sábado, 31 de maio de 2008

Directas no PSD: previsão de 4 de Maio e resultados

A 4 de Maio arrisquei um vaticínio para o resultado das directas no PSD: vitória de Manuel Ferreira Leite (MFL), Passos Coelho (PC) em 2º, Santana Lopes (SL) em 3º, Patinha Antão (PA) em 4º e Neto da Silva (NS) em 5º.
Assim lida a previsão, parece ter-se tratado de uma aposta 100% certeira, se exceptuarmos a não prevista desistência de NS.

Numa análise mais fina aos resultados obtidos por cada candidato, concluímos que a “pontaria” daquela previsão não foi assim tão afinada:
- Dois candidatos, MFL com 36,67% e PA com 0,67, tiveram resultados bastante inferiores ao respectivo intervalo da previsão de 4 de Maio, que eram, recordo, (49,5 a 54,5) para MFL e (3,5 a 4,5) para PA.
- Os dois outros candidatos, PC com 31,07% e sobretudo SL com 29,82%, ficaram muito acima dos respectivos intervalos da previsão, (21,5 a 24) para PC e (15 a 17) para SL… e lembro-me que diversos comentadores acharam excessiva a minha previsão para SL…

Tenho a noção de que à data em que a previsão foi apresentada, ela reflectia muito razoavelmente a tendência de voto das candidaturas em presença, exceptuando PA que foi arbitrada um pouco por simpatia confesso.

As diferenças apuradas para o resultado final têm dois tipos de explicações, a meu ver:
1ª) A boa campanha, bastante mais dinâmica e agressiva tanto de PC como de SL - com este último a recuperar bastante “sobre a meta” depois de ganhar, claramente, o debate a 4 na SIC Notícias – em contraste com a campanha bastante mais discreta de MFL e do seu relativo mau desempenho no debate a 4.
É possível que a campanha de MFL se tenha defrontado com alguns problemas de “staff”, exceptuando a inegável qualidade do seu Director de campanha Dr. Luís Marques Guedes.
2ª) A "balcanização" do PSD, que claramente subestimei, explicando um fenómeno que é a grande disparidade do voto de cada candidato em função das distritais e dentro de cada distrital em função das concelhias – este fenómeno, que merece atenção, terá favorecido mais PC parece-me.
Ter-se-á pois acentuado mais do que eu imaginava uma dinâmica de transformação do PSD numa espécie de Confederação de Distritais/Concelhias que, se cristalizar mais uns anos, pode vir a ser muito difícil de corrigir e susceptível de conduzir a um definhamento do Partido.
Parece-me que combater esse fenómeno será desde já um grande desafio de MFL.

Resta endereçar os parabéns à Vencedora, desejando-lhe toda a sorte do Mundo no desempenho das suas árduas funções – mas terá que fazer oposição “a doer” desde muito cedo.
Não lhe falta matéria para tanto, mas é preciso dispor de um “staff” consistente, bem apetrechado e sobretudo disposto à luta…

Inflação sobe em Maio para 3,6% - que grande maçada!

1. A Zona Euro já viveu dias bem mais calmos, desde que há 10 anos foi instituída.
2. Vivem-se actualmente os dias mais complexos desta nova experiência monetária e económica, com economias como a portuguesa em virtual estagnação ou mesmo recessão, mas sujeitas (i) a uma política monetária própria de um ciclo de grande expansão e (ii) a uma moeda muito forte, própria de economias sem os problemas estruturais como os que enfrentamos…
3. A notícia de uma nova e forte subida do índice de preços no consumidor (IHPC), de 3,6% em Maio (Maio 2008/Maio2007) na Zona Euro é mais um quebra-cabeças para o BCE, que mantém praticamente inalteradas desde há já um ano as suas taxas de juro de intervenção e terá que decidir, dentro de poucos dias o que fazer – subir ou manter…
4. Subir as taxas nesta altura será agravar ainda mais a enorme dificuldade cíclica de algumas economias, como a portuguesa e a espanhola, as quais têm pela frente uma tarefa gigantesca de recuperar a competitividade externa dizimada pela insistência quase paranoica num modelo de desenvolvimento há muito esgotado…
5. Mas não subir, face a estas variações de preços (em Espanha a inflação em Maio terá sido de 4,7%...), poderá começar a ser interpretado como sinal de complacência face ao possível alastramento do fenómeno à generalidade dos bens e serviços, criando o risco de atraso no combate a um tal cenário...
6. Pela nossa parte, justifica-se uma atitude de total perplexidade, face à profecia feita em Novembro do ano passado, pelo Gov/BP.
Recordo, mais uma vez essa profecia, segundo a qual a subida dos preços a que então se começava a assistir constituía um fenómeno muito passageiro e que por isso se podiam excluir quaisquer subidas dos juros em 2008…
7. Recordo também que essa profecia foi feita numa altura em que ainda se discutia a maior ou menor bondade dos pressupostos que baseavam a proposta orçamental para 2008, entre eles uma inflação de 2,1%...
8. Volvidos 6 meses, constata-se exactamente o oposto: NÃO SÓ as subidas de preços se agravaram e estão para durar (responsáveis do BCE têm vindo a anunciar isso nos últimos tempos), MAS TAMBÉM os juros não têm parado de subir no mercado e, agora, para cúmulo, até se admite que o BCE possa ajudar essa subida…
9. Perplexidade à parte, a minha habitual aposta vai no sentido da manutenção das taxas pelo BCE, em Junho, aguardando ainda mais um mês por uma nova indicação do IHPC…
Até porque na próxima semana se festejam em Frankfurt os 10 anos do Euro, com pompa e circunstância, e uma subida dos juros poderia estragar tal festa!
Grande maçada esta!

sexta-feira, 30 de maio de 2008

"Amnésia social"

A Batalha do Amor (Cezanne)

Tentar interpretar as relações e comportamentos humanos através da química é, naturalmente, muito redutor. Apesar da complexidade e variabilidade, têm que ter suportes fisiológicos.
O encanto da ternura demonstrada pelos pais em relação aos filhos, as explosivas e inebriantes manifestações de amor entre dois amantes e a serena e reconfortante relação entre amigos, só para falar de algumas situações, pautam-se por partilhar uma substância muito interessante: a oxitocina.
Quem diria que esta hormona, que tem um papel primordial no desencadear do parto (as contracções uterinas são da sua responsabilidade) e na subida do leite, poderia ter um papel tão importante nas relações humanas, ao ponto de se manifestar, também, como uma hormona do amor? "Elixir" mágico?
Provas científicas são conclusivas acerca destas novas acções. Por exemplo, o bloqueio da sua acção, em ratos e ratinhos, origina o abandono dos cuidados e da amamentação das crias. Perdem, igualmente, a capacidade de reconhecer os membros familiares das suas espécies, contribuindo para o aparecimento da chamada "amnésia social".
Quantas mães abandonam e chegam, inclusive, a matar as suas próprias crias? A explicação estará no bloqueio ou falta de produção desta substância nos seus cérebros.
A espécie humana não é diferente, apenas mais complexa, e a oxitocina poderá ser uma espécie de "cola" da sociedade, contribuindo para o reforço das ligações sociais, as quais são interpretadas como fonte de prazer desde que a dita hormona actue efectivamente.
Ao ser ministrada a seres humanos verificou-se que as pessoas se tornaram muito mais generosas e verdadeiras em tarefas que exigem a partilha de dinheiro e confiança com estranhos.
Curioso! Se pensarmos em muitos acontecimentos que nos têm afligido ultimamente, falta de confiança em sectores económicos e financeiros, e mal-estar nas relações sociais, quase que poderíamos afirmar que estaríamos perante uma carência grave de oxitocina!
O medo e o stress são brutalmente incomodativos. A hormona do "amor" consegue reduzir ambos.
Muitas são as áreas que poderão, eventualmente, beneficiar de uma utilização terapêutica: doenças da personalidade, autismo, depressão, fobias graves e até, quem diria, impotência.
A empatia, também, tem relação com a oxitocina e o mesmo se passa com a verdade. Menos oxitocina menos empatia, menos oxitocina menos verdade!
Certos acontecimentos, tais como os ocorridos no hemiciclo da Assembleia da República, leva-me a questionar se a "produção" de oxitocina por aquelas bandas não andará em baixo! Manifestações de antipatia, de animosidade, de agressividade verbal (por enquanto) e de muitas "inverdades" (palavra curiosa!) poderão ser sintomas graves de carência daquela substância, traduzindo-se num equivalente da "amnésia social" verificada em animais.
Os acontecimentos que nos rodeiam são fontes de graves preocupações, provocando calafrios e um mal-estar crescente. Às tantas, entrámos num círculo vicioso, em que os mecanismos fisiológicos, substratos da nossa conduta e relacionamento, se encontram, provavelmente, bloqueados.
As soluções não passam, exclusivamente, pelas terapêuticas médicas, mas, a par do que acontece no dia a dia, quem sabe se umas pitadas de oxitocina não poderia ajudar as pessoas a serem mais “amorosas”? Para começar, que tal uma “spraiada” gigantesca no hemiciclo do Parlamento, antes de cada sessão? Se der resultado, então, podíamos passar para outros níveis, tais como, o mundo dos especuladores e quejandos que nos andam a tramar a vida...
N.B. Ainda não há notícia de que os traficantes de droga tenham manifestado interesse por esta molécula!

O PSD

Os eleitores do PSD têm amanhã a faculdade de escolher entre quatro candidatos: o candidato da matriz social democrata, Manuela Ferreira Leite; o candidato da matriz liberal, Pedro Passos Coelho; o candidato de matriz populista, Pedro Santana Lopes; e o candidato de matriz tecnocrata, Patinha Antão.
Por mim, desde o início que escolhi Manuela Ferreira Leite. Não concordo com aspectos do seu programa, nomeadamente sobre a questão fiscal. É algo que coloco no passivo da candidatura. Mas os outros candidatos têm um passivo maior. E Manuela Ferreira Leite tem um enorme activo, a sua experiência, credibilidade, peso profissional e político. A sua Situação Líquida é incomparavelmente maior.
Estou de acordo com muitas das propostas de Pedro Passos Coelho, que teve a ousadia de colocar o liberalismo na discussão pública. Esse é o seu grande activo. Mas as boas ideias para se concretizarem precisam de um veículo que PPC ainda não é. Oxalá possa vir a sê-lo, já que a experiência liberal faz todo o sentido e muita falta em Portugal.
No fim, também creio que MFLeite vai ganhar. Porque os eleitores do PSD a conhecem, porque sentem que é um valor seguro, porque a situação económica intenacional e do país exigem firmeza e rumo certo.
E Pedro Passos Coelho, não ganhando agora, poderá estar a ganhar o futuro. As ideias estão geralmente certas. Carece de demonstração de maturidade, capacidade profissional e peso político. Um bem a valorizar no mercado de futuros!...

quinta-feira, 29 de maio de 2008

A revivescência do mercado de arrendamento?


O ´Expresso´ do próximo fim-de-semana aborda a questão da crise do imobiliário e de como ela se vai fazendo sentir no País.
A contrário do que se passou noutras paragens, a crise em Portugal não teve um impacto abrupto. Mas é já notória - com excepção dos standards mais elevados, isto é, da habitação de luxo - uma evidente estagnação do mercado imobiliário.
Não só nas periferias, mas também no interior das grandes cidades, é raro o bloco que não exiba anúncio de venda de lojas ou fracções de habitação. Como é também uma evidência a oferta sem procura de espaços para comércio ou serviços.
Em Portugal, a crise do imobiliário há muito que estava anunciada. Construiu-se muito para além das necessidades. Construiu-se, aliás, sem consciência das necessidades e da capacidade de absorção do mercado.
Uma crise de abundância, gerada pela elevada e continuada rendibilidade da aplicação imobiliária para quem promoveu, construia e vendeu; e pelo empréstimo bancário fácil e pelo juro baixo prometido a quem comprou.
Essa conjuntura favorável ao sector terminou. Havia de terminar um dia num País onde bem contados, existem já muito mais fogos de habitação do que famílias para os habitar, não sendo previsível que o mercado internacional da habitação turística (que é igualmente sensível à crise) viesse a absorver tudo quanto a mais se construiu pelo País.
Longe vai o tempo em que a aquisição de imobiliário era uma forma de entesouramento.
Hoje, com a menor valorização e por vezes a desvalorização determinada por acelerados indices de degradação ou de vetustez, mas sobretudo pelos encargos - fiscais e outros - que impendem sobre a propriedade, não é uma boa aplicação de poupanças a aquisição de imóveis para habitação cuja revenda já não garante o "salto" para uma moradia mais qualificada ou uma mais-valia considerável no futuro.
O que resta a quem detém este tipo de bens, dificultada que está a sua alienação com vantagem financeira?
A locação será uma hipótese.
Será que a crise de abundância pode efectivamente reanimar o mercado de arrendamento, sobretudo se se confirmar a tendência para o encarecimento do crédito à habitação?

quarta-feira, 28 de maio de 2008

10 anos de Euro - que futuro vamos escolher?

A propósito da passagem do 10º aniversário da criação da moeda única europeia, o conhecido articulista do Financial Times Martin Wolf apresenta hoje um breve mas muito interessante balanço da nova experiência monetária.
A primeira conclusão da sua análise é de que a zona Euro, constituindo um sucesso no plano da união monetária, de acordo com uma série de indicadores, do ponto de vista de uma união económica já o não é:
- O desempenho médio da zona durante este período, medido pelo crescimento do PIB, compara mal com o dos países que não quiseram aderir (Dinamarca, Suécia, Reino Unido) e também com o desempenho dos próprios países do Euro nos 10 anos antecedentes;
- A evolução da produtividade do trabalho tem sido insuficiente e o desemprego, embora um pouco mais baixo, continua muito elevado quando comparado a outras economias mais desenvolvidas.
Por outro lado, a zona Euro enfrenta neste momento enormes desafios.
Em primeiro lugar, acentuaram-se as divergências entre os países membros no tocante a níveis de inflação, custos unitários do trabalho e contas externas.
Em segundo lugar, a posição dos países chamados “periféricos”, em especial a Itália, Espanha, Portugal e Grécia, tornou-se mais vulnerável, enfrentando grandes dificuldades estruturais e cíclicas, alias estreitamente relacionadas.
A questão cíclica consiste em encontrar fontes alternativas de procura, agora que o boom do crédito está no fim e nada pode oferecer para estimular a economia.
Este problema é mais sensível em Espanha (e em Portugal, como bem sabemos).
Para ultrapassar este desafio é indispensável enormes melhorias na competitividade externa, esquecida por anos sucessivos de crescimento rápido do consumo interno estimulado pelo boom do crédito...que agora chegou ao fim e dele nada mais se pode esperar nos anos mais próximos.
A questão estrutural é bem mais complexa, implica ganhos de produtividade elevados para inverter o padrão de crescimento, em particular numa altura em que a valorização do Euro agudiza este problema.
Para ter algum sucesso, essa alteração de padrão de crescimento exigirá um esforço enorme de reformas, nomeadamente na redução da despesa pública improdutiva ou muito pouco produtiva.
No nosso caso o problema complica-se e muito com a ideia da promoção de grandes obras públicas nos próximos anos, consumindo recursos que não temos e agravando, em vez de favorecer, a evolução da competitividade externa.
Esse “programão” de obras públicas constitui, a meu ver, uma tentativa desesperada de prolongar um modelo de crescimento que não só produziu maus resultados como se mostra esgotado...iremos aguentar mais esse erro?
Com Martin Wolf, direi que é muito cedo para concluir quanto ao triunfo do Euro.
Esse triunfo só acontecerá se os problemas atrás identificados puderem ser resolvidos de forma eficaz, em tempo útil.
Mas esses problemas não são técnicos: exigem escolhas políticas muito difíceis, entre nós pavorosamente difíceis mesmo... Seremos capazes?
Que futuro vamos escolher?

O resultado do acordo ortográfico visto pelo Times

“It is really remarkable that a European colonial power changes its spelling to match that of a colony"
.
Remarkable, indeed...

Na base, finanças sãs...

Vem sendo repetido à exaustão que o equilíbrio das contas públicas é condição necessária ao crescimento económico. Daí, a recusa da descida de impostos, enquanto o “equilíbrio” orçamental não estiver reposto.
De tão repetidas, estas afirmações foram geralmente assimiladas como verdade absoluta e indiscutível: constituem mesmo um dos dogmas do nosso ritual político. Acontece que elas se contradizem nos termos e nos efeitos.
A primeira afirmação é verdadeira, se, e só se, o equilíbrio se fizer pelo lado da despesa pública, diminuindo-a. Acontece que esse “equilíbrio” se vem conseguindo predominantemente pelo lado da receita, pelo que, em vez de propiciar crescimento, induz apenas recessão. Porque o crescimento não resulta do equilíbrio das contas públicas, mas da capacidade de iniciativa, de investimento e de consumo privados. O permanente apelo a novos e mais impostos cerceia essa capacidade, com os resultados que estão à vista. Nestes termos, a afirmação é, pois, completamente falsa.
Da forma como o Governo tem actuado, e os bem pensantes apoiam, o equilíbrio das contas públicas vem tendo efeitos perversos, promovendo apenas e unicamente a crise.
No entanto, analistas, professores de economia, comentadores, os próprios media em artigos de fundo, não se cansam de defender a política oficial, clamando por mais crescimento e, ao mesmo tempo, fechando os olhos a cada vez mais despesa pública e ignorando, ou mesmo justificando, o continuado aumento dos impostos, que impedem o crescimento. Uma perfeita contradição, tanto mais que a poupança privada a nada pode obviar, por há muito estar no vermelho.
A cultura instalada vai fazendo persistir no erro e impedir novas políticas. Porque, para a cultura instalada, que vive normalmente à conta, contradições não importam, já que o crescimento do Estado é o seu próprio crescimento económico.

Vizinhança: um fenómeno "fora de moda"...

Não sabia que existia o Dia Europeu dos Vizinhos, assim como não me apercebo de muitos dias nacionais, europeus ou internacionais que comemoram, relembram, promovem ou fomentam um cem número de “coisas”. Enfim, não fazia ideia da existência deste Dia. Foi uma pequena peça televisiva que me despertou para o assunto.
Fiquei a pensar sobre as razões que motivaram a ideia de assinalar um dia dedicado aos vizinhos. Na verdade, a vizinhança é um fenómeno que está em extinção, vítima de uma nova dinâmica económica e social que alterou profundamente o modo como se opera a “socialização” nos países que registaram transformações económicas importantes. Com efeito, cultivar relações com os vizinhos constitui hoje em dia uma dificuldade, não sendo assim reconhecida porque as pessoas na azáfama do dia a dia não valorizam os laços de vizinhança, não sentem a sua falta, não os consideram algo que poderia melhorar a sua convivência social e humanizar o relacionamento com o meio.
Alteraram-se os modos de relacionamento com os outros e as formas como interagimos com o meio envolvente e as estruturas económicas e sociais de que dependemos, modificaram-se os hábitos e os costumes de vida, o espaço físico conheceu uma nova organização “urbana”, alargaram-se as ofertas e as respostas à nossa disposição para a ocupação do tempo e a descoberta do mundo e imprimiram-se novos espaços, tempos e ritmos para as 24 horas do quotidiano.
Com estas mutações da organização social desapareceram, em particular no meio urbano, os laços de vizinhança assentes em valores tão importantes como a proximidade, a solidariedade e a entreajuda. Desapareceram, assim, redes importantes de apoio, de convívio e de inclusão social.
Quantos de nós não conhecemos quem são os nossos vizinhos? Não sabemos quem são, como se chamam, se são altos, baixos, magros ou gordos, o que fazem, se estão bem ou se precisam de ajuda. A regra é hoje o desconhecimento do que se passa paredes meias com a nossa casa, no prédio ao lado ou no outro lado da rua. O vizinho idoso necessitava de uma ajuda mas não fomos informados ou a casa do lado foi assaltada mas não soubemos! Aparentemente não tem importância, é indiferente!
Se pensarmos um pouco mais sobre a importância dos laços de vizinhança, verificamos que a sua ausência é um factor que estimula a solidão, a exclusão social e a insegurança. Mas não temos tempo para reflectir sobre estes "detalhes" da vida! Andamos tão entretidos com o progresso que mais facilmente comunicamos pela internet com alguém que está do outro lado do mundo do que cumprimentamos um vizinho!
Agora consigo compreender um pouco melhor a razão de ser do Dia Europeu dos Vizinhos!

terça-feira, 27 de maio de 2008

Quem fala (esta) verdade, merece castigo

Reagindo ao raspanete do Dr. Mário Soares dado hoje por escrito aberto no DN, o senhor Primeiro-Ministro afirmou que os recursos são «escassos» para apoiar a classe média.
Querem confissão mais absoluta do fracasso desta legislatura?

Eleições no PSD: Por que apoio Pedro Passos Coelho

Em minha opinião, a candidatura de Pedro Passos Coelho à liderança do Partido Social Democrata representa uma lufada de ar fresco e uma esperança que se abre, quer para o PSD, quer para a sociedade portuguesa – podendo, por isso, significar uma enorme mais valia para todos os que anseiam participar mais activamente na vida política do nosso País, mas não se revêem totalmente na forma como os Partidos têm, muitas vezes, conduzido as suas actuações.

Encarnando, sem dúvida, uma linha de renovação no PSD, mas com experiência quer ao nível político, quer empresarial, Pedro Passos Coelho tem abordado com frontalidade todas as questões que lhe são colocadas (independentemente da sua natureza), e tem mostrado estar familiarizado com as fragilidades e os problemas que o nosso País enfrenta nas mais diversas vertentes.

Na minha área de formação, a economia, a situação que Portugal atravessa é muito complicada – o que já sucede desde há vários anos a esta parte. O crescimento económico é extremamente débil; o nível de vida da população tem vindo a deteriorar-se, ano após ano, face aos padrões europeus; a produtividade compara mal com a maior parte dos países da União Europeia; o desemprego subiu para níveis historicamente elevados; a desigualdade na distribuição de rendimentos é das maiores da Europa; o endividamento externo atingiu, desde há alguns anos, níveis preocupantes; o défice das contas públicas tem sido combatido muito mais à custa da receita do que da despesa (uma fórmula errada e não sustentável); a sociedade (famílias e empresas) encontra-se estrangulada com uma carga fiscal excessiva; o investimento, quer nacional, quer estrangeiro, escolhe outras paragens…

É fundamental perceber que, sem colocar o crescimento económico no topo da agenda governativa, nenhum dos outros problemas que enumerei será resolvido.

Ora, isso significa uma profunda mudança na estratégia de política económica que desde há vários anos tem vindo a ser prosseguida no nosso país. Significa, em particular, equilibrar o combate ao défice público com a necessária e urgente dinamização da economia. Assegurar a consolidação das contas públicas tem, obrigatoriamente, que passar pela redução do peso da despesa do Estado no PIB, em particular as despesas de funcionamento. Potenciar o crescimento económico implica a prossecução de políticas viradas para a competitividade e a produtividade, que tornem o país mais atractivo para as empresas – sem o que nunca será possível criar mais e melhores empregos, apoiar os mais carenciados e atenuar as desigualdades sociais.

Em ambas as vertentes, e como há anos venho defendendo, a política fiscal deve desempenhar um papel estratégico fundamental que, infelizmente, tem sido sistematicamente esquecido/adiado em Portugal.

O Governo Socialista liderado pelo Engenheiro Sócrates trouxe-nos mais do mesmo, e está visto que – até pelas suas raízes ideológicas – não será capaz de proporcionar esta viragem na política económica que Portugal urgentemente necessita.

Em minha opinião, o discurso que Pedro Passos Coelho tem proferido e as ideias que tem lançado colocam-no, de entre os candidatos à liderança do PSD, na melhor posição para materializar esta mudança, apresentar um projecto de governação alternativo ao que o Engenheiro Sócrates tem corporizado e, dessa forma, poder aspirar a ser Primeiro-Ministro em 2009. Um projecto mais liberal na economia, que permitirá uma maior ambição no domínio social.

E é por acreditar que este será o melhor caminho para o nosso País que, de forma convicta, lhe manifesto o meu apoio.


Nota: Este texto foi publicado no jornal "24 Horas" em Maio 23, 2008.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Economia: ignorância do Bundesbank...e sapiência lusa!

A propósito do péssimo desempenho da economia lusa no 1º trimestre de 2008 – lançando o pânico nas hostes oficiais e obrigando a uma atrapalhada (primeira) revisão das previsões até aí sacrossantas – as “nossas” autoridades balbuciaram umas quantas explicações para “nós” percebermos melhor a infausta notícia.
Uma das explicações, apresentada pelo Gov/BP, num registo eminentemente técnico, apontava para o facto de em 2008 a semana da Páscoa ter ocorrido no 1º trimestre, tendo como consequência um menor número de dias úteis na produção de bens…com a dolorosa consequência de um PIB menos “robusto”…
Menos de uma semana depois, o Bundesbank explicava a razão do forte crescimento da economia alemã no mesmo 1º trimestre, que chegou a 1,5% em cadeia (1º Trim2008/4ºTrim2007), que a repetir-se nos trimestres seguintes – não vai acontecer – catapultaria o crescimento da Alemanha para mais de 5% este ano…
Curiosamente, uma das principais razões desta aceleração do crescimento, apontada pelo Bundesbank, foi o facto de a semana da Páscoa ter ocorrido no 1º trimestre, o que teria motivado uma forte expansão das vendas a retalho, favorecendo o PIB em última análise…
Como se vê, a forma tão divergente como as duas economias reagiram à semana da Páscoa seria surpreendente - não fora o facto de o Bundesbank se ter enganado…esquecendo a redução dos dias úteis, essa sim decisiva para o desempenho da economia e relevando um factor despiciendo como a aceleração das despesas dos consumidores em semana pascal!
Só que na Alemanha, o facto de haver dias não úteis favorece o crescimento enquanto que em Portugal penaliza…elementar, meu caro Watson!
Ainda bem que “temos” lideres que “nos” esclarecem e fazem perceber estes complexos mecanismos da economia, tornando-os simples…pobres alemães, que têm de suportar a ignorância do Bundesbank!

A bomba mais próxima

Sempre entendi - e aqui por mais de uma vez o escrevi - que as boas decisões políticas não são as que resultam dos estímulos imediatos da conjuntura. Comentámos no 4R episódios surgidos no sector da educação, da justiça ou da economia e sempre defendemos que é mau sinal quando os governantes desatam a afastar o sabor amargo de um qualquer facto teoricamente mais penalizante à custa de uma alteração das regras de jogo.
Existem situações, porém, em que o ´esperar para ver´ não é solução. E se a espera pelo milagre não é a fonte do problema, a verdade é que o potencia e agrava.
Parece-me ser o caso da actual situação no mercado interno dos combustíveis.
Creio não ser desmentido se disser que, rebus sic stantibus, a alta dos preços nem a todos penaliza. Pelo contrário, favorece:
  • O Estado que (salvo uma substancial quebra no consumo) arrecada mais receita em IVA;
  • Todas as empresas do ciclo que vai da extracção do crude à distribuição dos refinados, passando pela transformação, armazenagem e distribuição.

Julgo também que não serei contestado se escrever que quem perde são os cidadãos, as famílias e as empresas, afinal o País pelas implicações profundas que o preço dos combustíveis tem na formação dos preços de bens essenciais, designadamente alimentares. É, aliás, bem sintomática a quebra do consumo privado já mensurada.

Também me parece incontestável que, tendo o investimento sofrido uma considerável perda no último período, como aqui se deu nota e comentou quanto ao IDE, a conjugação: i. da baixa do consumo privado; ii. com a diminuição do investimento reprodutivo; iii. somadas ao efeito inexorável da redução das exportações, enterra definitivamente qualquer perspectiva de recuperação da economia portuguesa, afundando o País em mais desemprego, pobreza e desigualdade.

E cada vez que o País se afunda num ciclo negativo, afunda-se mais que a generalidade dos seus parceiros, tornando mais difícil e esgotante o esforço de recuperação e mais vivo o penoso sentimento colectivo de que 'não chegamos lá...´

Não entendo, por isso, a persistência de alguns em considerar correctas as actuais políticas, esperando o milagre que num mercado aberto e global jamais acontecerá.

Nem percebo, neste quadro, a posição do Governo ao não admitir sequer, num cenário de agravamento, poder fazer variar os actuais parâmetros da política fiscal, desagravando o IVA ou alterando a fórmula de cálculo do ISPP (ou duas medidas), impostos que representam 60% do preço final da gasolina e do gasóleo, se tal se mostrar indispensável para garantir alguma estabilidade dos preços.

A menos que alguém me explique o contrário - mas em português, s.f.f.! - esta continuada obsessão pelas políticas de estabilidade financeira é sintoma de uma pulsão suicidária da economia, a cuja asfixia, em quase todos os sectores, assistimos dia-a-dia.

Como com franqueza também não entendo o choradinho constante do CEO da Galp em relação à situação da empresa e às expectativas dos investidores, uma vez que a despeito da redução de lucros de 8,4% no primeiro trimestre, estes atingiram, depois de impostos, amortizações e outras deduções, 109 milhões de euros! Não é desprezível para o mercado, e por isso não me parece que assustasse os accionistas e investidores uma menor voracidade pelos resultados; e se necessário fosse, o adiamento de algumas decisões de investimento...

Uma nota final.

Ao invés do que demagogicamente sugere o senhor Primeiro-Ministro, controlar a escalada de preços dos combustíveis não é favorecer os ricos, em detrimento dos que não têm automóvel. Os engenheiros sabem, e o senhor Primeiro-Ministro que é engenheiro também sabe, que os ricos sempre terão dinheiro para pagar combustível por mais oneroso que seja o seu custo. Quem não tem, e cada vez menos terá, são aqueles milhões de portugueses que sentem dificuldade em chegar ao fim do mês com as contas pagas e o estômago confortado. Esses, sem demagogia, são as principais vítimas dos preços exibidos na bomba mais próxima.

A selecção deles!...

Pelo que tenho visto nas primeiras, segundas e terceiras páginas dos jornais, pelo que tenho ouvido na rádio e pelas imagens que tenho visto nos telejornais sobre o estágio em Viseu, está já formada a Selecção deles para o Europeu de Futebol. Aqui vai ela.

Cristiano Ronaldo

C. Ronaldo C. Ronaldo C. Ronaldo C. Ronaldo

C. Ronaldo C. Ronaldo C. Ronaldo

C. Ronaldo C. Ronaldo C. Ronaldo

Capitão da equipa: Luís Figo

Suplentes:C. Ronaldo, como guarda-redes; C. Ronaldo C. Ronaldo C. Ronaldo C. Ronaldo , como defesas; C. Ronaldo C. Ronaldo C. Ronaldo, como médios; C.Ronaldo, C.Ronaldo, C. Ronalfo, como avançados.;Cristiano Ronaldo, como 3º guarda-redes.

Por uma globalização menos selvagem

No meio de tantos relatórios sobre tudo e mais alguma coisa, vi uma notícia no Le Monde do dia 23 que me chamou a atenção e que vem muito a propósito do sempre aceso debate nacional sobre liberalismo e o papel do Estado.
Uma Comissão criada em 2006 com o apoio do Banco Mundial, presidida pelo Prémio Nobel americano Michael Spencer, liberal ortodoxo, e composta por mais 20 personalidades de relevo mundial – Comissão sobre o Crescimento e Desenvolvimento – publicou um relatório que considera que é necessário um novo consenso para "tornar a mundialização menos selvagem", pondo em causa as políticas de desenvolvimento adoptadas no séc. XX na sequência do chamado “Consenso de Washington”. Este, elaborado pelo economista Jonh Williamson no fim dos anos 80, preconizou a redução dos défices, dos impostos e da despesa pública e a aceleração das privatizações e da desregulamentação.
Um olhar profundo sobre o resultado dessas políticas e a análise dos fenómenos de crescimento persistente de países como o Brasil, a Indonésia, a Malásia, Malta, Singapura ou a Tailândia, põem em dúvida o sucesso de pressupostos quer de forma de governos, quer de algumas receitas económicas até agora consideradas intocáveis.
Chegam agora à conclusão de que o Consenso de Washington “não teve em conta as consequências sociais das políticas que defendia, conduziu à insegurança económica e pôs as populações contra as reformas” consideradas necessárias no mundo global.
O relatório da comissão é peremptório: “A ortodoxia tem limites e, se houvesse uma receita infalível, já a teríamos descoberto”. E qual é a principal constatação? Pois bem. É a de que “o crescimento indispensável para fazer recuar a pobreza e assegurar um desenvolvimento sustentado reclama um Estado forte”.
E que entendem eles por um Estado forte? De facto, a associação entre o crescimento saudável e o papel do Estado deixa por uma vez o estribilho do apagamento a eito dos sectores públicos versus o sector privado, antes evidenciam que tem que haver um “planeamento a longo prazo que permita funcionários melhor pagos e uma administração “competente, credível e motivada”. Diz mesmo mais, diz que os “investimentos públicos em infraestruturas, educação e saúde, longe de impedir o investimento privado, o estimulam”.
O relatório, no breve resumo que pude ler no jornal, parece muito preocupado com a revolta das populações perante o crescente desemprego, a falta de apoios na adaptação a novas formas de trabalho e – last but not the least – deixa de considerar relevante a forma de governo que garanta o crescimento. Ou seja, o segredo do sucesso já não depende dos regimes democráticos que o ocidente arvora como condição…
As receitas milagrosas parecem, assim, estar no banco dos réus. É tão errado combater o desemprego com o aumento desmesurado do emprego público, como é errado cortar investimentos na saúde e na educação em nome de um liberalismo como profissão de fé. É errado controlar os preços para controlar a inflação, como é errado reduzir a análise do progresso a números e mais números, sem olhar a qualidade.
O que esta Comissão vem dizer é, afinal, de uma sensatez desarmante: é que não há fatos-pronto-a-vestir que sirvam a todos os países, uma vez que as realidades sociais não se compadecem com teorias cegas. E que a mesma receita, aplicada sem olhar a isso, como fez o Banco Mundial no século passado em muitos países, não só não provoca o crescimento como pode dar origem a graves problemas sociais.
Este relatório é um grande sinal de alarme e um toque de finados ao liberalismo economicista do fim do séc. XX. É que os povos querem é viver melhor, não estão muito interessados em saber quem é que segue de perto as teorias que estão mais em voga…

domingo, 25 de maio de 2008

A beleza da verdade...

Foi recentemente libertado nos Estados Unidos, no estado do Dallas, um cidadão norte-americno condenado a prisão perpétua sob a acusação de ter violado e morto uma jovem. Foi condenado quando tinha 28 anos e viveu na prisão durante 27 anos, período durante o qual sempre negou qualquer culpa no crime que o levou àquela condenação.
Apesar de seis pedidos de recurso e de dois testes de ADN teve que esperar pela nomeação de um novo juiz que decidiu iniciar um programa de revisão de centenas de pedidos de testes genéticos. Na sequência desta decisão, James Woodard foi ilibado porque um teste de ADN provou finalmente a sua inocência.
Quando esta história foi noticiada na televisão, fiquei impressionada com a monstruosidade dos erros judiciais cometidos contra este homem.
Hoje no programa 60 Minutos da SIC Notícias, estive a ver a entrevista que lhe foi feita e uma reportagem sobre os derradeiros últimos dias da sua vida na prisão que acabariam por o conduzir à liberdade.
O que mais me tocou na entrevista foi o facto de James Woodard ter solicitado às autoridades judiciais, em diversos momentos dos longos 27 anos que "viveu" na prisão, que lhe fosse concedida a liberdade condicional e de a mesma lhe ter sido negada por este homem nunca ter aceite ser culpado. Bastaria que assumisse a culpa e o seu pedido teria tido provimento!
O entrevistador perguntou-lhe porque razão não o fez? E James Woodard respondeu que a verdade é superior à liberdade, que a dignidade de um homem não se compra com mentira. Magnifico e raro pensamento, ainda mais impressionante vindo de alguém que recusou a liberdade condicional para um dia, que felizmente aconteceu, poder dizer que a verdade é fundamental na vida!
O entrevistador perguntou-lhe, então, onde tinha ido buscar força para esperar. James Woodard explicou que a força foi alimentada pela esperança de a justiça reconhecer um dia a brutal injustiça cometida. E assim foi. Hoje é um homem verdadeiramente livre!

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Mais despesa pública, mais impostos...mais pobreza!...

A edição de amanhã do Expresso vai focar a crise da economia portuguesa. Agora que “José Sócrates devia estar a colher os frutos da política de ‘aperto do cinto’ na primeira metade da legislatura, as contas saíram-lhe furadas…”, diz o Expresso.
Pois saíram. Mas acontece que Sócrates e o Governo tudo fizeram para tal resultado. Claro, a crise internacional, claro, a desaceleração espanhola, claro o aumento dos combustíveis…mas isso pouco explica. O que verdadeiramente explica a situação é a persistência continuada de políticas públicas erradas, nomeadamente a política orçamental e a política fiscal.
O Estado gastador continuou a fortalecer-se nos últimos anos: a despesa pública aumentou em termos nominativos e em termos reais, crescendo mais do que a inflação. Sem benefício para os cidadãos, que não vêem melhoria nos serviços públicos. Mais despesa que correspondeu a puro desperdício. Escudado no Estado soberano que gasta à toa, teve o Governo que aumentar impostos, para controlar as contas públicas, esportulando ao país capacidade de investimento produtivo, de reorganização empresarial, de formação de pessoal, de consumo racional, tudo o que a economia precisa. O Governo açambarcou montantes cada vez maiores de recursos dos cidadãos e das empresas, tornando a economia mais pobre para tornar o Estado mais omnipresente.
Para manter a omnipresença do Estado, que agrada aos ministros, inventou-se a falácia de que os impostos não podem baixar, enquanto não baixar a despesa. A falácia está em que a despesa nunca baixa, se não houver um facto exterior que imponha a sua redução. Por isso, primeiro têm que se reduzir impostos, para forçar a descida da despesa. Com efeitos benéficos sobre a economia e sobre uma criteriosa gestão das finanças públicas.
Apesar de todos os bem pensantes continuarem a ver o rei ataviado de vistosas políticas públicas, o rei vai mesmo nu. Que o próprio até confirma quando vai dizendo que “continua sem grande folga orçamental para desencadear políticas de contra-ciclo”. Óbvio! Não tendo diminuído a despesa, em termos reais, perante qualquer baixa ou desaceleração do PIB, logo se vê o que está roto. Mas aqui o Governo erra novamente: é que políticas de contra-ciclo só são possíveis com superavits orçamentais, não com défices como o nosso.
E se a despesa pública trouxesse riqueza, com os continuados défices, Portugal seria o pais mais próspero do mundo!...

A perigosa confusão entre a ficção e a vida real

Vi agora no telejornal uma breve notícia sobre um professor universitário americano que deu a última aula antes de se retirar à espera que um cancro no fígado lhe ponha fim aos seus dias. O vídeo desta aula corre no you tube e tem sido um êxito. Calculo que esta nova modalidade de voyeurismo desperte os mais profundos sentimentos solidários e comoções perante o sofrimento de quem assim apresenta, como um filme, a história da sua condenação.
Segundo a notícia, naquela universidade é regra os professores darem uma aula em que o tema é “o último dia de vida” ou seja, fingem que sabem que vão morrer e fazem um balanço do contributo positivo que, na sua opinião, deram a este mundo. Uma espécie de última confissão como método de auto avaliação de desempenho é, no mínimo, de mau gosto. Mais eficaz que o soro da verdade. Sublinhe-se que é uma ideia posta em prática numa universidade, certamente para lhe dar o selo de testado cientificamente. Esperemos que não se exporte a ideia…
A novidade é que, desta vez, era mesmo a sério e aquele homem ainda jovem que falava com ar prazenteiro aos seus alunos, fazendo trocadilhos que punham a sala às gargalhadas, terá poucos meses de vida, a acreditar no power point que apresentou com as radiografias onde se viam os nódulos assassinos. No fim, chamou ao palco a “viúva” (foi assim mesmo!), ela veio muito emocionada, e despediram-se.
Se fiquei chocada com a “técnica” imaginativa usada para garantir que a auto avaliação é sincera, - como pode mentir quem sabe que não terá outra oportunidade para se arrepender? - ainda mais me abalou que uma pessoa como aquele professor se tivesse prestado a esta representação sobre o seu próprio caso. Ainda se tivesse sido um impulso de emoção que o levou a partilhar com os alunos o seu drama, ainda podia entender, mas estva a seri tudo filmado para ser divulgado.Senti-me constrangida e apeteceu-me ir lá pedir-lhe que parasse com aquilo, que as pessoas não têm que se expor só porque há uma moda de banalização do que deve ser respeitado, o direito à intimidade da vida privada em primeiro lugar.
Não sei se o objectivo é afirmar um novo dever cívico de “partilhar” as angústias de quem se sente perdido, se é espantar o medo de morrer, se é outra coisa qualquer. Por mim, não gostei de ver e não auguro nada de bom quando se proclama o direito a expor e se aceita ser exposto, confundindo o teatro com a dureza da vida real.

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Para onde vamos?

A Margarida Corrêa de Aguiar chama a atenção no post abaixo para uma realidade que nos deve envergonhar: a do acentuado fosso entre os que mais têm e os que mais pobres são.
Porém, a situação é bem mais grave do que a comparação com os nossos parceiros poderá fazer crer.
Em primeiro lugar porque o estudo baseia-se em dados de há uns tempos atrás. Teme-se que a situação se tenha entretanto agravado profundamente.
Em segundo lugar porque não sendo os nossos ricos tantos nem tão ricos como os que o são nos outros Estados da UE, o estudo revela afinal que os nossos pobres são muito mais pobres do que os pobres dos nossos parceiros.

Começa a ser hora de as pessoas se interrogarem para onde caminhamos. E de agirem em conformidade. Esta visão de Portugal e do mundo que tudo reduz a números, está a colher os efeitos da falência das políticas orientadas pelas estatísitcas, pela opinião publicada, planeadas em função dos ciclos eleitorais e não do futuro do País.
São os números que facilitam a especulação porque a disfarçam com explicações pretensamente cientificas. E como que legitimam as medidas estritamente financeiras e a virtualidade das estatísticas favoráveis.

Porém, a realidade, para além das estatisticas e da sua leitura, para além dos discursos irrealistas de quem nos governa, é outra. A gravidade da situação retrata-se em notícias com esta cuja veracidade me não custa a admitir.

Pobre Portugal: CAMPEÃO!

Campeão, sim, mas pelas piores razões! Acabo de ler a notícia de que Portugal foi hoje apontado em Bruxelas como o Estado membro com maior disparidade na repartição dos rendimentos.
Segundo o Relatório Sobre a Situação Social na União Europeia em 2007, principal instrumento utilizado pela Comissão Europeia para acompanhar as evoluções sociais nos diferentes países europeus, que não tive ainda oportunidade de ler, conclui que os rendimentos se repartem mais uniformemente nos Estados membros do que nos Estados Unidos e que “Apenas Portugal apresenta um coeficiente superior ao dos Estados Unidos”.
Portugal consegue o feito extraordinário de se deixar ultrapassar pelos novos membros e sentar-se na cauda de uma fila já longa de países que integram a União Europeia.
Portugal está a empobrecer, incapaz de encontrar um rumo de futuro para a sua economia. Incapaz de criar riqueza, afogado num Estado avassalador de recursos, as políticas redistributivas mostram-se inadequadas à necessidade de proteger as famílias pobres. Os resultados estão à vista!
Sabemos que sem crescimento económico não há desenvolvimento social e as desigualdades sociais tendem a acentuar-se. O desenvolvimento económico é essencial, mas no curto e médio prazos são necessárias políticas concretas que minimizem a condição de pobreza em que vivem muitos portugueses.
Há muito que sabemos que em Portugal é significativamente elevada a percentagem de pessoas que sendo muito pobres o são persistentemente, o que inevitavelmente conduz a situações de privação cumulativa. Se juntarmos a esta base o fenómeno do desemprego e a precariedade do emprego compreendemos que a situação social é muito grave e que necessita de atenção política muito séria na direcção de aprofundar a selectividade dos recursos para quem efectivamente precisa.
Não é mais possível esconder a situação. Vontade de ajudar é o que sinto...

Do you understand?

Mais uma pedra no sapato no sinuoso caminho para a qualidade educativa. Agora é o ensino do inglês do ensino básico. O Ministério da Educação e a Associação Nacional de Municípios Portugueses não se entendem! Não estão de acordo em relação às contrapartidas financeiras que o ME pretende pagar aos Municípios pelo ensino do inglês, concretamente pela actualização do custo do ensino dos 3º e 4º ciclos e pelo seu alargamento, a partir do próximo ano lectivo, aos 1º e 2º ciclos. A ANMP diz que o dinheiro não chega. Pode ser que não, mas o problema não se resume apenas a dinheiro!
Este desentendimento, situação a que já estamos habituados, leva-me mais atrás na reflexão sobre duas questões de fundo:
- Primeira: porque é que o ensino da língua inglesa não é obrigatório? Mas quanto tempo vamos ainda necessitar para nos convencermos que o inglês é indispensável para qualificar e preparar as crianças e os jovens para a vida e para melhorar a competitividade de um país que vive numa economia aberta, integrado que está no espaço Europeu, que precisa de ser global e de intensificar o intercâmbio comercial, de experiências e do conhecimento à volta do mundo?
O inglês é tão necessário e importante como, por exemplo, a matemática e como tal deve ser ensinado desde tenra idade. Quanto mais tarde for introduzida a aprendizagem do inglês no processo educativo , maiores serão os custos e menores serão os benefícios, pois o esforço exigido a um jovem ou a um adulto será sempre superior.
- Segunda: como é feita a “contratualização” do ensino do inglês entre o ME e a ANMP? Não é suposto serem negociados e contratados com realismo e boa fé os direitos e os deveres a que ambas as partes se obrigam?
Não é suposto serem objecto de um contrato questões tão fundamentais como o número de alunos abrangidos, os requisitos curriculares a ministrar e as cargas horárias, o número e o nível de qualificações dos professores formadores bem como as remunerações a pagar, outras condições a observar como, por exemplo, as instalações utilizadas, o apuramento dos custos bem como o seu financiamento e as regras de actualização dos preços, a avaliação de desempenhos, etc? Não deveria esta “contratualização” ser do domínio público e escrutinada?
Se quanto à primeira questão está em causa uma visão política sobre a educação e as qualificações formativas, já quanto à segunda está em causa uma visão política sobre os instrumentos que regem a “descentralização” de competências do poder central para o poder local. Na primeira, a opção política está muito longe das necessidades e na segunda fica realmente a ideia de que o entendimento político foi feito à pressa, em “cima do joelho”.
Não são estas matérias que urge primeiro cuidar? Do you understand?

O seu a seu dono!...

Passaram dez anos sobre a Expo 98, considerada a mais bem organizada exposição internacional de todos os tempos. Os meios de comunicação social vêm recordando o tema, personalizando o acontecimento em torno de Mega Ferreira. Mega Ferreira pensou, Mega Ferreira criou, Mega Ferreira executou, Mega Ferreira foi a Expo e Mega Ferreira é a Expo, pois só ele é chamado para se referir ao tema.
É a tradicional visão redutora dos media, para quem os protagonistas são sempre os amigos, os chegados, os que têm as empresas de imagem a soldo. Mega Ferreira foi um dos que deu a sua contribuição, maior ou menor, quer na ideia, quer na parte final da execução, mas não se pode tomar a parte pelo todo, sob pena de injustiça reles e mesquinha. Estamos fartos de estátuas impantes erigidas sobre os verdadeiros heróis.
Na memória do evento, a minha homenagem a Cardoso e Cunha, o primeiro Comissário e aos restantes membros do primeiro Conselho de Administração da Parque Expo 98, na pessoa do Dr. Tavares Moreira, nosso companheiro de Blog, os quais tiveram a difícil tarefa de começar o projecto e ultrapassar obstáculos de toda a ordem, legais, logísticos, regulamentares, pessoais, para além de invejas e incompreensões. E a minha homenagem também ao segundo Comissário, Torres Campos e aos que o acompanharam e que levaram o Projecto a bom termo e ao êxito comummente reconhecido.
É bom que os mais novos fiquem a saber e os mais esquecidos recordem tais nomes e o serviço que prestaram e que os media, por facilitismo ou ouras razões, tão convenientemente esquecem.

“Portugal, país de silvas”...

O nosso país não anda bem e tenho algumas dúvidas se alguma vez andou, tirando aqueles períodos ditos nobres e, mesmo assim, não sei!
É pobre e vai continuar a ser pobre. Todos os esforços feitos nos últimos tempos tem-nos empurrado um pouco para a frente, mas os outros também sobem e parece que cada vez se distanciam mais de nós. Resta-nos a consolação – pobre consolação! – de vermos que povos mais miseráveis sofrem desesperadamente para poderem sobreviver com o mínimo de dignidade. Face a estes até nem deixamos de ser um paraíso.
A vida, no seu contínuo trajecto, é repleta de pequenos acontecimentos que nos moldam e que nos fazem reflectir e até filosofar. A situação económica dos portugueses não é das melhores e tende a agravar-se. Em contraste, anunciam-se tantas e tão dispendiosas obras que é legítimo perguntar: valerá a pena desviar dinheiro para estas, quando falta dinheiro para outros tipos de investimentos em que a saúde, a protecção social, a educação, a investigação e a cultura deveriam ser prioritários?
Também tenho dúvidas sobre a forma como são feitas as distribuições do orçamento do estado por muitas instituições públicas. A lógica da poupança é relevante e deve ser respeitada como um sinal de respeito dos cidadãos. Mas, às vezes, as coisas são um pouco anedóticas. Vejamos o caso de um instituto tão importante como o INAG (Instituto Nacional da Água). As suas funções, como Autoridade Nacional da Água, são muito relevantes mas parece que não consegue cumprir com muitas das suas funções, argumentando falta de disponibilidade financeira. Claro que também está sujeito “democraticamente” aos cortes orçamentais, a par de outras instituições.
Coimbra, como qualquer outra localidade que tenha “água”, tem alguns conflitos com esta instituição, e sempre por falta de verbas. Após várias interpelações que fiz, enquanto Provedor do Ambiente e da Qualidade de Vida Urbana de Coimbra, acabei de receber respostas às mesmas. Uma delas, dizia respeito à limpeza das margens do rio Mondego, entre o Açude – Ponte de Coimbra e a Ponte de Santa Clara.
A reposta é curiosa e não resisto a transcrevê-la:
Esta questão põe-se só relativamente à margem esquerda do rio, uma vez que na margem direita as margens são praticamente em paredão de alvenaria vertical.
A vegetação infestante que existe nos taludes em alvenaria da margem esquerda é constituída essencialmente por silvas. Este instituto não dispõe actualmente de meios para efectuar desmatações, quer físicos, quer financeiros.
No entanto de pouco serviria efectuar o corte das silvas pois, como não é possível serem arrancadas pela raiz sem danificar o revestimento de protecção do talude em alvenaria, rapidamente as silvas voltariam a crescer e ainda a robustecer-se, a não ser que se aplicassem produtos químicos, o que está fora de questão dada a sua localização. De salientar que esta questão é um aspecto essencialmente estético não ocasionando problemas ambientais.
Este instituto tem neste momento em fase de adjudicação uma prestação de serviços de trabalhos de “Vigilância, operação e manutenção”, no âmbito da qual poderão ser realizadas acções de corte das silvas periodicamente. No entanto, como atrás exposto, de pouco servirá dado que rapidamente as silvas se desenvolvem novamente.
Bom, seguindo este raciocínio então não vale a pena limpar as matas, porque as silvas voltam a nascer. A não ser que, neste caso, por estarem perto da água, não corremos riscos de incêndio. Também me ponho a pensar se valerá a pena cortar o cabelo ou as unhas, porque vão crescer novamente. Ficamos feios, mas não passa de um problema meramente estético.
Afinal, limpar ou desmatar o país de “silvas ou quaisquer outros infestantes” – e são tantos, infelizmente, os responsáveis pelo estado a que chegamos – está votado ao insucesso, porque voltam a nascer. A minha dúvida é se não provocam mesmo problemas ambientais, porque problemas sociais provocam com toda a certeza...
Portugal país de silvas...

quarta-feira, 21 de maio de 2008

“Aspirina e Poluição”...

Não tenho grande receio em andar de avião, até, porque, frequentemente, chego a adormecer mesmo antes de levantar voo! Das duas uma, ou é alguma falta de oxigenação que ataca o meu cérebro, ou, então, este quer “desligar-se” de qualquer coisa. Mas, adiante. O que me incomoda mais é a falta de espaço. Apesar de não preencher os critérios de ser um “avantajado”, sinto-me apertado e não sei onde meter as pernas.
Há já algum tempo foi descrito um novo síndroma, denominado da “classe económica” que, segundo alguns autores, é uma designação errada, já que pode atacar os passageiros da classe executiva e, até, mesmo os que viajam noutros meios de transporte. Afinal, tudo se resume à formação de pequenos trombos nas veias das pernas devido à imobilização das mesmas. Assim, quanto maior for o tempo da viagem sem mobilização dos membros inferiores maior é o risco de vir a sofrer uma “trombose venosa profunda” a qual pode libertar trombos capazes de se alojarem nos pulmões, podendo, nalgumas circunstâncias, provocar a morte. Para evitar tal situação recomenda-se várias práticas que vão desde a utilização de meias elásticas, movimentos com contracção dos músculos das pernas, tentar andar pelo corredor, uso de aspirina, e até mesmo de anticoagulantes, sobretudo nas pessoas de elevado risco, caso de idosos ou quem tenha sido sujeito a cirurgia.
A par da situação já descrita, veio agora juntar-se mais alguns dados novos. Ou seja, novas “causas” para a denominada “trombose venosa profunda”.
A poluição atmosférica tem sido ultimamente responsabilizada por vários problemas, caso de acidentes cardiovasculares, nomeadamente enfarte do miocárdio. Pois bem, tudo aponta para que as pessoas que habitem, ou trabalhem, em zonas poluídas corram riscos acrescidos de virem a sofrer “trombose venosa profunda” semelhante ao já definido “síndroma da classe económica”. E o risco não é nada pequeno, chega a ser 75% superior nas áreas mais poluídas! Deste modo, o que poderá ser feito para as pessoas que respiram ar poluído? Mexerem as pernas? Já as mexem! Às tantas, os autarcas das zonas mais poluídas das suas cidades ainda vão começar a distribuir meias elásticas ou aspirinas para prevenirem o problema. Como para o ano vai haver eleições, aqui está um bom mote para a campanha eleitoral. “Pela minha parte comprometo-me a oferecer a todos os munícipes das zonas poluídas um par de meias elásticas e uma caixa de aspirinas para prevenir a síndroma da classe económica”.
Como andamos a sofrer “embolias” de vários tipos sempre é uma ajudita...

Manias e arrumações


Li outro dia no DN que a mania de juntar lixo em casa é sintoma de uma doença chamada Síndrome de Diógenes, que começa por se manifestar com o hábito exagerado de nunca deitar nada fora e que depois, sobretudo na velhice, acaba por se converter numa fixação patológica que gera acumulações impressionantes de lixo. O artigo dava muitos detalhes, casos impressionantes, associados ao abandono e à degradação, uma das muitas formas por que se manifesta a miséria humana.
Aquele artigo quebrou o clima pachorrento com que se anunciava o meu domingo. A verdade é que eu já andava há que tempos a adiar a arrumação de uns armários que teimavam em não fechar completamente, para não falar das gavetas mais escondidas ou que exigem que suba a um escadote para tirar de lá o que se “arruma” quando não há paciência para mais.
Pois nem é tarde nem é cedo, pensei eu, e deitei mãos à obra.
Gastei um dia inteirinho em que a família estava fora e resisti heroicamente ao livrinho que me sorria do sofá, a tentar-me a novo adiamento da tarefa. Mal fraquejava, deitando uma olhadela sorrateira ao livro, logo me lembrava do artigo do jornal e pronto, vamos então subir ao escadote.
O facto é que, naquela azáfama, amontoei um considerável número de objectos de que já nem me lembrava que existiam cá em casa, outros tantos que já ninguém pensava em utilizar, ainda outros cuja necessidade era um absoluto mistério…enfim, não seria propriamente lixo, no sentido do tal artigo que me traumatizou, mas com os anos a passarem poderiam muito bem vir a enquadrar uma perspectiva alargada da tal mania.
Ora eu detesto manias, ou seja, combato ferozmente as atitudes que parecem não ter lógica, digamos que me tenho na conta de uma pessoa prática. E aquele monte de coisas inúteis, supérfluas ou fora de uso deixou-me estupefacta, sobretudo porque tenho a vaga consciência de ter sido pouco rigorosa, de ter cedido ao sentimento ao guardar ainda umas coisinhas que me lembravam isto e aquilo, outras porque receio a fúria conservadora das minhas filhas por lhes ir tirar relíquias que ainda só sobrevivem porque não é na casa delas que atafulham os espaços. Bem vistas as coisas, não fosse eu uma sentimental, ainda teria ido borda fora muito mais tralha.
Mas o pior de tudo é que, à medida que ia tornando a minha casa mais espaçosa, não consegui evitar um pensamento crítico quanto à ligeireza com que compramos coisas inúteis ou cuja valia não vai além do momento em que nos atraiu a atenção e nos deu prazer comprar.
O que as minhas arrumações me mostraram não foi, felizmente, o tal síndrome terrível, mas que já encontrei marcas sérias de puro consumismo, isso é bem verdade…
Vou ver se me lembro disso, e do trabalhão que tive a seleccionar mil coisas, sempre que parar numa montra. Até porque gosto de ter domingos descansados, sem o caos das coisas desalojadas do seu esconderijo espalhadas à minha volta. Mas enfim, como diria uma amiga minha, que é compradora compulsiva, antes isso que uma depressão!

terça-feira, 20 de maio de 2008

Literacia basilar!...

Os pedagogos e psicólogos, à falta de melhor ocupação, determinaram que a entrada dos meninos na escola podia causar traumas para a vida. Tendo vingado o produto e crescido o negócio das consultas, agora o problema está na mudança brusca e no “impacto violento” que as crianças sofrem quando passam do 1º para o 2º ciclo e deixam de ter um professor para ter vários.
A coisa é verdadeiramente séria e que tem motivado laboriosa investigação e profundos estudos. Segundo o DN, saiu agora outro, “A educação das crianças dos 0 aos 12 anos”, encomendado pelo Conselho Nacional de Educação. Dos 0 aos 12!...
O estudo promete, a avaliar pelo que dizem os seus autores. Para tal educação de excelência dos miúdos a partir dos 0 anos (não se fala em meses…), o modelo ideal seria um ciclo articulado de 6 anos assente “em equipas multidisciplinares, consistentemente lideradas, constituídas por professores especialmente vocacionados para a difícil tarefa de iniciar as crianças no domínio das literacias basilares e professores mais orientados para o conhecimento disciplinar, embora ainda integrado”.
Com tal gongorismo, ficará tudo claramente resolvido, porque ninguém percebe o que vai fazer, apesar da liderança consistente.
Até lá, os pais modernaços e adeptos, para conforto pessoal, das novas teorias, correrão aos psicólogos para ver se os rebentos já não estão traumatizados pelo excessivo número de professores!...
Claro que estão, que novos investigadores precisam de trabalho e a consulta tem que render!...
Literacia basilar!...

segunda-feira, 19 de maio de 2008

No reino do virtual...já tudo vale!

A notícia hoje divulgada sobre a quebra abrupta do Investimento Directo Estrangeiro (IDE) em Portugal, no último ano, é apenas mais uma para esburacar o já de si evanescente milagre económico português...
Com efeito, o IDE em 2007 foi € 4,5 mil milhões quando em 2006 havia sido de € 9,1 mil milhões, caindo pois mais de 50%.
No conjunto dos países (27) da U E, o IDE aumentou 21,2%, de € 455,4 mil milhões em 2006 para 552,0 mil milhões em 2007.
Sou dos que entendem que estas variações podem acontecer sem que isso represente uma tragédia...o IDE não é uma variável que possa aumentar sempre, pode ter altos e baixos, importa mais observar a tendência de longo prazo...
O que não me parece possível ou admissível é a reacção oficial a estas estatísticas, divulgadas pelo Eurostat:
O Ministro da Economia, colocado perante a questão, em lugar de reagir como seria normal – como acima refiro, o IDE de um ano apenas não justifica uma festa, embora a fizessem se o IDE tivesse aumentado 50%, nem significa uma tragédia – com a maior tranquilidade deste mundo NEGOU que o IDE tivesse baixado em Portugal...
Havia necessidade?!
Estamos definitivamente no reino do virtual, em que já vale tudo (menos tirar olhos, como se dizia no meu tempo de liceu)...

Cómico, se não fosse trágico…

… E, afinal, ao contrário do que o Primeiro-Ministro, o Ministro das Finanças e o Ministro da Economia nos andavam a tentar vender há larguíssimos meses, a economia portuguesa nunca poderia ficar imune à crise internacional. E pior: a situação é ainda mais grave do que se podia antever. Por duas razões.

Primeiro, porque não é à toa que o Governo cortou a projecção de crescimento para 2008 em mais de 30% (de 2.2% para 1.5%) – e, sabendo-se do optimismo que habitualmente caracteriza o Executivo, existem razões mais do que suficientes para desconfiar do novo número.

Segundo porque esta revisão foi apresentada logo que foram conhecidos os dados do INE e do Eurostat relativos ao PIB no primeiro trimestre de 2008. Que revelaram uma forte abrandamento da nossa economia, quer em termos trimestrais (0.7% no 4º trimestre de 2007 para -0.2% nos primeiros três meses de 2008), quer homólogos (1.8% para 0.9%). Ora, ao contrário do que se passou em Portugal, quer a Zona Euro, quer a União Europeia aceleraram em termos trimestrais (0.4% e 0.5% para 0.7% e 0.7%, respectivamente) e, em termos homólogos, a Zona Euro manteve o seu crescimento em 2.2%, tendo a UE-27 desacelerado apenas uma décima (2.5% para 2.4%). Esta evolução, baseada nos dados conhecidos para 15 países dos 27, assentou na aceleração registada em França e, sobretudo, na Alemanha que cresceu uns surpreendentes 1.5% face ao trimestre anterior e 2.6% em termos homólogos.

Ora, a Alemanha e a França são, a seguir à Espanha, os principais parceiros comerciais de Portugal. Logo, mesmo contando com o abrandamento registado nos nossos vizinhos (0.8% para 0.3% trimestralmente, e 3.5% para 2.7% em termos homólogos), parece evidente que o desempenho decepcionante da nossa economia não pode ser imputado apenas à conjuntura internacional (pois se a Europa até acelerou em termos trimestrais!...). Creio que, mais do que nunca, as nossas debilidades estruturais e a nossa falta de competitividade (sobre as quais tanto já tenho escrito) vieram ao de cima e contribuíram para mais um trimestre de divergência (alargada) do nosso país para a Europa. Mas, sobre este facto não ouvi nem uma palavra ao Governo, tendo o Primeiro-Ministro e o Ministro das Finanças atirado “toda a culpa” da nossa evolução para cima da crise global. Seriedade?... Pois sim…

Aliás, se dúvidas existissem, bastaria atentar no seguinte: mesmo no cenário revisto em baixa, ainda houve a lata (é mesmo disso que se trata) de continuar a projectar uma descida do desemprego quer para 2008, quer para 2009; e tudo aponta para que os efeitos da crise se prolonguem por 2009 (agora não tanto à custa dos mercados financeiros e de crédito, cujo pior momento poderá já ter sido ultrapassado, mas sim devido à alta, cujo fim não está à vista, muito pelo contrário, dos preços das matérias primas, mais especificamente dos produtos alimentares e do petróleo), fazendo com o próximo ano seja mais fraco do que o actual – como até o sempre prestimoso Governador do Banco de Portugal já veio referir… Pois não é que, mesmo assim, o Governo prevê uma aceleração do crescimento português para 2% no próximo ano?!... Mas baseado em quê, Santo Deus?!...

Enfim, deixo só a recordação de, em meados de Abril, termos ouvido o Primeiro-Ministro, comentando as previsões do FMI (crescimento de 1.4% em 2008 e 1.3% em 2009), e perante todos os evidentes sinais de tormenta que nos chegavam de fora e o que os indicadores de confiança prenunciavam, afirmar que “o Governo não tem nenhuma razão para alterar a sua previsão de crescimento económico para 2008” e caracterizar o cenário traçado pela instituição sedeada em Washington como muito pessimista. Um mês depois, aí estão os 1.5% de crescimento para 2008… Grande diferença há entre 1.5% (novo número do Governo para 2008) e 1.4% (número do FMI) não é, caro leitor?!...

Tudo isto era cómico se não fosse trágico. Afinal, trata-se do Governo do nosso país...

domingo, 18 de maio de 2008

Parabéns ao Sporting!...






Final da Taça de Portugal
2-0
Parabéns ao Sporting
E aos lagartos cá do Blog, Tavares Moreira, Ferreira de Almeida e Miguel Frasquilho.
E também à nossa aguerrida leoa, Pèzinhos n`Areia, comentadora ilustre e assídua do 4R!
Nota para memória futura: O FCPorto perdeu todos os jogos importantes em que o treinador denunciou medo e alterou o seu sistema de jogo, 4-3-3, para o mais defensivo 4-4-2, em que não está rotinado. Foi assim duas vezes com o Sporting e com o Liverpool. Por cúmulo, hoje também inventou jogadores para lugares que não são os seus lugares naturais, como foi o caso desgraçado do João Paulo. Jesualdo, pese o seu mérito, que se deve enaltecer, ainda não interiorizou totalmente que é Porto e não o Alverca que está a treinar.

A masturbação tecnocrática!...

Segundo o DN, o Governo, preocupado com a corrida ao levantamento dos Certificados de Aforro, mandou o Instituto de Gestão de Crédito Público (IGCP escrever aos Subscritores, tentando travar o fluxo significativo de saídas.
Técnicas de gestão mal aprendidas e mal assimiladas constituem o maior adorno curricular académico de muitos membros do Governo; e a militância nas juventudes partidárias e no Partido a única nota curricular profissional. Sem formação de base nem experiência profissional ou de vida, deslumbram-se perante as luzes da tecnocracia, são dela prezas fáceis e fazem as maiores asneiras.
É o que acontece com a masturbação tecnocrática a que, nomeadamente, vem sendo sujeita a gestão por objectivos, por exemplo, no caso da justiça, medida pelo número de processos concluídos, ou da ASAE.
Tal masturbação chegou há tempos aos Certificados de Aforro, com os resultados que estão à vista.
Em nenhuma emissão de dívida privada, por exemplo, obrigações, nunca o emitente sequer pensa em alterar as condições de subscrição iniciais. Porque, para além de ilegal, sabe que a perda de confiança faria com que nunca mais pudesse aceder ao mercado.
Por capricho tecnocrático e a seu bel prazer o Governo alterou drasticamente as condições de subscrição dos Certificados de Aforro. Um Secretário de Estado teve os seus dias de glória!...
Mas tempos difíceis vêm aí. Os mercados internacionais não têm liquidez, nomeadamente para prazos longos. Os Certificados de Aforro, pelo seu mérito e tradição, constituiriam alternativa de captação de fundos. E abrigo para poupanças que tanto se enaltecem e a que tanto se apela.
Em nome de uns trocos no imediato, ficaram desacreditados por acção de um tecnocratismo idiota e saloio, que não salvaguarda a lei, mal sabe ver as aparências e nunca atende ao essencial.
Um bom exemplo de consumada masturbação tecnocrática!...

Anedota justiceira II

Se a legislação fosse outra, o F.C.Porto poderia descer de divisão
Declarações do Presidente da Comissão de Disciplina da Liga de Futebol Profissional, ao anunciar a punição do FCPorto (perda de 6 pontos).
Lapsus linguae? Claro que se a legislação fosse outra, o clube até poderia ser de imediato dissolvido pelo Sr. Presidente!...

sábado, 17 de maio de 2008

Os anos passam mas não há melhoras...

O Expresso revelou hoje que o programa Novas Oportunidades emprega trabalhadores precários, com “falsos recibos verdes”, há anos, sem receberem os seus vencimentos, há meses. São 1.300 formadores nesta situação!
É sabido que é política do Estado não pagar a tempo e horas aos seus fornecedores, criando-lhes dificuldades económicas e financeiras, mas nunca deixando de lhes exigir o cumprimento escrupuloso das obrigações fiscais. Também é sabido que persistem há anos os “falsos recibos verdes”. O que eu não sabia é que o Estado não paga a estes trabalhadores.
Envergonham-me estes comportamentos por parte do Estado. O Estado deveria actuar como pessoa de bem, dar o exemplo, ser correcto e rigoroso no cumprimento das suas obrigações, respeitar os mais elementares direitos dos cidadãos, em particular, daqueles com quem constitui relações de trabalho.
Mas o que é ainda mais espantoso é que perante a notícia, a ministra da educação se tenha apressado em explicações, disparando as culpas para cima das demoras da aprovação do novo Regime de Vínculos e Carreiras da Administração Pública e dos financiamentos do novo quadro comunitário. A pergunta que se coloca é: que culpa têm os formadores que o governo tenha alterado os regimes ou as regras, se tenha atrasado na sua aprovação e regulamentação, se perca em “burocracias” processuais?
Mas agora parece que já está tudo bem! Segundo a ministra da educação “a maioria dos atrasos no pagamento dos vencimentos vem desde Março. É um atraso perfeitamente aceitável, mas era melhor que não tivesse ocorrido”. E garante que “está pronto o diploma que permitirá terminar com os recibos verdes e liquidar os vencimentos em atraso aos formadores do programa Novas Oportunidades”. Ele há coincidências surpreendentes! E pronto, não é preciso dizer mais nada…

Um Senhor Herói


A Actual fala de Harrison Ford, 66 anos, e do seu último filme «Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal» e diz que ele se afirma fervoroso adepto do «cinema físico», menosprezando a manipulação informática que actualmente permite desafiar as leis da gravidade. "Indiana Jones, tal como Harrison Ford, quer-se romântico mas cínico; corajoso mas com medo de cobras; heróis mas meio-vilão. Será por isso que ainda gostamos dele? "

Nós gostamos de nos identificar com os heróis, aliás é isso que faz deles os “nossos” heróis é porque nos estimulam a querer ser como eles e lá bem no fundo, acreditamos que um dia vamos mesmo ser assim ou encontrar alguém igual.
A utilização da informática para criar efeitos especiais e fazer parecer que os actores conseguem coisas que na realidade jamais conseguiriam destrói, a meu ver, esse fantástico culto dos heróis. Uma coisa é regalarmos os olhos perante imagens extraordinárias, voos impossíveis, lutas de gigantes e anões, destruições brutais e os actores a correr incólumes no meio dos destroços, enfim, uma coisa é conseguirem distrair-nos. Outra, muito diferente, é ficarmos literalmente apaixonados por uma personagem, por ela ser tal e qual o que gostaríamos de encontrar e, claro, termos a esperança de isso vir a acontecer.
O Super Homem tinha poderes ultra humanos? Só na aparência, porque aos olhos das crianças ele voava nas asas da coragem, da vontade de ajudar, na bravura dos que lutam pela justiça. E tinha a fraqueza de ser feio quando esses grandes sentimentos não o dominavam, além de perder a força quando estava perto do fragmento do seu antigo planeta. Ainda que através de símbolos visuais muito fortes, o Super Homem era um humano que, afinal, podia estar escondido em qualquer pessoa vulgar. Não era uma invenção de computador.
O meu herói, a minha irremediável paixão, foi o Cavaleiro Ardent, aquele bravo lutador com quem o Rei Artur sempre contou, que tinha como defeito gravíssimo estar apaixonado por uma loira mimada chamada Gwendoline. Nunca o vi actuar fora da banda desenhada em papel, mas aposto que já não me faria bater o coração se fizessem um filme cheio de efeitos absurdos onde ele não ficaria incapaz de lutar por ter uma ferida no braço, ficando à mercê dos inimigos e eu a sofrer de aflição até ao episódio seguinte, ou pudesse torcer as barras da prisão como se fossem torradinhas com manteiga, em vez de ficar na escuridão sem que as leitoras devotas pudessem confirmar em ânsias se ele estava vivo ou morto.
Os artificialismos, o virtual, é só o faz-de-conta, deve ser por isso que já não há heróis mas apenas estrelas de cinema.
Ainda em que o Harrison Ford compreende isto e não desiste de nos fazer bater o coração, ainda que ficando atrás do Cavaleiro Ardent…

A anedota justiceira!...

“São tão maus a jogar futebol como a perceber de leis...".

Miguel Sousa Tavares, referindo-se à pretensão do Benfica em ver o FCPorto afastado das provas europeias e condenado pela UEFA, pela FIFA e pelo Governo (retirando ao clube a qualidade de instituição de utilidade pública).

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Saladas e salsadas


O Expresso conta-nos que França e Inglaterra contrataram chefes famosos para reformular os menus das cantinas escolares e assim lutar contra a escalada da obesidade infantil e que, cá no burgo, os cozinheiros de renome já se ofereceram para ajudar nesse quebra-cabeças.
Há um anúncio qualquer que diz que crianças que gostem de bróculos simplesmente não existem. Bem, é capaz de haver uma outra, claro, mas eu não conheço nenhuma, e peixe cozido também não tenho ideia. Sopa, nem vê-la, é preciso esperar pelo fim da adolescência para acabar com as cenas à mesa por causa da sopa.
Não é um drama da actualidade, ou um erro da educação facilitista e desse desfiar de acusações aos pais desatentos a que já nos vamos habituando, sempre foi assim, salvo em caso de fome ou pobreza, caso em que se come o que há, mas creio que não é para esses casos que se teoriza sobre os menus xpto. Quem não se lembra de ficar à mesa horas a fio, à frente do prato com o cozinhado que detestávamos, até o pai ou a mãe se condoerem e deixarem-nos passar à sobremesa sem comer tudo até ao fim? Invariavelmente eram as couves, ou as favas, ou a sopa…
Acho que a questão da alimentação das crianças nos países ditos ricos não está na concepção elaborada de combinações que exijam artes culinárias por aí além, isso que a Inglaterra e França decidiram fazer é um golpe publicitário dos políticos, não acredito que uma mãe de família mediana não se farte de rir com tanta complicação. A menos que elas próprias não saibam cozinhar, como acontece na América (em geral, claro) onde, há 20 anos, as refeições na escola primária já eram uma fatia de pizza ou uma sanduíche de manteiga de amendoim porque as crianças não comiam outra coisa em casa, a tradição culinária era simplesmente nula.
As refeições equilibradas são simples, aquilo que uma família deve poder comer são produtos com alguma qualidade e cozinhados sem muitos condimentos, dependendo as diferentes combinações, e variedades dominantes, dos hábitos alimentares e dos produtos de cada país. Acho que toda a gente sabe isto. Não fui analisar os menus em muitas escolas, como o Expresso, mas duvido que seja por aí que as crianças fiquem obesas, deve ser exactamente porque comem cá fora mil e uma coisas de que gostam mais e que depois lhes tiram o apetite para o que servem nos refeitórios.
Como controlar os abusos das guloseimas ou da sanduíche ou das pizzas, esse é que é o problema, não venham agora querer convencer-nos de que em Portugal esses maus hábitos alimentares se adquirem na escola e que é aí que temos que nos concentrar, e muito menos de que um concurso internacional de chefes de cozinha saberá tornar apetitosa para uma criança a couve flor ou o arroz de grelos! Por esse caminho, ainda vamos ter directivas comunitárias a decidir os menus diários imperativos em toda a Europa a 27…

“Sócrates, ou a infantilização da política”


O Expresso vai abordar a cena dos “cigarritos” fumados pelo PM, na sua viagem à Venezuela, e questiona a hipótese de “infantilização da politica”. Bom, como toda a gente já falou sobre o assunto, é o momento de meter a colherada nesta matéria.
Em primeiro lugar, o PM violou a lei? Violou! E depois? Não devia ter violado, porque é PM! Responderam muitas “autoridades”, inclusive constitucionalistas! Foi alvo de atenção e de preocupação no Parlamento! Ainda ontem, a “Quadratura do Círculo” dedicou meia hora a falar de tão importante assunto. Ridículo, patético, país de anedotas e de pseudo-moralistas. O pobre do homem até deve fazer um sacrifício dos diabos para não fumar em público e evitar que seja atacado. Mas, porque é que o PM deu troco? Porque é que veio a terreiro pedir desculpa e que ia deixar de fumar definitivamente? Dizia, simplesmente: - Violei a lei e como qualquer cidadão cumpre-me pagar a respectiva coima.
O PM é um cidadão com mais responsabilidades, obviamente, mas não tem que ser um “santo” ou um ser “perfeito”! Se há coisa que abomino é a perfeição e, sobretudo, os “perfeitos”, ou pior ainda os falsos moralistas.
Caramba, não tarda e ainda vamos ter por aí alguma “Congregação para as Causas dos Políticos” a definir e a estabelecer as regras que leve à declaração das “virtudes heróicas” para ser deputado, à “beatificação” para ser ministro e à “canonização” para primeiro-ministro!
Ora, perante tais princípios, acabo por assinar a minha sentença “politica”. Ou seja, como estou longe dos tais objectivos que começam a ser desenhados e construídos para se poder fazer uma carreira politica, e não tendo vocação para a santidade, fico-me pelo ambiente dos “pobres diabos”.
Não tarda muito que, para se chegar a PR ou PM, terá de ser enfiado numa redoma desde o nascimento, ser treinado e vigiado constantemente para que não cometa nenhuma infracção que, possa, décadas mais tarde, ser utilizada como um pretexto para definir o carácter, comprometendo o seu futuro politico.
Senhor Primeiro-Ministro! Se fosse a si agarrava um dia destes num bom charuto e, à vista de todos, evitando os locais públicos onde é proibido fumar – é “chato” cometer duas infracções sobre o mesmo assunto -, desfrutava-o com a maior das satisfações.
Esta atitude seria muito salutar – mesmo tratando-se de tabaco! -, ao contribuir para evitar a “santificação” da vida politica...
Já sei o que vão dizer! Políticos santos?! Não há perigo. É coisa que não existe...

Trapalhadas com o PIB...e seus protagonistas

Ficou ontem a saber-se o que já há bastante tempo se suspeitava: o crescimento económico, no corrente ano será muito inferior ao que havia sido decretado pelo Governo e pelo BP e por ambos mantido ferreamente, sob juramento, até que a realidade os veio desmentir.
Mas há coisas neste episódio da revisão súbita da previsão de crescimento que são muito curiosas.
Ontem, por exemplo, um dos diários “on line” mais devotados à nobre causa oficial, apresentava este delicioso tratamento do tema:
- Com destaque: “Economia portuguesa converge coma Zona Euro ao crescer 0,9% no 1º trimestre” (confundindo, deliberadamente, crescimento em termos homólogos e em cadeia)
- Mais abaixo, em letra envergonhada: “Lituânia e Portugal tiveram o pior desempenho da União Europeia, com um crescimento negativo de -0,2%”
Sem mais comentários...
É extremamente provável que esta tenha sido a primeira revisão do crescimento do PIB para 2008 e que nova revisão ocorra a seguir às férias de Verão, mais concretamente em Setembro, quando forem divulgados dados do 2º trimestre.
E é bastante provável, atentando no andamento da carruagem económica, que a variação anual do PIB não chegue a 1%.
Acresce que não está excluída a possibilidade de uma recessão, agora em termos técnicos e não apenas na tese mais ousada, há dias sustentada pelo Dr. Miguel Cadilhe e que levou as vestais do regime a unirem-se num comovente coro de desagravo.
Se de facto viermos a cair em recessão técnica - o que acontecerá se o crescimento do 2º trimestre, em cadeia, voltar a ser negativo como o do 1º trimestre - Miguel Cadilhe terá motivos para sorrir e as nobres vestais, envergonhadas, procurarão refugio seguro para exercício de sua dolorosa ascese...
Particularmente curiosa a recentíssima profecia do Gov-BP, em plena Comissão de Economia e Finanças da AR, segundo a qual a economia portuguesa iria crescer este ano PROVAVELMENTE acima da média da Zona Euro e SEGURAMENTE o mesmo que a média da Zona - assim se entrando na sonhada convergência...
Os dados do 1º trimestre apontam exactamente o contrário: enquanto na média da Zona Euro o crescimento foi +0,7%, o “nosso” foi -0,2%.
Para que se cumpra essa generosa profecia, seria necessário que a economia portuguesa acelerasse bastante nos próximos trimestres e que a economia dos outros 14 países desacelerasse fortemente – cenário inverosímil.
É caso para dizer que o Gov-BP anda com pouca sorte (será só?): em Novembro do ano passado garantia que a subida dos preços no consumidor era um fenómeno muito passageiro e que estava excluída uma subida dos juros em 2008...foi o que se viu...
Agora, com o crescimento, é o que se vê...
A propósito, onde para a oposição?

As Cantinas dos Grandes Chefes!...

Segundo a edição de amanhã do Expresso, depois de França e Inglaterra terem contratado chefes famosos para reformular os menus das cantinas escolares, os cozinheiros portugueses não quiseram ficar atrás e desafiaram o Ministério da Educação a fazer o mesmo.
Fiz uma ronda pelas cantinas escolares onde os chefes da nova vaga começaram a pontificar, tendo começado por uma escola de Alvalade. O refeitório parecia a sala do Tavares: mesas postas a preceito, talheres de prata, baixela Vista Alegre como o nome do cozinheiro, auxiliares de refeições impecavelmente ataviados. O menu da semana estava afixado numa luxuosa moldura, devidamente iluminado com luzes indirectas, para não ferir a vista.
2ª feira: Carré de borrego desossado, depois rôti com tomate de longa cozedura, em cama de legumes lacados com geleia de limão e sumo de poejo; Sobremesa: Chocolate de Auarany morno, servido fofo, gelado de fava de tonka
3ª feira: Filete de peixe-galo, meunière perfumado com caril, arroz selvagem, milho, tomate, cereja e coentros; Sobremesa: Sopa de chocolate negro e branco com rabanadas, banana flamejada e sorvete de queijo fresco
4ª feira: Bochecas de porco preto alentejano estufadas, espargos verdes, castanhas com erva-doce e presunto estaladiço; Sobremesa: Sopa de frutos tropicais com sorvete de manga e pastelinho de Tentúgal
5ª feira: Lombo de bacalhau com molho de queijo da serra e frutos secos, batatinha a murro e miga crocante de broa de milho com grelos; Sobremesa: Cheese cake de framboesa e balsâmico
6ª feira: Garoupa com polenta cremosa, sucos de trufa; Sobremesa: Jalousie de maçã e pêra, gelado de caramelo com flor de sal
Claro que havia, à discrição, águas, soft drink, cervejas, vinho branco e tinto, café ou chá, digestivos, vinho do Porto, whiskies novos (Scotch, Malt, Bourbon, Irish, Canadian, etc) e aguardentes velhas.
Paradoxalmente, os alunos faziam uma greve de fome, exigindo bife com batatas fritas e peixe frito com açorda!...
Passei a uma escola da Picheleira, onde a ementa semanal era basicamente à volta de arroz com carne assada, caldeirada de cabrito, grão com bacalhau e similares. Os alunos também estavam em greve de fome e, com grandes cartazes, exigiam um Chefe.
Como o almoço era bacalhau, reivindicavam Laminado de bacalhau e seu tártaro com sapateira e mini-legumes com vinagreta de coentros e bâlsamico. Como sobremesa, bolo de chocolate e laranja, gelado Grand-Manier e ainda Carpaccio de abacaxi com anis estrelado e gelado de coco!...

Para quando a liberdade de escolha?

O CDS/PP apresentou ontem um projecto de diploma sobre a "autonomia das escolas" que foi chumbado pelo Parlamento, o que não surpreende, atentos os preconceitos ideológicos relativamente à concepção de uma escola pública assente na liberdade de escolha dos pais da escola para os seus filhos.
Não conheço o projecto de diploma, mas a ideia de liberdade de escolha da escola é uma ideia que me agrada porque considero que é relevante que a escola tenha qualidade, sendo irrelevante se a escola é propriedade do Estado ou propriedade de privados.
O que deve ser assegurado pelo Estado é uma rede de serviço público de educação à qual podem concorrer escolas públicas e escolas privadas. Importante é a qualidade da educação ministrada por esta rede, devendo o Estado estabelecer requisitos mínimos curriculares e pedagógicos, níveis de propinas a cobrar, estabelecer regimes de avaliação e fiscalizar o seu cumprimento.
Um modelo destes deve assentar num elevado grau de autonomia da escola, desde a escolha do modelo pedagógico e do modelo de funcionamento, passando pela contratação de professores e pela gestão administrativa e financeira dos recursos.
Concordo que a condição económica das famílias não deve condicionar a liberdade de escolha da escola. Porque não sendo assim, como acontece hoje, só as famílias com capacidade económica têm direito ao exercício dessa liberdade. As famílias de menores recursos não têm possibilidade de escolher, ficando-lhes vedada a impossibilidade de os filhos frequentarem as melhores escolas.
Acresece que a liberdade de escolha da escola é um factor que induz maior qualidade porque promove a concorrência entre escolas da rede de serviço público de educação, independentemente de os equipamentos serem públicos ou privados. Por outro lado, a liberdade de escolha contribui para uma maior responsabilização dos pais na vida da escola, constituindo um estímulo para o seu maior envolvimento com reflexos tendencialmente positivos na qualidade da resposta escolar.
Um serviço público de educação com esta concepção é, na sua essência, mais democrático ao permitir a igualdade de oportunidade das famílias, independentemente da sua condição de rendimento, e também mais eficiente porque a liberdade de escolha e a autonomia de gestão favorecem melhores desempenhos. Para quando a liberdade de escolha?