“Hoje deu-me para escrever... Há já alguns dias que o tenho feito! Vê se gostas...”
Abri o anexo e deparo-me com um poema. Tinha encanto, magia, e conseguiu sugar-me para um mundo diferente, desconhecido, esquecendo dores e tormentos. Voltei a ler as palavras, os versos, e vi que tinham algo de diferente. Lembrei-me de ter lido que a poesia é filha da magia e foi com o objetivo de mudar o mundo, e alcançar o inatingível, que o homem começou a praticá-la. Sem palavras não é possível realizar práticas mágicas. Talvez seja por isso que certos rituais usam expressões e frases estranhas, repetitivas, no eterno esforço de procurar as palavras sagradas que permitam abrir novos mundos, que permitam compreender o que nos escapa, quer à razão quer à fé. Não há sociedade que não as procure, não há língua que as não deseje e não há poeta que não as sinta. Mas onde param essas palavras misteriosas? Que pergunta! É fácil, basta compreender a língua dos pássaros, linguagem mística e divina, perseguida em todos os cantos do mundo e em todos os tempos.
Não importa como, nem quando, o homem começou a falar, mas estou convencido de que foram os pássaros os iniciadores da mais importante característica humana, o uso da palavra. Os poetas sabem que existem palavras mágicas e fazem tudo para as encontrar, até afogarem-se nelas, despertando noutra dimensão. Procuram o poema perfeito, que, penso que foi Borges quem o afirmou, mas se não foi, decerto, não se incomodará com a paternidade, deverá caber numa palavra.
Li o poema e, de madrugada, ouvi, surpreendido, o canto de um pássaro. Quando os dias começam a espraiar-se, costumo ouvir cantos de aves na madrugada. Curioso, pensei, este ano o pássaro veio mais cedo, mas o seu canto é diferente, mais lindo e mais suave. Não pode ser o mesmo.
Estou habituado ao canto de um pássaro que, todos os anos, me avisa de um novo ano, não cronológico, porque o seu calendário é diferente. Começa aos soluços. Aparece um dia, depois não aparece e em seguida volta a aparecer com regularidade crescente, até substituir o relógio. Inicialmente canta um bocado, calando-se em seguida. Volta a cantar, prolongando a sua oração durante mais tempo e diminuindo as pausas. Ao fim de algum tempo, canta ininterruptamente, não me deixando dormir, ou melhor, eu é que não quero dormir para o ouvir. Há qualquer coisa de mágico no seu canto que me encanta. E quando se cala, vejo, pelo canto do olho, que o dia já despontou. São horas de levantar, mas adormeço, e em quinze minutos durmo como se tivesse dormido muitas horas.
Já ouvi um pássaro a cantar este ano, mas o seu canto é diferente do habitual. Às tantas, pensei, o outro deverá ter morrido, mas antes de morrer deverá ter pedido ao seu irmão para continuar com as suas lições misteriosas de ensino da língua de pássaros, a língua mágica, cujas palavras sagradas permitirão solucionar todas as aspirações humanas. Eu ouço-as, sinto que são belas, mas não consigo aprendê-las. Tenho que me agarrar às palavras dos poetas, porque são os únicos que as conseguem reproduzir, mesmo que por escassos segundos.
Veio então à memória os últimos versos da poetisa.
Como queria ser diferente,
Como queria ser melhor
Como queria ser eloquente,
Como queria não ter dor…
Sou o que sou
Sou o que me ensinaram
Alguém me abençoou…
A alma e a vida assim cantaram!
Abri o anexo e deparo-me com um poema. Tinha encanto, magia, e conseguiu sugar-me para um mundo diferente, desconhecido, esquecendo dores e tormentos. Voltei a ler as palavras, os versos, e vi que tinham algo de diferente. Lembrei-me de ter lido que a poesia é filha da magia e foi com o objetivo de mudar o mundo, e alcançar o inatingível, que o homem começou a praticá-la. Sem palavras não é possível realizar práticas mágicas. Talvez seja por isso que certos rituais usam expressões e frases estranhas, repetitivas, no eterno esforço de procurar as palavras sagradas que permitam abrir novos mundos, que permitam compreender o que nos escapa, quer à razão quer à fé. Não há sociedade que não as procure, não há língua que as não deseje e não há poeta que não as sinta. Mas onde param essas palavras misteriosas? Que pergunta! É fácil, basta compreender a língua dos pássaros, linguagem mística e divina, perseguida em todos os cantos do mundo e em todos os tempos.
Não importa como, nem quando, o homem começou a falar, mas estou convencido de que foram os pássaros os iniciadores da mais importante característica humana, o uso da palavra. Os poetas sabem que existem palavras mágicas e fazem tudo para as encontrar, até afogarem-se nelas, despertando noutra dimensão. Procuram o poema perfeito, que, penso que foi Borges quem o afirmou, mas se não foi, decerto, não se incomodará com a paternidade, deverá caber numa palavra.
Li o poema e, de madrugada, ouvi, surpreendido, o canto de um pássaro. Quando os dias começam a espraiar-se, costumo ouvir cantos de aves na madrugada. Curioso, pensei, este ano o pássaro veio mais cedo, mas o seu canto é diferente, mais lindo e mais suave. Não pode ser o mesmo.
Estou habituado ao canto de um pássaro que, todos os anos, me avisa de um novo ano, não cronológico, porque o seu calendário é diferente. Começa aos soluços. Aparece um dia, depois não aparece e em seguida volta a aparecer com regularidade crescente, até substituir o relógio. Inicialmente canta um bocado, calando-se em seguida. Volta a cantar, prolongando a sua oração durante mais tempo e diminuindo as pausas. Ao fim de algum tempo, canta ininterruptamente, não me deixando dormir, ou melhor, eu é que não quero dormir para o ouvir. Há qualquer coisa de mágico no seu canto que me encanta. E quando se cala, vejo, pelo canto do olho, que o dia já despontou. São horas de levantar, mas adormeço, e em quinze minutos durmo como se tivesse dormido muitas horas.
Já ouvi um pássaro a cantar este ano, mas o seu canto é diferente do habitual. Às tantas, pensei, o outro deverá ter morrido, mas antes de morrer deverá ter pedido ao seu irmão para continuar com as suas lições misteriosas de ensino da língua de pássaros, a língua mágica, cujas palavras sagradas permitirão solucionar todas as aspirações humanas. Eu ouço-as, sinto que são belas, mas não consigo aprendê-las. Tenho que me agarrar às palavras dos poetas, porque são os únicos que as conseguem reproduzir, mesmo que por escassos segundos.
Veio então à memória os últimos versos da poetisa.
Como queria ser diferente,
Como queria ser melhor
Como queria ser eloquente,
Como queria não ter dor…
Sou o que sou
Sou o que me ensinaram
Alguém me abençoou…
A alma e a vida assim cantaram!
Estou indeciso, Senhor Professor... não sei se nos ofereceu um conto em prosa, se um poema, ou um cântico. Espero que, com a ajuda de uma certa ilustradora que muito bem conhece, um dia esta dúvida venha a ser desfeita.
ResponderEliminar;)
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarEsta poetisa escreveu palavras
ResponderEliminarManifestou o que sente sem dizer um "ai"
Atribui-lhes beleza e magia
Porque eram para o seu pai!
Como queria ser diferente,
ResponderEliminarEncarar fracassos, abraçar vitórias
Não me sentir ausente
E obter glórias!
Como queria ser diferente,
Continuar para sempre menina
Sem estar doente…
Voar e saltar como uma bonina.
Como queria ser diferente,
Ver o mundo a brilhar
Sentir-me contente
Irradiar-vos com o olhar.
(...)
(...)
Caro Professor e amigo
ResponderEliminarSimplesmente belíssimo.
Um abraço
António Piedade
Uma beleza de texto acrescido com este poema igualmente belo e ternurento da jovem Inês Massano...Imagino o orgulho de V. Exa. Srº Professor!
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