sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Taxas moderadoras?

O aumento das taxas moderadoras anunciadas pelo governo são assustadoras. Quem conhece a realidade do país sabe que esta atitude vai ter consequências negativas precisamente em termos de saúde! Um paradoxo. Mais um a juntar a tantos outros. O que o Governo pretende é cobrar, não pela totalidade do preço dos atos, mas quer obrigar o cidadão a pagar o "consumo" dos cuidados de saúde. Estou convencido de que não ficarão por aqui. Para 2013 haverá mais, em 2014 mais um bocadinho e assim sucessivamente. Também não posso aceitar a designação de taxas moderadoras, porque não são. Vejamos, o Governo anunciou quem irá ficar isento, afirmando, inclusive, que o número dos que não têm que pagar vai aumentar! Sendo assim, onde está o efeito da dita "moderação"? Se milhões de cidadãos não vão pagar, logo, não há qualquer moderação, pelo contrário, aumentam os que ficam isentos, que deverão continuar a "sobrecarregar" o SNS. Quem vai pagar são sempre os mesmos, os que já pagam com língua de palmo para que este país consiga arrastar-se pelas ruas da amargura fingindo que existe. Se entre os pagantes existem pessoas para as quais as taxas moderadoras não constituem grande problema, o mesmo não acontece para a dita classe média obrigada a "moderar" os seus instintos na procura dos cuidados de saúde, acabando por ser penalizados, em termos financeiros, e correndo riscos acrescidos de agravamento dos seus problemas clínicos.
Tenho, cada vez mais, dificuldade em compreender certas medidas. Só espero que os tais 200 milhões de euros, que o ministro Gaspar pretende encaixar com as taxas, não sejam "compensados" por prejuízos superiores decorrentes da falta de cuidados naqueles que têm de refrear os seus "desejos" na procura do SNS.
A loucura também é fonte de prejuízo.
Chamem-lhe tudo, mas não lhe chamem taxas moderadoras, porque não são, pelo menos para todos.

Monótono...

"Apesar de ter afirmado que não tem intenção de aumentar os impostos, Rajoy sabe que terá que fazer duros ajustes durante seu mandato e por isso em seus últimos discursos repetiu que 'esse não é o momento de aplaudir, mas de solucionar problemas' e que não se enfrenta um 'cenário como esse com afagos e elogios. "(20 de Dezembro)


"A vice-presidente do Governo, Soraya Sáenz de Santamaría, anunciou hoje que o novo Executivo se deparou com um desvio orçamental muito superior ao previsto. Este ano, o défice ficará nos 8% do PIB, bem longo do que o Executivo de José Luis Rodríguez Zapatero tinha previsto – 6%.Entre as medidas extraordinárias que o Executivo irá tomar está o aumento temporário de alguns impostos. “Vamos pedir um esforço aos cidadãos que mais ganham e mais têm”, afirmou Soraya Sáenz de Santamaría. Em causa está um aumento do IRS, através de um “contribuição de solidariedade temporária” de dois anos sobre os rendimentos mais elevados do trabalho e de capital." (30 de Dezembro)

Confiança




Sucedem-se os balanços e os vaticínios em registo unânime. 2011 foi mau, 2012 será pior. Quando tudo parece negativo há que repor a esperança. Alguém por aí perguntava se será caso de a realidade ser escura ou de a perspectiva ser pouco luminosa. À custa de pensarmos que há sempre alguém ou alguma instituição pronta para resolver os nossos problemas, os indviduais e os coletivos, perdemos, isso sim, a perspetiva de que o futuro depende fundamentalmente de nós, da nossa capacidade de idealizar e de fazer. Por isso, desejo sinceramente um 2012 com saúde, condição primeira para que tudo de bom sobrevenha.
Em especial, dirijo às minhas queridas amigas e queridos amigos autores deste 4R, aos amigos comentadores e a todos quanto nos acompanham nos sentimentos, ideias e reflexões que aqui imprimimos, votos para que 2012 venha a ser um ano de realizações e de sucessos.

Metidos entre a espada e a parede...

Nas últimas semanas, em compras de Natal e na resolução de problemas de natureza administrativa e burocrática que vão sendo empurrados para o final do ano, deparei-me com vários casos de jovens a trabalharem em tarefas ou funções completamente desajustadas da sua formação, do investimento que eles próprios, as famílias e o país neles fizeram. Não que seja uma novidade, mas transformou-se num problema.É que os jovens sendo o futuro de qualquer país merecem redobradas atenções. Precisamos deles e eles precisam de nós. Sendo jovens, apesar de hoje em dia estarem abertos ao mundo, de serem “viajantes” globais e de terem acesso ilimitado à informação, deveriam ser auxiliados nas suas escolhas e decisões em momentos importantes da sua vida, como é o caso das escolhas dos estudos, das vias profissionais, do enquadramento das suas expectativas. E sendo jovens as políticas públicas e a sociedade em geral, incluindo as estruturas empresarias, deveriam olhar e apostar neles como factor de dinamismo, empreendedorismo, inovação e qualificação. Penso nos muitos jovens que se encontram no desemprego, desiludidos e desnorteados, a braços com a ausência de perspectivas, com dificuldades de toda a ordem, com a necessidade de adiarem projectos normais de vida pessoal, familiar e profissional, forçados a não darem os passos da autonomia e responsabilidade que desejam ter e que são próprios desta fase da vida.Não admira que estejam a imigrar, à procura de um país que lhes dê as oportunidades de vida que Portugal não é capaz de proporcionar. São os mais ambiciosos, os que acreditam nas suas capacidades, dispostos a enfrentar desafios e riscos e, também, mais qualificados que partem, porque também são estes que melhores condições reúnem para interessarem empregadores estrangeiros.Seria uma mais-valia que fossem para fora por sua livre escolha entre o ficar e o ir, que o fizessem enquanto etapa de vida com vontade de regressarem e aqui constituírem família e se realizarem como pessoas e profissionais e ajudarem na sustentabilidade do país. Mas não, não é assim que as coisas se estão a passar. Partem porque desesperam com a falta de oportunidades ajustadas ao que sabem e sentem serem as suas possibilidades. Não é tanto uma questão de sobrevivência, mas uma questão de futuro.Numa das minhas idas às compras, tocou-me um episódio passado com uma jovem por quem fui atendida. Fiquei surpreendida com a resposta firme da colaboradora quando lhe perguntei pela composição da malha de uma camisola que me agradou. Tocou na camisola, voltou a tocar, e respondeu ser uma mistura de lã, caxemira e seda. Perguntei-lhe se tinha a certeza, se não seria melhor ler a etiqueta. Desconfiada, espreitei disfarçadamente. Confirmei. Simpatizei com a rapariga, o suficiente para fazer conversa. Tinha um ar fresco e delicado. Vim a saber tratar-se de uma rapariga licenciada em engenharia têxtil, com o curso e um estágio concluídos há cerca de dois anos, que finalmente tinha conseguido um trabalho de vendedora naquela loja, estava contente pois precisava de trabalhar e ganhar algum dinheiro para ajudar a mãe com quem vive. Aconselhei-a a não baixar os braços, a procurar um trabalho compatível com os seus conhecimentos universitários, os seus gostos e preferências. Com um sorriso algo esperançoso e orgulhoso disse-me que estava à espera de uma resposta de uma empresa industrial italiana. Tem confiança em ser seleccionada para aí fazer um estágio. Anda a fazer a mala e a tratar dos papéis. Vontade e amargura misturaram-se nas suas palavras, com os olhos postos entre o presente e o futuro. Fui atendida com um requinte profissional a que não estou habituada por estas paragens, mas à custa de uma distorção que não é de todo desejável.
São estes jovens que partindo vão cavar o nosso empobrecimento e envelhecimento. A factura poderá ser muito elevada. Estamos metidos entre a espada e a parede. A solidariedade inter-geracional está ameaçada...

OE/2012: decisão sensata do Presidente

1.Mais de uma vez tenho divergido, neste fórum, de posições do PR em matéria orçamental nos tempos recentes: relevo, em especial, a controversa defesa de uma equidade fiscal que, em minha opinião, não teve em conta, entre outros factores, a situação profundamente desigual, em termos de segurança de emprego, em que se encontram as pessoas que trabalham no sector privado, de uma forma geral, e as que estão empregadas no sector público.
2.Mas hoje cumpre-me salientar a decisão - que considero especialmente muito sensata - de não submeter a lei do OE/2012 ao veredicto do Tribunal Constitucional, não cedendo às inúmeras pressões, de N quadrantes, que procuraram condicionar a decisão do Presidente e clamavam pela verificação da constitucionalidade.
3.A apreciação desta lei pelo Tribunal Constitucional seria o que habitualmente se apelida “abrir a caixa de Pandora”, ou seja uma operação de consequências imprevisíveis e de risco altíssimo, podendo neste caso ferir de morte os interesses do País.
4.Imaginemos, por absurdo, que o Tribunal Constitucional, instado a pronunciar-se sobre a lei, entendia que a mesma estava ferida de X inconstitucionalidades, forçando à sua revisão em matérias que poderiam implicar mais despesa (sobretudo) ou menos receita...
5....obrigando por isso a uma revisão da lei, tendo como consequência um agravamento do défice orçamental e das necessidades de financiamento do Estado...
6.A imagem e o crédito externo do País, já tão fragilizados, tombariam com estrondo, piorando ainda mais as já precaríssimas condições de acesso a financiamento, ao mesmo tempo que os objectivos assumidos no Plano de Assistência Financeira ficavam postos em causa, com as dramáticas consequências que não é difícil adivinhar.
7.Já aqui procurei explicar, em Post editado há algumas semanas, que eventuais inconstitucionalidades de decisões impostas pela absoluta falta de dinheiro se podem reconduzir a uma única inconstitucionalidade: a da própria falta de dinheiro...
8....e como suprir eficazmente uma inconstitucionalidade deste tipo? Só se o venerando T.C. dispusesse de meios para accionar o financiamento necessário, doutra forma a declaração de inconstitucionalidade constituiria um acto de perfeita inutilidade, com todo o respeito pelo venerando Tribunal...
9.Por outras palavras e imaginando, novamente por absurdo, que determinadas despesas agora eliminadas seriam reconsideradas no OE (esquecendo as consequências dramáticas referidas em 6), não havendo dinheiro para as pagar, o pagamento dessas despesas teria de ficar em espera “sine die”...e nós todos felizes com a reposição da norma constitucional, fingindo que tudo estava bem?
10.Andou muito bem o Presidente, em minha opinião, não enviando a lei do OE/2012 para o Tribunal Constitucional.

Felizmente

Em tempo de Natal os nossos emigrantes voltam à terra. Um ciclo que se repete, mesmo que agora lhe dêem outros nomes, qualificados, mobilidade, globalização, foram para fora e vêm de visita, estão diferentes e reparam nas nossas diferenças, quando saíram ainda éramos um país consumista, não há luzes de natal nas ruas, o que é que aconteceu, guardaram-nas, é deprimente! Há muito que os nossos jovens começaram a ir embora, não é novidade para ninguém, até há pouco era para a Europa, agora também vão para o Brasil, dois para Macau, já falam no México ou na Colômbia, ou na Austrália. Os que tiveram a sorte de encontrar o seu caminho onde o procuraram chegam cheios de energia, contam coisas novas, falam-nos da sua vida que já corre longe de nós, não conhecemos o seu dia a dia, as roupas que trazem, o novo corte de cabelo. Ouvimos falar de empresas com nomes estranhos, de teatros e espectáculos, de amigos cujo nome nunca ouvimos e temos dificuldade em fixar sem lhes conhecer a cara. O Yannis, o Ronald, a Elina, a Isla, este é daqui, este dali, os colegas de trabalho pedem lembranças deste país curioso, muitos tiveram que ver no mapa onde fica, tiveram bailout, como os gregos? Ah, e como vivem, tão pobres? Levam coisas a que antes não ligavam nenhuma, camisolas tricotadas à mão, marmelada, paio, vinho do Porto, que pena não caber o bacalhau e a sopa, lá nunca fica tão boa, deve ser dos legumes, dá-me aquela receita dos biscoitos, trouxe-te um creme de algas, é fantástico. O tempo é curto para rever toda a gente, nós rimo-nos das aventuras e dos novos gostos, perguntamos tudo, conta, conta, ó mãe, não consigo contar tudo, passa-se tanta coisa, onde guardaste aqueles sapatos de que eu gostava tanto, espero que não os tenhas deitado fora, empresta-me o teu casaco, o meu não coube na mala, era muito volume, lá é um gelo, ao menos aqui há sol, que dias maravilhosos, mas as pessoas são tão tristes, estão viciadas na crise, que livros tens que eu possa levar, tenho saudades de ler um romance em português.
Depois partem, dias tão curtos para matar saudades e tão compridos de agitação, uma breve revolução que nos deixa mais pequenos, tão encolhidos na nossa tristeza, a vê-los partir com a sua juventude, tantos sonhos, felizmente, tanta esperança, felizmente, tanta coragem, felizmente. E nós cá, a desejar tanto que sejam felizes, mesmo longe de nós, se tem que ser. Foi bom, o Natal. Felizmente.

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Chita!


Morreu a Chita. Fiquei muito surpreendido, porque para morrer agora teria de ter muitos anos e que eu saiba os chimpanzés não vivem tanto. Não importa, pode ser um caso de longevidade extrema ou, então, de usurpação de identidade.
Recordo-me dos deliciosos livros aos quadradinhos com o Tarzan, a Chita e a Jane. Devorava as histórias, considerava-as muito atraentes, havia algo de mágico difícil de explicar para uma criança. Quando tive oportunidade de ver o primeiro filme fiquei deslumbrado por ver em movimento o que via no papel.
Esta vivência fantasiosa deverá ter-me marcado imenso e permitiu, agora que penso nisso não tenho dúvidas, respeitar e admirar os chimpanzés. Sempre me senti constrangido como foram e são tratados estes animais, nomeadamente na investigação científica. Recentemente, a descodificação dos genomas humanos e dos chimpanzés veio revelar o elevado grau de semelhança em termos genéticos. Partilhamos cerca de 98,5% dos genes. Se em termos fisio-anatómicos as diferenças são óbvias, em termos comportamentais e cognitivos os chimpanzés também revelam sentimentos, inteligência e têm as suas formas de comunicação.
Tem-se discutido muito se não deveremos inclui-los no género Homo, ficando com três espécies: o Homo troglodytes (chimpanzé comum) o Homo paniscus (chimpanzé pigmeu) e o Homo sapiens (chimpanzé humano).
O Instituto Nacional de Medicina, presidido pelo assumido cristão evangélico Francis Collins, acaba de recomendar a suspensão de financiamento a toda a investigação que envolva estes animais, o que lhe valeu o reconhecimento de cientistas não religiosos. Na base desta decisão está precisamente o tal reconhecimento de identidade com os seres humanos, o que, para o núcleo duro dos cristãos, que negam a alma a qualquer animal não humano, é de realçar. De facto há em toda esta história dos seres humanos algo mal contado, como o direito a ter "alma", o que lhes permite provocar "descontinuidade" entre "Nós e os Outros", quando, na realidade, existe apenas "continuidade" entre todos os seres vivos, como é percetível através da evolução. Outro aspeto, também duvidoso, tem a ver com o direito de suserania relativamente aos "outros" e ao ambiente, baseado, entre nós, ocidentais, precisamente na Bíblia. Estas atitudes ou interpretações poderão ser responsáveis pelas atrocidades cometidas contra o ambiente, contra as outras espécies e também contra si próprio.
Voltando às aventuras com Tarzan, poderei especular que a singularidade, a beleza e a atração exercidas pelos intervenientes terão a ver precisamente com a não existência de "descontinuidade" entre espécies, sobretudo entre o Homo troglodytes e o Homo sapiens, a não reivindicação de alma por parte do humano e o não "direito" a ser proprietário dos outros e do espaço envolvente. Sendo o ser humano mais inteligente, competir-lhe-á, isso sim, exercer a função de guarda e de segurança de tudo o que o rodeia, protagonizado pelo Tarzan nas suas aventuras, sempre acompanhado da fiel Chita.
É curioso como certas histórias encerram significados e ensinamentos tão belos, que só agora me apercebi, mas que entretanto não deixaram de produzir os seus efeitos.
Ainda bem, Chita. Obrigado.

"Gloria in Excelsis Deo"



O ridículo no seu melhor! O que eles precisavam era de uma valente vassourada no lombo e alguém que os "limpassem" do templo.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

ENVC: Grande pessegada em perspectiva?

1.Tive desde logo a percepção (disse-o a algumas pessoas das minhas relações) de que o Governo actual cometeu um sério erro, quando logo nos primeiros dias de funções resolveu recuar em relação à decisão que já havia sido tomada pelo anterior executivo no sentido de efectuar um significativa operação de “downsizing” na estrutura dos ENVC...
2....tendo cedido face à onda de contestação que envolveu as habituas forças vivas da cidade de Viana do Castelo, que não queiram ver afectada, num cabelo que fosse, uma empresa que pertence ao “património cultural” da cidade mas que só subsiste se puder contar com a generosa contribuição dos nossos impostos...
3. O plano que o anterior CA da Empresa já tinha aprovado e recebido chancela ministerial, reduzia os efectivos da empresa em qq coisa como 750 pessoas, ficando com uma dimensão muito mais pequena e custos operacionais muito reduzidos, compatível com o baixíssimo nível de actividade que hoje mantém...
4.Interroguei-me na altura sobre as razões do recuo do Governo, que não consegui perceber uma vez que se tratava de uma decisão tomada, obviamente imputável ao executivo anterior, o novo Governo teria apenas que dizer tratar-se de uma decisão já tomada, que certamente tinha sido devidamente estudada e pela qual o CA ainda em funções respondia.
5.Os meses passaram, foram publicamente alvitradas muitas hipóteses de solução, mas ao cabo e ao resto parece que nenhuma solução em concreto foi possível estruturar e hoje surgem novamente notícias que dão conta da situação desesperada da empresa e da necessidade de, urgentemente, o Estado nela “enterrar” (é o termo mais apropriado) mais € 57 milhões de Euros, dos quais € 37 milhões em capital social e mais € 20 milhões em injecção de tesouraria pura (donativo? indemnização compensatória? empréstimo da inevitável CGD com garantia do Estado?) para que a empresa não caia em ruptura de tesouraria já em Janeiro...
6.Os números divulgados são elucidativos:
(i)Passivo de € 263 milhões no final de 2011 (era de € 240 milhões em final de 2010 e entretanto o Estado deve lá ter aplicado, a fundo perdido, mais alguns milhões sem o que o passivo certamente já estaria próximo de € 300 milhões);
(ii)Prejuízos de exploração de € 41 milhões em 2011;
(iii)Encomendas reduzidas a € 20 milhões, há um ano seriam de € 40 milhões;
(iv)Capitais próprios negativos de € 96 milhões, isto admitindo que a valorimetria dos activos merece alguma credibilidade, a situação pode até ser bem pior...
7.Pelo caminho ficou a história rocambolesca de um ferry que os Açores rejeitaram, que depois de várias tentativas parece que mais ninguém quer, e que provavelmente ficará a apodrecer nos ENVC...mas que terá custado à empresa a módica quantia de € 57 milhões!...
8.O porta-voz da Empordef, Holding estatal que controla esta empresa, admite agora muito timidamente algumas hipóteses de solução deixando entender que não serão muito mais do que quimeras...e pelo caminho volta a colocar “em cima da mesa” a hipótese de encerramento ou de quase encerramento acima referida mas que o Governo há 6 meses não quis considerar, tendo cometido, muito provavelmente, um erro de palmatória...
9.ENVC: uma grande pessegada em perspectiva para a rentrée do novo ano?

Simplesmente degradante...

Há já algum tempo que tenho andado para escrever um apontamento sobre o assunto. Uma “Casa dos Segredos” completamente às claras para toda a gente ver. Que junta e aumenta o que de pior a sociedade tem. As televisões e os públicos em geral gostam dos “bigbrothers”, gostam de explorar sentimentos, viciam-se no jogo das emoções, torcem-se para que os protagonistas vão mais longe, façam aquilo que é impensável esperar que façam à vista de toda a gente. É a curiosidade que se vai afiando para ver o inqualificável, a promiscuidade, a leviandade, a grosseria, a falta de ética e de estética também, a falta de vergonha e pudor. É juntar o pior sem limites.
Esta e outras casas dos segredos são bem o retrato da degradação moral, da usura e da falta de cultura e educação a que chegou a sociedade em que vivemos. A troco de dinheiro as pessoas vendem o que são e o que não são, expõem à saciedade do público uma concentração de comportamentos e atitudes a todos os títulos condenáveis de serem explorados para satisfação seja de quem for.
Andam mal as televisões, as “marionetas” das casas dos segredos e os telespectadores que promovem e se servem, usam e abusam e gozam e viabilizam a miséria humana.
Não me venham dizer que estas casas dos segredos existem porque têm audiências. A apresentação de programas cada vez mais medíocres não se pode refugiar no argumento de que é o que as pessoas querem. Lamentavelmente há muito quem queira ter poder sem querer assumir a responsabilidade do seu exercício. Depois é o que se vê. Simplesmente degradante...

Mas não há ninguém que veja isto?

Dos 23 filmes portugueses estreados em 2011:
a) Dez tiveram menos de 500 espectadores!...
b) Seis tiveram entre 2.000 e 3.000 espectadores!...
c) Cinco tiveram entre 3.000 e 7.000 espectadores
d) Os dois mais vistos tiveram 20.194 espectadores e 17.102 espectadores.
Uma maravilha estes realizadores. Seguramente, fazem filmes para não ser vistos. Porque eu não vou ao ponto de dizer que não sabem fazer filmes!...Enfim, filmes confidenciais. Como confidenciais são os dinheiros que, também sem vermos, estas fitas nos custam.
Mas não há ninguém que veja isto?

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

"Digerir o cadáver Portugal"

Li, reli, arrepiei-me e não sei o que dizer.
Vou guardá-lo.

As barragens à inteligência

Não sei se a Barragem do Tua se justifica ou não em termos energéticos ou se as obras devem continuar ou parar. Mas sei que o Douro foi declarado Património da Humanidade já lá estavam implantadas todas as barragens actuais, do Pocinho a Crestuma-Lever, passando pela Régua, Carrapatelo, Torrão e muitas outras ao longo da bacia hidrográfica.
Por isso, não sei, nem compreendo como é que a Unesco pode sustentar que construção de mais uma barragem, e logo no extremo da região delimitada, põe em causa o Património Mundial que o Douro encerra.
Como também não compreendo que tal decisão da Unesco tenha sido pacificamente aceite pela opinião publicada e bem pensante de Portugal e pela generalidade dos agentes políticos. E não tenha sido tomada como ingerência bárbara em assuntos internos. Ao invés da Troyka que nós chamámos para pagar vencimentos e obtermos mais algum crédito externo, mas que, para esses mesmos, constitui um atentado à nossa independência.
Construa-se ou não a Barragem do Tua, mas por razões que sejam nossas e só nossas O contrário é aceitar uma barragem à inteligência que os bem-pensantes nos querem impor. Em nome de uma, falsa, ideia de "cultura" e da Unesco, talvez a mais corrupta instituição internacional.


segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Um golo de aguardente!

Para o meu amigo Pinho Cardão

Morava na estação. Era um catraio. Nos tempos livres corria pelas redondezas, não para muito longe, a povoação era pequena, rica de atividades e atraía tudo o que havia em muitos quilómetros em redor, os comboios assim o determinavam, como igualmente as fábricas de serração, de sabão, do pez e os grandes armazéns de distribuição, um verdadeiro polo industrial e comercial que tinha vida e dava vida aos que necessitavam de viver. Uma bela época, apesar da pobreza típica de Portugal dos finais dos anos cinquenta e da década de sessenta. Munido de um papo-seco, recheado de uma mistura de manteiga e de açúcar amarelo, corria pela ladeira passando pelo taberneiro, cumprimentando efusivamente os que saíam trôpegos e os que entravam sequiosos em matar a sede com meios quartilhos até sentirem a felicidade a invadi-los de forma grotesca dando expressão às suas formas naturais de ver o mundo. Passava em seguida a toda à bolina em frente da padaria, do barbeiro, do sapateiro, do talho, da farmácia, atravessando com cuidado a estrada. Antes de continuar pela velho caminho de macadame, que desaguava naquele ponto, via do lado direito mais uma tasca, que era coisa que não faltava naquelas aldeias, enquanto do lado esquerdo podia imaginar os tiquetaques do relojoeiro e a mistura dos cheiros da loja de mercadorias, mas continuava apressado, só parava momentaneamente em frente do petroleiro, pela simples razão de ficar inebriado com a mistura do cheiro do petróleo e do bacalhau, que nunca mais esqueci. Do lado direito, um pouco mais à frente, o marceneiro fazia-se ouvir através dos sons despertados na madeira, enquanto do lado esquerdo já se sentia a mistura dos berros do ferrador e do cheiro dos animais, mas só parava mais à frente na oficina do Porrudo, que era primo do meu pai. Trabalhava em ferro e fazia carroças muito lindas. Ficava deslumbrado com a maneira de fazer as rodas. No final colocava uma cinta de aço a toda à volta. Tinha forjas e muito foles, uns mais pequenos e um que era monstruoso. O que eu gostava mais era da forja pequena onde colocava um tipo de carvão muito redondo e duro. Tinha acoplado um pequeno dispositivo a que se tinha de dar à manivela. Ao princípio custava, mas depois ganhava-se balanço e era mais fácil. Quando girava com velocidade surgia um clarão vermelho e em seguida uma chama que gostava muito, baixinha, sem deitar fumo, com uma cor azulada que me fascinava. Queres dar à manivela? Quero. Depois de estar quente, muito quente, enfiava uma barra de ferro que ao fim de algum tempo ficava vermelha. Com uma tenaz retirava-a, punha-a na vertical, olhava, revirava-a e, em seguida, malhava com um martelo fazendo saltar muitas faíscas, dando-lhe a forma pretendia. Parecia manteiga. Mergulhava em água, num recipiente apropriado, ouvia-se o chiar enquanto uma pequena nuvem se levantava, voltando a enfiar a peça na forja. Ao fim de algumas operações, o objeto estava concluído, uma ferradura. Serve-te? Como? Estou a perguntar-te se achas que te serve? Mas eu não sou um cavalo! Aí não? Então és o quê? Um homem, não? Quando começava com esta lenga-lenga via logo que ia sair asneira. Sabes quando é que uma pessoa começa a ser homem? Que diabo de pergunta, pensei eu, e respondia-lhe com silêncio. Já pintas? O quê? Oh minha cavalgadura, então não sabes o que é "pintar". Claro que sabia, o que eu queria era não lhe dar troco, porque aquela rapaziada dos ofícios gostava de se divertir à nossa custa, mas para isso precisavam de pretextos e os pretextos surgiam assim que lhes respondíamos. Entretanto, a conversa interrompeu-se porque o cavalo que estava no ferreiro estava à espera do novo calçado feito à medida. Quando regressou puxou de um garrafão e começou a beber. O calor das forjas fez volatizar a aguardente impregnando as minhas narinas. Queres dar um golo? Não, não bebo aguardente, obrigado. Fazes mal, rapaz, tens que experimentar para seres um homem.
Uns tempos depois soube que estava doente. Fui vê-lo. Estava deitado na cama. O quarto era muito pequeno e a casa humilde, casa de pobre. Perguntei-lhe como estava. Mal. E via-se. A conversa não foi muito longa. Entretanto, pediu-me para tirar o garrafão que estava debaixo da cama. Garrafão? Sim. Estranhei o pedido. Ajoelhei-me e vi um garrafão deitado. Tirei-o. Agarrou-se ao dito, retirou a rolha e com sofreguidão tragou um valente golo. Um longo Ah, perfumado de aguardente, invadiu as minhas narinas. Toma, bebe um golo. Mas eu não bebo. Poderias beber à minha saúde, disse com uma certa tristeza. Incomodado com a situação, fiz-lhe a vontade. Bebi um pequeno golo. Queimou-me a língua e o céu da boca, mas a queimadura continuou o seu percurso, pelo menos até ao estômago, eu bem senti. Olhou-me com satisfação e disse: Já és um homem!
Não morreu na altura, ao contrário do que se esperava, e, curiosamente, acabei por o ver, décadas depois, num funeral. Quem é aquele? É o meu primo, o Porrudo. O quê?! Ele ainda está vivo? Não vês que sim! Pois é, estou a ver, mas...

domingo, 25 de dezembro de 2011

Um Santo Natal para Todos



"Adoração dos Pastores" - Josefa de Óbidos


Que todos os dias das nossas vidas seja sempre Natal, que reine sempre a alegria, a generosidade, a solidariedade e a tolerância. Um Santo Natal para Todos.

sábado, 24 de dezembro de 2011

Ratoeiras fiscais...

1.“Vão pr’ó raio que os parta”, assim reagiu o ilustre confrade Massano Cardoso num post editado em 30 de Novembro último, ao que considerou o iníquo tratamento que os serviços de finanças impõem aos contribuintes que se atrasam no pagamento do imposto “único” de circulação (IUC), aplicando-lhes coimas de € 15 por cada atraso, tendo ele próprio sido vítima desse tratamento…
2.Perguntava o ilustre confrade se os muitos milhões de Euros perdidos pelas finanças em processos de execução que prescrevem, supostamente por negligência dos serviços, não justificariam a aplicação de uma coima aos agentes do fisco objectivamente responsáveis por tais perdas? Porquê haverão de ser apenas os contribuintes visados por tal procedimento punitivo?
3.Acabei de ser tb contemplado – quase em jeito de postal de Boas-Festas – por um aviso de pagamento dessa coima, por atraso de pagamento (de apenas alguns dias, note-se) de um IUC em 2010…e lembrei-me do amargo queixume do ilustre confrade…
4.…mas lembrei-me também de que, ao contrário do que sucede com a generalidade das demais obrigações fiscais periódicas – IRS, IMI, IRC – no caso do IUC a administração fiscal não se digna notificar o contribuinte para pagar…
5.…cabendo pois ao contribuinte descobrir,caso se lembre, qual a época de pagamento do imposto e qual o respectivo montante através do site portaldasfinanças…
6.Nestas condições, é muito fácil um qq contribuinte, que tem muito mais que fazer do que andar sempre a pensar nos impostos que tem a pagar, deixar passar a época de pagamento do imposto, sem que tenha sido movido por qq intenção de não pagar…
7.Ocorre perguntar, sendo a RTP um serviço público, que pagamos a “peso de ouro” de resto, custaria muito divulgar através de uma publicidade simples das finanças, as épocas de pagamento deste imposto? Ou, senão quiserem ocupar o horário de transmissão, incluir essa informação numa simples página de teletexto?
8.Recordo os tempos em que a RTP mantinha um serviço de apoio aos agricultores, informando-os das épocas em que deviam realizar determinadas tarefas relacionadas com as sementeiras, as adubagens, as podas, as colheitas, etc…
9.Mas não senhor, era o que faltava darem-se agora a esse trabalho, os contribuintes “que se amanhem”, que esqueçam tudo o resto, esqueçam a sua vida e mantenham-se em permanente vigília para saberem quando têm de pagar os impostos nos casos em que a administração nem se digna informa-los…
10. Verdadeiras ratoeiras fiscais que nos montam! É fartar, vilanagem!

Recordação de Natal

Trata-se de um texto editado na véspera do Natal de 2005, também um sábado (passaram já 6 anos, continuamos na 3ª República, apesar dos esforços do pessoal aqui da Quarta…), e do qual, vá lá saber-se porquê, alguns dos leitores mais antigos do 4R por vezes se lembram e me vão recordando. E até me pedem para o republicar. Por isso, aí vai ele.
Esta historieta, de um Portugal que já não existe, só a poderá entender quem, como o Ferreira de Almeida ou o Massano Cardoso tenham vivido fora das grandes cidades e tenham conhecido a vida das pequenas terras.
Quando era muito miúdo, um dos homens a dias que trabalhava na agricultura, em casa dos meus pais, era o Sr. Emídio, mais conhecido pelo Emídio Ferreiro, em alusão à sua outra profissão. De todos os homens a dias, era do Sr. Emídio que mais gostava.
Se andava a pôr couves, eu lá estava a tentar ajudá-lo, se plantava alfaces, eu lá estava a dar-lhas à mão, acompanhava-o nas semeaduras, nas regas, nas mondas e nas colheitas.
O Sr. Emídio contava-me histórias, sobretudo da 1ª Grande Guerra, onde esteve, em 1917. Descrevia as trincheiras, os ataques de baioneta, a agonia dos feridos, enaltecia os actos de valentia e condenava os cobardes que procuravam fugir.
O Sr. Emídio tinha sido 1º cabo e dizia-o com muito orgulho da posição hierárquica que tinha atingido. Para mim, nessa altura, ser 1º cabo era o posto máximo da carreira militar, o chefe supremo.
Mas contava-me outras histórias e descrevia-me a grande cidade de Lisboa por onde tinha passado uns anos, com tanto entusiasmo que da primeira vez que vim a Lisboa quis ir ver os sítios de que me falava o Sr. Emídio.
Por essas alturas, o meu Pai andava a fazer obras para aumentar a casa.Em pedra, claro.
Para o trabalho da pedreira e dos pedreiros era preciso ter os guilhos, os picos e demais ferramentas bem afiadas: disso se encarregava o Sr. Emídio na sua forja.
Deste modo, passei a ir também à forja do Sr. Emídio, onde o via a dar ao fole, espevitando o braseiro, de forma a pôr o metal ao rubro para ser moldado, com fortes marteladas, em bicos bem afiados que penetrassem na rocha.
Era aliás esse o braseiro a que o senhor abade da minha terra aludia, meio sério, meio a rir, quando falava aos miúdos do inferno: portassem-se mal e lá cairiam no inferno, onde o fogo era bem pior que as brasas a arder da forja do Sr. Emídio!...
Afeiçoei-me ao Sr. Emídio. Em determinado Natal, pedi ao meu Pai para dizer ao Sr. Emídio para fazer a consoada connosco.
Não muito convencido, mas depois de me ver muito triste, o meu Pai lá se resolveu: oh! Emídio, venha logo comer o bacalhau cá a casa!...
Que não, dizia e repetia o Sr. Emídio.
Mas eu lá o convenci e ele veio com a mulher, a Srª Nazaré.
Em vários anos seguintes, repetia-se a cena e lá estava em casa também o Sr. Emídio.
Pela lei da vida, o Sr. Emídio morreu há muito. Mas não há noite de Natal em que não me venha do Sr.Emídio uma doce e nostálgica recordação.

Nota: Dos comentadores da primeira hora e desse texto, continua a honrar-nos o ilustre Tonibler. Menos constante, a Anthrax. Mas "la donna è mobile"...e há um finlandês para enfreniziar...Um abraço especial a ambos.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

"As Mentiras Convencionais da Nossa Civilização"

Na época do Natal, manda a tradição que se apele à paz e à concórdia entre os homens de boa vontade, uma mera retórica que não resolve nada. Quem sabe se não é uma forma de adiar os problemas. Eu sei que não é muito correto focar este assunto, mas a leitura do post do Pinho Cardão, e o desencanto de alguns concidadãos a este propósito, greve na CP, mais um motivo de desencantamento associado a tantos outros que têm vindo a cair-nos em cima do lombo ao longo do tempo, levaram-me a transcrever um pequeno trecho de uma obra que, embora escrita há mais de cento e vinte e cinco anos, mantém plena atualidade.

"As revoluções são tormentas que propendem para a realização das aspirações populares. Nunca são voluntárias, são apenas o resultado de uma lei física, como o furacão que restabelece o equilíbrio entre as densidades do ar causadas pelas diferenças da densidade do ar causadas pelas diferenças de temperatura, ou como a catarata que conduz ao mesmo ponto de elevação a superfície de dois cursos de água. Todas as vezes que a diferença do nível se torna grande, rebenta a revolução, que os poderes constituídos podem conter artificialmente durante certo tempo, mas que não conseguirão evitar. Na tradição histórica, são, pois, as revoluções o único facto que, por sua violência, sua extensão e seus resultados, permite ajuizar com firmeza do grau e dos motivos do descontentamento humano" (Marx Nordau in As Mentiras Convencionais da Nossa Civilização - Francisco Alves & Ca. Rio de Janeiro, 1887).

Perante o que andamos a observar, aos soluços e à pedrada, dou por mim a questionar: - Quanto falta para atingir o tal "grau de descontentamento" que permita desencadear a "revolução"? Motivos? Esses andam por aí, mas, afinal de contas, ainda não devem ser suficientes. E serão algum dia? Talvez, apenas para dar a esperança de que tudo irá mudar, mas não, será apenas mais um ciclo idêntico a muitos outros que culminará em injustiças e desequilíbrios sociais. A humanidade nunca muda, apenas se disfarça. Sabe qual é o verdadeiro valor da mentira, da mentira social, da mentira política, da mentira económica e da mentira religiosa. Custa dizer isto, mas não é mentira nenhuma e já que se fala de mentiras, mentiras por mentiras, prefiro as da poesia. São as únicas em que acredito.

O triunfo dos porcos

Um sindicato de maquinistas de comboios, em prepotente manifestação de abuso de poder, mais uma vez decidiu fazer greve num período sadicamente escolhido para maximizar o prejuízo de quem, no final, lhes vem pagando o salário. Nomeadamente com impostos. Uma violência fomentada por pequenos ditadores de ocasião a quem se vai permitindo praticar todos os abusos. Da lei e das pessoas. Os grandes ditadores fazem-se desta massa.


Mais uma vez, o triunfo dos porcos.

"Alfarroba"

Peregrinar com destino à capital transformou-se numa rotina quase religiosa. Converge tudo para Lisboa. A cidade gosta de se impor ao resto do país, não é por acaso que desdenha dos seus domínios chamando-lhe "província", criando um afastamento de forma a realçar a sua pretensa aristocracia, o que me diverte imenso.
Tive de participar numa reunião sem grande importância, que poderia realizar-se sem a minha presença, já que faz parte daquelas em que uma pessoa "tem" de entrar mudo e sair calado, mas as obrigações formais exigem que se cumpra o ritual. E eu cumpri. Restou-me algum tempo livre que aproveitei para ir até ao Chiado, onde tomei um café, onde me misturei com uma massa de gente anónima, mas conhecida de outros momentos, onde saboreei os fumos de castanhas a assar, fumos impedidos de dispersar pelo nevoeiro que se fazia sentir, onde vi alguns comportamentos sui generis, a conferir alguma luminosidade àquele espaço, onde me confrontei com algumas transformações arquitetónicas, felizmente para melhor, pelos menos desapareceram os incomodativos andaimes, onde me deparei com o fecho de uma livraria, a da Guimarães Editores, que feriu a minha sensibilidade e onde tive oportunidade de entrar nalguns alfarrabistas, como não poderia deixar de ser.
Senti que não estava com muita sede de livros. Não sei porquê. Às vezes acontece-me, entro sem sede e saio carregado que nem um doutor! Desta vez não.
De qualquer modo, consegui resolver um problema. Há muitos anos, agora sei que foi há quase vinte, participei, com outros colegas, na tradução de uma obra em português, uma obra técnica, um dicionário de Epidemiologia. Recebi alguns livros como compensação. Ao longo do tempo, alguns colegas pediam-me emprestado o livro, e, como seria expectável, acabei por ficar sem nenhum exemplar. Eu pensava que ainda deveria ter pelo menos um, guardado na faculdade, mas qual quê, também desapareceu! O livro, que nunca esteve à venda, foi distribuído pelos organismos oficiais a quem quisesse, mas esgotou-se. Ainda me recordo das voltas e do tempo que perdi para o encontrar. Em vão! Fiquei irritadíssimo. Paciência. Sempre que necessitava de alguma consulta tinha o original em inglês. Então não é que vejo um exemplar no meio daqueles longos escaparates, enfiado entre obras filosóficas, históricas e alguma poesia? Não percebi bem qual o enquadramento do mesmo, mas não faz mal. Na primeira página estava escrito o preço, cinco euros, quase que diria que é a "chapa cinco" para aquelas bandas. Retirei-o bruscamente com medo de que alguém se antecipasse, como se houvesse um outro epidemiologista à caça de "alfarrobas". Ri-me com esta expressão, porque no dia anterior, na televisão, durante o programa "O elo mais fraco", a certa altura, o esgazeado do apresentador pergunta a um concorrente, o que é que se pode encontrar num alfarrabista, e o jovem respondeu, automaticamente, alfarrobas! Pensei, ora aqui está uma bela e desejada "alfarroba", que custa cinco euros e que tanto trabalho me deu. Esta coisa de trabalhar e ter de pagar por cima para adquirir algo em que nos dedicámos com afinco, e gratuitamente, provocou-me uma sensação curiosa.
Valeu a pena ir à capital, passear por espaços familiares e resolver um problema que pensava ser insolúvel, sem nenhum esforço, a contrariar uma bela frase de Fernando Savater na sua obra "O grande labirinto", onde afirma: "Temos de estar preparados para o esforço, porque Deus vende as coisas mais valiosas pelo preço da fadiga que nos custa alcançá-las". Mas também é verdade que, por vezes, inesperadamente, conseguimos receber deliciosas prendas, e sabe muito bem, sobretudo nesta quadra.
Uma saborosa "alfarroba" que vou guardar como deve ser.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

4R nomeado como um dos melhores de 2011

O Quarta República foi nomeado como um dos melhores blogues de 2011 pela tvi24. Tanto mais de registar quanto o veredicto foi dado por um júri composto por 20 ilustres autores de blogues conhecidos e de que não fazia parte nenhum dos "bloguistas" do 4R.

Agradecemos o reconhecimento do Júri. E envolvemos no agradecimento os nossos ilustres comentadores, que tanto nos estimulam. Com comentários concordantes ou discordantes, mas dignos e limpos.

Decorrem votações até 6 de Janeiro, para eleger o melhor. Aqui. Naturalmente...o 4R.

A sensibilidade social

Depois de qualquer medida tomada pelo Governo no sentido de remediar o mal que assolou este país, ou mesmo quando o 1º Ministro se limita a dizer e a aconselhar o óbvio, outra forma de ganhar a vida, como no caso dos professores, logo vem a acusação de falta de sensibilidade social.
Porque, se não está nas mãos do 1º Ministro assegurar emprego a quem foi ou pretende vir a ser engenheiro, mestre-de-obras ou professor, estaria certamente nas suas mãos prometer a todos um futuro radioso de trabalho e emprego. E, prometendo esse radioso futuro, certamente que revelaria enorme sensibilidade social. Porque a verdadeira sensibilidade social não está em fazer, mas, pelos vistos, em prometer. Está nas palavras, que não nos actos.
Os dois governos anteriores, que ocultaram a verdade e enganaram os portugueses e directamente nos levaram a esta situação, foram pródigos em manifestações de sensibilidade social: quanto maior era o desemprego, maior eram as promessas de emprego (ainda se lembram dos 150.000 novos postos de trabalho?), quanto maior era a dívida e o défice, maiores os aumentos aos funcionários…Enorme e imbatível sensibilidade social.
Claro que os amantes deste tipo de sensibilidade social continuariam a prometer empregos crescentes a professores num país com uma taxa de natalidade fraquíssima, e com um número médio de alunos por turma ou de professores por aluno perfeitamente comparáveis com os países da EU. Politicamente correcto, bacalhau a pataco, que todos aplaudiriam.
Mas, nas circunstâncias, aconselhar a procurar outra actividade é, pelos vistos, não ter sensibilidade social.
A demagogia e o politicamente correcto campeiam e desgraçam este país. As verdades incómodas devem ser ocultada e as pessoas, pelos vistos, devem ter gosto em ser enganadas. Revelando toda a sua sensibilidade social. Num país de faz de conta, claro está!

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Ana Jorge

Reconheço que uma pessoa possa renunciar ao seu mandato ou pedir a demissão do seu cargo. Não devem faltar razões que justifiquem estas tomadas de posição. No entanto, se essas razões não são explicitadas, caso seja possível, naturalmente, fico um pouco perplexo com as mesmas. É o caso de Ana Jorge, que, pretendendo voltar ao seu cargo hospitalar, para um novo projeto, se "desligou" da Assembleia.
Eu sei que é muito complicado "viver" naquele ambiente, mas o respeito pelos eleitores é fundamental e quando se trata de pessoas de bem, então, é mais difícil de compreender e de aceitar.
Lamento.

Meditemos



A propósito da avaliação do sindicalista Mário Nogueira como professor, Camilo Lourenço assina este artigo de opinião que a estimula a meditar no sistema que, ao longo de décadas, permitiu a multiplicação destes verdadeiros fenómenos. Primeira perplexidade: por que é o sindicalismo alérgico ao princípio republicano da renovação do mandato representativo? É admissível que alguém que tenha um percurso dividido em 1/3 do tempo passado na profissão e 2/3 desse tempo fora dela seja mesmo assim considerado profissional do ofício?

Professores serão casta superior, estando-lhes vedada a emigração?

1.Vai por aí uma vozearia desabrida, na sequência de declarações do PM que simplesmente admitiu a existência nos PALOP’s de uma boa oportunidade de trabalho para os professores que não conseguem em Portugal encontrar um emprego pago pelo Estado – e muito menos pelo sector do ensino privado que, além de estar em declínio, será naturalmente mais selectivo nas contratações que faz.
2.Sucedem-se as declarações dos habituais donos do megafone – com notável saliência para o indomável M. Alegre e para o ubíquo (em termos comunicacionais) Sec. Geral da CGTP, um clamando a “cabeça” do PM e outro acusando-o de crime (supostamente de “genocídio”, embora não tenha esclarecido o tipo exacto de crime)...
3....e até um famosíssimo comentador de TV, sempre infalível nas suas apreciações, acusou o PM de ter dito algo que não devia...
4.Na minha perspectiva, estamos a assistir a uma típica manifestação do que apelidarei de” hipocrisia sistémica ou de regime” – uma prática que consiste em não admitir que se reconheçam e expressem em público as fragilidades do regime político vigente para dar resposta aos problemas que afligem cada vez mais a sociedade portuguesa ou que se desfaçam os mitos de que esse regime tudo pode resolver...
5....e quem, sobretudo a nível oficial, tiver a ousadia de o fazer, é imediatamente apodado de todos os defeitos, quando não mesmo de “criminoso”, como acima referi...
6.O que o PM disse é da mais elementar razoabilidade, partindo da óbvia constatação de que o Estado não pode – nem poderá num horizonte de tempo razoável - assegurar emprego a todos os professores, pelo que estes deverão, quanto antes, procurar alternativas de trabalho, sendo os PALOP’s uma solução natural e até positiva para muitos deles...
7.Mas o que o homem foi dizer! Reconhecer que o Estado está incapacitado para albergar todos os professores no seu diáfano manto orçamental, mas que iconoclasta! O Estado pode estar momentaneamente incapaz, pela óbvia razão de que não tem dinheiro (isso ainda se pode tolerar), mas não pode é deixar de admitir que, mais ano menos ano, todos os professores voltarão, tranquilamente, a sentar-se à mesa do Orçamento!
8.Para qualquer outro português – trabalhador da construção civil, dos serviços de restauração, empregado do comércio, motorista, electricista, canalizador, advogado, engenheiro, contabilista, etc, etc – a emigração é uma óbvia alternativa, pode ou deve mesmo emigrar - e fazem-no aos milhares por mês, desde há muitos meses a esta parte!
9.Mas os senhores professores nem pensar, era o que faltava! Esses constituem uma casta superior, têm lugar cativo na mesa do Orçamento, se momentaneamente o lugar que ocupavam ficou impedido, por falta de verba, é apenas uma questão de tempo: o PM e demais responsáveis não deverão descansar enquanto não suprirem tal impedimento!
10.Que hipocrisia generalizada e que comunicação social tão estranhamente subordinada à formosa decadência do País, sempre disponível para acolher as mais medíocres aplicações do sacrossanto princípio do politicamente correcto...que tristeza, em suma!

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

A fábrica de ecos da RTP



Dizia hoje de manhã a RTP que ainda não tinham acabado os ecos das declarações de Passos Coelho sobre as alternativas que se colocam aos professores não colocados.

Para comprovar devidamente a afirmação, logo emitiu uma entrevista telefónica com Manuel Alegre, em que este pedia a cabeça do 1º Ministro!...

Confusão de ecos, seguramente...Ou, talvez mais certo, fábrica de ecos prontos a servir...

Palhinhas vazias!



São horas de almoço. Acabo de tomar o meu café. Vejo o cauteleiro que há dias me vendeu uma cautela e que me desejou boa sorte. No restaurante, quando estava a acabar de comer, ouvi o sorteio. Começaram a sair as bolas, cinco, eu digo quatro, e sai o quatro, nove e sai o nove, depois não me recordo qual era o algarismo que vinha a seguir da minha cautela, só sabia que o último era o um, mas saiu o zero. Ri-me, surpreendido pela sequência dos três primeiros algarismos, os mesmos do segundo prémio. No café, o cauteleiro estava a ver a Sport TV e não se deve ter apercebido do sorteio, mas não me pareceu muito incomodado. O sono da idade deveria estar a atormentá-lo. Foi bruscamente sacudido do seu silêncio por um cliente que lhe deu a notícia da taluda. Também lhe disse que na sala estava uma pessoa a quem tinha saído o terceiro prémio. Não se comoveu, e eu também não. Faltava ainda mais de meia hora para iniciar a tarde. O sol estava a ser amável, mas, mesmo assim, apeteceu-me entrar na igreja em frente. Muito bem cuidada, limpa, airosa. Diferente das demais. Entrei. Nestas alturas é habitual haver presépios. Tal como tinha previsto estava um logo à entrada. Aproximei-me e vi as palhinhas vazias, o resto estava lá, os pais, os animais, tudo bem enfeitado, mas do menino Jesus, nada! Onde é que Ele se terá metido? Pensei. Estes jovens são sempre o mesmo, não nos podemos distrair um minuto, piram-se num ápice! Só espero que não se esqueça do seu dia!

Tesouro espanhol volta a estragar os planos dos nossos sábios comentadores...

1.Tal como tinha já feito por duas vezes na semana passada e com grande sucesso – para aproveitar a vaga da “catastrófica” Cimeira Europeia de 9 do corrente - o Tesouro espanhol voltou hoje ao mercado, desta vez para colocar dívida de curto prazo...
2....e os resultados não poderiam ter sido melhores, pois tendo anunciado um objectivo de colocar € 4,5 mil milhões de dívida, acabou colocando € 5,64 mil milhões e a taxas muit(íssim)o inferiores às das últimas colocações: € 3,72 mil milhões a 3 meses, taxa de 1,735% (anterior tinha sido 5,11%) e € 1,92 mil milhões a 6 meses, taxa de 2,435%, (anterior tinha sido 5,227%).
3.Pelo que se constata, a confusão está instalada nos mercados, dos tenebrosos especuladores de casino, que parecem desconhecer os altíssimos riscos decorrentes do espectacular falhanço da Cimeira do dia 9 e apostam na compra de dívida soberana, denominada em Euros, com o Euro na iminência de colapso...
4.Confesso-me surpreendido e esforço-me, em vão até agora, para descortinar as razões deste comportamento...
5.Estamos a terminar o ano 2011, os mercados estão quase a “fechar os livros”, o que nos reservará 2012? Será que vamos assistir à implosão do Euro ou à sua lenta agonia? Será que a jangada vai mesmo afundar?
6. Ou será que nada disso vai acontecer e afinal são os mercados que mostram estar do lado da razão? Mas se for assim, o que irá acontecer aos nossos sábios e proféticos comentadores?
7. Será que ainda os vamos ver em 2012 glorificando as virtudes do Euro? E reconhecer o seu enorme “potencial”, para reforço do projecto europeu? E, quiçá, destacar o papel fundamental dos mercados, convertidos de seres ignóbeis em criaturas muito respeitáveis?
8.Dos nossos sábios e proféticos comentadores tudo se pode esperar...como os exímios surfistas, é simplesmente uma questão de mudarem para outra vaga que na ocasião seja melhor para cavalgar...

Uma fotografia...

Na velha casa da terra natal, subo as estreitas escadas até ao andar de cima. Vou lá poucas vezes. As últimas arrumações convidaram-me a ir dar uma olhadela. São um pouco íngremes, é preciso apoiar no velho corrimão. À entrada de uma pequenina sala, que, por sua vez, serve de antecâmara a um dos sótãos, vejo, pendurado na parede, uma velha fotografia. Uma delicada sépia embelezada pelo tempo. Vestidos a rigor, um casal, com fatos domingueiros, olhares profundos, fixando com determinação a objetiva da câmara, numa pose ensaiada pelo artista, ombreavam uma criança vestida à época, alvorada do século vinte. Quem são? Nunca tinha reparado nesta fotografia. Sei lá! Não sabes? Devem ser parentes da minha avó, talvez primos que emigraram no princípio do século passado para os Estados Unidos. Sabes como é que se chamam? Já te disse que não sei quem são. Eram coisas da minha avó! Mas nunca lhe perguntaste quem eram? Deixa-te disso. O melhor é tirá-la daí. Não senhor. Tem que ficar. Tem arte, possui algo que não entendo, os olhares são muito penetrantes, quase que permitem ver o que lhes vai na alma. Entretanto, retiro a foto da moldura e vejo que foi mesmo tirada em Boston. Uma foto assinada. Até a criança já deve ter morrido, disse eu, em voz alta. Quem terá sido? O que fez? Quantos anos viveu? Como terá morrido? Será que chegou a ver esta fotografia? Se sim, será que alguma vez se lembrou dela? E as interrogações iam surgindo umas atrás das outras, como se tivesse necessidade de construir uma vida ficcionada onde pudesse colocar um protagonista, neste caso a criança, justificando-lhe uma existência momentânea. Ponho-me a pensar que, em adulto, terá visto, como é perfeitamente natural, fotografias dos pais antes de ter nascido. Num dia qualquer, em que os progenitores já não existiam, poderá ter folheado um álbum e vê-los sem a sua presença. Quem sabe se não lhe terá passado pela mente que estar morto é muito semelhante ao não ter nascido, a não fazer parte de uma fotografia qualquer, uma fotografia de quem se goste muito, se assim for, então, não deve ser muito mau.
Deve ser delicioso não estar numa fotografia que apreciemos imenso.

Sobre a Redução dos Feriados em Portugal

A necessidade de termos que produzir mais riqueza para conseguirmos mais rapidamente pagar o atoleiro de dívidas em que estamos – Estado, famílias e empresas, isto é, toda a sociedade – metidos está na base da anunciada decisão do Governo de reduzir o número de feriados já a partir do próximo ano.

Apesar de nada ser ainda definitivo, ao que se sabe, a possibilidade mais forte é o fim de 4 dos 14 feriados anuais que hoje temos[1]: 2 católicos e 2 civis.

Creio ser consensual que Portugal precisa não só de produzir mais, como de ser mais produtivo (isto é, produzir mais no mesmo tempo). No último caso, aumentar a produtividade consegue-se realizando as alterações (reformas) que nos tornarão mais eficientes. Reformar a Administração Pública; o Sector Empresarial do Estado; a legislação laboral; o mercado de arrendamento; a justiça – trata-se de alterações que constam do Memorando de Entendimento assinado em Maio último. E, como há tantos anos venho defendendo (infelizmente em vão, até agora…) espero que, logo que ultrapassada esta fase, uma reforma do sistema fiscal seja também realizada.

É na questão de produzir mais que cabe, sem dúvida, a redução dos feriados. Mas não só, como veremos.

Primeira constatação a fazer: em relação à Europa, Portugal tem, de facto feriados anuais em excesso. A média da UE-27 é de 12.1 feriados por ano, com um máximo de 16 na Eslováquia e um mínimo de 8 no Reino Unido. Com 14, Portugal está próximo do topo – pelo que parece fazer sentido reduzir o número de feriados. Mas não, em minha opinião, como parece estar a ser pensado.

Vejamos a natureza dos feriados. Excluamos, por razões óbvias, o Natal, o Ano Novo e a Páscoa (4 feriados, todos católicos, sendo o Natal e o Ano Novo também civis). Ficam o Carnaval (móvel), 25 de Abril, 1 de Maio, 10 de Junho, 5 de Outubro e 1 de Dezembro, como feriados civis; e o Corpo de Deus (móvel), 15 de Agosto, 1 de Novembro e 8 de Dezembro (católicos). A proposta é de eliminar 2 feriados católicos (Corpo de Deus e 15 de Agosto), o que a Igreja aceita desde que sejam suprimidos 2 feriados civis… que o Governo se inclina para que sejam o 5 de Outubro (comemoração da Implantação da República) e o 1 de Dezembro (comemoração da Restauração da Independência). Percorrendo os nossos feriados civis com significado histórico, pergunto: existirá algum com maior significado do que o da devolução da nossa independência, em 1640, depois de 60 anos de domínio Castelhano?!... O dia da nossa refundação como País, apresta-se para, pura e simplesmente, ser varrido do mapa?!... Lamento, mas não posso concordar. Se algum destes feriados não devia ser abolido era este. Respeito igualmente quem pensa que o 5 de Outubro também não deve ser; e o mesmo em relação aos mais recentes (e que, por isso, talvez pareçam ser mais importantes) 25 de Abril e 1 de Maio.

Tenho a consciência de que qualquer decisão sobre datas com carácter histórico será sempre polémica. Mas, por isso mesmo, valerá a pena correr esse risco – para mais numa altura em que a sociedade portuguesa já está tão pressionada (e não se vislumbram, para mais, dias melhores antes de 2013, face à informação hoje disponível)?... Valeria – se não existissem alternativas. Que, em minha opinião existem. Vejamos.

Sendo Portugal um país laico, embora de predominância católica, penso que não viria mal ao Mundo se fossem abolidos os dois feriados católicos propostos, mantendo-se os 5 mais importantes: 3 óbvios – o Natal e 2 na Páscoa, como já referi – e ainda 1 de Novembro (Todos os Santos) e 8 de Dezembro (Imaculada Conceição). Passaríamos, assim, de 14 para 12 feriados – em linha com a média europeia.

Adicionalmente, julgo que se podia prever a deslocação dos feriados para a segunda ou sexta-feira mais próxima… Com a – óbvia – excepção do Natal e Ano Novo (os feriados pascoais já são uma sexta e um domingo). Muitos não compreenderão que defenda que o 25 de Abril, o 1 de Maio, o 10 de Junho, ou mesmo o feriado que entendo ter mais significado histórico (1 de Dezembro), possam ser gozados às segundas ou às sextas. Mesmo quando coincidem com fins-de-semana. Note-se que, neste caso, as cerimónias oficiais continuariam a existir nos dias correspondentes; apenas o descanso seria saboreado junto a um fim-de-semana. Seriam, assim, eliminadas as chamadas “pontes” – responsáveis, em boa parte, pelo custo para a economia portuguesa de cada feriado, estimado num valor próximo de EUR 40 milhões. Para quem acha esta ideia caricata, recordo apenas que este é o regime existente nos EUA (que tem 11 feriados federais por ano, número a que acrescem os estaduais e locais), com excepção do Natal, Ano Novo e dia da Acção de Graças (Thanks Giving, última quinta-feira de Novembro, e que tem, para os americanos, maior significado que o Natal). Um regime ao qual nem o feriado do 4 de Julho – comemoração da Independência – escapa: as comemorações oficiais são sempre nesse dia; o descanso é gozado pela população sempre a uma segunda ou a uma sexta – mesmo quando o dia coincide com o fim-de-semana. Um feriado que não é, certamente, menos importante para os americanos do que o 1 de Dezembro, o 5 de Outubro ou o 25 de Abril para os portugueses…

Finalmente, se devemos trabalhar mais durante o ano (e concordo que sim), então por que não regressar, temporariamente (por exemplo, durante o período de ajustamento a que estamos submetidos) aos 22 dias úteis de férias, em lugar dos actuais 25?... Só aqui já se ganhava mais um dia do que com a abolição dos dois feriados civis propostos…

É esta a minha contribuição para que possamos todos criar mais riqueza (o que é muito necessário) – evitando, ao mesmo tempo, controvérsias dispensáveis na sociedade portuguesa.

Nota: Este texto foi publicado no Jornal de Negócios em Dezembro 20, 2011.


[1] Contando com o Carnaval (tolerância de ponto decidida pelo Governo no início de cada ano) e sem contar com os feriados municipais.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

27-1=?

A divergência entre Cameron e o seu Vice Primeiro Ministro sobre as decisões europeias foi assumida claramente, debatida e mantida. No entanto, a coligação mantém-se e isso não é considerado um drama a exigir solução radical. Entre nós, pobres democratas de curta data, massacrados de crises, um milésimo dessa discussão, a mera suspeição de semelhante divergência, abriria uma crise política dramática, catastrófica, como agora se diz, de consequências apocalípticas, como também se diz desde que nos esquecemos do que seja o debate político e a mera possibilidade de pensarmos fora do que nos é apresentado como inevitável.
Também preferia que os ingleses tivessem concordado com o que foi decidido na mais uma vez histórica cimeira, e teria preferido pela simples razão de que estaria mais convencida das suas virtualidades. Os ingleses não estão condicionados por necessidades desesperadas, estão fora do círculo de influência impositiva da nova Europa e teriam avaliado bem o equilíbrio e a eficácia das decisões. E têm uma réstia de poder.
Gosto da maneira suave como têm sido insistentes os “convites” para os ingleses reponderem, para que se cheguem aos bons. 27 não é muito diferente de 26 mas há um abismo entre os dois. Agrada-me que tenham desistido do tom ameaçador e que em Inglaterra o assunto seja debatido, pelo menos os argumentos existem e, sejam ou não incontornáveis, pelo menos pensa-se neles antes de desatarmos todos a copiar as Constituições uns dos outros.
As unanimidades, para terem alguma consistência, implicam convergência de posições e de condições, sem isso ou são soluções óbvias que não se percebe porque é que demoraram tanto tempo a decidir, ou então são apressadas e, em breve, veremos que não serviram para muito mais do que para testar a facilidade com que se avança sem se ver o que se pisa.

Mercados/especuladores VERSUS comentadores/profetas da queda do Euro, quem tem razão?

1. O Tesouro francês colocou hoje no mercado dívida de curto prazo, “com a procura a disparar e as taxas de juro a afundar” segundo notícias há pouco divulgadas.
2. Concretamente, foram colocados € 7 mil milhões, dos quais: (i) € 1 mil milhões a 8 semanas, (ii) € 3,5 mil milhões a 12 semanas, (iii) 1 mil milhões a 25 semanas e (iv) € 1,5 mil milhões a 47 semanas.
3.A procura foi igual a 6 vezes (!) a oferta no prazo das 8 semanas, nos restantes prazos terá sido igual a 2 vezes a oferta. As taxas de juro baixaram em todos os prazos, com saliência para as 12 semanas, em que foi de 0,05% quando em leilão anterior para o mesmo prazo tinha sido de 0,22%...
4.Começa a parecer-me que há qq coisa de errado em tudo isto...
5.POR UM LADO, nos nossos meios mais eruditos continua a desancar-se, “ad nauseam”, a última e tenebrosa Cimeira europeia, bem como a timidez do BCE que não revelou a coragem suficiente para inundar a Europa de liquidez, comprando a saborosa dívida pública dos países sujeitos a “stress” financeiro, facilitando-lhes a vida e “resolvendo” a crise europeia...
6....como se a crise europeia fosse, na sua essência, um problema de financiamento dos défices públicos dos países cujos desequilíbrios orçamentais e desequilíbrios externos os conduziram a uma situação de difícil acesso ao mercado financeiro...
7.POR OUTRO LADO, os mercados - desde a realização da Cimeira e da decisão do BCE, de poucas horas antes, que criou uma nova linha de financiamento para os bancos, de longo prazo (3 anos) - têm mostrado crescente apetite pela compra de dívida pública em mercado primário, de que a Espanha primeiro e agora a França têm beneficiado...
8. Será que os mercados/especuladores não prestam a devida atenção às vozes proféticas dos nossos sábios comentadores (e tb de muitos comentadores por essa Europa fora) e ainda irão arrepender-se dos investimentos que estão fazendo sem dar atenção a esses doutos avisos, quando o Euro cumprir finalmente a profecia e soçobrar?
9.Ou será que os mercados/especuladores estão de olhos mais abertos que os nossos proféticos comentadores e já perceberam que essa teoria da falência da moeda única é mais para entreter auditório e que os problemas da zona Euro – eventualmente amputada do seu membro mais frágil – acabarão por ser resolvidos, certamente com grande esforço (e dor, até) mas sem dano de maior para os detentores privados de dívida soberana (que não grega)?

O critério jornalístico

Logo pela manhã, a SIC Notícias informou que morreu "querido líder" da Coreia do Norte. Mas, para evitar juízos maldosos de quem o pudesse chamar ditador, logo se apressou a referir que se tratava de um " homem que governou o país com mão de ferro".

Sabemos perfeitamente: para a generalidade da "informação", à esquerda não há ditadores, é tudo gente cordata, às vezes apenas um pouco mais musculada. Estaline, Mao, Fidel, Kim Jong-il e tantos outros foram pessoas estimáveis e heroicos defensores da humanidade. Uma questão de critério jornalístico.

Em coerência, espera-se um voto de pesar na redacção da SIC e congéneres com igual critério.

domingo, 18 de dezembro de 2011

Um pobre mágico de feira...



António José Seguro desafiou o Primeiro-Ministro a “pôr fim à austeridade".
Tarefa fácil e primária. O Primeiro-Ministro carrega num botão e aí despacha de um só golpe o fim da austeridade.
Francamente, nunca vi melhor ilustração e entendimento da função de um Primeiro-Ministro. Portanto, não se preocupe, António José, se o 1º Ministro o não ouvir. Nem precisa de ser o senhor a substituí-lo, que por certo tem habilitações a mais. A coisa está perfeitamente ao alcance de um qualquer pobre mágico de feira ou de um Zé de ocasião que apareça ao virar da esquina disponível para exercer o cargo. Contrate-o, compre o botão e a magia aparece. Genial e de efeito completamente seguro.

sábado, 17 de dezembro de 2011

Difíceis coincidências...

1. Esta semana foi pródiga em intervenções ministeriais e em artigos de opinião e debates sobre os temas da transferência dos fundos de pensões dos bancos para a segurança social e da reforma da segurança social pública.
2. Sobre o primeiro tema escrevi aqui no 4R sobre o significado e as implicações da transferência dos fundos de pensões dos bancos para a segurança social. Com a decisão da transferência, ditada pela redução do défice de 2011, acabou-se com um sistema de segurança social que era sustentável, suportado num sistema de capitalização, que garantia através de um património privado autónomo o financiamento das pensões em pagamento e as responsabilidades com pensões dos trabalhadores no activo. Um sistema que deveria ser preservado e que deveria servir de modelo de referência tendo em conta as suas virtualidades.
3. E o segundo tema tem que ver com o primeiro. É que no mesmo momento em que se acaba com um sistema de capitalização, e se agrava a insustentabilidade da segurança social pública, o governo coloca na agenda política a necessidade de fazer reformas no sistema público de pensões porque o Estado Social vai recuar na sua generosidade e não poderá continuar a garantir as pensões prometidas.
Reformas que, segundo anunciado pelo ministro da segurança social, passam pela introdução do “plafonamento” nas pensões públicas - tectos para as contribuições e tectos para as pensões.
Trata-se de redefinir a função de “seguro” do Estado e a função de “poupança” das pessoas em complemento da pensão pública.
O papel dos sistemas públicos de pensões ganha assim maior relevância no objectivo central que é “segurar” o rendimento na velhice em níveis que permitam prevenir a pobreza e exclusão social.
A concretização deste objectivo implica uma mudança no modelo de financiamento do sistema de pensões - actualmente alicerçado no sistema de repartição - porque envolve uma alteração na relação entre contribuições e benefícios e uma mudança de cultura previdencial que favorece a ideia de liberdade de escolha individual e assenta numa partilha de responsabilidades e de riscos entre o Estado e os cidadãos.
Acontece, porém, que o “plafonamento” apresenta o problema do financiamento do “custo de transição” do actual sistema para o novo sistema, agravado pela actual situação de ruptura das finanças públicas. Aguardemos para ver como é que o governo tenciona ultrapassar esta dificuldade.
4. É pertinente - já era - a reforma da segurança social. Atrasos e adiamentos contribuem para o avolumar dos problemas e dos riscos e conduzem no tempo a soluções muito mais dolorosas para as pessoas, que acabam por se confrontar com um reduzido espaço de manobra para poderem alterar as suas decisões em relação à reforma. Todos sabemos que a mudança de atitudes e comportamentos perante a reforma leva tempo e que os seus efeitos são lentos.
5. Mas que não haja ilusões. Quaisquer que sejam as mudanças, o país precisa de criar riqueza, pelo que tem que haver uma aposta clara no aumento da produtividade e da poupança e na criação de emprego.
6. É muito positivo que o governo não esconda a realidade e não crie falsas expectativas e promessas. Dada a grande assimetria de informação existente entre os decisores políticos e os cidadãos, é um imperativo político e ético que os governos sejam transparentes e falem com verdade às pessoas. Mas é preciso indicar caminhos às pessoas e dar-lhes saídas.
7. Finalmente, e voltando ao princípio, a transferência dos fundos de pensões dos bancos para a segurança social pública é que não encaixa na necessidade de reformar o sistema público de pensões.

Boas Festas de Natal



Também aqui me recuso a alinhar no politicamente correcto de ignorar o Natal nos cartões de Boas-Festas. Comemora-se o Natal, porque houve o natal que todos conhecemos, natal de uma grandiosa figura histórica que inspirou homens, culturas e civilizações. Figura por quem se ergueram as mais majestosas obras-primas do génio humano, da arquitectura, à pintura, à literatura ou à música. Não é uma questão de religião; é simplesmente uma questão de não ignorar a história. E se religião é com cada um, a história é património de todos.
As melhores Boas-Festas para todos os membros desta Tertúlia. E os votos de um 2012 com (a possível...) alegria de viver!…

"Trinta euros"

Verifico com alguma frequência distorções preocupantes na utilização da ciência. Os "não cientistas" já perceberam que é relativamente fácil, e economicamente rentável, o mau uso e abuso da mesma. Em termos práticos pretendem apenas faturar à custa da "ciência". O que eu não consigo compreender são as atitudes de investigadores que enveredam pelos mesmos caminhos dos ditos "não cientistas" usando e abusando de certos conceitos para fins mais do que duvidosos.
Vender o futuro e hipotecar o presente está na ordem do dia. Vejamos como se cozinha algo do género. Em primeiro lugar demonstra-se que o fenómeno é real, em seguida prova-se que as consequências são potencialmente negativas e depois oferecem-se soluções, pelo menos teoricamente. No fundo estão criadas as condições para uma área de negócio.
Leio que estão em saldo espermogramas na Universidade de Aveiro! Só me faltava esta.
Vamos à história. Tudo aponta para uma diminuição da espermatogénese nos últimos decénios. Há quem aponte para uma redução de cinquenta por cento do número de espermatozoides perante o que se observava há meio século. Pode ser que assim seja, sendo responsabilizados por tal a exposição a muitas noxas ambientais.
Para acautelar o futuro, em termos de fertilidade, os alunos são "convidados" a saber como andam os seus "cabeçudos" quer na forma quer em número. É simples e rápido obter uma amostra mas têm de pagar a análise, que passou de setenta euros para trinta. Um grande desconto.
Esta notícia, ou campanha, que quer "prevenir" complicações futuras de eventual infertilidade, tem que causar alguma apreensão entre os rapazes para se sentirem "obrigados" a fazer o espermograma. Se não se sentirem ansiosos não irão realizar o exame.
Sabe-se que uma pequena percentagem de homens tem dificuldades na produção de espermatozoides. Será que com esta medida irão reverter a situação? Tenho algumas dúvidas. Se um jovem ficar a saber que tem azoospermia, ou qualquer outra anomalia quantitativa ou qualitativa não irá ficar perturbado? Não se sentirá diminuído? Não poderá provocar conflitos com a namorada? Não poderá impedir um relacionamento guilhotinando laços de amor? Não será melhor deixar que a natureza siga o seu curso? Mais tarde, caso se verifique estar perante uma situação de infertilidade, então, deverão ser utilizados os meios mais convenientes. Mas a notícia não fica por aqui, os investigadores propõem o congelamento do sémen de forma a ser utilizado no futuro caso haja necessidade, porque, como cada vez se procria mais tarde, o risco de diminuição da fertilidade é uma realidade. É por isso que alguns industriais da ciência começaram, lá fora, a criar condições para bancos de gâmetas femininos com este propósito, adiamento da maternidade. A dificuldade de a mulher engravidar aumenta quase que "exponencialmente" com a passagem do tempo a partir de certa idade, mas, no tocante ao homem, as coisas não são semelhantes, basta repetir o velho ditado, "homem velho e mulher nova fazem filhos até à cova".
No fundo, nesta história, existe uma manipulação e um convite a certas práticas, no pressuposto de que é necessário, e até mesmo prudente, fazer seguros de "fertilidade". Nunca se sabe o dia de amanhã e como a ciência prevê e oferece soluções para alguns casos, que podem naturalmente ocorrer, vai "obrigar" a maioria a despender trinta euros, preço de saldo, contra os setenta iniciais, para saber como está a fábrica em termos de produção e qualidade de espermatozoides.
Não tarda e vamos ter bancos de tudo e mais alguma coisa a troco de vantagens futuras para fazer faces a eventuais situações, mas para isso é indispensável criar ambientes de ansiedade na maior parte da população. Sem esse estado de espírito não se consegue grande coisa. O uso e abuso da velhinha frase "mais vale prevenir do que remediar" parece-me exagerado nalgumas situações, nomeadamente nesta. Uma política e aposta na prevenção da infertilidade deveria ser feita nos jovens em termos de redução do consumo de bebidas alcoólicas, do não consumo de drogas e de tabaco e evitar a exposição a muitas substâncias químicas que nos cercam, medidas que teriam efeitos muito positivos na produção e saúde dos cabeçudos e sempre se pouparia trinta euros, muita ansiedade e muito mais coisas...

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Bacoradas



Uma bacorada era o termo usado para definir o palavreado sem tino nem senso, asneira grosseira e primária, ou desbocadas palavras a que não se dava qualquer crédito.

Mas os tempos mudaram.
Quanto maior a bacorada, mais a comunicação social acorre a dar tempo de antena e a promover o autor. E a filmá-lo em atitude triunfante.
E os autores das bacoradas já têm voz no Parlamento, que logo lhes concede a palavra para melhor espalhar a porcaria.

A bacorada criou o dom de se multiplicar. Dos autores passou às instituições. Os autores, que antes eram deixados a refocilar sozinhos no esterco, passam a reverenciadas personalidades e assumem-se como elites e proeminentes titulares de lideranças parlamentares.

O país está como está!...

"Especuladores de casino" mais generosos com a Espanha?

1.Encontramo-nos numa altura em que a discussão política em Portugal se tem centrado em torno da tão ousada quanto imaginativa proposta de um deputado do PS no sentido de brandirmos aos nossos credores a “ameaça/bomba atómica” de não pagamento da dívida – em português arcaico “marimbarmo-nos para a dívida” – proposta que terá certamente apavorado tanto os nossos credores externos, que não tugiram nem mugiram...
2.Neste circo político nacional, esta fase tem sido riquíssima em contributos inovadores da bancada parlamentar do principal partido da oposição no sentido da resolução dos problemas financeiros do País – há poucos dias a recomendação do ilustre deputado Galamba no sentido de os bancos poderem conceder crédito sem que para isso terem de mobilizar recursos, agora esta proposta de concedermos a nós próprios uma moratória da dívida, sem apelo para os credores...
3....por isso o País tem motivos para estar confiante e optimista com esta nova vaga da política nacional...
4.Em Espanha, onde as inovações financeiras que estão sendo lançadas em Portugal ainda não chegaram, o tempo tem sido aproveitado para realizar algumas emissões de dívida pública com assinalável sucesso...já aqui referi em Post editado há 3 dias, a emissão de dívida de curto prazo (a 1 ano e a 18 meses), com taxas muito inferiores às anteriores e por montantes mais elevados.
5.Ontem novas emissões, desta vez de dívida de prazos mais largos, mas igualmente com alto sucesso: colocados € 6,03 mil milhões, dos quais
- (i) € 1,4 mil milhões a 10 anos, com taxa média de 5,55%, abaixo da yield (5,7%) que se verificava no mercado secundário na véspera do leilão;
- (ii) € 2,18 mil milhões a 8,5 anos, com taxa média de 5,2%;
- (iii) € 2,45 mil milhões a 5 anos, taxa média de 4,02% (taxa inferior em mais de 0,55 ao último leilão para o mesmo prazo.
6. Acontece que para este leilão de ontem a explicação (hipotética) que aqui avancei para o sucesso da emissão de dívida de curto prazo – as decisões da “tenebrosa” Cimeira de não voltar a impor penalizações aos detentores privados de dívida soberana em caso de futuras (eventuais) reestruturações e do “timorato” BCE de oferecer aos bancos uma nova facilidade de liquidez ao prazo de 3 anos – não serão suficientes (sobretudo a segunda) , uma vez que se trata de dívida que excede largamente os 3 anos...
7....mas não excluo que a decisão da Cimeira de não impor perdas aos detentores privados de dívida tenha sido mais eficaz do que eu próprio admitia...
8.Em qualquer caso, registe-se esta atitude “generosa” dos especuladores de casino em relação a Espanha, apesar de, que eu saiba pelo menos, não tenha havido nenhum político espanhol de 1º plano ameaçando o não pagamento...e quem sabe se os mesmos especuladores não teriam sido ainda mais generosos, com receio de serem atingidos por tão mortífera bomba atómica...

Mesmo que nunca se saiba a verdade toda, fica a saber-se que existe toda uma verdade por contar...

Chamaram-me a atenção para este post do José António Barreiros. Não me é indiferente o que ele escreve, como me não são indiferentes todas tentativas de branquear ou falsear a História, seja lá em nome do que for. Entendo bem o sentimento de revolta de JAB, não por saber o que ele sabe sobre o caso a que se refere, mas por também me ter acontecido o impulso de gritar pela verdade, bem sabendo que a poucos interessava e que muitos seriam os que prefeririam a versão tabular. Fica, porém, o registo de que, independentemente da História que se quer oficializar, há uma verdade que fica por contar. Não é tudo, mas já não é pouco...

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

O drama do desemprego...

Os números publicados pelo IEFP relativos ao desemprego de Novembro são reveladores da severidade da crise e espelham a situação dramática de centenas de milhares de pessoas que perderam o emprego e não têm como voltar a trabalhar. A oferta de emprego apresenta uma descida de 45% face a Novembro de 2011 e uma redução de 15,4% face a Outubro deste ano.Os números não revelam por inteiro a verdadeira realidade do desemprego, uma vez que não considera os desempregados que não estão inscritos nos centros de emprego – inclui aqueles que perderam o direito a esta prestação social - e os jovens à procura do primeiro emprego. Estima-se que considerando estes dois grupos o número de desempregados possa andar nos 900.000. O desemprego jovem está a aumentar, assim como está a aumentar o desemprego mais qualificado. O desemprego estrutural está a agravar-se.
Perante a gravidade da situação, com metade dos desempregados sem receberem subsídio de desemprego, e as previsões negras para a economia em 2012/2013, as alterações à legislação do subsídio de desemprego que o Governo está a preparar merecem reflexão. Estas alterações resultam dos compromissos assumidos com a Troika e os compromissos são para cumprir.
Com efeito, a redução do período de concessão desta prestação social de três anos para dezoito meses, numa fase em que o desemprego vai continuar a aumentar e se vai agravar a redução da oferta de emprego, vai acelerar as situações de desprotecção social. Este ajustamento está em linha com as regras praticadas nos países europeus. O problema é que sendo esta regra normal ela aplica-se a situações de normalidade económica e social. A regra não está pensada para crises da dimensão da nossa. As alterações em curso não poderiam acontecer num momento tão socialmente desajustado.
Seria conveniente um período transitório para a sua entrada em vigor, de modo a não agravar a situação económica e social de uma parte significativa da população. Quem pode acudir a tantas pessoas? Não estou a falar de números, estou a pensar em pessoas, em famílias, a pensar na sobrevivência, na angústia, na mendicidade. O que está em causa são níveis de dignidade de vida. Como nos podemos alhear desta dimensão? Como vamos viver colectivamente com este drama?

Giralt, o Robin Hood da banca espanhola

1.Ao ler o último (interessantíssimo) Post da Suzana Toscano, “The Shrinking Man”, ocorreu-me referir aqui uma história muitíssimo curiosa, real e actual, que encontrei na edição inglesa do El País de 19 de Novembro último, a propósito do início do julgamento de um Robin Hood da banca espanhola.
2.Trata-se de um cidadão espanhol-catalão, Eric Duran Giralt, que alegadamente, entre 2006 e 2008, terá burlado nada menos que 38 bancos em Espanha, conseguindo obter empréstimos e utilizar fundos com cartões de crédito/débito, sem qualquer intenção de os reembolsar.
3.Mas o mais curioso é que Giralt confessou e justificou o seu comportamento, dizendo nomeadamente que “quando em 2008 solicitei um cartão de crédito ao BBVA, muitos milhares de famílias encontravam-se já sobre-endividadas. Os bancos sabiam disso mas continuaram a oferecer às pessoas facilidades de crédito conscientes de que essas mesmas pessoas não iriam ser capazes de pagar”.
4.Em 2 anos, Giralt conseguiu sacar cerca de € 500.000 em empréstimos e saques com cartão, confessadamente como forma de protesto contra aquilo que apelida de “especulação financeira”, tendo ido ao ponto de utilizar uma boa parte dos fundos sacados no financiamento da edição de uma revista, que distribuiu profusamente, chamada CRISE, na qual explicou detalhadamente o esquema utilizado para “alavancar” todo aquele dinheiro...
5. Giralt começou a ser julgado em meados de Novembro, depois de uma rocambolesca fuga para a América Latina e um regresso forçado a Espanha, numa acção cível que lhe foi movida pelo BBVA por utilização irregular de um cartão de débito/crédito, com o qual foi efectuando sucessivos levantamentos diários de € 1.500 quando o limite contratual da facilidade era de € 600.
6.Giralt enfrenta dezenas de outras acções cíveis, movidas por diversos bancos credores, os quais provavelmente não conseguirão recuperar um simples Euro pois Giralt, o Robin Hood, está completamente insolvente! Mas conquistou grande simpatia junto da opinião pública em Espanha...
7.E por cá, não existirá também um Robin Hood da banca? Caso exista, ainda poderemos vê-lo arvorado em herói, pelo menos por um determinado bloco político...

A outra falta de crédito

Há dias foi o Professor Freitas do Amaral que, esquecido da sua condição de ex-ministro dos Negócios Estrangeiros do governo do então PM José Sócrates, zurzia sem dó nem piedade nas escolhas de que ele próprio se não pode desresponsabilizar. Assim, cruamente, condenando aquele que foi o primeiro-ministro de um governo que livremente integrou. Assim, sem uma centelha de um arrependimento assumido ou mesmo implícito, mas capaz de nos levar a pensar que não há quem seja imune ao erro, escape a ser enganado por um bom manipulador ou evite ser seduzido por um hábil sedutor.
Hoje é o seu sucessor no cargo que vem dizer que os portugueses devem ser chamados a pronunciar-se em referendo sobre a Europa. Mesmo que se passe por cima da questão de saber que referendo seria este na atual conjuntura, que objetivo com ele se pretenderia atingir, que quadro político esperaria o País após a consulta, o que mais choca é que Luís Amado vem propor agora o que o governo de que fez parte rejeitou in limine, lançando mão do argumento, para mim desde sempre inaceitável (como aqui repetidamente o escrevi), de que há matérias que pela sua complexidade não podem ser objeto de pronuncia popular. Foi esse o principal argumento contra o referendo em relação ao Tratado de Lisboa, celebrado entre o marcante "Porreiro, pá!" e o virar de costas do PM português ao MNE também português que, pretendendo partilhar da alegria aristocrática daquele momento, lhe estendia a mão para o cumprimento que ficou por dar. Certamente que os problemas europeus não se simplificaram, bem pelo contrário. Por isso creio que estas opiniões acabam por ser uma machadada mais na arruinada credibilidade dos políticos. Não só dos que tiveram responsabilidades no passado, como Freitas do Amaral e Luis Amado, mas sobre toda a classe política, não escapando aquela que está no poder, cuja cotação cai inexoravelmente no mercado da credibilidade de cada vez que um deles nega quem foi, o que fez e o que omitiu.