Europeístas nacionais terão perdido o Norte?

1.Achei particularmente curiosas algumas afirmações do Dr. Mário Soares, hoje divulgadas, que constituem uma boa ilustração das angústias que pelos vistos atormentam os europeístas nacionais de que o Dr. Soares é indiscutivelmente um porta-voz destacado.
2.Anotei as seguintes: “Estamos a entrar numa recessão que não nos deixa horizonte de esperança...”; “ É difícil acreditar que os responsáveis europeus sejam tão incapazes que se recusem a ver a realidade da situação...”; “O Governo não está a tirar gorduras ao Estado, está a destruí-lo...”.
3.Paradoxalmente, hoje mesmo foi divulgada uma previsão actualizada do BCE para o desempenho da economia europeia em 2011, revelando uma ligeira melhoria em relação à previsão anterior – um crescimento médio do PIB de 2,6%, contra 2,5% da anterior previsão.
4.A realidade europeia, se bem que não isenta de problemas e de riscos, parece pois muito longe da visão catastrofista do Dr. Soares, uma vez que não estamos a entrar numa recessão generalizada, bem longe disso...A falta de um horizonte de esperança, neste contexto, afigura-se pelo menos um claro excesso de linguagem...
5.Quanto à suposta incapacidade dos líderes europeus associada a uma recusa em “ver a realidade da situação”, caberá interrogarmo-nos se afinal a resposta dada por esses mesmos líderes, na última cimeira, já caiu no rol do esquecimento...
6.Sim, porque as decisões dessa última cimeira foram recebidas, se bem nos lembramos, como um bom passo em frente na resolução dos problemas do excesso de dívida de alguns países - começando pela Grécia que viu aprovado um segundo programa de ajuda traduzido em mais € 109 mil milhões (se bem que destes apenas € 34 mil milhões sejam em “dinheiro fresco”, o restante é constituído por 3 parcelas de reestruturação/alívio de dívidas já existentes).
7.Se os líderes europeus foram capazes de encontrar uma resposta – não há 3 semanas ainda – que foi saudada como uma resposta audaz e adequada às circunstâncias, porquê acusa-los já de “incapacidade para ver a realidade da situação”?
8.Finalmente e quanto à crítica ao governo português de “não tirar gorduras ao Estado, estar a destrui-lo” numa referência especial às privatizações, não deixa de ser curioso que essa crítica não tenha sido expressa aquando da divulgação do acordo com a “Troika”, porque as privatizações anunciadas têm a ver com o cumprimento desse acordo...
9.Tenho a noção de que os o nossos Europeístas perderam o norte a partir do momento em que (i) se descobriu que a zona Euro está longe de viver num “mar de rosas”, sendo impossível a alguns dos países membros continuar a acumular défices e dívida como se nada se passasse, (ii) se percebeu que a União Monetária não irá muito longe sem um forte reforço da componente financeira e fiscal, (iii) se concluiu que já não podemos financiar automática e indefinidamente os nossos défices no exterior.. .
10.Terão vivido sempre na doce ilusão de que a Europa tudo resolvia, tudo prodigalizava, tudo pagava, bastava-nos emitir a factura a tempo e horas para garantir que o nosso “rico Estado Social” funcionasse sempre...
11.A partir do momento em que a Europa descobriu que esse modelo de funcionamento não é mais sustentável, que é preciso que todos façam pela vida...”Aqui d’el Rei” que já não há estratégia, os líderes não têm visão, não temos um horizonte de esperança, estamos a destruir o Estado...não terão perdido o norte, vagueando agora sem rumo por um mundo desconhecido?