segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

O dia que hoje existe

Um amigo que vai partir para a Colômbia ofereceu-me este Natal uma colectânea de poemas “Um País que sonha – cem anos de poesia colombiana”, publicada pela Assírio e Alvim. Estamos a habituar-nos aos que partem , aos que chegam por uns dias que mal dão para matar saudades, estamos a habituar-nos a deixar de ser parte da vida deles, tentamos contar-lhes como ficámos, trazê-los de novo ao nosso quotidiano, mas foge-lhes o olhar, distrai-se a atenção, há que tecer novos fios, encontrar amarras, eles que fiquem partindo, eles que nos levem deixando-nos. Todos os dias muda o ano, que se esgota para trazer outro, o tempo atrás do tempo e nós atrás dele, tenho saudades, diz-me um cartão, ainda bem que temos as saudades para nos encher o novo ano, vamos guardá-las connosco, prolongando os afectos, é sinal de que um dia gostámos e voltaremos a gostar, ainda e sempre, assim se alargue a nossa alma, ano após ano, ausências e presenças a encher-nos os dias.

O dia que hoje existe

Viva e triunfante
a lua ergue-se
sobre a vastidão destes campos.
Sopra o vento e passa
e o seu canto traz-me à memória
a imagem de um melro,
outra lembrança não faz falta.
Pergunto-me se voltará
a ave ao jardim,
à árvora que foi sua.
Mas se duvida e não o sabe
ou se o seu voo prefere
o ar profundo de outro astro,
não importa;
a alegria que me produziu a sua presença
tem e terá sempre o seu próprio,
incessante, intenso resplendor:
toda a luz e a luz do dia.

Álvaro Rodriguez Torres
(in Um País que sonha cem anos de poesia colombiana)

Um Feliz ano de 2013!



"Vencidos da vida"


Encontrei, hoje, num alfarrabista, o livro do poeta Manuel da Silva Gaio, "Os vencidos da vida", texto que serviu à conferência proferida na sede da "Associação de Estudantes da Faculdade de Letras da Universidade de Combra, em 28 de abril de 1928.
Destaco a seguinte passagem: "Certa noite, entrando na sala do restaurant onde haviam de cear, souberam os Vencidos que no quarto ao lado estava uma mulher, só, esperando alguém... que não chegava.
Mandaram-na convidar a vir cear com eles.
Aceitou.
Era a célebre Maria Juliana - a mais petulante e engraçada aventureira da época.
A sério, ia um dos convivas (naturalmente Oliveira Martins) explicar o terrível deficit do país, quando ela exclamou:
- Bem o conheço - é o do Banco Inglês.
Aludia a um Duff, então director daquele Banco.
E ali armou ela com Guerra Junqueiro um dos seus mais vivos e renhidos assaltos de frase.
Já no fim, quando o poeta, derivando do assunto, calculava a despesa provável duma esboçada viagem - observou-lhe, impertinente:
- Isso é a minha conta, só no sapateiro.
Ao que ele, sem hesitar, replicou logo:
- Deixa cá ver quantos pés tens."

Moral da passagem, hoje, também, temos um défice terrível, temos de cear, temos de fazer contas, continua a haver Marias Joaquinas, não sei com quantos pés, "directores de bancos" a gozarem connosco e, por fim, os vencidos da vida, mas os atuais não se comparam nem de perto nem de longe à craveira daqueles onze magníficos.

Um olhar social a caminho de 2013…

No final do ano é costume formularmos votos de Bom Ano Novo. É normal que as pessoas desejem umas às outras o melhor para as suas vidas no ano que vai entrar, que tudo aconteça de acordo com as melhores expectativas, que os seus desejos se realizem, não faltam os votos de saúde e de muitas alegrias e felicidades.
Sabemos como são especialmente importantes as palavras de alento e de esperança de mudança para as pessoas apanhadas pelo desemprego, muitas delas sem disporem de qualquer rendimento, que procuram trabalho mas não encontram resposta positiva, e que se confrontam diariamente com dificuldades financeiras para resolver necessidades tão essenciais como a habitação ou a escola dos filhos. O agravamento dos sacrifícios em 2013 vai especialmente pesar sobre todos aqueles que estão no desemprego e que vivem com carências económicas significativas.
Tenho esperança que em 2013 o país cresça em consciência social e que, como tal, governo, políticos, empresas e cidadãos ganhem maior sensibilidade social, sejam mais responsáveis e estejam mais disponíveis para contribuir para o reforço da solidariedade social, seja no plano político, seja no plano institucional e individual. Esta esperança funda-se na observação do ano de 2012 que não deve deixar ninguém indiferente perante o sofrimento de muitos portugueses.
Justamente num momento em que a taxa de desemprego atinge níveis muito graves e em que a pobreza está a crescer a partir de níveis já de si elevados esperava-se do Estado Social uma maior capacidade na protecção das pessoas e famílias atingidas por estas chagas sociais. O Estado Social falhou quando era mais necessário, para quem dele necessita. A situação é de grande emergência financeira, mas passou a ser também de grande emergência social.
Desejo, pois, o maior cuidado nos cortes anunciados de 4,4 mil milhões de euros na despesa pública, que sejam procuradas e encontradas alternativas que não afectem os níveis de rendimento já de si muito baixos e precários da maioria da população e que não reduzam os níveis de protecção social já de si fragilizados. 
 
Votos de um BOM ANO 2013 para todos os nossos Amigos, Comentadores e Leitores!

2013: olhem mais para a economia e menos para o orçamento...

1. Ao lerem o título deste Post, alguns dos nossos muito estimados Comentadores terão, naturalmente, a tentação de observar: olhem, este tanto mal andou a dizer e agora converte-se ao Crescimentismo! Mas nada de mais enganador...
2. Tenho aqui sustentado, desde sempre, que o grande objectivo do Programa de Ajustamento da Economia Portuguesa (PAEF) consiste na correcção dos desequilíbrios que a mesma evidenciou e acumulou ao longo de mais de 15 anos, reflectidos num sucessivo e enorme défice das contas com o exterior (vulgo balança de pagamentos)...
3. Esse desequilíbrio, como também sabemos, ficou a dever-se a uma excessiva expansão da despesa pública e privada, sem contrapartida na produção de bens e serviços transaccionáveis, a qual conduziu ao sobre-endividamento das Famílias, das Empresas e do Estado (em sentido amplo, compreendendo o Central, o Regional, o Autárquico e o Empresarial), bem como a uma bolha considerável no sector dos serviços não transaccionáveis (agora grandemente responsável pelo surto de desemprego)...
4. A não correcção desse desequilíbrio em tempo útil teria conduzido a uma catástrofe económica, financeira e social de grandes proporções, envolvendo a falência não apenas do sector privado (Famílias e Empresas, até agora duramente atingidos) mas também das várias componentes do Estado...
5. Foi exactamente para evitar uma catástrofe desse tipo que em Maio de 2011 se celebrou o PAEF, com a famosa Troika, incluindo uma parafernália de instrumentos dirigidos à correcção dos desequilíbrios assinalados.
6. O PAEF atribui enorme relevo à correcção do défice orçamental - como não podia deixar de ser, dada a enorme escala das despesas públicas no contexto da economia, que confere ao Estado (em sentido amplo, repito) o estatuto de agente económico de longe mais relevante - mas compreende igualmente um conjunto de medidas dirigidas à correcção do sobre-endividamento dos demais sectores.
7. Assim, o grande sinal de sucesso do PAEF será dado pelos indicadores do reequilíbrio externo da economia: balança de bens e serviços e balança corrente+balança de capitais.
8. Em 2013, as previsões do BdeP apontam para uma completa reviravolta das contas com o exterior, que deverá traduzir-se em SUPERAVITS da balança de bens e serviços de 4,5% do PIB (em 2012 praticamente equilibrada) e de 4% no saldo conjunto das balanças corrente e de capitais (ligeiro superavit em 2012).
9. Caso essas previsões venham a confirmar-se – é esta a grande incógnita para 2013 - poderá dizer-se, afoitamente, que os objectivos do PAEF terão sido amplamente cumpridos, representando mesmo um sucesso de tal ordem que qualquer 0,5% ou 1% de desvio no objectivo fixado para o saldo orçamental passará a ter um significado pefeitamente secundário...
10. É este que não outro o sentido do título dado a este Post...e, como podem verificar, não existe aqui a mais leve réstea de teoria crescimentista...

domingo, 30 de dezembro de 2012

Rita Levi-Montalcini





Morreu hoje, com 103 anos. Foi prémio Nobel da medicina em 1986. Uma mulher notável. 
Na altura  em que ia fazer cem anos deu uma interessante entrevista. Com base nas suas palavras escrevi um pequeno texto. Reli-o.

http://quartarepublica.blogspot.pt/2009/04/rita-levi-montalcini.html

Proibido!

Nesta reta final de 2012 recupero uma foto que tirei a um mural de uma escolinha de um povo remoto para a todos desejar para 2013 o que as crianças que o pintaram ali desejaram publicamente.


sábado, 29 de dezembro de 2012

"Arte ou necessidade" de enganar



A espécie humana apresenta características próprias, sendo algumas particularmente interessantes, universais e tão frequentes que esbarramos nelas a toda a hora, em todos os locais e níveis sociais. Pretendo destacar uma delas que nos incomoda, que nos faz sentir pequenos, responsável às vezes por elevados prejuízos, sofrimento físico, morte de alma ou simplesmente por pequenos custos que com o tempo se esquecem; de qualquer modo deixam sempre qualquer coisa a moer por dentro, alertando-nos para que não caiamos novamente. Trata-se do engano.
A capacidade de enganar está muito disseminada, a ponto de, em determinadas circunstâncias, chegar a ser considerada como normal, como uma forma de vida, havendo técnicas mais ou menos elaboradas para conseguir que as pessoas adquiram os serviços e os bens em causa. Neste caso basta ver a publicidade que passa na televisão, abusiva, distorcida, eticamente condenável, mas legal, em que vários agentes se "enfeixam" com a maior das naturalidades. Muitas pessoas são "convidadas" para poderem vender a sua banha da cobra. Estamos perante enganos "legais". Noutras circunstâncias as coisas são mais complicadas, como é o caso de relatos de pessoas que são burladas a torto e a direito por indivíduos sem escrúpulos. Somos todos potenciais vítimas, mas o caso dos idosos merece particularmente atenção. Caem com extrema dificuldade, agravando mais as suas condições de vida ao serem espoliados dos seus parcos bens. Outros, mais organizados, arrebatam para longe dos seus países pessoas ansiosas de deixarem a miséria, acabando por serem exploradas a vários níveis, caso da escravatura sexual e dos migrantes que vão trabalhar e que não recebem, verdadeiras formas de escravatura, fenómenos que definem bem os seres humanos. Mas há, também, os de alto coturno, que conseguem, através dos sistemas financeiro e económico, destruir as sociedades como é o presente caso em que estamos todos envolvidos. Mesmo na área da saúde esta é vendida com despudor de várias maneiras, apelando, por exemplo, à ansiedade futura de doenças que nunca irão ocorrer e se ocorrerem não há garantias de solução com as técnicas propostas. Sempre é uma forma de enganar, quase que diria, ironicamente, "cientificamente comprovada", um termo utilizado de forma abusiva em muitas circunstâncias. Há, também, burlões que conseguem entrar em certos circuitos sociais, políticos e económicos, capazes de distorcerem a realidade, criando novas expectativas e originando "verdades de ocasião", que podem provocar prejuízos, isto para não falar dos enganos mais comuns, os de natureza política. Mas afinal o que está por detrás deste fenómeno? A crença de que os outros são honestos e capazes de ajudarem o próximo, o que nem sempre é verdade e a facilidade de acreditarmos em falsas promessas, a que podemos acrescentar ambições ocultas, típicas de quem, também, pode "enganar o próximo". Quase que diria que o ser humano "gosta" de ser enganado ou necessita de enganar para poder atingir os seus objetivos, políticos, económicos, sociais, profissionais e, até, religiosos.
"Meio mundo anda a enganar a outra metade". Alguns nascem, vivem e morrem nas suas próprias metades, sempre burlões ou sempre honestos, mas há também um grupo muito significativo que, volta e não volta, salta de um campo para o outro, burlões hoje, vítimas amanhãs. Por fim, há ainda aqueles que passaram "definitivamente" do lado dos "burlões" para o lado dos "honestos". Quando tal acontece falam com um à-vontade fora de comum, tornando-se em moralistas de primeira e fina água. Será que estão verdadeiramente arrependidos? Não sei, pode ser que sim.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Mutualização de dívidas: bom ou mau?

A nova Lei das Finanças Locais prevê a mutualização das dívidas dos municípios, isto é, todos os municípios contribuem para o saneamento financeiro daqueles que estiverem em situação de ruptura financeira, leia-se, que registem uma dívida superior a 225% das receitas.
A mutualização será feita através da criação de um fundo, o Fundo de Apoio Municipal. Tanto quanto entendi das explicações que ouvi, todos os municípios serão obrigados a fazer contribuições para o FAM.
Os municípios em situação de necessidade financeira serão obrigados a recorrer ao capital do FAM para apoio financeiro, ficando sujeitos a programas de ajustamento e ao pagamento de juros pela utilização dos fundos resgatados. Uma solução estilo “troika”, embora desconheça, e são aspectos relevantes, quem vai gerir o FAM e quais as regras a que ficam sujeitos os resgates.
Seja como for, a mutualização das dívidas dos municípios levanta a questão, pelo menos teórica, de saber se poderemos estar perante uma situação de “moral hazard”, fenómeno que se verifica quando há tendência para os agentes económicos assumirem riscos que de outra forma não assumiriam por saberem que os potencias custos serão suportados por outros e/ou se o mecanismo de mutualização introduz uma maior responsabilização dos municípios - individual e colectiva - na gestão financeira.
A Associação Nacional de Municípios Portugueses é que já se manifestou contra a nova Lei, dizendo que em relação à mutualização das dívidas discorda que os municípios com contas equilibradas financiem os desequilíbrios financeiros dos municípios incumpridores.  

Uma atitude que merece registo especial...

1. Conheço apenas pelos relatos da comunicação social as possíveis razões para a demissão voluntária do Doutor Nogueira Leite das funções que exerceu até agora no CA da CGD: nuns casos fala-se em divergência quanto à estratégia de negócios; noutros, de dificuldades com a Tutela; noutros ainda, de problemas de gestão interna relacionados com a denúncia de práticas irregulares nunca devidamente esclarecidas.
2. Seja qual for a razão, considero digna de especial registo a atitude assumida pelo Doutor Nogueira Leite, pelo simples facto de ser bastante rara: hoje em dia as pessoas que ocupam lugares deste tipo quase nunca saem pelo seu pé, pelo contrário resistem até onde podem para manter o lugar, movendo todas as influências possíveis para o efeito.
3. Recordo-me de que há cerca de 20/25 anos a situação era bem diferente, este tipo de atitudes era bem mais frequente: as pessoas que exerciam funções de alta responsabilidade em instituições públicas, nomeadamente no sector financeiro, eram capazes de deixar os seus lugares quando entendiam que as orientações não eram as que lhes pareciam mais adequadas ou quando se sentiam pessoalmente menos bem tratadas.
4. Hoje em dia assiste-se a uma atitude generalizada de grande conservadorismo no desempenho destes lugares, está instalado um tipo de carreirismo em que tudo se suporta em nome da preservação do lugar e quase ninguém arrisca uma atitude de independência e desprendimento como esta que agora testemunhamos.
5. Não deixa de ser curioso que este conformismo se estende ao conjunto da sociedade que se organiza em torno do poder, em diferentes níveis como os anéis de Saturno: repare-se no reduzidíssimo eco que a atitude do Doutor Nogueira Leite acabou por ter, já ninguém fala na sua saída por muito importantes que tenham sido as razões que a determinaram...
6. E a própria comunicação social, que neste tempo e com tanta frequência gosta de se mostrar crítica acérrima das orientações da política económica – normalmente sem fundamento, valha a verdade - neste tipo de assuntos opta por uma grande discrição, vestindo o uniforme cinzento da grande maioria...
7. Por tudo isto considero que a atitude de Nogueira Leite, sem curar agora de avaliar as razões que a determinaram até por não as conhecer suficientemente, é merecedora de uma nota especial de apreço, pelo desprendimento e pela independência de espírito que revela, contrastando com o conservadorismo e apego ao lugar que se tornaram apanágio da grande maioria neste nível de responsabilidade do sector empresarial do Estado.

Juntam-se a fome e a vontade de comer

Um burlão digno desse nome é minucioso na sua arte de enganar, toma todas as precauções para iludir a sua vítima e para isso usa a fraqueza do outro, os seus pontos fracos ou, por outras palavras, usa sem cerimónia a vontade que o outro tem de ser enganado. E de onde vem ao burlado a vontade de ser enganado, é porque é tolo? Não, é porque se julga muito esperto. Julga-se tão esperto que espera poder tirar um proveito a que não teria acesso fácil ou ao qual não teria sequer direito nenhum. Quer isto dizer que nunca há só um burlão, há sempre dois, um que percebeu o que o outro quer e não pode ter, ou porque não existe ou porque é muito caro ou difícil, e este porque quer alcançar o que o outro lhe oferece de bandeja, sem lhe exigir o preço ou o esforço que o cobiçado resultado exigiriam. O espertalhão é burlado com facilidade, julgando que os que não viram a oportunidade são estúpidos, ou pouco lestos, adianta-se a todos, aproveita com sofreguidão, nem acredita na sorte que lhe tocou, vangloria-se intimamente com a sua glória, ah!, quando os outros souberem, ou quando eu anunciar, o burlado é vaidoso, ou trouxa, como dizia o meu avô, e um vaidoso humilhado ou um trouxa apanhado pela sua credulidade sentem raiva ou sofrimento mas não inspiram pena.
O povo traduz esta teoria arrevezada de forma muito simples: “Junta-se a fome com a vontade de comer”. É por isso que as burlas são, em regra, tão perfeitas na sua execução e tantas vezes ocultadas ou negadas pelos burlados, porque denunciam duas artinhamas ridículas depois de descobertas.



quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Economista do Ano

Perto do fim do ano, estamos em condições de especular sobre os Economistas que mais se distinguiram em 2012. Por mim, daria o título, ex-aequo, a quatro ilustres catedráticos nas matérias económicas, a saber:
Artur Batista da Silva, José Reis, Boaventura Sousa Santos, Mário Soares.
Noto que a nomeação tem apenas a ver com as contribuições dadas como Economistas para o progresso da ciência económica, não entrando em linha de conta com quaisquer outros dados curriculares ou de natureza pessoal. Que fique bem entendido.
A nomeação deve-se à contribuição teórica que todos deram para a solução dos problemas estruturais da economia portuguesa, descrevendo com rigor as causas da crise, os seus responsáveis e as medidas correctivas a implantar. Deve-se particularmente a Artur Batista da Silva a investigação fundamental que levou à descoberta da responsabilidade da Comissão Europeia na crise portuguesa, por ter injectado fundos em Portugal e ter obrigado os sucessivos governos a comparticipar nos projectos, do que resultou um aumento da dívida pública. Aos restantes deve-se a investigação original que coloca como causa da crise, a par dos especuladores internacionais, que nos emprestaram dinheiro a mais, o BCE, o FMI e a Troyca, por cobrarem juros pelo apoio prestado, minimizando assim o reflexo na crise do aumento da dívida pública. A investigação enfatiza a superioridade das medidas de natureza financeira em relação a meras medidas de natureza económica atinentes a revitalizar a actividade económica. Neste contexto, a questão da produtividade para o crescimento da economia é algo tão negligenciável nas investigações levadas a cabo que nem sequer é mencionada. Um trabalho de grande fôlego teórico que dá aos políticos e governantes os instrumentos para resolverem os problemas com que Portugal se debate.

Burlão mau...e burlões bons!...

Artur Batista da Silva viu que tinha na comunicação social um fortíssimo mercado completamente disponível para adquirir as mais tontas teorias, desde que servissem a Agenda dos que se opõem ao Memorando da Troyka e às políticas nele consignadas.
Feitas as devidas apresentações, foi um sucesso de conferências, entrevistas, aparições. Um cartão da ONU e de Professor numa Universidade americana maximizavam o efeito devastador das suas teses na política governamental.
Alguém o conheceu na televisão e foi a desgraça. De grande guru passou rapidamente a grande falsário e burlão.
E a mesma comunicação social que o promoveu e distribuiu embevecida as suas teorias logo tratou de desfazer no personagem, mantendo todavia intacta a “verdade” das suas ideias.  
Aliás, as mesmíssimas ideias que outros tantos e tantos, hora a hora, vão passando pelas nossas televisões, com as mesmas teses, preconceitos e juízos finais. Como urge preservar esses doutrinadores, mata-se o personagem que apareceu do nada e não fazia parte da nomenklarura.   
Afinal, a grande burla é a do cartão. Porque a burla da mensagem tem que ser preservada. Custe o que custar. 

Será que o senhor forçou a entrada?

Leio que alguns dos órgãos de comunicação que convidaram aquele senhor que ao que dizem não é quem julgavam, intentam levá-lo a tribunal. Pode ser que tenham um bom motivo para isso para além da tentativa de apanharem a cara do chão. Porém, será provavelmente a primeira vez na história da justiça portuguesa que alguém é processado por ter correspondido ao convite...

Deixem Artur Baptista da Silva em paz!:..

1. Numa sociedade em que os sentimentos hipocrisia e farisaísmo se encontram solidamente implantados e generosamente distribuídos, todas as baterias apontam agora na direcção de Artur Baptista da Silva (ABS)...mas porquê?
2. A resposta até será simples mas não é, ao contrário do que possa parecer, pelo facto de indiciariamente se tratar de um impostor, que terá inventado uma falsa ligação à ONU e exibido título académico de uma inexistente universidade americana...
3. A verdadeira resposta está no formidável coro de elogios que as intervenções deste falso profeta mereceram de um considerável escol de “Sumidades” cá do burgo, que o foram ouvir, o entrevistaram e fizeram absoluta fé no que ouviram, como se de um grande especialista e responsável da ONUse tratasse...
4. O que aconteceu foi que ABS, muito habilmente, percebeu que devia “tocar a música” que eles tanto gostam de ouvir e que em última análise tem a ver com a excelente ideia do Crescimentismo, que aqui tantas vezes temos discutido – crescimento económico sem recursos, que muitos políticos e alguns notáveis especialistas tanto proclamam como solução mágica para a economia portuguesa.
5. Atentem só neste belo naco de prosa, extraído de artigo publicado no último sábado, dia 22, da autoria de um conhecidíssimo “opinion-maker”, que teve aliás a subida honra de entrevistar Baptista da Silva na TV, no dia anterior: “ ABS é um ilustre desconhecido para a maioria dos portugueses. Mas não devia ser um ilustre desconhecido para o Governo. Em 1º lugar, porque coordena a equipa de 7 economistas que o SG da ONU, Ban Ki-mon decidiu criar para estudar o risco geo-político e social na Europa do Sul como resultado dos programas de ajustamento. E, em 2º, porque é ele que ficará encarregado do Observatório Económico e Social das Nações Unidas para a Europa do Sul, a instalar em Portugal em 2013”...
6. E, em conclusão, esta bela tirada “ a ONU, que suponho não pode ser acusada de estar contra o Governo, defende que Portugal tem de renegociar a sua dívida...será pedir muito a Passos Coelho, Vítor Gaspar e Carlos Moedas que leiam a entrevista que ABS deu ao caderno de economia do Expresso a 15 de Dezembro?”!!
7. É exactamente pelo facto de se terem deixado cair no enorme logro e no mais completo ridículo, com um entusiasmo quase delirante que a prosa citada bem evidencia, que estes “Doutores” tentam agora trucidar ABS, diante de quem até há poucos dias se curvavam respeitosamente e cujas opiniões tanto adularam!
8. Se virmos bem, ABS não é mais do que um ALFARABI dos nossos dias, um brilhante alquimista da economia, que teve o engenho de convencer esta NATA da economia portuguesa de que existe a moderna pedra filosofal – o crescimento económico sem recursos, o "nosso" Crescimentismo.
9. E como ele estudou e soube executar, de forma brilhante, a "partitura" que eles tanto gostam de ouvir...Pois então que deixem em Paz o ABS, por mim acho que ele até devia AGORA merecer uma demorada ovação...

De vez em quando uma boa notícia...

No meio das notícias catalogadas de "escandalosas", encontrei esta notícia. Pequena mas das tais que merecia maior relevo, afinal precisamos de boas notícias, bons exemplos, boas práticas.
Não tendo as sementes que centrifugam o mediatismo, notícias destas  ficam por aí ignoradas.  Esta é  sobre o sector do calçado, sobre os preços que praticamos no mercado internacional. Temos o segundo valor mais elevado. Não é necessariamente uma má notícia. O preço deve ser visto como um reflexo do nível de competitividade. A capacidade de gestão, a inovação e a internacionalização são factores que criam valor. O preço espelha as vantagens competitivas nele incorporadas. Portugal continua a fazer bem no sector do calçado, um sector que dispõe de uma associação empresarial que é um exemplo das vantagens que se obtêm quando muitas empresas sem escala juntam esforços para ter escala a nível global. Portugal sempre foi um país de "sapateiros", seria uma perda grande que não fosse capaz de modernizar este activo face ao desafio da escala global. A realidade encarregou-se de o provar. Em 2007 escrevi um post sobre o sector do calçado. Ao relê-lo verifico que se mantém actual...

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Quebrar a confidencialidade


A medicina tem-se tornado cada vez mais defensiva, com implicações óbvias para todos, especialmente para os doentes, que vai desde um certo grau de "desumanização" a tratamentos "excessivos" passando pela sujeição a exames muitas vezes desnecessários. 
A reforçar este comportamento tem contribuído algumas decisões judiciais. A última prende-se com a condenação de uma psiquiatra francesa por homicídio que foi cometido por um dos seus doentes. Como não reconheceu o "perigo público" do doente, que matou a avó, devido a facto de ter problemas mentais, a médica passou a ser a responsável. 
Há anos o caso Tatiana Tarasoff criou um novo paradigma nestas áreas, a quebra da confidencialidade. Um estudante indiano matou uma jovem que era sua amiga, ao  interpretar mal a situação, julgou que a moça estava interessada nele devido a questões culturais. A rapariga afastou-se, o rapaz entrou em depressão, andou em tratamento e, segundo a versão dos pais, terá confessado ao psicólogo a intenção de matar a rapariga. O psicólogo informou a polícia que o deteve durante algum tempo, mas tiveram de o libertar por, aparentemente, estar na posse das suas capacidades mentais, embora tivessem sido alertados para o facto de poder ter momentos de lucidez e comportamento normal. Apesar de algumas peripécias, o psicólogo avisou  que iria pedir o internamento compulsivo, mas as autoridades estavam convencidas de que o rapaz não tinha problemas de maior. O que é certo é que acabou por matar Tatiana sem que a família e a vítima tivessem sido avisadas do risco que corriam. Poddar, o assassino, foi julgado, condenado, houve apelação, libertaram-no e foi para a Índia, onde deve estar, se for vivo.
Este caso serviu de paradigma para justificar, judicialmente, a quebra de "confidencialidade eticamente justificada", quando uma terceira pessoa corra graves riscos. 
Esta decisão não foi unânime. Houve quem defendesse que a defesa da vida é uma prioridade justificando a quebra da confidencialidade. No entanto, houve quem votasse contra alegando que a confidencialidade é um direito do doente que não poder ser posto em causa.
Reconheço que não é fácil resolver certos assuntos. Os médicos podem, em algumas circunstâncias, ficar entre a espada e a parede, quebrar a confidencialidade, sim ou não? Na grande maioria dos casos, utilizando o bom senso e a experiência, é possível solucioná-los, o pior é quando somos confrontados como o caso da psiquiatra francesa. Como é que podemos ter a certeza de que o problema em questão pode provocar a morte de alguém? Como estabelecer a linha de "quebra de confidencialidade"? E se o médico não avisar, o que é que lhe pode acontecer? Ser acusado de um crime? Não poderão cair em exageros para poderem defender-se provocando mais danos nos doentes? Mas só os médicos é que deverão ser condenados? E os juízes que "libertam" ou não tomam as medidas adequadas face a potenciais assassinos, aplicando medidas ligeiras as quais permitem a realização posterior de crimes anunciados? O que é que lhes acontece? Nada. E no caso dos sacerdotes católicos que têm acesso a confissões de crimes ou a potenciais criminosos? O que é que lhes acontece? Nada. 
Estas situações são preocupantes porque vão decerto agravar mais o distanciamento entre médicos e doentes e tornar mais "fria e distante" as relações da esfera clínica. 
Preocupante, demasiado, a meu ver.

O esquema da Estamo

Escândalo! exclamam eles, exclama a nossa classe bem pensante surpreendida com o fenómeno. O Tribunal de Contas descobriu o esquema da Estamo, a empresa criada pelo Estado, detida exclusivamente pelo Estado, a quem o Estado vendia imóveis que por sua vez o Estado, por interposta Estamo, vendia ao próprio Estado e a particulares. 
Esquema oculto, fruto de uma qualquer engenharia subterrânea que só o conhecido faro investigatório do Tribunal de Contas permitiu desvendar? 
Longe disso. 
Esquema sim, mas bem às claras. A Estamo era até publicitada no célebre sítio do Ministério das Finanças com uma das pouquíssimas empresas credoras do Estado. Esquema denunciado num trabalho assinado no semanário ´Expresso´ em 2009 e há muito comentado AQUI pelo signatário, e AQUI por Tavares Moreira. 2009, 2010, 2011, 2012. Quatro-Anos-Quatro de uma pantominice ditada pela necessidade de criar artificiosamente receita a par das formas imaginosas de varrer para baixo do tapete despesa pública, retirando-a do perímetro orçamental. 
Há que denunciar estes esquemas, sim. Mas denunciar também que estas coisas se passaram perante todos os poderes que as encararam com um também visível encolher de ombros, incluindo do Tribunal de Contas que desde a primeira hora teve conhecimento do comportamento da criatura que agora condena.
Não sei, sinceramente, qual a narrativa que mais me incomoda. Se aquela que no passado validava estes esquemas como racionais e legítimos, ou se esta espécie de justicialismo do rigor a partir das auditorias do Tribunal de Contas, todavia postiço porque tardio e absolutamente inconsequente.

O "caso" daquele senhor que não era quem supostamente julgavam

Aproveito a ausência de notícias para perceber o que se passou  nestes dias em que o meu mundo se reduziu, quase por completo, ao espaço familiar. Para além da mensagem do PM que me pareceu muito acertada para as circunstâncias, chamou-me a atenção o que muito se escreveu a propósito de um senhor levado a um debate onde por norma comparecem os que aí são havidos como gurus dos tempos modernos. Ao que parece foi apresentado como sendo um grande especialista em economia da crise, de curriculo impressionante, a quem a ONU houvera confiado o estudo do fenómeno no sul da Europa. Nos jornais e pelas redes sociais espalha-se, em tom anedótico, o equívoco dos responsáveis pelo programa, havendo mesmo quem sugira o seu afastamento invocando precedentes de quem assim se deixou enganar e retirou essa consequência.
Fui à procura e encontrei alguns excertos da intervenção do tal senhor na SIC. E depois de ver e ouvir, concluí que são afinal muitos os que passam por aquele espaço - e por outros de todas as TV - que em nada se distinguem na postura e no discurso deste ilustre personagem. Não há, pois, qualquer razão para o escândalo, salvo se escândalo for o burlesco habitual dos debates televisivos em Portugal, participado por toda a sorte de bizarros especialistas.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Que seja o Natal mais feliz de todos

Desde a minha cidade natal desejo a todos os meus Amigos e suas famílias, autores, comentadores ou frequentadores deste espaço, uma noite e um dia de Natal plenos de alegria, antecipando um novo ano que contrarie o que de pior se vaticina.


Acreditar ou fingir.

Há momentos da vida que são recordados com mais intensidade do que outros, não por serem mais graves ou mais intensos, apenas porque se associam a festividades que, pela sua natureza, acabam por os colocar no altar da injustiça, no cofre da indiferença e no cemitério da dor, obrigando a refletir sobre a incompreensão do erro da vida. Um erro monstruoso e sem sentido com o qual vivemos o nosso dia-a-dia. Nem mesmo as palavras de paz, os votos de felicidades, as mensagens estereotipadas e as inúmeras ceias são capazes de encher o bandulho da alma. Mesmo que sintam algum conforto gástrico ou mental promovidos por um bacalhau quente ou regados mais à-vontade com um vinho de melhor qualidade não conseguem esconder o resto. É apenas uma forma de fingimento, porque serão muito poucos os que ainda acreditam na solidariedade, na esperança de melhores dias ou na vontade de transformar o mundo, e os que acreditam, ou fingem acreditar, andam bem recheados todo o ano. Os outros estão condenados ao sofrimento, à dor e ao desespero, não fingem, sofrem mesmo, mas mesmo assim querem acreditar...

domingo, 23 de dezembro de 2012

Votos amigos de um Feliz Natal


Quando na rádio já mal se ouve uma música de Natal e até o Stille Nacht, que enterneceu milhões, é silenciado...
...Quando os cartões de Boas Festas já apagaram todas e quaisquer imagens de um Menino no berço que justificou a sua existência...
...Quando a comemoração do Natal já vai acabando para se transformar num mero feriado igual a outros tantos...
...Quando os preconceitos das minorias se sobrepõem ao sentimento das maiorias e o Natal começa a ser banido do espaço público...
...Quando o acontecimento fundador do Natal é transformado em percentagens de vendas a mais ou a menos...
...E o seu simbolismo tende a desaparecer
Eu quero enviar a todos, Autores, Leitores e Comentadores do 4R um verdadeiro postal de Natal.
Votos amigos de Boas Festas e de um Feliz Natal

sábado, 22 de dezembro de 2012

Frioleiras

Conheço-a há muito tempo. Entra sempre com um sorriso muito belo e suave, um sorriso do qual emana confiança, alegria e humildade, um sorriso alcandorado numa atitude aristocrática. A voz, delicada e bem timbrada, cativa-me, porque se trata de uma voz que nunca envelheceu. Ouvindo-a sem a ver seria incapaz de decifrar a idade. Tem idade para ser minha mãe. Está doente. Aceita os seus males e vai convivendo com a situação com um à-vontade incrível. Impressiona-me o seu caráter e a forma como encara o futuro. Sempre que surge alguma complicação telefona-me ou aparece-me, e, deste modo, vamos resolvendo os assuntos. Mulher prática capaz de sugerir soluções que me deixam meio deslumbrado.
Gosta imenso de conversar, mas como é natural nestas pessoas evita prolongar a sua presença com receio de perturbar a consulta. Sou eu que a retenho, porque é bom e saudável falar com pessoas deste nível. Desta feita comentou um escrito meu, tinha apreciado o seu conteúdo, e completou o comentário dizendo que um dia deveria escrever as minhas memórias. Sorri e disse-lhe que não teria tanto interesse como isso, só se fosse para mim, para recordar alguns acontecimentos. Manteve o sorriso sedutor dizendo que em nova aprendeu estenografia, coisa que a irmã não tinha conseguido. Deu-lhe muita satisfação, porque provocava admiração ao registar tudo. Registou tanta coisa e com tanta facilidade que começou a escrever as suas "memórias". - Tão cedo? - Sim. Um dia saiu de casa, casou, foi à vida. Mais tarde encontrou os seus apontamentos estenografados. Tentou interpretá-los mas não conseguiu. Tinha-se esquecido das regras. Riu-se ao dizer que tinha lançado para o lixo tantas folhas. - Uma pessoa esquece-se de tanta coisa. - Pois é. Sussurrei. - Quer ver outra coisa? Eu aprendi a fazer frioleiras e agora já não me lembro, tenho tanta pena. - Fri... o quê? - Frioleiras. - Frioleiras? - Sim, uma espécie de "renda", que se faz com fio e uma navete. Curioso, escrevi num motor de busca a palavra frioleira e apareceram-me as imagens. Virei o écran para a senhora que, ao ver as imagens, interrompeu o seu sorriso lançando um sonoro "Ah é isso mesmo"! - Como é que o senhor doutor descobriu, foi tão rápido. - Gostava tanto de voltar a fazer isso, mas não me lembro. Ainda tentei encontrar as explicações e comecei a lê-las, foi então que o sorriso se acentuou de uma forma que nunca tinha visto. - Quer ver que o senhor doutor ainda vai aprender a fazer frioleiras? Olhe, depois diga-me como é para ver se reaprendo. Ainda li algumas linhas mas depressa desisti, aquilo é muito complicado. A conversa continuou com a senhora de idade a relembrar mais episódios da sua juventude e da sua produção. - Senhor doutor, da próxima vez vou trazer alguns dos meus trabalhos de frioleira que tenho guardado lá em casa. Quer vê-los? - Quero, claro.
Analisando o dicionário verifico que o significado de frioleira é múltiplo, "espécie de espiguilha, feita com lançadeira, para guarnições, enfeites", frivolidade, insignificância, parvoíce, bagatela, tolice, futilidade.
A consulta terminou, aprendi muito e fiquei a saber o que são frioleiras, as tais "rendas" que a minha doente se esqueceu como é que se fazem. Poderão pensar que esta descrição é uma frioleira, "futilidade ou parvoíce", mas não, pelo menos para nós os dois, já que nos esquecemos da doença, do sofrimento, e ainda vamos apreciar um dia destes a beleza das frioleiras.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

O burrinho e a vaquinha



Então Pedrito, viste o presépio? - perguntei eu, tinha ele acabado de chegar com a avó que o tinha levado a ver se havia presépio na igreja dos Jerónimos.
-Vi. Mas não tinha burrinho, nem vaquinha...
-E Nossa Senhora e S. José tinha?
-Tinha e a avó disse que era mãe e pai do Menino Jesus…
Esta tarde, com um pouco de tempo livre entre dois compromissos, e tendo à mão três igrejas num raio de trezentos metros, fui verificar do burrinho e da vaquinha. E vi que burro e vaca já começam a não ser   chamados para tal ofício.
Também a Igreja parece a estar a aderir ao politicamente correcto. Vá lá, que o Menino ainda não aparece órfão de Pai e a Mãe. Lá chegaremos... 

Sedução




Jogar é uma atividade permanente da nossa espécie, serve para aprender, serve para crescer, serve para divertir, serve para competir, serve para tudo, serve até para seduzir. Todos procuram a sedução. Seduzir e ser seduzido não é mais do que a procura de uma estranha sensação, momentânea, bela, rica, cheia de cores e de sons, que nos faz deslizar num precipício de doce prazer, que se esgota rapidamente na indiferença, convertendo-se amiúde num pesadelo, relembrando dolorosas agonias ou antevendo o fim num estertor melancólico. Todos procuram a sedução, sabendo que acaba normalmente em cinzas de desespero, fertilizando sofrimentos e sentimentos que a memória se recusa a esquecer. 
Ninguém esquece um olhar, um som, uma imagem, uma carícia, uma palavra, uma brisa, uma nuvem, um raio de sol perdido, uma queda de água tímida, uma árvore vaidosa, uma bela flor solitária, uma lembrança perdida e achada à esquina de um trivial dia, ninguém esquece, todos querem recordar para poderem sentir a mais estranha das sensações, o sabor da sedução, uma sensação momentânea, bela, rica, cheia de cores e de sons que nos atrai para o poço do prazer, onde, por mais voltas que demos, nunca conseguiremos afogar-nos. Um desejo negado aos sentidos e às almas loucas de desejo.
Os jogos de sedução são efémeros e intensos. Quem é que consegue saborear a doçura da liberdade que aprisiona os sentidos e as emoções das almas?

TAP

Afinal o Governo não vende a TAP ao senhor Germán Efromovich. Invocou como razão não se encontrar suficientementemente demonstrado que o grupo interessado obteria as garantias financeiras correspondentes aos fundos propostos mobilizar para toda a operação (encaixe líquido para o vendedor, cobertura dos passivos e reforços do capital social). Sabe-se que a efetividade das garantias só era exigida no momento da formal vinculação a um enredo contratual, regra que, na maioria dos casos - diz-me a experiência, que é alguma - deixaria confortável o Governo se outras razões, porventura de maior peso, não existissem recomendando o exercício do direito não vender o que se anunciou. A meu ver foi uma decisão sensata. Outro desfecho correria o sério risco de se transformar num caso muito desconfortável para o Governo e um novo fator de desestabilização política num momento em que continua a ser crucial que o Executivo conserve pelo menos níveis mínimos de solidez. O facto de não haver verdadeira competição, os boatos que foram postos a circular sobre conversas prévias entre governantes e o interessado, a informação prestada pelo Tribunal de Contas de que não procedeu ao acompanhamento do procedimento e a pouca clareza da informação que deliberadamente ou não foi sendo veiculada pelos media, contaminaram o processo e lançariam uma terrível dúvida sobre a sua lisura caso a decisão tivesse sido outra. As constantes entrevistas do senhor Efromovich ajudaram a adensar a sensação de desconforto, e por isso sinto que o Governo andou bem deliberando o que deliberou, suspendendo o processo e prometendo rever o método. E a revisão do método é essencial, não só para este processo de privatização como para outros onde as mesmas dúvidas se vão instalando.
  
Curiosa - ou não... - foi a reação dos que um dia antes antecipavam o escândalo e exigiam que o Governo recuasse na intenção de vender a TAP a quem apareceu a comprá-la. Tendo o Governo cedido à "exigência", apareceram, tristonhos e de sobrolho franzido, a dizer que a coisa trazia água no bico. Haja paciência!
 

Sem fim do mundo

Segundo uma profecia maia, o mundo acabará amanhã, com a pequena excepção de uma aldeiazinha perdida nos Alpes franceses, Bucarach. Não sei por que motivo se sabe tão pouco da civilização maia mas sabe-se tanto das profecias que esse misterioso povo deixou para a posteridade e que suscitam tanto interesse mediático. Mas o que me faz maior confusão é, segundo ouvi num telejornal, o que terá levado 200 (duzentos!) jornalistas a abancar na tal aldeiazinha, ao ponto de um batalhão de polícias ter aí assentado arraiais, passado credenciais e impedido o acesso a imaginárias multidões que aí procurariam assistir do alto ao arrasar do resto do globo. Se os tais jornalistas fossem realmente testemunhas do fim do mundo, a quem se destinariam as suas reportagens? Além disso não deve ser nada agradável sobreviver ao fim do mundo e recomeçar tudo de novo, a partir da idade da pedra, há salvações muito duvidosas. Por mim, prefiro aguardar tranquilamente pelo dia de amanhã, prestes a começar não tarda mesmo nada, e acreditar que, se o mundo acaba cada dia, também recomeça a cada momento, devagarinho, às vezes, mais rápido, outras, mas ao menos que estes “sustos” nos sirvam para dar valor ao que não conseguimos preservar e ao que temos para valorizar. Por mim, hoje gostava de apanhar um avião da TAP e viajar tranquilamente até um dos lugares maravilhosos que o nosso mundo ainda tem para visitar.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

A revolta de Gerard Depardieu...

1. Foi notícia destacada nos últimos dias a decisão do famoso actor francês Gerard Depardieu de não só mudar a sua residência para a Bélgica mas também de renunciar à nacionalidade francesa, para adquirir a nacionalidade belga, como forma de protesto contra a decisão do governo francês de tributar os rendimentos anuais superiores a 1 milhão de Euros com uma taxa marginal de 75%.
2. “Vou, porque você considera que o sucesso, a criação, o talento - na realidade a diferença - devem ser sancionados” e “Quem é você para me julgar assim? Infelizmente não tenho nada mais a fazer aqui”, escreveu Depardieu na carta que enviou ao 1º Ministro do governo francês e que foi tornada pública por um diário francês.
3. “Devolvo-lhe o meu passaporte e o meu seguro social, que nunca utilizei. Não temos a mesma pátria, eu sou um cidadão do mundo, um verdadeiro europeu, como meu pai me ensinou”, acrescentou.
4. O gesto de Depardieu causou grande polémica em França, sendo alvo de duras críticas de sectores de esquerda e de aprovação e aplauso da parte de outros sectores - como seria de esperar, atento o estatuto de figura nacional, quase herói nacional, do popular actor.
5. Trata-se obviamente de uma atitude discutível - que tanto pode ser admirada e elogiada como susceptível de crítica negativa - mas uma atitude que tem pelo menos o mérito de ser uma pedrada no charco contra uma medida de política que em última análise é mais emblemática do que eficaz (a receita dela decorrente será muito pouco expressiva) e tem uma forte conotação demagógica.
6. A decisão de Depardieu suscita outras questões, nomeadamente a da existência de uma diversidade de regimes fiscais sobre o rendimento no seio da União Europeia, que permitem a um cidadão (de um nível de rendimento “jeitoso”, evidente) ou grupo empresarial optar pela residência/sede mais conveniente em função do tratamento que lhe é oferecido...
7. ...embora seja claro, no caso em apreço, que a diferença é gerada pela decisão do governo francês em impor uma tributação extremamente gravosa, tornando a opção pela fiscalidade belga uma decisão racional...não somos todos grandes europeístas, sobretudo quando nos convém?
8. Em Portugal, recordo-me de há pouco tempo alguém com notoriedade (já não me recordo exactamente quem) ter prometido ou “ameaçado” PIRAR-SE, caso viesse a verificar-se em 2013 o agravamento fiscal que agora se confirma; mas, após a confirmação do agravamento fiscal, essa promessa de “piranço” parece não ter passado, pelos vistos, de falsa promessa...é pena, não termos um Depardieu nacional...

Constitucionalissimamente!...

"Não foi inconstitucional entrar três vezes em bancarrota".
António Pires de Lima, em entrevista ao Jornal de Negócios
Claro! Inconstitucional é sair!...

Oposição, porém serena e responsável


"Temos de ter particularmente cautela para que a carga fiscal que estamos a impor não se revele intolerável e insustentável para a sociedade portuguesa" - Doutor Vitor Gaspar, ontem, no Parlamento.
 
Que comentário esta declaração merecerá do Governo ? 
 

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Homenagem ao Voluntariado

Felizmente que há outro país para além do que diariamente nos é impingido pela comunicação social.
Felizmente que há outra gente para além das tristes figuras que diariamente preenchem os écrans das televisões, de todas as televisões.
Felizmente que há outra gente que não destila ódio, nem rancor, mas procura agregar e unir. 
Felizmente que há outra gente que voluntariamente dá o melhor de si nos hospitais, nos bairros degradados, na assistência a idosos, na visita aos isolados da vida ou da fortuna, no acompanhar de deficientes profundos, nos cuidados paliativos, na assistência à pobreza, na luta contra a discriminação e os preconceitos e a exclusão social. 
Eles são os voluntários para quem a compaixão não constitui palavra vã, antes integra um permanente exercício de solidariedade.
Eles nunca aparecem na comunicação social. Ou, se por qualquer excepcionalidade, aparecem, logo são maltratados e ofendidos pelos politicamente correctos de serviço, papagaios e aves de arribação de todos os tempos e lugares. 
 Porque o voluntariado da caridade, da solidariedade e da compaixão estorva que muitos sucumbam, e atrasa a revolução. 
A minha homenagem ao voluntariado e aos voluntários deste país. Afinal, eles não precisam das televisões para serem verdadeiros heróis do povo. Do povo que voluntariamente servem e a quem dão alento e um pouco de felicidade.  

Libertação da alma.


Levantou-se de manhã um pouco estranha para o que era habitual. Não conseguiu perceber a razão, mas não ficou preocupada. Levantou-se, esperançada de que algo de bom lhe iria acontecer. Vestiu o belo vestido garrido feito com linhas do arco-íris da adolescência, espantosamente suave e leve. Em seguida buscou o colar de pérolas, pérolas feitas da amargura da sua vida. Colocou-as em redor do pescoço e sentiu algum frio, frio não desagradável, apenas um frio contido a querer testemunhar a transformação do sofrimento num belo enfeite que lhe apetecia ostentar nesse dia. Abriu as janelas de par em par, e uma lufada de ar fresco, a querer adivinhar o nascimento de um dia quente, acariciou o seu rosto tranquilo e o colo que se debatia enigmaticamente com o temperamento do colar. O vestido esvoaçou de contente querendo imitar o arco-íris do qual tinha nascido. Foi então que um suave e silencioso nevoeiro começou a surgir perante os seus olhos como se o mesmo libertasse minúsculas e quentes gotículas, resultantes do confronto entre o calor do seu corpo e o da atmosfera. O nevoeiro volitava de asinha sem saber o que fazer e para onde ir, até que, subitamente, se agigantou numa dança voluptuosa e desconcertante. Não teve receio, uma deliciosa atração inundou-a completamente, obrigando-a a seguir a bela nuvem, suave, doce e serena. Não sabe bem se foi atrás dela ou se foi com ela, afinal era a sua alma a libertar-se. Deixou de sentir frio, deixou de sentir medo, deixou de sentir angústia, deixou de sentir, apenas vivia a alegria da liberdade. E foi atrás dela ou foi com ela. Eu tentei agarrá-la, mas não consegui, porque ninguém pode agarrar uma alma transformada em nevoeiro. Resta-me olhar e recordar...

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Mais uma vez...um PS pouco esclarecido!...


O PS exige que Passos Coelho esclareça todas as ligações de Miguel Relvas à privatização da TAP.
Depois de Passos Coelho esclarecer, o PS diz que ficaram muitos pontos por esclarecer.
Como ficaram muitos pontos por esclarecer, o PS exige que Miguel Relvas se desloque ao Parlamento para esclarecer.
Depois de Miguel Relvas se ter deslocado ao Parlamento para esclarecer, o PS ainda ficou longe de estar esclarecido.
O que não importa; nessa altura já se inventou novo assunto para esclarecer. E vira o disco e toca o mesmo. Os Ministros gastam solas e tempo no Parlamento e os deputados aparecem na televisão.
Ah! Miguel Relvas recebeu no verão passado Efromovitch, o único a apresentar proposta para compra da TAP. Veja-se, um bem tão valioso e com um único interessado! Miguel Relvas tem que esclarecer por que razão a British, a Katar, a Lufthansa, a Continental, etc, etc, não apresentaram propostas. Tem que esclarecer. Não só esclarecer, mas obrigá-los a apresentar. À força, se for possível!...E esclarecer o PS dessa posição musculada. Que, de imediato, exigirá novos esclarecimentos.

Do Neo-liberalismo e suas falsas imputações...

1. Achei graça a um artigo de Vasco Pulido Valente, na edição do Público de 15 do corrente, que, no seu estilo muito peculiar, aborda a questão do (ab)uso que tem sido feito dos termos neo-liberal e neo-liberalismo.
2. VPV começa por dizer o seguinte “A esquerda usa hoje a palavra “neo-liberalismo” como antigamente, quando se proclamava marxista, usava as palavras “mais-valia”, “exploração” ou “luta de classes”: ou seja, sem fazer a menor ideia do que está a falar.
3. E acrescenta” Isto não admira numa facção que nunca se distinguiu pelo estudo, pela honestidade ou pela inteligência”, e ainda “Mas, para nosso mal, a populaça adoptou esta “linguagem de pau”, primitiva e estúpida, e começa a detestar o “neo-liberalismo” e os “neo-liberais”, sobretudo os do Governo e arredores”...
4. Num registo algo diferente, tenho aqui procurado explicar a impropriedade do uso destas expressões quando imputadas em especial à política do actual governo (e tb do anterior, embora em minha opinião este fosse mais próximo da figura)...
5. ...pois não concebo que se apelide de neo-liberal um governo que (i) ousa aumentar a carga fiscal na medida que conhecemos e vamos conhecer ainda melhor em 2013, (ii) castiga fiscalmente a poupança e o investimento, (iii) se permite aplicar uma taxa marginal de tributação em IRS (54%) superior à que é aplicada em países economicamente bastante mais avançados, (iv) ao contrário da fama de que goza, mantém um elevadíssimo nível de assistencialismo do Estado, etc, etc, etc.
6. Também já aqui disse que verdadeiramente neo-liberal teria sido uma política que, na iminência da bancarrota e da falência do Estado em que o País se encontrava em Abril de 2011, se tivesse recusado a solicitar a ajuda externa do FMI e da União Europeia, confiando exclusivamente aos mecanismos de mercado a correcção dos gravíssimos desequilíbrios da economia portuguesa...
7. ...Desequilíbrios que seriam corrigidos, certamente, embora com custos muito mais elevados – começando pelos funcionários públicos, que deixariam de receber os seus salários em Maio de 2011 e meses seguintes (seria o não pagamento inconstitucional?) – e de uma forma bem mais célere.
8. Nesse cenário, (i) a perda de rendimento das famílias teria sido bem mais rápida e acentuada, (ii) o desemprego já há muito teria ultrapassado os 25% da população activa, (iii) a queda do PIB teria sido abrupta (da ordem dos 15 a 20% em 2011/2012), (iv) os deputados e outro pessoal político teriam passado a deslocar-se de autocarro/metro/motorizada para o seu local de trabalho/descanso, (v) a agitação social teria sido imensa e frenética, com manifestações gigantescas a toda a hora...
9. ...Mas provavelmente estaríamos nesta altura já em fase de recuperação da actividade económica, com as contas externas altamente superavitárias, o défice público anulado...tudo isto, obviamente, no pressuposto de que a agitação social não tivesse causado o desmoronamento do status quo, a começar pelo “estoiro” do regime político...
10. Embora não seja propriamente o tipo de linguagem preferido, achei graça ao escrito de VPV...

domingo, 16 de dezembro de 2012

As mamas também são minhas!

Mamando no Estado Social foi, ontem, um post do Ferreira de Almeida. Nele aprendi que foi o Estado que pagou as mamas de Petra de Spínola. 
Bom, a partir de agora, as mamas também são minhas! Melhor dizendo, nossas, que não sou egoísta e, a bem dizer, se trata de equipamento colectivo!... 

sábado, 15 de dezembro de 2012

Cabeleireiros e barbeiros...

Dia sim, dia não, recebo um lembrete da Administração Tributária sobre o novo Site e-factura para que, até 31 de dezembro, os consumidores possam testar o seu funcionamento, a fim de o poderem utilizar em produção real a partir de 1 de janeiro, data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto.
Ao consultá-lo aparecem quatro caixas com as actividades de reparação de automóveis, de reparação de motociclos, de restauração e alojamento e de cabeleireiros. Não percebo porque é que muitas outras actividades ficaram excluídas.  Quais foram os critérios? E, já agora, não entendo porque razão os barbeiros não foram incluídos. Bem sei que os cabeleireiros de homens estão na moda, mas quer-me parecer que os barbeiros vão voltar.  Enfim, há coisas que o cidadão comum não alcança. É assim e pronto.

A história do Fisco e das Doze Declarações


Ter mulher-a-dias vai obrigar a doze declarações mensal ao fisco. O Orçamento assim manda. Em vez de uma Declaração no fim do ano, doze Declarações. Como se já não bastasse a carga do aumento dos impostos, ainda vem a sobrecarga do aumento da burocracia sem tento, nem senso.
A adaptação do sistema e do correspondente software, bem como da instalação do controlo burocrático adjacente trarão inevitavelmente custos que poderão não compensar o benefício esperado.
Por força do aumento dos impostos, muitos empregadores passarão a entregar ao Estado o que antes pagavam às empregadas domésticas, que vão despedir. Despedimento real, das pessoas e, consequentemente, das Declarações. E outros, perante o ónus da declaração mensal, optarão por pagar em notas, coisa que ainda não é proibido usar como meio de pagamento. Despedimento virtual das pessoas, despedimento real das Declarações. Fica o risco com o infractor? Mas é gozo adicional para a burocracia da Direcção Geral dos Impostos!...
Com doze Declarações das mulheres a dias, qualquer burocrata rejubila! 

Mamando no Estado Social

Há minutos ouvi o depoimento de um médico preocupado com a penúria de meios no hospital onde presta serviço. Pareceu-me sinceramente amargurado, inconformado por nada poder fazer face à necessidade de poupar em tudo. Depois, ISTO! E um sentimento de revolta por este Serviço Nacional de Saúde que comparticipa nas mamas desta criatura e recusa tantas vezes a assistência a quem perdeu o que de mais precioso tem na vida!

Matança de crianças


Sou frequentemente assaltado não pela dúvida mas pelo desespero face a acontecimentos que não consigo entender, sobretudo se as vítimas não têm qualquer responsabilidade ou participação. Sou frequentemente assaltado pela tristeza e até incompreensão face ao sofrimento atroz que atinge muitas pessoas, sobretudo os mais pequenos, inocentes vilipendiados perante uma natureza indiferente ao homem, embora não a possa considerar como cruel. A crueldade é própria apenas de alguns humanos quando cometem crimes hediondos, como foi o caso de mais uma matança de crianças. Não é a primeira vez que tal acontece, outras já ocorreram e muitas mais irão acontecer no futuro, testemunhando a perversidade da natureza humana praticamente imune a todos os códigos de conduta e princípios religiosos. Assalta-me a angústia dos que pretendem justificar tamanhos e criminosos atos, de que deus não tem nada a ver com isto. Argumentam que o homem é dotado de livre arbítrio e como tal o único responsável pelos seus atos. Uma opinião que não é mais do que uma tentativa para desresponsabilizar o divino quando perguntamos como foi possível que o criador deixasse que tal acontecesse.
A matança das crianças ocorreu no mesmo dia em que fui assistir à festinha de natal de um neto. Pais, avós, irmãos, amigos e muitos familiares comungaram durante algum tempo, absorvendo uma alegria suave, prazenteira e acolhedora junto dos pequeninos. Soube-me bem e preencheu aquela lacuna existencial que constantemente me assalta de dia para dia. Depois da festa soube que tinha ocorrido uma matança de crianças. Mais uma loucura. A mente de alguns humanos é muito estranha. A nossa espécie mata em nome de tudo inclusive da loucura e da maldade. 
Fala-se tanto de milagres, fala-se tanto de d(D)eus e e(E)le esquece-se da sua criação, deixando que crianças sucumbem às mãos de um louco. A resposta é sempre a mesma: "são insondáveis os desígnios de deus"! Considero estar perante uma resposta perversa e cruel.
Invoca-se a divindade a torto e a direito e, no entanto, surgem acontecimentos desta natureza que afligem qualquer um de nós. Olho e encontro uma vazio inexplicável, indiferente às aspirações, desejos e ambições de uma espécie consciente, frágil, inconstante, arrogante, humilde, amorosa e perversa ao mesmo tempo.
O divino pode servir para muitos, mas não chega para mudar e ajudar a humanidade, a indiferença é tão visível, tão dolorosa, tão palpável que só me resta gritar-lhe, mas não vale a pena, somos frutos de um acaso que se transformou em necessidade. É com base nesta última que iremos continuar, tentando projetar alguma espiritualidade, criatividade e beleza para quem sempre manifestou indiferença. À falta de amor divino devemos oferecer a poesia dos seres humanos, dos que ainda sabem construir e adorar a vida, umas vezes com alegria e outras com sofrimento. 
Que mais posso dar? Apenas um pensamento para as crianças e um abraço para os pais. 

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Dor e alegria...




Hoje, dia da matança de crianças nos Estados Unidos, realizou-se a festinha de Natal das crianças do colégio, entre as quais esteve o meu neto do "meio". Uma alegria para os meninos e meninas, pais, avós, irmãos e amigos. Um dia que acabou por ser uma estranha mistura de sentimentos. Um dia em que foi patente o contraste entre a dor e a alegria, entre uma dor eterna e uma alegria passageira. Um pensamento para as inocentes crianças e um abraço para os pais e familiares.