Tenho andado a ler, fascinada, o magnífico “Pós-Guerra – História da Europa desde 1945”, de Tony Judt, um livro monumental que começa com o retrato da brutal destruição da civilização europeia e descreve e analisa a reconstrução geopolítica e social até aos nossos dias e a sua repercussão no mundo.
Interrompo a custo a apaixonante leitura ao serão para ouvir, aqui e ali, com infinitamente menos proveito e interesse, os “debates” da actualidade nacional, os quais me levam sistematicamente a outro livrinho muito interessante e bem mais rápido de ler, o ensaio “O essencial sobre os elementos fundamentais da cultura portuguesa”, do antropólogo Jorge Dias, escrito em 1950, mais ou menos a época que descreve a obra de Tony Judt:
“O Português gosta de fazer projectos vagos, castelos no ar que não pensa realizar. Mas no seu íntimo alberga uma certa esperança de que as coisas aconteçam milagrosamente. Esta forte crença no milagre, cujo aspecto mais grosseiro é a enorme popularidade do jogo da lotaria, chega a tomar aspectos curiosos, dos quais sobressai o sebastianismo (…) A crença viva é decididamente uma força, mas, quando toma aspectos irracionais e supersticiosos, pode ser uma fraqueza (…) A imaginação sonhadora, a antipatia pela limitação que a razão impõe e a crença milagreira levam-no com frequência a situações perigosas, de que se salva pela invulgar capacidade de improvisação de que é dotado. Quando se aproxima a catástrofe, abrem-se-lhe os olhos da razão, e então é capaz de desenvolver tal energia e com tal eficiência que a isso é que se poderia chamar milagre."
Entre as incertezas da História e as vezes em que a racionalidade e a técnica parecem tantas vezes falhar nas suas previsões e soluções, talvez esta característica dos portugueses seja, uma vez mais, capaz de mostrar as suas virtualidades. Oxalá que, de uma maneira ou de outra, haja mesmo milagres.
Confirmamos a cada passo da nossa História, as caracteristicas que a cara Drª. Suzana refere às nossas raças.
ResponderEliminarEscrevo "raças" porque, bem vistas as coisas e como ainda ha dois ou três dias o Sr. Prof. Massano referia num post, corre-nos nas veias, sangue de muitas origens geográficas, quem sabe, até mesmo extra-terrestre.
Sim, porque a explicação para certos feitos de que os nossos antepassados foram autores, desenquadra-se de um estereótipo já referenciado.
Contudo, não deixamos de ser cobardes e medrosos, duas características que em determinadas situações nos causam pânico e nos conduzem desesperadamente sair da nossa introversão natural, e a unir-nos ao nosso vizinho do lado, em busca de apoio e protecção.
Apesar de todas as evoluções da espécie, assinaladas pela ciência, continuamos a reagir instintivamente... como os irracionais.
Vamos acreditar que possa ser assim. Mas, a ncessária mudança é tão dramática, que vamos mesmo esperar que seja assim. Pois o pior é que se perca a esperança, não de voltarmos ao que éramos (pois isso será impossível) mas de podermos manter-nos como uma sociedade justa, equilibrada e democrática.
ResponderEliminarE isso, nos dias de hoje, não se fará à esquerda nem à direita. Não NESTE sistema...
http://notaslivres.blogspot.pt/2012/11/crise-qual-crise-ou-refundamos-ou.html
ditado
ResponderEliminar'fia-te na Virgem e não coras, vais ver o trambolhão que apanhas'
Concordo em absoluto com a análise do antropólogo que a Dra. Suzana Toscano, aqui cita. Efetivamente, o português de modo geral, nos momentos difíceis, começa por se lamentar, mas no seu íntimo a acalenta crenças diversas, algumas até metafísicas, e assim vai andando até ao momento em que essas crenças se esvaziam e dão lugar à descrença. Nessa altura, em que a razão vem ao de cima, reflete, toma medidas, luta (seja isso o que for), emigra…
ResponderEliminarE tem sido sempre assim. No extremo vamos à luta, atravessamos oceanos, acabamos por tomar conta do nosso destino…
Vivemos momentos muito difíceis, até de vergonha! Não compreendo como é que um estado uno, com tantos anos de história, com gente de enorme valor, decide pedir ajuda a funcionários estrangeiros para fazer as suas próprias reformas! Malditos políticos, malditos invertebrados, decididamente não merecem este povo…
Caro Bartolomeu, também sobre isso discorre o antropólogo, a mistura de sangue que nos corre nas veias, bem como as influências ancestrais de outros povos e outras culturas com as quais nos misturámos de uma forma única, fazem dos portugueses um povo com características muito diferentes dos espanhóis, por exemplo. Somos uma espécie de "camaleões" quando tirados do nosso meio, voltamos ao que éramos quando regressamos, somos individualistas mas solidários, rebeldes pelo sonho e evasão mas submissos quando nos metem medo. Admiramos e cobiçamos o luxo mas sabemos viver na sobriedade e na pobreza quando não o alcançamos, dispensando até o conforto em troca de alguma aparência exterior de prosperidade, como se vê em muitas casas pelo país fora.Quanto à evolução da espécie...basta ler a História recente da Europa para perder as ilusões.
ResponderEliminarCaro Gonçalo, as grandes mudanças são em geral as que menos se planearam, felizmente uma boa parte da capacidade de ajustamento resulta de movimentos ditados pela necessidade de sobrevivência e pela luta permanente pela felicidade, por isso tem que haver esperança, não nas decisões magnas de quem pensa por nós, mas ao menos em que, apesar dessas, será possível voltar a encontrar um caminho.
Caro Floribundus, também é verdade, os milagres não acontecem sozinhos...
Caro jotac, tem sido sempre assim, a nossa História é um fenómeno de impossibilidades que se realizaram. Deixe lá isso dos consultores, se ao menos assim fosse mais fácil cumprir o que nos é pedido já não seria mau, vergonha mesmo é se não formos capazes de evitar a miséria de tantos.
"(...)se ao menos assim fosse mais fácil cumprir o que nos é pedido já não seria mau, vergonha mesmo é se não formos capazes de evitar a miséria de tantos."
ResponderEliminarNão deixo não...cá está a crença
:)