido. E funcionou mal quando fui avisado para o receber e este não estava pronto para ser entregue. Defeitos, pois, no front-office e no back office, que envolvem soldados, cabos, sargentos, oficiais e generais. Ou melhor, um sistema voltado para si próprio e nada para o cidadão.
A Coordenadora tinha razão: a culpa é do sistema. Assim, ficam os funcionários a salvo e, como não é próprio de um cidadão civilizado dar uma marretada nos computadores, o sistema continua intacto.
E os cidadãos ao serviço do sistema.
Sans rancune, caro Henrique Pereira dos Santos, que a experiência da vida nos ensina que, em Portugal, é assim é assim!...
Sem perdão nem gastar muito palavreado porque não vale a pena permita-me senhor Dr. deixar-lhe com toda a consideração o desabafo: "É claro que o senhor tem mau feito!...
ResponderEliminarou em português-português "O senhor não é manso!..."
Solidário com os seus escritos e com as suas atitudes
David
Perdão digo agora: queria dizer "sem perda de tempo nem gastar muito..."
ResponderEliminarObrigado
David
...mas escreveu o seu protesto???
ResponderEliminarO sistema informático é terrível. Nas finanças, então nem falar. Quando nas finanças resolveram meter a culpa no sistema eu respondi "...faça à mão, que eu espero ali sentado!...". Pode não resolver nada, mas, perdidos por cem, perdidos por mil, a reacção dos serviços vale bem o trabalho.
Que a administração pública funciona mal e é autista não há qualquer dúvida.
ResponderEliminarA questão é separar responsabilidades.
No episódio dos óculos há dois tipos de responsabilidade:
1) é razoável ou não a regra de não poder ter óculos (admito que sim na medida em que os óculos efectivamente dificultarem a identificação pessoa e essa flexibilidade deveria estar na regra);
2) havendo a regra, é evidente que é imperdoável e da exclusiva responsabilidade do funcionário o seu não cumprimento.
Chegado aqui a minha pergunta é:
o funcionário foi obrigado a descontar no seu ordenado os custos suplementares que provocou nos serviços e nas pessoas servidas?
Evidentemente que não. De quem é a responsabilidade por isso?
henrique pereira dos santos
Do sistema!
ResponderEliminarCaro Drº Pinho Cardão:
ResponderEliminarTenho acompanhado este seu tirocínio e creia que estou solidário consigo. Tanta perseverança não há-de ser em vão!
As questões levantadas pelo caro henrique pereira dos santos são bastante pertinentes e recordam-me um episódio que se passou comigo há uns anos atrás em que fui admoestado numa operação stop pelo agente por conduzir com óculos e não os ter posto nas fotos dos documentos, carta e BI. Ainda hoje não sei se havia (há?) alguma disposição regulamentar sobre isso mas, senão havia, passou a haver, por desejo daquela autoridade.
O que eu verifico actualmente nos serviços públicos, em todos eles sem excepção, é um passar para baixo da responsabilidade de fazer e, quando assim é, qualquer palerma faz regulamentos. Por exemplo, o drº Pinho Cardão foi atendido pelo coordenador, que na maior parte dos casos são pessoas limitadas, alguns até as únicas habilitações académicas são as oferecidas por este governo, as rvvc que igualam um secundário de estudo efectivo a um secundário conseguido pela apresentação de um dossier e um power point (muitos mandados fazer a terceiros). Ora, considerando o transtorno causado ao cidadão Pinho Cardão, por incompetência do funcionário ou pela própria incompetência do serviço por não estabelecer regulamentos sobre ter ou não óculos nas fotos, não seria curial que o chefe de divisão ou mesmo o director viesse justificar-se o próprio serviço?
Caro JotaC:
ResponderEliminarPois acho que sim. Mas, segundo compreendi, alia a autoridade máxima era a Coordenadora.
Embora no estrangeiro, acompanho de perto o meu país.
ResponderEliminarFiz uma referência a este post no meu blogue http://postaisalemanha.blogspot.com/
É só um simples contributo para mostrar como as coisas podem ser feitas de outro modo: para servir os cidadãos e de modo a facilitar-lhes a vida.
Desvanecido, caro Luís Bonito.
ResponderEliminarE obrigado pela informação quanto ao funcionamento dos serviços públicos na Alemanha.
O seu post é elucidativo.