sábado, 5 de novembro de 2016

Uma Europa adormecida

Enredada nas suas contradições, enfraquecida pela mediocridade das suas lideranças, entretida com a espuma dos dias, a Europa vai alienando o seu património para garantir a manutenção do modo de vida que instalou após a II Guerra Mundial. Não se apercebe que, tal como os nobres falidos, está a vender as últimas jóias da família para conservar o brasão.

Em letras pequenas, a imprensa noticia que a Volvo vai deslocalizar boa parte da sua produção para a China. Não se trata de um ato isolado, nem começou com a Volvo o movimento de fixação na China e noutros chamados emergentes de importantes centros industriais. Não irá terminar com a Volvo. Dominando a China, hoje, as melhores tecnologias e possuindo as melhores infraestruturas industriais, beneficiando de baixos custos de produção, a deslocalização de unidades emblemáticas da Europa era uma inevitabilidade há muito anunciada, facilitada pelo desarmamento progressivo das barreiras ao livre comércio. À China, obviamente, só interessa que a sede das empresas se mantenha na Europa. E a Europa tarda a perceber o que lhe está a acontecer. Quando acordar, acordará pobre. E nessa altura nem mercado será para a própria China.

8 comentários:

  1. Anónimo11:20

    Caro Ferreira de Almeida, a deslocalização da produção nem é o mais gravoso. A compra por outras entidades é bem mais complicada por envolver todas as patentes e engenharia da marca, algo substancialmente mais importante do que o fabrico. De qualquer forma a Volvo Cars há quase vinte anos que não é Sueca. A Volvo decidiu desinvestir do ramo automovel ainda nos 1990s tendo vendido a divisão dos carros à Ford e esta vendeu-a posteriormente a interesses chineses. Mas há depois o reverso da medalha, as divisões de autocarros e camiões, estas sim, mantêm-se Europeias na Volvo original e tem adquirido fabricantes doutros lados. A Volvo é accionista de referência da Mack, um fabricante Americano de camiões e da divisão de camiões e motores industriais da Nissan.

    Hoje em dia as empresas já não são o que eram, pequenas e nacionais. As marcas já pouco dizem quanto à origem dos seus donos e até um carro ter uma dada marca não significa que seja fabricado por essa marca. Os Mercedes Class G são fabricados pela Magna-Steyr, na Áustria, sendo a Magna-Steyr, embora nominalmente Austríaca, detida por Canadianos.

    O mercado é internacional hoje em dia.

    ResponderEliminar
  2. "a Europa vai alienando o seu património para garantir a manutenção do modo de vida que instalou após a II Guerra Mundial"

    Será que isto quer dizer mesmo que a Europa deve seguir o caminho do empobrecimento e da austeridade perpetuas?
    Será?
    Afinal onde estão as pessoas?
    Serão carne para canhão das multinacionais e dos seus patrões que com tais políticas vêm aumentar de ano para ano as suas fortunas, ampliando para números nunca antes vistos as desigualdades sociais?
    Consciente ou inconscientemente é esta a mensagem.

    Isto já não é ser de direita, isto é a apologia do totalitarismo.

    ResponderEliminar
  3. Meu caro Zuricher, permito-me discordar do meu Ex.mo Amigo. O investimento estrangeiro nunca foi um mal para a Europa. Foi em parte à custa dele que se deu a reconstrução. Não vem desse lado qualquer problema, sendo certo que nos últimos tempos o investimento nas empresas de referência sediadas na UE tinha uma natureza mais especulativa do que reprodutiva. O que ocorre agora em grande parte da Europa é a aquisição de empresas por capital de emergentes seguido, mais tarde ou mais cedo, da deslocação dos centros de produção para paragens onde os custos de produção são menores, aumentado a competitividade dos produtos sem ser à custa, como no passado não muito distante, da qualidade. Diz-me o meu Amigo que é assim o mercado internacional na atualidade. Não tenho sobre isso qualquer dúvida. O que sinto é que a desindustrialização em curso com os seus saldos negativos no emprego e a inevitável degradação de níveis de vida, não se vê como pode ser compensada por outras vias de criação de riqueza. E não se vê porque é patente a falta de visão dos dirigentes e a acomodação dos eleitorados.

    ResponderEliminar
  4. Anónimo20:19

    Caro Ferreira de Almeida, não pretendi dizer que o investimento estrangeiro é um mal. De todo em todo, mesmo! Quis apenas ressalvar que embora tenha os seus prós e o saldo seja positivo, se olharmos apenas aos contras, então a perda das patentes e da engenharia é um mal muito superior ao da perda do fabrico. É nas patentes e na engenharia que está o grande valor. Não no fabrico. Com impactos prolongados no tempo dado que quando empresas Europeias precisarem usar este ou aquele produtos ou métodos de fabrico têm que pagar royalties a empresas do espaço extra-Europeu. Em termos globaiss é dinheiro que sai da Europa quando antes entrava ou girava dentro do continente.

    Em relação ao resto estamos de pleno acordo. Hoje em dia produz-se o mais barato porque, efectivamente, é o que os clientes procuram. A qualidade é cada vez mais um nicho de mercado. Mas, falando apenas na qualidade, a qualidade da construção Europeia é chão que deu uvas na maioria dos sectores. Tirando em casos muito pontuais, na indústria Europeia qualidade hoje em dia é algo muito dúbio. Existe em muito poucos sectores. Até coisitas pequenas, género os electrodomésticos que todos temos em casa, que marca Europeia existe que consiga ombrear com a KitchenAid dos EUA? Concordo consigo, porém, em que a desindustrialização é um problema muito grande e, sinceramente, também não vejo como pode a Europa recuperá-la em larga escala. Muitas vezes justifica-se esta deslocalização apenas com os salários nos países baratos mas é muito mais do que apenas a questão salarial. É um todo que torna a produção mais barata e, ainda assim, em vários sectores mantendo qualidade muito apreciavel. Na Europa, inversamente, os custos (e riscos...) são cada vez maiores daí ser natural assistir-se a essa deslocalização. Os EUA aparentam estar a começar a arrepiar caminho. Veremos a ver o que acontece.

    ResponderEliminar
  5. Caro Ferreira de Almeida,

    " E não se vê porque é patente a falta de visão dos dirigentes e a acomodação dos eleitorados."
    Possíveis causas:
    - Visão no máximo a 4 anos (agora parece que até é apenas a um ano);
    - Os eleitores deixam tudo nas mãos dos governos. O problema está no excesso de estado que retira autonomia e sentido de responsabilidade às pessoas. É um jogo praticado pelos governos (partidos) que só pode dar mau resultado.

    ResponderEliminar
  6. Tem toda a razão, meu caro Alberto Sampaio. A dimensão participativa da democracia é hoje uma quimera ou próximo disso.

    ResponderEliminar
  7. Meu caro Zuricher, li de novo o seu primeiro comentário e o que seguiu ao meu. Não tinha entendido bem o alcance do que anotou no primeiro, vejo agora que sublinhava a questão, de facto importantíssima, das patentes e das transferências de tecnologia, com o que estou de acordo por inteiro.

    ResponderEliminar
  8. A Europa vem dinamizando políticas que afectam a competitividade das empresas, aumentando os custos de produção e assim favorecendo a deslocalização. Dou o exemplo da política energética. A China polui imensamente mais que a Europa, tendo por isso custos de energia muito mais baixos. As políticas de energia europeias são um verdadeiro subsídio dado à indústria chinesa. Eles agradecem.
    Os EUA baixaram substancialmente os custos da energia com o gás de xisto, ao ponto de muitas empresas deslocalizadas terem voltado aos Estados Unidos. Por cá, a corrente é da proibição de tal fonte de energia, chegando-se até a proibir a busca de locais onde a mesma posaa existir.
    Tudo feito por lóbis, em nome de princípios e de conclusões ditas científicas não comprovadas. Mas que fazem a corrente que leva ao empobrecimento europeu.

    ResponderEliminar