terça-feira, 18 de maio de 2010

Dívida pública dispara, Certificados em evaporação...

1. Divulgados hoje os dados da dívida pública directa do Estado para o final de Abril - outras dívidas públicas ficam por contabilizar - constata-se o seguinte:

- A dívida pública total passou de € 132.746 milhões no final de 2009 para € 139.947 milhões no final de Abril, um aumento de € 7.201 milhões, ou seja € 1,8 milhões/mês;
- O “stock” de Certificados de Aforro caiu em Abril € 82 milhões, acumulando uma perda de € 258 milhões em 2010 e prolongando uma quebra quase ininterrupta desde o início de 2008, cifrando-se agora em € 16.613 milhões, equivalente a 11,87% da dívida directa total (16,24% em Janeiro de 2008).

2. Quanto ao primeiro dado, da dívida directa total, deve admitir-se que o padrão de crescimento do 1º quadrimestre não se vai prolongar até final do ano...se assim fosse, teríamos um crescimento da dívida superior a € 20.000 mil milhões, muito acima da previsão do OE/2010...aguardemos para ver.

(Um parêntesis para dizer que leio agora mesmo uma declaração de F. Ulrich, segundo o qual os valores porque o Estado se quer financiar até 2013 “são impossíveis, não poderão ser financiados”...e também que “o dia em que batermos na parede não está muito longe, talvez por semanas”...)

3. Relativamente ao fenómeno da evaporação dos Certificados de Aforro, a situação já se afigura um tanto caricata, depois de tanta gente – também nós aqui no 4R – ter chamado a atenção para a incongruência da política de remuneração deste tipo de dívida de longo prazo.
4. Impressiona sobretudo a insensibilidade e o aparente desinteresse dos responsáveis face à necessidade de incentivar a poupança interna e de recorrer tanto quanto possível à emissão de dívida pública subscrita por residentes.
5. No contexto actual, a hemorragia dos Certificados de Aforro só pode ser compensada por outras formas de dívida, dirigidas em boa parte a subscritores não residentes, agravando o já “alarmante” fenómeno do endividamento externo.
6. Mas pior do que isso: esta substituição de dívidas significa também amortizar dívida interna mediante a emissão de nova dívida (muito) mais onerosa...
7. Em artigo de opinião recente, um responsável governativo pretendeu sustentar esta estranha política afirmando, entre outras coisas, que não faria sentido o Estado subsidiar mais do que já faz as poupanças de particulares...
8. Confesso que me intriga bastante ver como é que os particulares renunciam tão voluntariamente a um generoso subsídio do Estado, desfazendo-se a este ritmo dos Certificados de Aforro...
9. E também se for verdade que o Estado subsidia os subscritores de Certificados quando lhes paga um juro anual de pouco mais de 0,7% nas condições actuais de emissão, acrescido de um prémio de permanência anual (cumulativo) de 0,25%...então o que dizer da emissão de obrigações (a 10 anos) a taxas de 5%, dirigidas a não residentes sobretudo?
10. É nestas incoerências da política económica que a credibilidade, tal como os Certificados, se vai evaporando...

8 comentários:

  1. Caro Tavares Moreira:
    Pois é. A situação a que se chegou até um cego em matéria económica e financeira a via. Claro que os insignes governantes e os não menos insignes grandes economistas e professores que o apoiavam tinham outra visão, melhor, tinham visões, de cujo veneno eles deviam ser os primeiros a provar. Acontece que o Governo, mais dia, menos dia, cai. Mas os "grandes economistas" ficam e, pior, ainda ficam a ensinar nas Universidades e nas televisões.
    Quanto aos Certificados de aforro, bom, a política do governo é das coisas mais estúpidas que já vi.

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  2. Ninguém é tão estúpido, caro Pinho Cardão, o que significa que o estúpido nesta história sou eu.


    E isto é mau, caro Tavares Moreira? Eu já não tenho esperança de que a coisa se alinhe e, por isso, quanto mais rápido...

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  3. Caro Pinho Cardão,

    Entre esses famosos economistas/profs admiradores do regime por convicção gamelar, alguns estão já adoptando o comportamento típico dos ratos que sentem o navio a afundar-se...
    É da gente mais engraçada que alguma vez se viu...
    Porque não organizar um espectáculo de circo especial com estes protagonistas, colocando-os em ambientes socio-políticos hipotéticos, sujeitos a mudanças súbitas - seria fantástico vê-los a mudar de discurso de uma cena para a outra, respondendo aos estímulos - oferta de supostos lugares em empresas - que o profissional do circo simularia proporcionar-lhes...
    Haverá outra solução ocupacional mais útil ao País para estes afamados opinadores?
    Quanto aos Certificados de Aforro e apesar da enorme convicção manifestada por alguns responsáveis para manter esta absurda política, acredito que irá mudar e depressa...

    Caro Tonibler,

    Ainda vamos ter de amargar mais um bom tempo, não se iluda quanto à rapidez da solução por muita canelada na gramática que se vá acumulando...

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  4. Anónimo10:27

    Caro Dr. Tavares Moreira,

    A sua última frase é que mais me preocupa - a de termos de "amargar mais um tempo".
    Preocupa-me o discurso geral de apaziguamento que trará mais revolta
    Preocupa-me a obsessão pela estabilidade do Presidente que traz menor capacidade de reacção
    Preocupa-me descrença do Dr. Tavares Moreira que assume a inevitabilidade da desgraça
    Preocupa-me que o "grito de alerta" do Presidente do BPI, seja considerado de incendiário e fora de propósito de um banqueiro - ONDE É QUE FICA A PÁTRIA!? DEPOIS DOS BANCOS!?

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  5. Caro Agitador,

    Quando diz que o preocupa a minha "descrença" e que assumo "a inevitabilidade da desgraça" é bom salientar que são conclusões suas.
    E são conclusões simplificadas, silogismos abreviados.
    Aquilo que chama de "descrença" tem a ver com uma análise objectiva da realidade e a simples constatação de que os políticos que nos dirigem e as suas medidas estão terrivelmente desfazados da realidade - é algo que constamos sucessivamente há anos, vale a pena ter ilusões, acreditar em promessas?
    Repare neste pormenor muito recente: há pouco mais de uma semana o Plano de Austeridade era para durar até 2011; nos dois últimos dias passou sucessivamente para 2013 e para prazo indefinido...
    Que conclusão se pode tirar daqui, se os principais responsáveis pela política não têm a menos ideia de aspectos absolutamente essenciais das mesmas, de uma semana para a outra mudam radicalmente de posição?
    Quanto ao que chama "inevitabilidade da desgraça"...acha, sinceramente, que ainda temos de esperarpela desgraça ou será que esta já aí está?
    Qual então o sentido exacto de inevitabilidade?

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  6. Anónimo19:49

    Caro Tavares Moreira,


    A desgraça não é inevitável. Basta inflectirmos caminho com determinação que encontramos novo rumo rapidamente. Agora, este processo de aguentar o sistema e só reagir após a ruptura do mesmo é que é revoltante. Não considero desgraça os ajustes na despesa, com despedimento, etc. Eu também já fui despedido e a minha vida não virou desgraça. Já considero desgraça a falta de capacidade de reacção das elites políticas e outras. Já considero desgraça que a incompetência seja tolerada com o objectivo de não fazer ondas.

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  7. Caro Tavares Moreira

    Um país maduro e adulto com dirigentes com o mesmo grau de maturidade já teria marcado eleições ou, em alternativa, gizado um qualquer plano nacional de "combate à crise".
    Considerar que eleições são um elemento destabilizador é infantil e anti demnocrático, aquelas estão exactamente cá para isso.
    Este governo foi eleito com base num projecto que é inviável, o que diz tudo sobre o grau de aptidão do actual PM para governar nesta conjuntura.
    Admitir que um governo possa manter-se no poder cumprindo, quase por completo, o programa do partido derrotado é, no mínimo um embuste político e, no máximo, uma burla política.
    Vamos pagar caro esta imaturidade

    Cumprimentos
    joão

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  8. Caro Agitador,

    Registo, com o devido respeito, sua sintética digressão sobre a noção de desgraça...
    Não deixando de notar que a "inflexão de caminho, com determinação, para encontrar novo rumo", não se afigura tarefa nada fácil, se nos imaginarmos a transpor do plano verbal para o plano da realidade.

    Caro João,

    O comentário que faz parece-me propositado e adequado ao momentoque passa, podendo acontecer que o cenário que sugere acabe por se concretizar mais depressa do que neste momento se admite.
    Como terá reparado, a temperatura subiu imenso nos últimos dias, parecendo indicar que vamos ter um verão bem quente...

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