sábado, 13 de outubro de 2012

Chocolate e capacidades cognitivas...



Como epidemiologista estou sempre à coca para analisar certas notícias que saem na comunicação social. Os assuntos relacionados com a saúde são muito apetecíveis quer para quem os transmite quer para quem os lê. A doença assusta qualquer um, mesmo os mais afoitos, e, por isso mesmo, tudo o que venha a propósito para a preservar é bem-vindo, e se for acompanhado de prazer tanto melhor. Quando isto acontece, associação “saúde e prazer”, é porque devem existir outros motivos, não propriamente o desejo de mais saúde para o próximo, mas o desejo de mais dinheiro para si ou para quem representa. Uma observação a exigir uma análise mais profunda. Fica para depois.
Numa das mais prestigiadas revistas médicas mundiais, The New England Journal of Medicine, foi publicado recentemente um pequeno artigo, designado como "nota ocasional", uma nova forma de publicar artigos, em que o autor, Franz Messerli, aborda os efeitos benéficos do chocolate. No final do artigo, o autor faz aquilo que qualquer cientista deve respeitar, ou seja, fazer a sua declaração de interesses. Neste caso concreto li que "Dr. Messerli afirma que consome diariamente as variedades de chocolate negro de Lindt, mas não exclusivamente",
O assunto do cientista “chocolatomaníaco” prende-se com o consumo do "alimento dos deuses", as funções cognitivas e a “taxa de laureados com o prémio Nobel”. Num estudo ecológico, o autor estabelece uma correlação linear (intensa) entre o número de laureados por dez milhões de habitantes e o consumo de tão energético alimento, rico em flavonoides, substâncias que são dotadas de propriedade antioxidantes nos organismos. Neste caso concreto teriam um papel muito importante na melhoria das capacidades cognitivas de um povo tornando-o mais apto para a descoberta, criatividade e inovação. Olhando para a única figura do texto, verifica-se que são os suíços os que estão à frente em prémios Nobel e no consumo de chocolate. Os suecos também andam por aqueles lados, embora comam menos do que os suíços, mas como o prémio é dado pelos suecos, isto é como no futebol, o fator casa é importante, para não falar nas arbitragens. E Portugal? Por acaso também lá está, com uma taxa de laureados a par da China, Japão, Brasil, Grécia e Espanha.
Achei interessante este artigo, porque se trata de um estudo ecológico, estudos que não explicam grande coisa, nunca mais de dez por cento daquilo que queremos investigar, constituindo por vezes um bom ponto de partida para outros mais complexos destinados a avaliar a associação entre um fator e um problema de saúde. O que me divertiu imenso é o atrevimento do autor acerca das qualidades estimulantes intelectuais do chocolate. O autor abusa, e de que maneira, sobre os efeitos do chocolate, a ponto de ter ficado de boca aberta. Como é que uma prestigiadíssima revista médica se pôs a jeito para publicar algo deste tipo? Se fosse um jornal, no seu suplemento semanal dedicado à saúde, vá lá, até seria benigno e curioso para ter um pretexto para uma boa conversa à mesa do café, mas no NEJM?! Hum! Há qualquer coisa que não bate certo.
Em síntese, se aceitarmos esta grande "descoberta" não me importo nada, mas mesmo nada, em contribuir com uma taxa suplementar para a compra de chocolate negro para ofertar aos nossos governantes e responsáveis, talvez pudessem melhorar as suas capacidades cognitivas, tornando-os mais inovadores e criativos, um pouco à semelhança dos premiados com o Nobel.
Eu não acredito muito, mas não custa nada tentar, pois não?
Declaração de interesses: não como chocolate há muito tempo, com muita pena minha, mas devido a problemas de saúde não posso, às tantas melhorei de umas “coisitas” e piorei de outras, nomeadamente as minhas capacidades cognitivas. A inveja é uma coisa muito feia! Que inveja tenho dos que comem chocolate, não por uma questão de saúde, mas apenas por uma questão de prazer...

6 comentários:

  1. Anónimo00:24

    Que boa desculpa para anular os remorsos dos abusos com o chocolate!

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  2. Chocolate da marca Lindt, caro Professor?! Quando as marcas são mencionadas.... dá que pensar!

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  3. Já tenho um bom pretexto para deixar os meus netos abusarem de chocolate. E eu também não vou perder a oportunidade.

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  4. Pois....após a leitura deste artigo....terei de "bloquear" o 4ª...no magalhaes da minha filha!

    Quer dizer, um pai a cortar nas goluseimas, ainda se arrisca a ouvir um filho dizer algo do tipo:

    "Então Pai, não gostavas que eu fosse prmeio Nobel ? ...ora, então dá cá mais um chocolate."

    E perante isto fica o Pai sem argumentos...!?!?!?!

    bem,sendo assim, vou ali ver se como uma tablete de chocolata...a ver se descubro um plano para sair desta!

    ,o)

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  5. Caro Amigo e Porfessor,

    Ora vamos a por a história em dia: recordo-me de o meu Amigo me ter recomendado, há cerca de 8 anos, ali para os lados de um local que agora se encontra sob cerco, que consumisse chocolate, na sua opinião seria bastante benéfico para a saúde...E quero dizer-lhe que segui seu conselho, com moderação é certo, e não me considero nada arrependido!
    Tenho um amigo, jurista muito conceituado, que consome uma tablete de chocolate (grandona) inteira por dia, às vezes mais, e diz-me que nunca se sentiu tão bem!
    E esta, hein?

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  6. Caro amigo Tavares Moreira

    Claro que não ponho em causa o valor do chocolate, o que ponho em causa é a forma como se utilizam certas propriedades para outros fins, e também a displicência como se publicam certos trabalhos. Falo do chocolate, do vinho, do chá, das beringelas, do alho, da maçã, da canela, do piri-piri, das amoras, Oh meu amigo, nunca mais terminaria. Não há qualquer problema em ingerir quantidades moderadas de um bom chocolate, eu também gostaria, e faz bem desde que moderadamente, claro. Gosto imenso destes temas, mas há interesses "ocultos" que me irritam sobremaneira com o objetivo de induzir o consumo. Veja bem se não tenho razão. Naquela altura falei das propriedades do dito, recordo-me que foi no plenário, às tantas para preencher algum vazio de um daqueles debates que bem sabemos, e o meu amigo passou a compreender os seus efeitos e tem sido um regular e moderado consumidor. Ótimo. Fez bem. Mas soube fazer, isso é que importa. Estou convencido de que se tivesse conhecimento deste estudo de que não passaria a comer da forma que come. Nem ligava, mas há pessoas que não sabem filtrar e vai daí.... O mesmo se passa com o vinho, por exemplo. O que lhe posso dizer é que gostaria também de ter seguido o meu próprio conselho. Enfim, é vida!

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