1. Estamos a um passo (1 semana = 0,5 passos) de conhecer a proposta de Orçamento do Estado para 2010, embora tivesse hoje sido noticiado que mais de metade dos ministérios ainda não teriam enviado para o MOF as suas propostas, o que deixa antever alguma dificuldade no cumprimento das "guide-lines" que lhes terão sido transmitidas para a respectiva elaboração.
2. Não se conhecendo ainda a proposta de Orçamento, fervilham já os comentários dos habituais analistas e também as declarações tácticas de políticos quanto à forma de abordar a discussão, a negociação (e agora também a pré-negociação, ao que parece) e a votação dessa proposta...
3. Trata-se do primeiro Orçamento anual destes últimos 9 anos que vai ser discutido e votado sem maioria absoluta...embora, ao que se pode deduzir das declarações tácticas atrás referidas o Orçamento tenha a sua aprovação garantida...
4. Não deixa de ser curiosa este cenário político em que se discutem quase até à exaustão estratégias de negociação e se pretendem definir posições a tomar em relação a uma “lei de meios”...que é inteiramente desconhecida, tampouco se sabe qual terá sido o saldo/défice orçamental oficial de 2009...
4. Uma coisa se pode ter por quase adquirida (sendo certo que com os políticos nunca se pode ter certezas quanto às opções finais) – não haverá agravamento da carga fiscal, especialmente em sede dos impostos sobre o rendimento. Isso parece estar excluído de qualquer negociação prévia ou posterior à apresentação da proposta.
5. Quanto ao resto, caberá indagar que previsões vai o Governo apresentar por exemplo sobre o comportamento das receitas fiscais depois da forte quebra registada em 2009 e que deve ter atirado o défice para perto de 9% do PIB... sendo certo que não se pode esperar grande recuperação (se alguma) dado que a muito tímida recuperação da actividade económica esperada (+0,5%) não consente nenhum optimismo...
6. Outros pontos de especial interesse, do lado da despesa, prendem-se com (i) as despesas com pessoal, (ii) as despesas sociais para fazer face a um nível de desemprego muito elevado e que poderá continuar a agravar-se em 2010 e (iii) os encargos com a dívida pública que não poderão deixar de reflectir a forte subida do nível da dívida e o aumento das taxas de juro do mercado obrigacionista que se registou nas últimas semanas e que provavelmente se acentuará em 2010.
7. Parece muito recomendável que a proposta orçamental para 2010, dadas as incertezas que se verificam, seja elaborada com grande cautela e realismo, para evitar que se caia numa situação de revisões sucessivas do défice como aconteceu em 2009...agora num cenário em que as agências de rating e os mercados estarão de olhos postos nos países do “arco da dívida”.
8. Afigurar-se-ia um enorme risco, neste quadro de vigilância "laranja" ou "vermelha", entrar num cenário de revisão a curto prazo dos pressupostos orçamentais e do saldo esperado...
9. Tendo presentes estes problemas à partida e a necessidade de encontrar um consenso que assegure a aprovação de um Orçamento – nem que seja “só” para mostrar ao País que os políticos privilegiam o interesse nacional – não se afigura nada fácil o cumprimento do processo orçamental para 2010... parece ser mesmo um caso bem bicudo. Veremos.
Caro Tavares Moreira
ResponderEliminarApenas, como quase sempre, "algumas" achegas:
a) O défice de 2009 é, segundo Teixeira dos Santos, 8%. Há quem diga que será um pouco a cima.
b) A Comissão quer que o nosso défice baixe para 3% até 2013.
c) Não existe moratória para este caminho, ergo, tem de se começar já.
d) Teremos de cortar a despesa em, pelo menos, 1%, quando o desemprego vai aumentar e o investimento diminuir e os credores não vão "facilitar".
Aliás, teremos de demonstrar que estamos mesmo a cortar e não apenas a realizar os movimentos adequados.
Dito isto, fico sem saber se todos os actores políticos já interiorizaram este facto, ou se estão à espera que venha uma cartinha de Bruxelas que permita tomar as medidas odiosas sem que tenham de ficar com o opróbio das mesmas...
No primeiro caso estamos perante um caso manifesto de falta de competência, no segundo numa encenação ilegítima e não democrática.
Cumprimentos
joão
Caro Dr. Tavares Moreira,
ResponderEliminarQualquer que seja a perspectiva, o facto é que não consigo encontrar "ângulos/bicos" credíveis para limar/podar. O que me leva a pensar que o problema possa ser capaz de ser esse mesmo: é que a "coisa" talvez não seja bicuda e sim redonda, quiçá esférica.
Caro Tavares Moreira:
ResponderEliminarNão sabemos qual o Orçamento. Mas tenho poucas dúvidas que trará aumento da despesa, em termos nominais e em termos reais. Faz parte da genética socialista.
E há-de haver impostos que sobem; outros diminuirão simbolicamente, como arma de arremesso e de propaganda. No fundo, a carga fiscal irá subir.
O PSD irá abster-se e o OE será aprovado.
Por acção socialista e omissão social democrata será um mau orçamento. Oxalá me engane. Teria muito gosto em dar a mão à palmatória.
Caros João e Pinho Cardão,
ResponderEliminarVejo-me forçadp a convidar meus Amigos a entenderem-se quanto à matéria da redução da despesa...quem sabe se o ponto de convergência não poderá ser encontrado mediante a criação do conceito "redução negativa"...?
Teríamos uma redução - satisfazendo Bruxelas e João - mas de sinal negativo, isto é na realidade um aumento, "satisfazendo" P. Cardão...
Ou será esta hipótese invendável?
Caro Tavares Moreira:
ResponderEliminarDentro da semântica socialista, vai ser mesmo assim: redução negativa da despesa, isto é, aumento real da dita.
Pour épater le bourgeois, a expressão não está nada mal encontrada, isso não!...
Caro Edurado F.,
ResponderEliminarPensando bem, nomeadamente em termos de calculo infinitesimal, se o número de bicos for assim tão grande, como admito bem que seja, a figura que estamos a considerar tenderá para a circunferência à medida que o número de bicos se aproximar do infinito...
E então estaremos a considerar uma figura redonda e não bicuda como bem observa.
Não me custa nada admitir essa versão, devo dizer-lhe, tantos são os "bicos" com que a proposta orçamental terá de se defrontar, sobretudo se pretenderem apresentar uma propostarealista...
Caro Tavares Moreira,
ResponderEliminarAlguma coisa vai ter de subir. Com um défice de 8%, mais as parcerias público-privadas que não estão incluídas na Conta Geral do Estado, o défice deve ser louco. Portanto, não nos resta senão subir impostos no curto-prazo, ou de uma vez por todas, delinear um projecto de longo prazo com o intuito de incentivo ao investimento, com cortes nos impostos e na despesa.
Se tal não acontecer, o que é mais provável até a situação explosiva se concretizar, é um aumento da despesa.
Caro André,
ResponderEliminarNa minha perspectiva não haverá qq tipo de explosão em Portugal - e aqui divirjo das declarações de políticos e opinion-makers que tanto gostam de anunciar os riscos de explosão social, por exemplo - pela simples razão de que não existe material explosivo em quantidade suficiente...
O que temos e vamos continuar a ter é uma implosão lenta, mas segura e incontornável...um empobrecimento certo, lamentável, mas directamente resultante das "nossas" opções políticas.
Não nos podemos queixar...
Caro Tavares Moreira,
ResponderEliminarAté o governo português já deve ter chegado à conclusão de que não há mais impostos para cobrar, pelo que a redução do défice se fará pela fórmula que mais sucesso tem tido nos últimos anos - a especialização específica das especializações e reclassificações funcionais das subrubricas de despesas ou, de uma forma mais simples, a boa da martelada contabilística. Na realidade, a despesa é como o Natal, é quando um homem quiser. Portanto, se pudermos registar amanhã aquilo que gastamos hoje, vamos ter um grande ano de consolidação orçamental.
Caro Tavares Moreira
ResponderEliminarLi um paper elaborado por um banco dinamarquês, www.danskebank.dk, onde realiza um exercício muito interessante sobre a consolidação da dívida píblica da europa a 15.
A metodologia é puramente mecânica e os pressupostos são os constantes dos dados oficiais, seja da dívida, seja das projecções; as primeiras são do eurosatat e as segundas do FMI. Apenas manteve constante o crescimento para o período entre, 2015 e 2020.
Propõem vários cenários, dos quais realço os seguintes:
1 Manter a trajectória
2 Cumprimento das regras do pacto de estabilidade até 2020, isto é alcançar um dívida pública de 60% do PIB até 2020.
3 Alcançar os 100 % da dívida até 2020.
Neste exercício mecânico, a dívida portuguesa directa e seguindo as regras e dados constante do eurostat seria, em 2020 de +/- 150%, a da Grécia de +/-220%, a da Irlanda de +/- 250% e a da Espanha +/- 140 %, todos do PIB.
Para alcançar um cenário de consolidação como o constante do ponto 2, seria necessário que o saldo entre receita e despesa primária deveria ser superavitário nas seguintes percentagens:
Grécia 3.5 %
Irlanda 3.0 %
Espanha 2.5 %
Portugal 2.0 %
Para o cenário, mais realista, do ponto 3, o superavit deveria ser o seguinte:
Grécia 3.0%
Irlanda 2.5%
Espanha 2.0%
Portugal 1.5%
NB estes saldos são a média para o período entre 2010 a 2020.
Quando o Governo for a Bruxelas apresentar o seu Plano de Consolidação da dívida, para cumprimento do Pacto de Estabilidade, o saldo da receita/despesa primário será analisado com atenção, com a agravante que, no nosso caso, temos uma década perdida, uma população envelhecida, um potencial de crescimento limitado e uma capacidade de financiamento fortemente condicionada, acrescidos de um governo com uma "taxa marginal" de confiança e de capacidade de mobilização negativa.
Calculo que, um plano de consolidação em que o saldo primário não seja, pelo menos, metade do que temos tido actualmente, não será bem recebido.
Acho que, para o especialista e um não leigo, é fácil perceber porque o actual PM já não fala, nem apareçe desde o fim do ano....ou porque considero um erro político monumental não incluir o máximo de partidos possíveis na aprovaçao do próximo orçamento...
Cumprimentos
joão
Caro Tonibler,
ResponderEliminarAtenção que essas técnicas de "ocultação" de despesa com recurso ao famoso martelo contabilístico estão hoje muito condicionadas nos seus efeitos pela vigilância sobre a dívida...
É que toda essa despesa, por mais oculta que seja, tem de ser paga...
Caro João,
Muito interessante sem dúvida o exercício de que nos dá conta...
Parece-me que qualquer dos cenários de correcção da trajectória natural implicaria, seguramente, um grau de heroicidade muito mas muito alto mesmo...