quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Perplexidades não faltam...

Duas associações de reformados - Cidsenior e Apre - decidiram recorrer aos tribunais para impugnar a decisão do governo que determina que o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social deve investir 90% dos seus recursos financeiros - 10,9 mil milhões de euros - em dívida pública portuguesa. Com esta medida, o então ainda ministro das finanças encontrava no Fundo um mecanismo para assegurar o financiamento de mais necessidades do Estado - 4,5 mil milhões de euros – e, em simultâneo, não agravar o rácio da dívida pública - 2,5% do PIB.
Não surpreende a iniciativa destas Associações. Dizem que a decisão do governo é insensata e irracional. Sendo o Fundo financiado essencialmente pelas contribuições dos trabalhadores – financiamento privado – e sendo uma almofada financeira da Segurança Social para fazer face ao pagamento de pensões, a decisão de aumentar a capacidade do Estado se financiar à custa de um património que pertence aos actuais e futuros pensionistas é o ponto de discussão.
Mas não é apenas a decisão em si mesma que é questionável. É questionável que a gestão do Fundo esteja sujeita a orientações políticas que colidem com a natureza do Fundo e a gestão financeira prudente a que deve obedecer a composição da carteira de activos. Pergunta-se, então, para que serve o conselho de administração da entidade que gere o Fundo. 
O argumento de que a dívida pública portuguesa paga mais juros que as outras dívidas públicas da OCDE e que, portanto, é um bom negócio para o Fundo é uma visão que ignora o risco. A diversificação de activos é uma regra de ouro para reduzir o risco, a que acresce o facto de no caso de Portugal ser muito elevado o risco da dívida pública.
O argumento de que o Fundo deve ajudar o Estado porque os contribuintes estão a financiar - através de transferências do Orçamento do Estado (2012 e 2013) - os saldos negativos da Segurança Social não colhe a meu ver. Esta opção política levanta uma outra questão: se o FEFSS é uma almofada financeira para pagar pensões, então poderia ser utilizado na actual conjuntura obviando-se ao aumento da carga fiscal.
A crise não pode tudo justificar. A “nacionalização” do FEFSS ou “expropriação” como alguém lhe chamou está em linha com a estatização de uma boa parte dos sistemas de pensões privados a que temos vindo a assistir nos últimos anos. Uma situação que agrava a sustentabilidade dos próprios sistemas públicos de pensões e que tem consequências graves para os pensionistas e os contribuintes. Perplexidades não faltam...

7 comentários:

  1. Mas se nós não acreditamos na nossa dívida quem acreditará?

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  2. Não se trata de acreditar ou não, caro Luís Moreira, trata-se de uma gestão prudente do risco por parte de quem tem ã sua guarda um fundo de emegência que deveria, precisamente, salvaguardar as situações em que o risco passa a realidade. Ou o patriotismo é só para os reformados? Creio ter sido bem recente o clamor contra o facto de os bancos, em particular a CGA ter sido chamada a comprar dívida... Depois não faltará quem acuse os reformados de serem um peso excessivo no orçamento, pudera! Se as receitas vão para outro lado, não admira.
    Margarida, muito oportuno este post, é bom lembrar estas decisões porque a memória é muito curta, já é frequente ouvir, por exemplo, quanto é que as pensões dos bancários "custam" à segurança social mas já poucs se lembram de quanto entrou com os fundos de pensões.

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  3. Anónimo21:07

    Absolutamente de acordo, Margarida. Com a oportunidade do post e com a apreciação que faz.

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  4. Cara MCAguiar

    Curioso comentário já que, por exemplo, os reformados japoneses (e os não reformados), acreditam na dívida soberana e, por esse facto, já vai em mais de 200% do PIB.
    Podemos sempre arguir que eles,(japoneses) pensam de modo diferente; mas não podemos negar a evidência que é a sociedade mais velha do mundo; o que torna ainda mais extraordinária, a confiança depositada na dívida.

    Cumprimentos
    joão

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  5. Caro Luis Moreira
    A confiança não passa por obrigar o FEFSS a ter que concentrar os seus investimentos em dívida pública nacional.
    O argumento da confiança não anula o risco de colocar todos os ovos na mesma cesta. A confiança radica na prudência da gestão.
    Suzana
    Lembra bem a transferência das responsabilidades com pensões dos fundos de pensões dos bancos para a Segurança Social. A contrapartida financeira foi utilizada para pagar dívidas do Estado - ajudou no ano da transferência (2011) à redução do défice - mas agravou a já de si difícil situação da Segurança Social e vai custar aos contribuintes cerca de 520 milhões de euros/ano (a factura começou em 2012).
    Caro Joao Jardine
    É verdade, a dívida pública japonesa está colocada na sua maioria junto de residentes. Não sei qual é o nível de diversificação das carteiras de activos dos investidores institucionais, incluindo as seguradoras, ou seja, qual é o peso da dívida pública no total dos investimentos. O governo nipónico anunciou – medida incluída no plano “Abenomics” - que vai aumentar o imposto sobre o consumo a fim de cobrir os custos cada vez mais elevados da Segurança Social, aliviando assim o peso colossal da dívida do país.

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  6. Cara Margarida,

    Esta solução, indefensável numa perspectiva de gestão rigorosa dum fundo com as responsabilidades do FEFSS, tem pelo menos uma lógica imbatível: a da continuação, da persistência no reiterado erro de acabar com sistemas autónomos de previdência social, integrando-os no bolo da previdência geral, de inspiração estatal...
    Assim, nacionaliza-se tudo, as responsabilidades e os activos!
    Veja se os partidos e opinion-makers, que usam o rótulo "esquerda", se indignaram com esta medida (e tão propensos à indignação eles são, como bem sabe)!

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  7. Dr. Tavares Moreira
    Uma medida exemplar. A dívida pública portuguesa paga mais, há que aproveitar (quais bunds, quais AAA)! Estão todos de acordo e quase todos na defesa da reestruturação da dívida. Espero que não se esqueçam de excepcionar os recursos financeiros dos pensionistas.

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