É inexorável que vamos ter que debater o modelo que podemos e queremos ter para a Segurança Social. O tema das pensões tem dominado a agenda política mas da pior maneira. Dominar a agenda mediática, ainda por cima em clima de pré-campanha eleitoral, mas também por isso, não significa debater de forma responsável o tema. Pelo contrário, em tempo de ir a votos o debate é substituído pelo ruído, a racionalidade dá lugar à especulação ou ao silêncio "barulhento", o esclarecimento é substituído pela confusão.
Ninguém está interessado em ir ao centro das questões, o assunto é, pelo contrário, empurrado para a frente, logo se verá. Um logo se verá recorrente. Deixam-se as pessoas à vontade para fazerem as conjecturas que entenderem, sendo certo que é um dado adquirido que todas as gerações percepcionam que há problemas com a Segurança Social e, em particular, com o sistema de pensões. Mas as pessoas estão baralhadas, pois ouvem dizer que está tudo bem e o seu contrário, que a culpa ora é do desemprego ora é da demografia. E ficam sem saber de que lado está a verdade. As pessoas estão desorientadas. Por um lado querem saber, por outro lado têm medo.
É evidente que o debate já deveria ter acontecido, o seu adiamento alimenta a desconfiança e faz crescer a instabilidade, tudo o que não deveria acontecer.
Todo este caminho seria bem diferente com um quadro institucional de governação do sistema de pensões e da Segurança Social diferente daquele que temos. A falta de transparência e ausência de informação constituem barreiras efectivas a um debate sério. Estas barreiras impedem a sociedade em geral, os decisores políticos, os parceiros sociais e outras partes interessadas de conhecerem, com regularidade e profundidade, a evolução macro daqueles sistemas e os impactos das decisões políticas.
Há falta de estudos oficiais - se existem não são publicados - e a falta de credibilidade e fiabilidade há muito que tomaram conta das projecções das contas e dos estudos que lhe estão associados, os dados oficiais sobre as muitas variáveis em presença são complexos, incompletos e opacos e não há partilha de conhecimento de fontes públicas com a comunidade política, social, académica e outros.
Ou seja, este "estado da arte" impede a existência de uma base inquestionável e sólida de partida para o debate que é urgente fazer com a necessária ponderação. A questão é: qual é o ponto de partida? Sem informação credível não pode haver um debate sério. Mais, esta falha abre as portas para que aconteça precisamente o contrário.
Se não resolvermos este problema não seremos capazes de passar para um patamar de confiança e segurança. Este salto é fundamental para melhorar a qualidade das próprias escolhas políticas e para instituir uma plataforma de escrutínio público que inclui as instituições e a sociedade civil.
O ruído sobre as pensões seria certamente mais comedido se existisse informação rigorosa e auditada. Não só a informação é vital, como não é admissível que haja monopólio dessa informação por parte dos governos que em cada momento estão em funções.
O melhor caminho para não se resolver um problema ou para iludir a sua existência é não o querer compreender ou então, conhecendo-o, não o querer assumir. É por isso fundamental que, para se encontrar uma solução para um problema, seja primeiro necessário compreendê-lo, ou seja, identificar as suas causas. Ora, antes do problema da Segurança Social e do sistema de pensões, temos o problema que se chama falta de transparência.
O tema da governação começa a ganhar mais peso no País, seja na administração pública, seja nas empresas e nas instituições. Os modelos de governação fazem toda a diferença. É a diferença entre ter ou não ter transparência, entre ter ou não ter conflito de interesses, entre ter ou não ter fiscalização, entre ter ou não ter confiança , entre ter ou não ter boas práticas de gestão ou entre ter ou não ter bons desempenhos.
Enfim, chegámos a um ponto da vida do nosso País com muitos problemas de raiz por resolver. Fomos nós que os criámos, somos nós que os temos de resolver, está a levar muito tempo...
Cara MCA
ResponderEliminarCom alguma ironia mas não toda, eu diria que o ponto de partida sobre a polémica da chamada sustentabilidade das pensões deveria começar por definir os limites dos parâmetros que incidem sobre o valor da chamada “sustentabilidade” das pensões.
Assim deveria inscrever-se na Constituição Portuguesa, à semelhança do que propõe a maioria para o valor do défice público, um limite máximo da taxa de desemprego na ordem dos 6%, a obrigatoriedade de um saldo migratório positivo, a obrigatoriedade de um saldo demográfico igualmente positivo e um salário mínimo com acréscimo obrigatório todos os anos proporcional ao crescimento económico.
Os governos deferiam assim ficar obrigados a executar as políticas indispensáveis à concretização destes objectivos.
Não deveriam incitar os jovens à imigração nem criar uma instabilidade permanente no emprego, nem proceder à diminuição de salários. Estou certo que obedecendo a estes preceitos constitucionais deixaríamos de falar muito rapidamente na chamada sustentabilidade das pensões.
Pode acreditar, sempre que abro a lista mensal dos aposentados, pergunto a mim próprio, até quando isto vai estoirar?
ResponderEliminarJá aqui o disse: Um amigo sevilhano, pensionista, tinha salário de 5.500€ e a pensão é de 2000€.
Há dias estive com um escritor de Mérida e dizia-me, a minha pensão é de 2000€.Pensões limitadas.
Ambos ficam admirados por certas pensões em Portugal.
Apenas por curiosidade, uma senhora de Buenos Aires diz que a coisa por lá anda mal e quanto a segurança, apesar de mau, de longe prefere estar em Espanha.
Cumprimentos.
A esquerda faz de conta que o problema da sustentabilidade das pensões não existe e até ironiza relativamente a ele. Inclusive conheço pessoas ainda jovens que vão por esse caminho, o que é estranho, já que deveriam estar preocupadas com o seu próprio futuro. Mas o tempo corre e, como já afirmou Medina Carreira, esse problema das pensões é uma bomba-relógio...Depois, afirmou ainda ele, já não será a Constituição contra os fatos mas sim os fatos contra a Constituição. Nessa altura, a situação será muitíssimo mais dura. Se existisse responsabilidade, o problema seria analisado a fundo e chegar-se-ia a um amplo acordo, a um quase pacto de regime, diria eu, a fim de pelo menos se atenuar o problemas mediante medidas apropriadas que realmente se impõem para uma correção de rumos que urge.
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ResponderEliminarSenhores comentadores anteriores,
Com todo o respeito que me merecem os pontos de vista colocados com urbanidade, intervenho apenas para reparar que a questão nuclear desta reflexão de MCA é ausência de divulgação de dados e de transparência dos dados divulgados, que não permite a análise ideologicamente descomprometida da questão da sustentabilidade da segurança social. Quem pode discordar?
Caro Carlos Sério
ResponderEliminarEstá mesmo convencido que por inscrever todos esses desejos na Constituição haverá um milagre? Pode explicar o que é o saldo demográfico positivo? Com que políticas o vai obter?
Caro opjj
O sistema de pensões em Estanha tem, há já muitos anos, plafonamento (horizontal, aplica-se acima de um determinado montante), isto é, tem um tecto salarial até ao qual são calculadas as contribuições e um tecto ao valor da pensão a pagar. A maior partes dos países europeus tem plafonamento.
Estamos muito atrasados nas reformas a fazer, o tempo passou e a nossa situação orçamental agravou-se. A dificuldade de introduzir o plafonamento está no facto de implicar um período de transição ao longo do qual há uma redução de contribuições sem a correspondente contrapartida de pensões menores. Os benefícios do plafonamento surgem muitos anos à frente. No entretanto, é necessário encontrar financiamento para as receitas perdidas. Ora, esta é uma dificuldade objectiva que temos.
Em bom tempo, a Espanha percebeu que tinha de ir mais longe.
Caro Pedro Almeida
Do contacto que tenho com as gerações mais novas, o que vejo é a total desconfiança no sistema. Muitos jovens acham mesmo que não deveriam fazer contribuições, que cada um deveria tratar da sua reforma! Já perceberam que o custo de não se fazerem mudanças vai ser por eles suportado, seja com aumento de impostos, seja com redução de pensões. É interessante analisarmos que o envelhecimento da população, vai por um lado reduzindo o peso "político" dos mais novos e, por outro lado, fazendo pesar o grupo dos mais velhos. As associações de reformados tenderão a ter um peso eleitoral crescente.
Caro Rui Fonseca
Diz bem, é a questão nuclear da reflexão e é uma questão nuclear para o bom funcionamento de um sistema de pensões. Esta questão nuclear tem impedido uma compreensão aprofundada e alargada sobre o sistema de pensões. É, a meu ver, um entrave a mudanças.
Cara Margarida,
ResponderEliminarPartilho, no essencial, as suas preocupações quanto à necessidade de divulgação de informação esclarecedora da situação e das perspectivas do sistema de segurança social, em todas as suas vertentes, muito em especial na vertente das pensões.
Enquanto essa informação não for divulgada, de forma clara e completa, a discussão política do tema continuará envolta em enorme confusão, poucos perceberão o sentido e a viabilidade das propostas que vão por aí surgindo...
Uma revisão do "velho" Livro Branco da Segurança Social, editado há quase 20 anos, teria pleno cabimento.
Dr. Tavares Moreira
ResponderEliminarLembra bem o Livro Branco da Segurança Social, um trabalho que é oportuno reler que nos transporta para a realidade de hoje.
Mais um excelente - porque muito esclarecedor - texto seu, Margarida.
ResponderEliminarCara Margarida,
ResponderEliminarE se há alguém a quem deveria ser confiada a coordenação do trabalho de actualização do "velho" Livro Branco, esse alguém chama-se... Margarida Correa de Aguiar!
Apoiado!
ResponderEliminarDr. Tavares Moreira, deixa-me sem palavras. José Mário, não sei o que dizer.
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