sábado, 31 de julho de 2010

Os génios da educação

Depois de decretar que quem reprovasse no 8.º ano podia desde logo fazer exame do 9.º ano, e quem passasse tinha que o frequentar, Isabel Alçada vem agora dizer ao Expresso que vai acabar com as reprovações.
Até porque eles custam 600 milhões de euros por ano, adianta o jornal.
Acabar com os chumbos e, assim, poupar 600 milhões é a última genial invenção dos cientistas da 5 de Outubro.
Estamos de parabéns: os génios da educação são portugueses!...

Abnegados gestores, flácida cerviz!...

O Conselho de Administração do Metro do Porto enviou uma carta ao Governo pedindo apoio financeiro e referindo a caótica situação económica e financeira em que a empresa se encontrava: 2 mil milhões de euros de dívida, necessidades de tesouraria de 200 milhões para o ano em curso, para os quais não era capaz de conseguir financiamento. Dada a situação, o não apoio do Estado poderá "pôr em causa o cumprimento de compromissos assumidos, quer no que respeita a investimentos em curso ...quer no que respeita ao serviço da dívida, da qual uma parte significativa tem garantia da República", transcreve o Jornal de Negócios.
Claro que o Ministério tratou logo de deitar a questão para debaixo do tapete: "informação de rotina...não há nenhuma situação de emergência", disse.
Em consequência, valente puxão de orelhas levou o Presidente do Metro, a avaliar pela sua reacção à nota do Ministério. De um momento para o outro, a situação deixou de ser preocupante, "o Metro continua a cumprir...apenas podendo estar em causa uma dilatação dos prazos de pagamento habituais"...o funcionamento do Metro "não está, nem nunca esteve em causa...", disse ao Público, edição de ontem, 30 de Julho.
Só lhe faltou pedir a demissão por ter escrito carta tão pouco condizente com a realidade!...
Abnegados gestores estes, sempre prontos a vergar a cerviz ao menor pestanejar do dono!...

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Quem avisa amigo é

Foi hoje noticiado com escândalo que alguns dos radares que estão colocados nas estradas a indicar a velocidade máxima não estão capazes de dar origem a multas porque os dados que armazenam não são tratados. É curioso este espírito nacional de gostar de ser policiado e castigado, sem o que qualquer aviso é considerado inútil. Por mim, esses radares servem de alerta para se ser prudente na velocidade e só isso é suficiente para que tenham uma acção importante, pena é que muitos condutores só cumpram as regras se sentirem a ameaça da multa, como os meninos que só se portam bem quando os pais os ameaçam com castigos. Depois queixam-se da caça à multa mas, pelos vistos, é merecida, se só se conduz com prudência quando se tem medo de ser apanhado…

O Estado anti-social

O Metro do Porto está em ruptura financeira e pode parar se o Estado não pagar, dizia ontem o Jornal de Notícias, com base numa carta remetida pela empresa ao Governo. Endividamento em 2009: 2 mil milhões de euros; necessidades de tesouraria em 2010: 280 milhões de euros, dos quais a empresa apenas conseguiu financiar 75 milhões.
Situação similar é a do Metro de Lisboa, da Carris, dos Transportes Colectivos do Porto, da CP e da Refer, num total de dívida que andará pelos 15 mil milhões de euros, 9% do PIB.
O Estado Social foi demagogicamente ampliado e distribuído à razão de votos nas eleições. A eficiência empresarial, por maior que seja, não o consegue pagar e os impostos também não: só o SNS consome todo o IRS. Em boa parte, o Estado Social tem sido pago pelo estrangeiro, mas as portas fecharam-se quando eles viram que, para além do capital, estão a financiar também os juros.
Não tarda, e mais depressa do que muitos pensam, e alguns nem pensam, lá vão ser os cidadãos chamados a pagar directamente a dívida. Através de um aumento brutal das tarifas de todos os transportes, diminuindo drasticamente o rendimento disponível dos cidadãos.
Que também têm culpa no cartório, ao aceitarem pacificamente que os políticos lhes vendam gato por lebre, isto é, um Estado Social oneroso, quando lhe disseram que era gratuito ou abaixo do custo, mas que vão ter que alimentar e pagar. E, para cúmulo, premiando a burla em eleições.

Em tempos de crise...

... devemos aproveitar todas as anedotas que têm para nos oferecer.
Diverte-nos, consola-nos, faz-nos rir, eleva o ânimo da malta.
E quando no mundo dos humoristas surgem novos talentos, devemos divulgá-los.
Isto tudo a propósito da melhor anedota da semana.
Melhor que a do negócio da PT.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Dores de alma

Tarde muito quente. O ar abafado entrava na sala sem pedir licença transformando-a numa verdadeira sauna. Senti uma letargia a querer invadir-me, limitando as capacidades para examinar os trabalhadores. Um pouco de sacrifício foi a solução para ultrapassar as dificuldades. Sai um, entra outro, e a rotina acabou-se por instalar ao fim de alguns minutos, mas sempre com a fadiga estival a querer tolher-me a ação. A meio da tarde, entrou uma senhora com ar tranquilo e ao mesmo tempo perscrutador. Era a primeira vez que me via. Sentou-se. Após as formalidades, e algumas perguntas de ocasião, perguntei-lhe se andava bem de saúde. Fez um pequeno compasso de espera, respondendo que, dentro do possível, sim, andava. – Dentro do possível? Questionei-a, ao mesmo tempo que olhava para uns olhos claros que, em tempos, deveriam ter sido azuis, mas onde agora brilhava uma tristeza cinzenta daquelas que a alma nunca consegue despejar, porque toda ela é feita de dor e o que é feito de dor nunca consegue ser totalmente apagado. Já os conheço. Olham para uma pessoa, timidamente, tentando ver até que ponto podem contar os seus problemas. Sabem como obter um alívio temporário, mas para isso é preciso encontrar alguém que, silenciosamente, beba as dores da sua alma. Olhou-me com muita serenidade e, passados brevíssimos segundos, conta-me a história, ou melhor, as histórias. Primeiro a de um filho, que tirou um curso de cariz técnico tendo conseguido um emprego altamente qualificado. As exigências técnicas e as responsabilidades decorrentes – bastava um pequeno erro para originar problemas muito sérios -, levou-o, ao fim de alguns anos, a descompensar psiquicamente, ponto de partida para o alcoolismo e a toxicomania. O marido alcoolizou-se ao ponto de, ainda novo, estar com graves sinais de demência. Os pais, idosos e com dificuldades em matéria de autossuficiência, tiveram de ser institucionalizados e sempre que os vai ver pedem-lhe para os tirar do lar. Estes são os protagonistas, porque as histórias de dor e de sofrimento dão para múltiplos argumentos e encenações. Contou-as com discrição, sem queixume e com voz suave, vendo-se o efeito libertador da palavra. Apanhado meio desprevenido, com a esferográfica na mão como a tentar registar no espaço os diversos acontecimentos que ia relatando, fiquei preso da sua narrativa. Senti-me como um homem estátua, prestes a escrever mas sem conseguir mover os músculos, olhando-a quase sem pestanejar, enquanto tentava recriar mentalmente as figuras e as cenas como se fosse um realizador de cinema. Ao mesmo tempo congeminava sobre os diferentes problemas que incomodam a alma das pessoas. Comparando-os com os que ouvia pareciam-me irrisórios, patéticos e até algo mesquinhos.
No fim, como se fosse uma garrafa de champanhe, deu-se a explosão silenciosa de um gás desejoso de liberdade. Um alívio anestesiante. Agradeceu imenso por a ter ouvido, porque há coisas que não se podem dizer a ninguém. Pediu-me desculpa por ter tomado o meu tempo ao contar-me estes episódios da sua vida sintetizada em poucos minutos. Não me lembro de lhe ter dito nada. Olhei-a com respeito e admiração e continuei o exame, libertando-me da posição de homem estátua...

Estado vende património a si próprio: qual o interesse?!

1. Foi hoje noticiado que em 2009 o Estado (Min. Saúde) vendeu o património imobiliário de quatro hospitais públicos à Estamo – empresa imobiliária cujo capital pertence 100% ao Estado – por cerca de € 111,5 milhões.
2. A quantia arrecadada com essa venda do Estado a si próprio (...) foi destinada a financiar despesas correntes e de capital de muitos outros hospitais públicos, sendo que cerca de € 75 milhões foram canalizados (formalmente) através de aumentos de capital de 18 hospitais públicos – em última análise para pagar despesas obviamente.
3. Encontramos aqui um esquema muito simples de o Estado realizar despesa pública, pura e dura, sem passar pelo crivo orçamental, ou seja uma operação de clara desorçamentação, tudo indica (se alguém conseguir demonstrar o contrário agradeço).
4. Evitar-se-á, assim, que a despesa pública (dos hospitais) corrente ou de capital correspondente tenha reflexo no défice orçamental – a verba em questão já não tem que ser transferida para os hospitais pelas ARS à custa de transferências do OE...
5. Este procedimento “habilidoso” suscita dois tipos de comentários pelo menos.
6. O primeiro tem a ver com a moralidade que o Estado pretende impor aos cidadãos e empresas quando os acusa da adopção de procedimentos de evasão fiscal por exemplo – que autoridade tem um Estado para exigir comportamentos decentes dos cidadãos e empresas quando ao mesmo tempo utiliza habilidades destas (supostamente) para fugir ao controlo orçamental?
7. O segundo de índole mais económica decorre do enorme equívoco que este tipo de procedimentos representa: estas pessoas ainda pensam ou cuidam que, pelo facto de conseguirem ocultar uma despesa que deveria figurar no orçamento, conseguem evitam algum mal...
8. É certamente um enorme equívoco, em nossa opinião, pois o problema do excesso de despesa pública, se é disso que têm receio, não se resolve fugindo ao controlo orçamental...só se resolve reduzindo a despesa!
9. Falta levantar uma interrogação acerca deste episódio: onde foi a Estamo encontrar fundos para pagar estes € 111,5 milhões...alguma dúvida de que foi junto dos bancos? E depois não há dinheiro, ou só há a preço altíssimo, para financiar as pequenas e médias empresas - primeiro estes “negócios” depois a economia! Nota zero!

O Acusador Público

Foi corajosa a sentença da Juíza de Instrução Criminal que, sob toda a pressão de muita opinião pública, intoxicada por anos de opinião publicada e intervenções dos mais diversos agentes, entre os quais accionistas do Banco, mandou arquivar o mais grave dos crimes imputados pelo DIAP aos Administradores do BCP, o crime de burla qualificada. Um deles viu mesmo arquivadas todas as acusações.
Recentemente, foram também arquivados pelo Tribunal os processos instruídos pelo MP contra Carmona Rodrigues, impedido pelo facto de se recandidatar, e Vereadores da Câmara de Lisboa. No caso do Apito Dourado, todos os Tribunais, de 1ª instância e da Relação, Administrativos até ao Supremo e o Tribunal Constitucional pronunciaram-se através de sentenças que absolveram os réus. Alguns acusados de mais de 100 crimes!...Podia continuar a lista.
Nada para admirar, já que, segundo o que Maria José Morgado dizia há tempos (edição do DN de 21.08.07, pág. 14), a eficácia do seu DIAP se mede pelo número de processos que terminam em acusação. Mesmo que findem em absolvição, depois de julgados. Também no DCIAP de Cândida Almeida, a regra parece ser a mesma: em declarações de há meses (Público, 26.02.10), dos 64 processos instruídos apenas 19 resultaram em condenações pelos Tribunais.
Torna-se assim óbvio que o objectivo e a eficácia para estes dois Departamentos é acusar, acusar e acusar, mesmo que a prova seja inconsistente, o que é o mesmo que acusar sem prova, quando a eficácia se deveria medir pela prudência, equilíbrio e bom senso.
Dando um protagonismo excessivo a quem deveria ter na discrição própria da função de fazer justiça uma das suas maiores virtudes. Ao contrário, as Directoras do DIAP e do DCIAP, por exemplo, são das figuras mais mediáticas da sociedade portuguesa. Não deixam de emitir comentário depois de cada busca domiciliária para a qual as televisões foram antecipadamente convidadas (não tarda, as buscas serão dadas em directo…) e pronunciam-se, a todo o tempo, sobre os mais variados assuntos. Quando as coisas lhes correm mal, a queixa é a da falta de meios.
Pois se o Ministério Público se dedica a provar o improvável (mas que exibe permanentemente como provado no tribunal da opinião publicada) como é que lhe sobra tempo, meios e condição para comprovar o óbvio?
Mude-se-lhe o nome: em vez de Ministério Público, Acusador Público.
É o que faz, sem olhar a meios nem a custos, mas sabendo os fins melhor que ninguém.

Um reconhecimento importante

Envoltos na espuma do trivial, passam-nos muitas vezes despercebidas notícias importantes para o nosso futuro colectivo. Aqui fica o registo de uma: a Assembleia Geral da ONU acaba de reconhecer o direito de acesso a água de qualidade e a instalações sanitárias como um direito fundamental da humanidade.
A deliberação pôs termo a uma discussão de 15 anos, e entre os 163 Estados que votaram o projecto de resolução elaborado pela Bolívia, ainda se verificaram mais de 40 abstençõesO texto aprovado declara que "o direito a uma água potável própria e de qualidade e a instalações sanitárias é um direito do homem, indispensável para o pleno gozo do direito à vida".
Efectividade desta declaração? Depende, naturalmente, da vontade dos Estados. Fará o seu caminho, como todos os outros direitos fundamentais fizeram. Lento, polémico, mas impondo-se pela razão às conveniências políticas de alguns neste condomínio planetário.


quarta-feira, 28 de julho de 2010

Afinal era só para fazer render o peixe!

"Naturalmente que o Governo se congratula com o resultado", acabou de dizer sobre o desfecho da venda das participações da Vivo pela PT, o ministro António Mendonça regressado do teste de carga.
O governo é o mesmo que invocou o interesse nacional para utilizar a prerrogativa de vetar o negócio de que agora se congratula. Ficou a saber-se, pelo menos, quanto vale o interesse nacional: 350 milhões de euros. E quem, afinal, dele acabou por BESneficiar.


A nova fonte de compromisso internacional: o teste de carga

"Este teste de carga é um pequeno acto, mas carregado de simbolismo, porque é com estes pequenos acontecimentos que assumimos compromissos com projectos fundamentais e sem dúvida que esta ligação ferroviária é estrutural na relação entre os dois países a todos os níveis. Quer pessoais, económicas e políticas". Com estas declarações o ministro das obras púbicas português anunciou em Espanha a irreversibilidade do TGV com obra marcada em território português para Setembro próximo.
Os acordos técnicos bilaterais, as trocas de cartas, os protocolos de cooperação, até os apertos de mão seguidos de um entusiástico "porreiro, pá!", deram lugar a uma nova e extraordinária forma compromissória até agora desconhecida dos manuais de direito internacional e dos breviários da diplomacia: o teste de carga.
Para quem não saiba, na definição deste leigo, o teste de carga de uma estrutura suspensa consiste em sujeitá-la a cargas (no caso concreto deste viaduto de 300 metros, estacionar 12 camiões de 40 toneladas) e examinar o seu comportamento para verificar a sua solidez estrutural. Pois foi este "pequeno acto, mas carregado de simbolismo" que levou o ministro a terras de Espanha, e "este pequeno acontecimento" a justificar "compromissos com projectos fundamentais"!
Ai se o ridículo remodelasse governos...

Coimbra

Ando sempre atento ao que dizem e ao que fazem a Coimbra. Na última semana li dois artigos interessantes sobre o mesmo tema: “Porque Coimbra perdeu peso?”. Durante séculos foi, praticamente, a única cidade que produzia as elites intelectuais e académicas e, por esse motivo, dominava e regia todo o império, não propriamente através dos naturais da cidade, mas, sobretudo, através dos que passavam pela universidade. O ensino, a cultura, a ciência e a técnica democratizaram-se e espalharam-se por todo o território. Ainda bem. Agora, ouvem-se queixas de que não há quase ninguém a nível do governo e das mais altas instâncias decisórias, como se fosse absolutamente necessário ter alguém da nossa terrinha nesses cargos, esperando, provincianamente, algumas benesses ocasionais. É típico deste país. Para se obter o que quer que seja, nada melhor do que colocar um patrício nesses lugares, um favorzinho para a construção de um parque infantil, um novo centro de saúde, abrir uma nova estrada, transferir certos serviços da cidade vizinha, roubando-lhe alguma importância, para ser, por sua vez, também, importante, no fundo uma espécie de nepotismo territorial, porque são dos “nossos” e se não forem os “nossos” quem é que nos acode?
Coimbra pode “cheirar a mofo”, por culpa própria, mas também devido a uma certa “raiva” frequentemente demonstrada a vários níveis. Pessoalmente, tenho tido ocasião de ouvir comentários pouco abonatórios e preconceituosos sobre a cidade, vindos, inesperadamente, de pessoas muito respeitáveis. Comentários sobranceiros, cínicos e fortemente negativos revelando uma animosidade que não dá mostras de abrandar.
Um desses episódios ocorreu há alguns anos, no palácio das Laranjeiras, numa reunião de trabalho de deputados ligados à área da educação com o ministro. Às tantas, o ministro, para justificar uma nova proposta de lei relacionada com o ensino superior, deu exemplos do que estava mal, apontando frequentemente a Universidade de Coimbra. Um, dois, três, quatro comentários, não sei quantos, já não me lembro, mas foram mais do que suficientes para que um colega de bancada, bastante incomodado com os apartes, licenciado e amante de Coimbra, chamar a atenção do ministro dizendo-lhe: - Oh senhor ministro, tenha cuidado com o que diz, olhe que está aqui um deputado que é professor da Universidade de Coimbra! O ministro olhou-me, sem demonstrar grande constrangimento, e prosseguiu na sua exposição, evitando as referências preconceituosas. A partir daquele momento, mentalmente, deixei de o tratar por ministro e passei a designá-lo por “gajo”, concluindo que um gajo qualquer pode chegar a ministro, mesmo sendo professor universitário. Na altura do debate, fui incumbido de fazer o discurso da minha bancada. Recordo que tinha algumas reservas relativamente a uma ou duas das propostas do diploma. Subi ao púlpito. Comecei a falar por cima do ministro que, comodamente sentado na galeria dos membros do governo, deveria estar a ouvir a minha intervenção. Ao fim de algum tempo enfiei-lhe dois ferros curtos, que devem ter sido suficientemente dolorosos, porque consegui captar a atenção de grande parte dos deputados, os quais, como é sabido, são periodicamente acometidos do “distúrbio de deficit de atenção com hiperatividade”. Fi-lo sem intenção, era um caloiro, mas, confesso, soube-me bem!
O país é que “cheira a mofo”, e como é desagradável o melhor é empurrá-lo para Coimbra. É um hábito que já se instalou, empurrar o lixo para Coimbra ou conotá-la como tal. E não é de agora. No princípio do século XX, um dos mais ilustres cientistas portugueses, Ricardo Jorge, disse “cobras e lagartos” sobre a Faculdade de Medicina de Coimbra. Na altura, considerou que três escolas médicas eram demais! e como o dinheiro era pouco, o grande higienista não esteve com meias medidas propondo: “É que uma dessas escolas, a faculdade coimbrã, vegeta em condições tão anómalas, que a sua conservação constitui doravante uma monstruosidade”. “Situada no mesquinho burgo de Coimbra...” para preconizar mais à frente o fim da Faculdade de Medicina de Coimbra no “ventre das escolas médico-cirúrgicas de Lisboa e Porto”, afirmando mesmo: “mas desgraçarem ali uma escola de medicina, isso é um crime administrativo que lesa a par a ciência e os interesses pátrios”. Pois é! A vontade de comer Coimbra é uma realidade mas não vai ser fácil mastigá-la, quanto mais engoli-la, nem com a ajuda de uma varinha mágica

terça-feira, 27 de julho de 2010

Registo pessoal


Foi quando ia a subir para o avião que ele me fez a surpresa. Disse-me baixinho, a rir-se com aquela covinha na cara que aparecia sempre que ele pregava uma partida, então ias embora sem mim, ias ver Luanda sem eu te ensinar a olhar tudo como era, de que te servia ires lá sem eu te ensinar? Deu-me a mão e nunca mais a largou. Foi comigo a todo o lado, sempre a apontar os sítios, a fazer-me ver renovadas as casa decrépitas, a queixar-se do trânsito, parece impossível, a escandalizar-se com a modernização do edifício da Fazenda, agora todo envidraçado. Gostou de rever a Igreja da Nª Senhora do Carmo, mas não era lá que ia à missa, a Igreja de S. Paulo já não existe. Ficou mudo de emoção quando fomos à Ilha, quis tocar na areia e ficou contrariado por não termos ido molhar os pés. Provou comigo o kalulu de peixe, a fuba e a ginguba doce, a cerveja Cuca também, comeu mamão e reclamou de não haver mangas das que ele se lembrava, doces como o mel.
Viajou comigo ao Lubango, meteu conversa com portugueses que tinham ido para lá nos anos 50, como ele, e ouviu calado as memórias dos dias vividos em África depois de ele se ter vindo embora. Na Serra da Leba ouvi-o repetir a frase que tantas e tantas vezes ele dizia, Angola é um país fantástico, já viste esta imensidão, já viste a força desta paisagem, já viste o que era andar de jipe nas picadas, passar rios nas jangadas?
Viu Benguela com curiosidade distante, Luanda ainda lhe enchia a alma, a Luanda dos vestígios de grandeza mas sobretudo a Luanda que renasce, as obras por todo o lado, os hotéis que se erguem no horizonte, as estradas a pedir restauro, tanta coisa por fazer, tanta coisa para fazer, esta terra parece querer voltar a ser uma terra de oportunidades para quem tem coragem, em Lisboa atrofiava-se, bem fez ele em ir para lá quando era novo, ali a família crescia em liberdade, com cabeça arejada, não era como em Lisboa, uma cidade de sacristias, como ele dizia para escandalizar a minha avó.
E reconheceu logo a Restinga, no Lobito, a rua direita que vai até ao fim, as casas alinhadas, o Clube Ferroviário, a brisa do mar, aqui vivia-se bem, já viste, isto aqui era um paraíso, vim cá em trabalho e depois com a mãe e convosco, eras pequena e não te lembras, mas viemos, foi um grande passeio.
Fui a Luanda com o meu pai no coração, foi ele que guiou os meus olhos pelos sítios de que ele falava, que ele filmou e que tantas e tantas vezes nos fez reviver. A minha memória era a memória dele, era ele que se lembrava e queria que as filhas se lembrassem também, queria por força que fizéssemos parte de Angola, onde nascemos, e onde ele viveu os anos mais felizes da sua vida.
Em Luanda sonhei com a presença do meu pai, revi nítido aquele olhar entusiasmado de quando falava de África, soou-me a sua voz e o seu riso, vi-o de novo jovem, muito moreno, as filhas pequenas no banco de trás, a guiar pelas estradas largas que ajudara a construir, no tempo em que não duvidava de que aquele seria para sempre o seu País.
Nesta viagem a Angola senti-o tão perto, tão perto, que parece que me vinguei das saudades.

Os homens, os bichos e as bichas

Uma coisa é certa, os bichos começam a ser melhor tratados do que os homens. Já nem falo do viaduto especial para lobos, ornamentado a preceito, sobre a A24, em Vila Pouca de Aguiar, nem dos túneis para os sapos e rãs, sob a A5 para Cascais. Se a humanidade do interior é discriminada em relação à do litoral, com os bichos tal não acontece, como fica demonstrado.
Agora, fiquei maravilhado com os cuidados postos na qualidade de vida das cagarras, que abundam nas Ilhas Selvagens. Mais de 70, digo, de setenta cientistas reuniram-se recentemente na zona para estudar a diversidade marinha. (Um parêntesis, para evidenciar que cada vez mais se fala e exige diferença e diversidade, excepto para a nossa Constituição, que não admite diversidade alguma em relação ao caminho para o socialismo). Mas, adiante.
Pois lá, nas Selvagens, as cagarras são acarinhadas: desde logo, anilhadas, para se saber onde andam, os cientistas constroem-lhes muros para os ninhos, de imediato numerados. Uma equipa de quatro Doutores ou em vias disso só por si controla 400 ninhos. Em prol dos bichos, ajoelham, retiram a cagarra que choca o ovo, revistam o ninho, tomam nota do nº da anilha, verificam se é macho ou fêmea, cortam um pedaço de uma pena e marcam a ave com tinta. O trabalho é de importância decisiva para o objectivo científico em vista que é, no ano seguinte, saber se o ocupante é o mesmo ou diferente. Mas os cientistas procuram ainda penetrar no mais íntimo das aves: se os casais são fiéis, a taxa de divórcio, o sucesso reprodutivo, o que comem no verão ou no inverno, “esse tipo de trabalho”, segundo um dos cientistas. Aliás, uma conclusão é decepcionante: a taxa de divórcio é apenas de 3% a 4%, o que indicia uma sociedade razoavelmente tacanha e atrasada.
A curiosidade pela dieta das cagarras é de comover: ao escurecer, os cientistas, munidos de lanternas na cabeça, sentam-se no chão com um tabuleiro e um garrafão de água salgada, agarram as cagarras, enfiam-lhe um tubo na garganta, bombeiam água e fazem-nas vomitar para o tabuleiro. O vómito é tratado com pinças e colocado num frasco com álcool. Para “ perceber o ecossistema” e fazer prosseguir a ciência.
Enfim, a função faz o órgão e as cagarras os cientistas. Aliás, os únicos humanos autorizados a relacionar-se com as bichas. Castigo severo para os madeirenses, que se pelavam por elas, espalmadas, salgadas e secas ao sol. Não sei é se alguns cientistas, à surrelfa, farão ainda o mesmo. Há que investigar. Mas não, a comunidade científica carragal não mete o pé na argola, a não ser o da cagarra!...
Nota: Não inventei nada, tudo isto é verdade revelada pelo Público de 22 Julho de 2010.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Que bom é esquecer e perdoar...

The Web Means the End of Forgetting” é o título de um artigo assinado por Jefrey Rosen publicado no New York Times que gostei imenso de ler e que nos alerta para uma nova sociedade digital que está em marcha incapaz de esquecer e perdoar.
O artigo começa com a história de uma rapariga que pendurou uma fotografia sua no MySpace, na qual aparece numa festa vestida de pirata e a beber num copo de plástico, com a legenda “Drunken pirata”. Por causa desta fotografia a universidade em que a rapariga estudava negou-lhe, segundo percebi, o estatuto de professor, alegando que ela estava a promover a bebida a estudantes mais novos. A estudante recorreu da decisão junto de um tribunal que viria a rejeitar a queixa dando razão à universidade.
O Autor alerta-nos para os custos de uma época em que muito do que dizemos e fazemos e do que outros pensam e dizem sobre nós é guardado para sempre e à disposição de todos em arquivos digitais ao dispor de todos na Web. É como que uma memória gravada que não mais se apaga, que acompanhará as nossas vidas para sempre, deixando marcas que não se podem remover. É uma memória perigosa e, porventura, castigadora que não dispõe da capacidade de esquecimento ao contrário da memória que transportamos connosco.
A memória que reside no cérebro e no coração e à qual estão associados sentimentos e emoções está construída para saber esquecer, desvalorizar, reconstruir e desconstruir os nossos próprios actos e comportamentos do passado e os actos e comportamentos dos outros, concedendo a nós próprios e em relação aos outros uma second chance como lhe chama o Autor do artigo. Aprender com a experiência, corrigir erros e adaptar os nossos comportamentos à curva da vida são factos aceites pelos homens. A capacidade de nos reinventarmos a nós próprios e começar de novo é a bem dizer uma questão de sobrevivência. Mas uma sociedade que guarda na Web partes de nós próprios impossibilita, na prática, o esquecimento e o perdão.
Segundo o Autor, o banco de memória permanente da Web significa que cada vez mais não há second chance. É que agora a pior coisa que uma pessoa faz transforma-se muitas vezes na primeira coisa que todos sabem de si. Será que esta visão de Jefrey Rosen é assim tão verdadeira?

O homem é um trapalhão!...

Governo quer avançar com urgência com privatização da TAP, diz o jornal i, com base numa resposta do Gabinete de António Mendonça a questões colocadas pelo BE.
Não há urgência nenhuma para privatizar a TAP- António Mendonça, hoje, questionado sobre a afirmação anterior.
Quando era miúdo, dizia-se em casos como este: o homem é um trapalhão!...

Défice externo não nos larga - até quando?

1. Apesar das inúmeras proclamações oficiais, de maior ou menor intensidade dramática, no sentido de que se torna necessário inverter a trajectória de endividamento externo – desde a invocação da medonha insustentabilidade até às habituais promessas do tipo “agora é que vai ser” – constata-se que esse endividamento não desarma.
2. As contas externas para os primeiros 5 meses do ano, divulgadas na semana passada pelo BdeP não deixam grande margem para dúvidas: tudo indica que voltaremos a ter, no corrente ano, um défice externo corrente superior a 10% do PIB...
3. Não obstante o bom ritmo de crescimentos das exportações de bens até Maio – 14,5% - as importações também subiram bastante, 9,5%, não deixando que o défice comercial diminuísse.
3. Assim sendo, é caso para perguntar: será que caíram em “saco roto” os sucessivos apelos ao aumento da produtividade e da competitividade? Ou que da catadupa de medidas anunciadas para reforço da competitividade (as mais das vezes não ultrapassando o plano da oratória fácil, é certo) nada resulta?
4. Na aparência assim será...os desequilíbrios estruturais da economia portuguesa parecem não ter solução, por mais recomendações e medidas que sejam avançadas, tendo como resultado a manutenção de um enorme desequilíbrio externo – e o consequente aumento de endividamento ao exterior ao ritmo de mais ou menos 17 mil milhões de Euros/ano...
5. Como já aqui tenho repetido vezes sem conta, tenho a percepção de que o nó deste problema está no excesso de despesa pública.
6. Quando digo isto não me refiro apenas à despesa do Estado-Administração – que aliás parece estar fora de controle como se pode concluir da informação sobre a execução orçamental de Junho – mas também às diversas outras fontes de despesa pública que são as administrações locais e regionais bem como as empresas públicas nacionais, regionais e municipais.
7. Trata-se de uma imensa floresta de fontes de despesa que tem como contrapartida uma produção de serviços de utilidade muito baixa, tendo por isso um impacto tremendamente negativo nas contas externas de uma economia actualmente muita aberta como é a economia portuguesa.
8 Se a economia fosse menos aberta, o resultado deste desequilíbrio estrutural seria muito mais inflação, mas como não existem (por agora) restrições à importação de bens, o resultado é um persistente e indestrutível desequilíbrio externo.
9. Como as medidas até agora tomadas para reduzir o impacto destas múltiplas fontes de despesa pública são pouco mais do que cosmética, teremos de continuar a viver por enquanto com este “insustentável” desequilíbrio externo! A pergunta continua a ser - até quando?
10. Um bom tema de reflexão para os responsáveis políticos que atacam as suas férias...

A maldição lançada sobre a justiça portuguesa

Não há outra explicação, a justiça sofre de mau olhado. Só isso explica a falência total das medidas para recuperar a credibilidade e a eficácia mínima do sistema de justiça.
O senhor ministro da justiça dá hoje uma entrevista ao ´Público´. O discurso é de tal forma recorrente que esta poderia ser a entrevista estival do responsável da justiça do ano passado ou de há quatro anos atrás. Significativa a ausência de qualquer ideia acerca da anunciada nova reforma da acção executiva, após a falência do ensaio que deveria fazer corar de vergonha os criadores do actual sistema perante os resultados conhecidos. Diz o ministro que tem um grupo de gente muito sábia a tratar de reformar a reforma. Tudo como dantes, não espantando que nestes sábios se encontrarem alguns dos que elaboraram a anterior lei.
Significativo, também, é o anúncio de que, volvido um ano e picos sobre a entrada em vigor da alteração das custas judiciais que encareceu como nunca o acesso à justiça, tudo volta à primitiva quanto ao momento do pagamento da taxa de justiça! Para que, dentro de meses, se questione o sistema de parcelamento ou o momento em que se paga. No que não se vai mexer, claro está, é no montante da taxa de justiça, a não ser para a aumentar.
Sem direcção política, com ministros escolhidos a dedo pelo seu desconhecimento sobre como se passam as coisas no terreno, minada por interesses corporativos e sindicais, a justiça continua a apostar no experimentalismo. A tal ponto é assim que por estes dias quem é mais notado no meio, não é quem contribui com o seu estudo e conhecimento para a boa aplicação e aperfeiçoamento do Direito, mas quem se dedica às análises das patologias do próprio sistema.

Que bom que é o frio!

A trabalhar ou de férias o calor que se vai fazer sentir não é para brincadeiras! O País está varrido por alertas amarelo e laranja. Eu estou em alerta vermelho com as maiores dificuldades em suportar 40 graus. Parece que a temperatura mais amena – 31 graus - vai acontecer justamente no Algarve, local em que os veraneantes suspiram por mais calor. O tempo, volta e meia, também nos troca as voltas! Desta vez, a culpa é do Anticiclone dos Açores actualmente localizado a norte do arquipélago. O melhor é pensar no frio do Pólo Norte para aguentar todo este calor...

domingo, 25 de julho de 2010

Visita do Presidente a Angola I-A Economia Angolana

A propósito da visita do Presidente da República a Angola, aqui ficam umas pequenas notas acerca da economia e das finanças públicas angolanas, realidade não muita conhecida e susceptível de provocar algumas surpresas. Por exemplo, em termos de finanças públicas, Angola está em condições de dar um grande exemplo a Portugal. Os principais traços da economia caracterizam-se da forma seguinte:
• Até 2009, a economia angolana tinha vindo a crescer na ordem dos dois dígitos por ano, (21% em 2007, 13%, em 2008).
• A Balança de Pagamentos acumulava saldos positivos, da ordem dos 10 mil milhões de dólares em 2007 ou de 6 mil milhões em 2008, equivalentes a 16% e a 8% do PIB, respectivamente.
• O saldo orçamental era positivo e apresentava valores da ordem dos 11% e dos 9% do PIB, em 2007 e 2008.
• Ao mesmo tempo, a dívida pública externa apresentava valores muito confortáveis, 15 mil milhões em 2008, cerca de 19% do PIB.
• A inflação andava pelos 12% a 13%.
Devido à crise internacional e à baixa do preço do petróleo, a economia estagnou em 2009, variando os indicadores disponíveis entre uma recessão de -0,3% e um acréscimo de actividade de +0,7%.
De facto, e como o petróleo contribui para cerca de 60% do PIB e para 97% das receitas do Estado, tal situação repercutiu-se no Orçamento, que apresentou um défice de -9% e na Balança Corrente (défice de cerca de -2%, cerca de 1, 5 mil milhões de euros).
Tal levou, como muito bem explicou o Dr. Tavares Moreira, ao atraso dos pagamentos e à negociação de um pacote de apoio com o FMI, com resultados já muito positivos.
Em termos apoio financeiro, Angola terá acesso a um montante de 6 mil milhões de USD, a concretizar de acordo com o cumprimento do programa. Neste momento, já foram levantados montantes superiores a 500 milhões de USD.
No âmbito do Programa, o Governo obriga-se a restrições orçamentais. Em 2010, a Despesa Pública crescerá apenas 1%, em relação à efectivada em 2008. Salienta-se que tal acréscimo é devido ao acréscimo do investimento público em 6%, já que a despesa corrente decresce 1,6%.
Como resultado das medidas tomadas e da recuperação da actividade económica, espera-se para 2010 um crescimento da ordem dos 7%, um saldo orçamental positivo da ordem dos 6%, um retorno da balança corrente aos saldos positivos, 4%. Os dados até agora obtidos confirmam genericamente as previsões.
Não pode deixar de se registar a capacidade de liderança que permitiu um ajustamento tão rápido e eficaz das variáveis orçamentais.
Ficarão para capítulos seguintes as relações comerciais com Portugal e os resultados da visita presidencial.

Vamos mas é ao que interessa!

S.f.f., parem com essa maçada das revisões constitucionais, os debates sobre a sustentabilidade do estado social, os poderes presidenciais, deficites excessivos, SCUT, remodelações governamentais. Não venham mais com  as prognoses sobre o stress dos bancos, as deprimentes notícias sobre falências e insolvências, despedimentos e encerramentos. Enquanto não começam os jogos da Liga, concentrem-se no conhecimento do que é verdadeiramente importante e que traz centenas de milhar de almas preocupadas. Está  tudo aqui ao alcance de um clique. As últimas sobre a família do bébé, até à nova bébé do símbolo do sucesso nacional. E mais, muito mais...
Ditosa Pátria que tão grandes heróis continuas a gerar!

sábado, 24 de julho de 2010

O truque socialista

O PSD, no seu pleno direito, decidiu apresentar uma Proposta de Revisão Constitucional.
Como de costume, e em vez de a analisar nos seus méritos e deméritos, o PS logo sobre ela formulou as mais tenebrosas intenções e os mais selváticos objectivos: ataque definitivo ao Estado Social, regresso ao antes do 25 de Abril foram as intenções mais benévolas que os socialistas viram no documento.
Ao mesmo tempo, foi posta em prática uma barragem de propaganda no mesmo tom, utilizando os comentadores, constitucionalistas, professores e jornalistas do costume. No dia da apresentação da Proposta, ela foi logo "desfeita" pelos entrevistados da RTP no seu principal telejornal.
Sempre assim foi o comportamento e a reacção inicial do PS em todas as Propostas do PSD. Foi assim, por exemplo, com as revisões constitucionais que permitiram as privatizações, a modernização do sistema financeiro, a abertura da Banca à iniciativa privada. E até, para muito PS, o fim do Conselho da Revolução.
Ganharia mais o PS, ganharia a classe política e ganharia o país, se Propostas, oportunas ou não, melhores ou piores, fossem discutidas pelo que valem, e não mediante meros e primários processos de intenção.
E conviria pensar que o maior ataque ao Estado Social está nos défices crescentes que este Governo tem permitido, mais do que permitido, dinamizado e desenvolvido. O PS tem sempre o Estado Social na boca, mas o que tem feito é enfraquecê-lo a todo o momento.
Todavia, não há magia que dure sempre. E os portugueses estão certamente a compreender o truque.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Situação orçamental: grande tormenta à vista?

1. A revelação, em versão oficial, para o 1º semestre do corrente ano, de um défice do Estado superior em € 462 milhões ao do período homólogo de 2009, sugere que o cenário de forte tormenta nas contas públicas, no corrente ano e em 2011, está ganhando uma probabilidade muito grande.
2. Com efeito, uma vez terminada (não totalmente convém desde já sublinhar) a estranha sub-contabilização dos encargos com a dívida pública que durou até Maio - quando estes encargos caíam 25% em relação ao período homólogo de 2009, situação totalmente incompreensível como aqui salientamos – as despesas correntes do Estado, até Junho, mostram um crescimento superior a 5%, ou seja estão fora de controlo como bem notou há poucos dias o Pinho Cardão.
3. Convém ainda salientar que o agravamento do défice só não foi superior porque, como também assinalou o Pinho Cardão, mais uma vez o crescimento da receita fiscal suportou uma boa parte do crescimento da despesa.
4. E no crescimento da receita fiscal tiveram papel determinante o IVA, com um crescimento formidável de 16,3%, graças ao crescimento do consumo privado, bem como o imposto sobre veículos, que cresceu 21,3% devido à subida “alucinante” da compra de automóveis novos, quase 60%.
5. Mas atenção que o comportamento do consumo privado em geral e a compra de automóveis novos em especial não vão poder manter no resto do ano o dinamismo do 1º semestre, sob pena de o País “ter de fechar a porta”...
6. Sendo assim, não será de esperar para o 2º semestre, não obstante a subida de algumas taxas dos impostos, nomeadamente a do IVA de 20 para 21%, um comportamento tão favorável da receita fiscal.
7. Assim, ou a despesa é sujeita a um controlo muito mais apertado – mas como? - ou vamos ter um final de ano particularmente agitado em sede de execução do Orçamento do Estado e de cumprimento do objectivo de redução do défice que se afigura virtualmente impossível.
8. E não abordo aqui, ficando para outra ocasião, as seguintes “matérias”:
- O inevitável agravamento dos encargos com a dívida pública, que deverá acentuar-se ao longo do 2º semestre;
- Os atrasos de pagamento, que se estão a acumular em diversos sectores da Administração Pública – com destaque para a situação caótica que se vive na Saúde, onde as dívidas se amontoam de forma “obscena” para evitar que o Estado agrave o défice transferindo para as ARS os fundos necessários para regularizar essas dívidas;
- A sistematicamente adiada solução de problemas pendentes no sector financeiro público.
9. “Matérias” que, pela sua dimensão, poderão vir a colocar a situação das Contas Públicas num cenário só descritível por Dante Alighieri.

Não custa a acreditar...

Reacção de um porta-voz da Associação de Estudantes da Escola Gil Vicente em Lisboa ao novo Estatuto do Aluno, ontem aprovado na Assembleia da República:
Quer um exemplo? O novo estatuto prevê que os alunos tenham de pagar o material que estragaram. Isso é pedagógico? Não é. Se um aluno partir um vidro e for obrigado a pagá-lo, no dia seguinte parte outro e dois dias depois outro ainda. Porque a obrigação da escola não é castigá-lo, mas explicar-lhe porque é que não deve andar a partir vidros."
É este o estudante tipo que fomos criando ao longo dos últimos anos, fruto de um clima de indisciplina, desresponsabilização e facilitismo e consequência da falta de autoridade das escolas. Temos pela frente um trabalho muito duro de transformação…

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Feriados, sempre!

Se um feriado custa 37 milhões de euros, quatro custam 148 milhões, logo, o PS não vai aprovar a proposta de duas das suas deputadas. As senhoras deputadas esqueceram-se dos votos? Ainda correm o risco de não serem mais deputadas, e daí talvez não, porque representam muitos votos... Confuso? Talvez não!

Clemência para criminosos?

Não sou chileno, mas tenho muita dificuldade em compreender esta atitude da conferência episcopal chilena ao pedir clemência para os militares chilenos condenados por crimes durante a ditadura. E na altura dos crimes o que é que fizeram?

Dívidas de Angola a empresas portuguesas

1. Muito tem sido escrito, nos últimos dias, a propósito da situação de atraso no pagamento de dívidas de Angola a empresas portuguesas, dada a relevância que este tema mereceu nas negociações realizadas no âmbito da visita, ainda em curso, do Presidente da República àquele País.
2. Não deixa de ser curioso notar que um assunto de que quase se não falava até agora, de repente se tenha tornado num tema tão dominante como se fosse uma situação inteiramente nova.
3. E também é curioso notar que do lado de responsáveis oficiais portugueses não exista ainda uma noção clara da natureza do problema e das possíveis implicações da sua eventual resolução.
4. Assim, por exemplo, o Presidente da AICEP declarava há 2 dias em Luanda que, caso este assunto se resolva isso será bom para a economia portuguesa pois “é dinheiro que entra na nossa economia”, sugerindo que se trata de pagamentos a efectuar a empresas residentes em Portugal.
5. Ora isto está longe de ser exacto, como vamos ver.
6. Importa dizer, para começar, que este problema tem origem no início de 2009, quando a economia de Angola sofreu um duro choque externo, decorrente da quebra acentuada dos preços do petróleo, traduzido numa perda de termos de troca superior a 40%.
6. E recordar que a economia de Angola vinha de um período de muito forte expansão, com um ritmo de crescimento do PIB de 15% no período 2003-2008, com as exportações de petróleo (+ de 90% das receitas de exportação de Angola) sustentando um também muito forte crescimento das importações.
7. No início de 2009 tudo mudou, as receitas das exportações caíram a pique e tornou-se necessário impor um travão às importações sob pena de um rápido esgotamento das reservas cambiais do País que, a acontecer, teria posto em causa a solvabilidade externa e causado uma situação de penúria como a vivida nos anos 80.
8. Uma das formas de travar as importações consistiu exactamente na suspensão dos pagamentos nos grandes contratos de obras públicas, o que atingiu sobretudo as grandes construtoras e indirectamente muitas outras empresas, nomeadamente PMEs.
9. Mas importa notar que estas dívidas são dívidas domésticas (não são dívidas ao exterior) de que são credoras empresas residentes em Angola de cujo capital as empresas portuguesas são detentoras na totalidade ou em parte.
10. Assim, os pagamentos que o Estado angolano vier a fazer serão utilizados para satisfazer compromissos no mercado local em primeiro lugar, tanto em USD como em Kwanzas – nomeadamente à banca local, que terá refinanciado parte destas situações de atraso – só sendo exportável para Portugal uma parte das verbas a receber, para pagamento de serviços em especial (rubrica dos invisíveis da Balança de Pagamentos de Angola).
11. A parcela exportável para Portugal poderá vir a ser talvez da ordem de 1/3 ou 40% do total (é difícil apontar um número certo), não sendo pois exacto dizer que tudo o que vai ser pago “é dinheiro que entra na nossa economia”.
12. Importa ainda referir que se tratou de uma situação que afectou empresas de outras nacionalidades, nomeadamente grandes construtoras brasileiras.
13. Em qualquer caso, as notícias de que estes atrasados vão ser pagos é boa, até porque reflecte uma normalização da situação cambial em Angola que abre perspectivas para um crescimento – não ao ritmo frenético do período 2003-2008 é certo – das relações económicas entre os dois Países.
14. Caso estas notícias se concretizem é tb justo dizer que o PR prestou um bom serviço ao País.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Rir ou chorar?

João Teixeira Lopes (Bloco de Esquerda) à bulha com Strecht Ribeiro (PS).

“Rank and yank”

O princípio da seleção natural ensina-nos que os membros mais aptos de uma espécie têm mais hipóteses de sobreviver. Em termos biológicos trata-se de uma regra universal e que explica a evolução e a biodiversidade. Aquele conceito de os menos aptos, os mais frágeis, estão condenados à eliminação não é correto, porque o conceito de mais “frágil” poderá modificar-se de acordo com as condições e pressões ambientais. O conceito de eliminação dos menos aptos é, por vezes, utilizado nas esferas social e laboral. Quando tal acontece, as consequências podem ser muito graves e negativas para a própria humanidade. Custa-me imenso ver a aplicação destes princípios à sociedade.
O caso da Enron é paradigmático de uma certa forma de darwinismo social que importa evitar. O diretor executivo de então, Jeffrey Skilling, confessou que o sistema que pôs em execução na empresa, “rank and yank”, foi elaborado em ideias darwinistas, no “desejo dos genes” em se propagar. Este modelo, perverso, baseia-se em hierarquizar os trabalhadores numa determinada escala. De tempos a tempos, no caso da Enron, de seis em seis meses, os 5% melhores classificados eram compensados financeiramente e os últimos 15% eram “eliminados”, despedidos. A atmosfera laboral causada por este sistema é fácil de imaginar; um modelo perfeito para os trabalhadores se destruírem uns aos outros.
Trata-se de um sistema não compatível com a empatia e a solidariedade humanas, que, curiosamente, foram os principais motores de desenvolvimento e de sobrevivência dos grupos. Mesmo em outros primatas é comum verificar-se comportamentos altruístas, sem os quais não pode haver harmonia nem garantias de sobrevivência. O altruísmo de grupo sobrepôs-se na nossa espécie, e sobrepõe-se em muitas outras, ao egoísmo individual, o qual reflete, de algum modo, um certo desejo de domínio e de poder. O grande problema surge quando o egoísmo se impõe como norma e se dissemina como uma epidemia. Se analisarmos bem o que está a acontecer na nossa sociedade, podemos verificar uma tendência expansionista do modelo “rank and yank”, a outros setores, tendência perniciosa a todos os níveis, colocando os cidadãos uns contra os outros, numa tentativa feroz de sobrevivência e de obter as máximas compensações e mordomias possíveis.
O sistema democrático, por definição, deveria garantir as liberdades e garantias a qualquer cidadão, mas também permite que se constituam grupos cujas finalidades darwinistas sociais e políticas são uma triste realidade ao não respeitarem princípios éticos.
A empatia e a solidariedade humanas continuam a existir, sem sombra de dúvida, mas só aparecem esporadicamente em casos extremos, ou seja, catástrofes naturais, acidentes graves ou quaisquer outros capazes de despertar esse resquício evolutivo de entreajuda e de altruísmo. No dia-a-dia começa a ser cada vez mais rara a força altruísta do grupo ou grupos e começa a prevalecer o “egoísmo grupal”. Os próprios partidos políticos, e diversos agrupamentos ideológicos e económicos, têm dado algumas provas, inquietantes, deste tipo de comportamento. Usando as prerrogativas da democracia, alimentam os seus membros em detrimento da maioria trabalhadora, simples e detentora de um idealismo violado constantemente por muitos em que depositaram o seu voto e a sua confiança.
Apesar de toda a evolução e crescimento civilizacional, os cidadãos crentes na humanidade serão as vítimas preferidas de um sistema que faz lembrar o modelo “rank and yank”, acabando por ser desterrados, humilhados, empobrecidos, esquecidos e até eliminados. Os que andam a definir as “regras da vida”, sabem que poderão ocupar os tais 5 ou 10% do topo. Acontece que essa escala é criada com base em interesses não coincidentes com o que esteve em tempos na base da evolução da nossa espécie: altruísmo, empatia e solidariedade de grupo. Resta a esperança de que, tal como já aconteceu por diversas vezes noutros tempos, certas convulsões sociais consigam criar a ideia de que é possível construir uma sociedade mais justa.

Orçamento de Estado: gastar à tripa forra!...

Acaba de sair o Boletim de Execução Orçamental do 1º Semestre.
Confirma-se o que já se sabia: a austeridade não chegou ao Estado e o Governo continua a gastar à tripa forra.
O défice dos seis primeiros meses atinge os 7,8 mil milhões de euros, um agravamento de 500 milhões face aos valores do 1º Semestre de 2009. Traduzindo também um desvio em relação ao montante orçamentado para 2010.
A Despesa Corrente aumentou 5,1%, aumento bem real, porque muito superior à inflação, traduzindo ainda um acréscimo do peso em relação ao PIB.
O défice não foi maior dado o aumento da receita dos impostos em 6%. Sempre o aumento da carga fiscal a pagar os aumentos da despesa corrente.
O país anda desgovernado, a austeridade é só para os cidadãos, o Ministério das Finanças não cumpre qualquer função de política económica ou financeira, não serve o país e age apenas como o tesoureiro do Estado.
O Ministro das Finanças não existe enquanto tal.

A erosão da costa portuguesa

O JN continua a publicação de um dossier sobre o dramático problema da erosão na costa portuguesa. Está de parabéns pela iniciativa que decerto contribuirá para a reflexão que tarda sobre as razões antrópicas ou naturais do encolhimento do território português. Os infogramas que o JN publica na versão on-line - e que podem ser vistos aqui - são excelentes e dão bem a ideia da dimensão e sobretudo da gravidade do problema no litoral norte.
A acompanhar com muito interesse.

Tantos constitucionalistas!

Desde sábado que emergem constitucionalistas aos magotes! Onde é que eles andavam? O que faziam?

terça-feira, 20 de julho de 2010

Irão: Mulher em risco de ser executada por adultério


Através do El País, tive acesso a uma carta da Amnistia International, relativa à condenação à morte de Sakineh Mohammadi Ashtiani, a fim de ser enviada ao Ayatollah Sayed Ali Khamenei. Não é que acredite muito no Ayatollah, mas, nunca se sabe...




Ayatollah Sayed Ali Khamenei

Líder de la República Islámica

Excelencia,

Me dirijo a usted para expresarle mi gran preocupación por la situación de Sakineh Mohammadi Ashtiani, una mujer iraní condenada en 2007 por adulterio y que podría ser ejecutada en cualquier momento.

Sakineh Mohammadi, madre de dos hijos, está presa desde 2005. Fue declarada culpable en mayo de 2006 de mantener una “relación ilícita” con dos hombres, y condenada a recibir 99 latigazos. Con posterioridad fue declarada culpable también de “relación extramatrimonial”, acusación que ella negó, y condenada a morir por lapidación.

Durante los últimos días han venido sucediéndose una serie de declaraciones contradictorias por parte de miembros del gobierno iraní en relación a la situación legal de Sakineh Mohammadi. Por ello lo que le pido que aclaren cual es su situación legal actual, especialmente a su hijo y abogados.

Además, según las informaciones de las que dispongo, al menos otras ocho mujeres y tres hombres corren el riesgo de ser lapidados en Irán.

La ejecución por lapidación es un castigo especialmente cruel, por estar específicamente concebida para aumentar el sufrimiento de la víctima : para llevarla a cabo se escogen piedras lo suficientemente grandes como para causar dolor, pero no tanto como para matar a la víctima enseguida.

Por ello, le pido que conmute la pena de muerte de Sakineh Mohammadi y en el camino hacia la abolición total de la pena de muerte, promulgue una ley que prohíba inequívocamente la lapidación como pena judicial. A la espera de esta ley, debe declararse de inmediato una suspensión de las lapidaciones, dejando claro a todos los jueces y otros funcionarios que tendrán que rendir cuentas en caso de incumplir tal suspensión. Además deben destipificarse como delito las relaciones sexuales consentidas entre adultos.

Le pido también que garantice que el hijo de Sakineh Mohammadi, Sajjad Qaderzadeh no sea objeto de hostigamiento por las manifestaciones que ha realizado preocupándose por la vida de su madre.

Atentamente,

A importância do bom senso...

Nos últimos dias surgiram notícias relacionadas com cortes nos apoios financeiros da Segurança Social (SS) às refeições fornecidas a crianças carenciadas pelas instituições de solidariedade social, prontamente, aliás, desmentidas pelo governo. Esperamos todos, pessoas de bem, que tudo isto não passe de um falso alarme, embora não deixe de constituir estranheza que altos responsáveis daquelas instituições venham publicamente denunciar as situações. Se há duplicações indevidas de atribuição de subsídios, pois que se corrijam e, sobretudo, que sejam evitadas através de adequados mecanismos de controlo que a SS deve assegurar.
A pobreza e a privação material de satisfação de necessidades básicas da vida são uma realidade entre nós. Há um crescente número de famílias que não consegue satisfazer as mais elementares necessidades. Segundo dados recentes do Instituto Nacional de Estatística “...23,0% dos indivíduos viviam em situação de privação material, resultado ligeiramente superior ao verificado em 2007 (com 22,4%)..."
Não ter dinheiro para assegurar uma alimentação mínima é uma situação que muitas famílias enfrentam, dependendo totalmente do apoio de instituições sociais que na sua maioria recebem ajuda financeira da SS e/ou das autarquias locais.
As crianças deveriam merecer a nossa maior solidariedade e deveríamos actuar cirurgicamente para que não sofressem privações naquilo que é essencial a uma vida normal, preservando o seu crescimento feliz e o seu desenvolvimento equilibrado.
O sentido de emergência com que diariamente famílias e instituições sociais se confrontam não se compagina com ambientes de falta de flexibilidade de resposta, moldados, porventura, pelo fosso grande entre quem administrativamente decide na sua “torre de marfim” e quem no terreno não pode voltar as costas aos problemas e/ou pela abordagem economicista da gestão da “coisa” pública que se tem vindo a instalar.
É portanto incompreensível o caso denunciado pelo presidente da União das Misericórdias que ocorreu num Atelier de Tempos Livres (ATL) que funciona em Aveiro. Por ter servido mais do que as trinta refeições que têm apoio financeiro da SS, foi advertido que se o fizer pode perder os apoios pois está a fazer um serviço para o qual não está autorizado.
Uma situação à qual aquele responsável não poupou nas críticas: "Este aviso é um sinal da cegueira e da irresponsabilidade social próprio de a quem a crise ainda não bateu à porta". E acrescenta que esta situação mostra que se "estão a ser ultrapassados os limites do bom senso".
Mas quem é que tem coração para negar servir, se estiver ao seu alcance, mais uma ou duas refeições a crianças necessitadas? Mas que olhar social é este que leva a SS a proibir fazê-lo? Tão controladores numas coisas e tão laxistas noutras. Ouvi alguém comentar sobre este caso que se estava (não percebi quem?) a fazer uma tempestade num copo de água...

Meter golos sem saber ler nem escrever...

O FCPorto contratou mais um futebolista brasileiro, internacional das camadas jovens, Walter de seu nome. Que dizem especialista em meter golos, sem saber ler e escrever. No sentido literal da expressão. Parece que apenas sabe contá-los, se não ultrapassarem os dedos de uma só mão, claro...
A sua contratação é exemplo acabado de uma estratégia win,win, em que todos ganham. Ganha o jogador, porque irá certamente aproveitar as Novas Oportunidades e sairá bacharel de Bolonha no fim do contrato; ganha o clube, que conquista um goleador sem contrato, até que este o saiba assinar...

Ai gordura, gordura!

Gordura em excesso nas ancas? Perigo de perda de memória! Mas, em contrapartida, estão mais protegidas em termos cardiovasculares do que as mulheres que têm gordura em excesso ao redor da cintura. Estas últimas fazem mais enfartes e têm mais risco de diabetes, ao contrário das “cuzudas”, que correm menos riscos mas acabam por perder a memória.
Ai gordura, gordura!

De que se faz a espuma dos dias


Esta capa do i, exibindo as fotos do lider do PSD e do actual Chefe do Estado, é bem o exemplo de como se faz jornalismo político em Portugal e de como é difícil orientar um debate sério sobre o sistema político. O PSD, ao que parece, apresentará um projecto de revisão constitucional no qual propõe alterações aos poderes do órgão de soberania Presidente da República. Não conheço as razões da proposta, nem sequer, no seu pormenor a proposta, e espero, como cidadão atento, que a direcção do PSD explique por que motivos e com que objectivos pretende mexer na estrutura do nosso edifício político.
O que não é concebível é que antes de qualquer esclarecimento e debate, a proposta da direcção do PSD seja já apresentada como algo dirigido ao e contra o actual Presidente da República, visando reduzir-lhe os poderes.
Haverá esperança de um dia se poder discutir os momentos fundamentais da nossa democracia sem os fulanizar ou transformar, imediatamente, em espuma?

Subitamente, em Junho...lá se foi o milagre dos juros da dívida!

1. Em textos editados nos últimos meses, procurei chamar a atenção dos nossos leitores para o facto de os juros da dívida pública, segundo a versão do Boletim Mensal de Execução Orçamental da DGO, tanto em Abril como (sobretudo) em Maio, revelarem um comportamento dificilmente explicável.
2. Com efeito, no período de Janeiro a Abril, a conta dos juros (e outros encargos) da dívida apresentava uma queda de 15% em relação a idêntico período de 2009, sendo que em Maio essa diferença se alargava para 25%...
3. Tudo isto quando o montante médio da dívida directa do Estado, em qualquer destes dois períodos, tinha aumentado 12,5% em relação aos valores de 2009 e as taxas de juro não cessavam de subir...
4. Episódio estranho, este, sugerindo a ocorrência de um fenómeno muito raro, “milagroso” porventura, de atrofiamento físico dos juros da dívida pública...
5. Estranheza exacerbada pela explicação imperscrutável, contida no Boletim em causa, segundo a qual esta redução se ficava a dever a um comportamento “intra-anual” dos juros...
6. Comportamento “intra-anual”?! Mas isso não se conseguia perceber, uma vez que se era essa a razão, então também em 2009 os juros teriam sido baixos neste mesmo período, não sendo possível que em 2010 baixassem em termos relativos, menos ainda naquela radiosa expressão...
7. Esta manhã, antes mesmo da divulgação do Boletim de Julho, o Governo veio já informar que este “milagre” dos juros acabou e que os encargos com juros no período de Janeiro a Junho sobem cerca de 2,2% em relação a igual período de 2009...
8. Depois de no mês anterior estarem a cair 25%, o que de extraordinário se terá passado em Junho para uma reviravolta desta dimensão?
9. Esta situação é ainda menos inteligível quando se sabe que a contabilização dos juros da dívida pública deve seguir uma regra de mensualização, sendo os encargos contados sobre o saldo da dívida, em função da respectiva taxa de juro e independentemente das datas de vencimento dos cupões...
10. O mais extraordinário é que a explicação para esta súbita variação de Maio para Junho, dada pelo responsável governamental do sector, é exactamente a mesma que servia para justificar o “milagre” dos meses anteriores...o comportamento “intra-anual” desta rubrica da despesa!
11. Ora vá-se lá perceber esta novela! Assim, subitamente em Junho, lá se foi o milagre dos juros! Acabou-se o sonho!

segunda-feira, 19 de julho de 2010

John Nash, afinal um homem lúcido e brilhante!...

"Qualquer teoria, seja ou não económica, é em grande parte utilizada apenas ao nível académico. O que os responsáveis empresariais fazem na prática costuma ser algo diferente daquilo que aprenderam quando estudaram teoria económica. Quando uma pessoa se torna efectivamente um banqueiro tem de tomar decisões práticas, e isso não é algo que se possa fazer utilizando apenas o que se ouviu e aprendeu nas aulas".
John Nash, Prémio Nobel da Economia, pela contribuição para a Teoria dos Jogos Estratégicos, em entrevista ao Público de 15 de Julho passado
Lúcidas, as palavras de John Nash, que participou, na semana passada, na Conferência Europeia de Investigação Operacional na Faculdade de Ciências de Lisboa.
O que os responsáveis empresariais fazem na prática costuma ser algo diferente daquilo que aprenderam quando estudaram teoria económica, disse Nash.
Pena foi não ter explicado aos catedráticos economistas ministros ou comentadores que boas teorias económicas seria melhor que ficassem nos corredores das Universidades e não fossem aplicadas de forma genérica e universal. Por exemplo, as teorias Keynesianas, cuja aplicação sem nexo constitui forte obstáculo ao crescimento da economia portuguesa.
John Nash, uma mente brilhante.

domingo, 18 de julho de 2010

Mentiras e desmentidos

Parece que causaram agitação as declarações e contra-declarações da Ministra Helena André sobre os aumentos na função pública.
Não consigo perceber porquê. Quando não são os Ministros a desmentir o que disseram na véspera, são os factos do dia seguinte que os desmentem.
Então, mas alguém ainda liga alguma coisa ao que os Ministros dizem?

Qual é a verdade?

O Estado Social está finalmente, era inevitável, na agenda política. É positivo que o tema seja discutido e abundantemente esclarecido junto da opinião pública, quer pelo PS que acena com o papão do fim do Estado Social, quer pelo PSD que afirma a necessidade de repensar o Estado Social.
Há os que afirmam que o Estado Social do crescimento demográfico e do crescimento económico do passado é intocável. Não querem reconhecer politicamente que hoje o mundo ocidental se confronta com desequilíbrios demográficos, elevadas taxas de desemprego e baixas taxas de crescimento económico que, mais tarde ou mais cedo, nos obrigarão a repensar como pode e deve o Estado Social, orientado pelos primados da dignidade humana e das liberdades individuais, garantir os direitos sociais e o progresso social, intervindo na justa medida em que lhe compete combater as situações de pobreza e quaisquer formas de exclusão social.
Uma coisa é inquestionável. Não há Estado Social sem financiamento. Os recursos financeiros não são suficientes. A questão é técnica, mas há quem queira transformá-la num combate ideológico e político, acusando de neoliberais aqueles que sabem que não será mais possível o Estado assegurar tudo a todos.

sábado, 17 de julho de 2010

O senhor A.

- Dá-me licença senhor doutor? Posso entrar? Uma voz inconfundível, o senhor A., com os seus esplendorosos 94 anos, acaba de entrar no consultório. Um homem cheio de histórias, algumas de encantar, que me delicia com a sua intelectualidade e vivacidade espelho de um ex-desportista de diferentes especialidades. Simpático, lúcido e muito educado, revelou-me, mais uma vez, que anda preocupado com a sua obstipação. Neste caso, o problema reveste-se de uma particularidade porque se trata de um ostomizado desde há 28 anos. Anda meio neura, é assim que costuma dizer: - Ando neura, senhor doutor, com estes intestinos, os raios dos gases acumulam-se e depois sobem-me à cabeça. Ó senhor doutor, eu peço-lhe muita desculpa, mas os gases sobem até à cabeça, não é verdade? – Não, senhor A, não sobem. – Não sobem?! Então por que é que fico com tonturas? - Isso é outra coisa e nós vamos resolvê-la.
Voltando à obstipação, o senhor A, que está a pedir constantemente desculpa pelo que vai dizer, disse-me meio apreensivo que por vezes tem de massajar o abdómen ao redor do saco para empurrar as fezes. – Peço desculpa senhor doutor por lhe perguntar mas é perigoso fazer isso, não é? E a sua face mostrou alguma apreensão. Para ilustrar o problema, levantou-se e fez o gesto que costuma fazer, pressionando a parede ao redor do saco. - Ó meu amigo, não faz mal nenhum, pode fazer isso à vontade. A máscara de ansiedade desvaneceu-se imediatamente e voltou a sentar-se.
Nunca vi ninguém mais sequioso de informação do que o senhor A. Pede sempre desculpa antes de fazer uma pergunta ou explicar algo. Quer saber tudo, que lhe explique os fenómenos e que dê respostas às suas inquietações. Admiro esta capacidade de interpelação. A conversa continuou até que colocou novamente a máscara de inquietação, sem perder o sorriso, e, com uma voz forte, desfasada da sua idade cronológica, disse-me: - Ó senhor doutor, peço-lhe imenso desculpa, mas diga-me uma coisa, não acha que esta coisa – entretanto colocava a mão sobre o saquito -, possa ser, possa ser... – Possa ser o quê, senhor A.? Eu vi onde queria chegar, se não podia ser um cancro. – Tenho receio de que possa ser um cancro! – Ó meu amigo, cancro teve o senhor há 28 anos e matou-o com uma “pintarola do caraças”. Aqui, o meu amigo ficou de boca aberta e rematou: - Ah! Eu bem desconfiava. Sabe, quando fizeram isto, não me disseram o que tinha, mas, peço-lhe desculpa por dizer isto senhor doutor, foi coisa que não me tivesse passado pela cabeça na altura. Entretanto, libertou uma orgulhosa gargalhada de satisfação pelo facto de ter sido ele quem matou o cancro e não o inverso. Orgulhoso da proeza, mais uma a somar a tantas outras, já estava a vê-lo nas suas tertúlias familiares e amigas a comunicar a sua vitória sobre um cancro que teve há 28 anos. A conversa não ficou por aqui, aliás é impossível travar a sua sede de conhecimento. – Senhor doutor, peço-lhe desculpa, mas ainda gostava de lhe fazer mais uma pergunta, não se importa, pois não? – Claro que não. Diga lá. – Sou um amante de doces, o meu vício – já não fumo há trinta anos -, é comer biscoitos. Peço-lhe desculpa estar a falar-lhe do meu vício, mas é mesmo um vício, comer biscoitos. A minha nora diz-me que faz mal. – Faz mesmo mal? Mas antes de lhe dar a minha opinião, explicou-me que o culpado foi o avô, pasteleiro e inventor das arrufadas de Coimbra e que fez fortuna com a pastelaria. Disse-lhe que dependia no número de biscoitos. - Oh, só um ou dois por dia. O meu guarda-vestidos – foi mesmo assim, guarda-vestidos -, está cheio de latas e mais latas de biscoitos. Todos os dias escolho uma lata e tiro um ou dois biscoitos. – Se for um ou dois não faz mal nenhum. Coma os biscoitos, mas tem de me prometer uma coisa. – Diga, diga, senhor doutor, faça favor. – Tem de beber água, muita água para não entupir as tripas com os biscoitos. – Ah, sim senhor, vou fazer isso e tomar o xarope para a prisão de ventre todos os dias. O senhor doutor, pode estar descansado, vou fazer isso e depois venho-lhe dizer como me sinto. À saída, para e volta-se para trás, apalpando o saquito com a mão, que se via perfeitamente através das calças alceadas, como se fosse um cowboy canhoto: - Oh senhor doutor, estou tão feliz por saber que matei o cancro, e há 28 anos!

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Zás catrapás! Toma lá uma avaliação!

Está visto que a avaliação é finalmente assumida oficialmente como uma arma de arremesso e uma boa oportunidade para os vingativos acertarem as suas contas. É só passar os olhos pelos jornais e ficamos esclarecidos. A Fenprof avalia a Ministra com um “Não Satisfaz”, o Dr. Ricardo Salgado avalia Marcelo Rebelo de Sousa e o seu comentário sobre a venda da PT com um “Zero”. O Governo, em tempo de grandes apertos financeiros, resolveu de uma penada o problema da atribuição de prémios de desempenho aos dirigentes, exigindo que os que cobiçarem tal distinção têm que se submeter ao veredito dos seus subordinados. É uma forma curiosa de não correr riscos despesistas, pelos vistos o Governo está seguro de qual vai ser o teor da avaliação. Nada de espantar, sabendo-se que uma Ministra veio recentemente alegrar-se publicamente com a saída de um dos seus dirigentes, tal era o mal que ele lhe fazia e ela sem saber como o despachar. Também se vai resolver o problema dos serviços de saúde, talvez mesmo das listas de espera, dos erros médicos e da demora no atendimento, esperem só até estar em pleno o sistema da avaliação dos clínicos pelos doentes! Não passaram o “Tac” nem o antibiótico que eles queriam? Pois terão zero. Vai certamente ser dada formação específica aos avaliadores todos, doentes, funcionários, comentadores de televisão e sindicatos, e mais os que estiverem aí para vir, uma mina de ouro para quem já esteja a postos para decifrar as leis e regulamentos que terão que disciplinar isto tudo.
O pior é que o País também é avaliado, pelas empresas de rating, por exemplo, e essas parece que já sabiam o truque das avaliações, é sempre para baixo, que é para aprenderem!

O estado da retórica

Regressado às lides, depois de três semanas de justas férias dadas aos leitores do 4R, apanhei de chofre com a retórica de Sócrates de apresentar a melhoria de décimas no índice de pobreza como a prova de um melhor estado da nação, como se essas míseras décimas tivessem algum significado estatístico ou substancial.
Retórica tão miserável só revela que o estado da nação já nada mais pode esperar do estado do Governo. Usando tal argumentação, o Governo atingiu o estado do mais completo desespero.
Nenhuma retórica já lhe vale!...

Reformas estruturais: contradição...ou não?

1. “Também analisamos as perspectivas de crescimento em Portugal, não apenas no curto prazo e concluímos que não há provas reais de que as reformas estruturais que o Governo introduziu, gerem uma maior dinâmica de crescimento”.
2. Esta frase “assassina” é de Antthony Thomas, Senior Vice-President da Moody’s, tendo sido extraída das suas declarações a propósito do (duplo) “downgrade” imposto pela agência ao “rating” da dívida pública portuguesa – uma boa notícia, segundo a reacção oficial cá do burgo...
3. Esta frase, para além de outras considerações, parece ser de um inaudito atrevimento, depois de o PM ter afirmado – em princípio para todo o Mundo ouvir/ler – que Portugal foi o País que mais reformas efectuou, nestes últimos 5 anos, no âmbito da União Europeia...
4. À primeira vista, pois, temos aqui uma insanável contradição, entre as proposições de um PM ultra reformador e inabalável optimista e uma agência de rating que parece atrever-se, sem pudor, a negar essas proposições.
5. Mas pode ser que aquilo que à primeira vista parece uma contradição insanável, afinal não seja tão insanável assim ou nem sequer seja contradição. Senão, vejamos.
6. O que Thomas diz é que “não há provas reais de que as reformas estruturais que o Governo introduziu gerem maior dinâmica...”, portanto ele não nega que as reformas tenham sido introduzidas, limita-se a dizer que não há provas dos seus efeitos em sede de crescimento económico...e não só no curto prazo (para que não nos iludamos).
7. Por outro lado, o PM, no seu típico estilo de incontido auto-elogio, apenas se reclama do estatuto de grande reformador, não curando de avaliar os impactos das suas reformas – seria aliás muito arriscado prolongar o auto-elogio para esse terreno...pois teria que acrescentar “vejam o nosso défice externo a cair”, “vejam como a despesa pública não cresce”, “notem como o investimento privado aumenta”, “reparem na saúde financeira das nossas empresas” ,etc,etc...
8. Em última análise, pois, não há contradição entre estas duas declarações, podem ambas conviver alegremente e por muito tempo.
9. De resto bem sabemos que assim é: as reformas estruturais andam por aí a saltitar, quase todos os dias as agências de comunicação se encarregam de as proclamar para gáudio da esquadra “armani”. Quanto aos seus impactos na economia, isso é tema para os habituais pessimistas...

quinta-feira, 15 de julho de 2010

O crepúsculo do Direito?



Leio no Público que o Senhor Provedor de Justiça entregou ontem no Parlamento uma proposta de código de boa conduta administrativa. Nela se contêm, com honras de destaque na notícia, proposições como esta: "Em caso de erro, os agentes públicos devem reconhecê-lo e estar disponíveis para a sua correcção".
Quando as instituições sentem necessidade de escrever em códigos regras desta natureza, não é somente a confirmação plena da crise do dever e da consciência da responsabilidade individual nas sociedades actuais  - de que nos fala Gilles Lipovetsky numa obra que muitos aqui conhecem (O Crepúsculo do Dever - A ética indolor dos novos tempos democráticos, 2ª ed. Dom Quixote, 2004). É acima de tudo um tremendo sinal da profundíssima crise de eficácia do Direito.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Optimismo oficial (luso), Kumba Ialá e Hegel...

1. Parece que a moda do optimismo “contra ventos e marés” está de regresso, a avaliar por entrevista concedida (...) pelo PM ao F. Times em suplemento dedicado a Portugal.
2. Curiosamente, até a decisão da Moody’s de baixar dois “degraus” o rating da dívida pública portuguesa, foi oficialmente recebida como sinal positivo...
3. A partir daqui o que é que não poderá deixar de ser tomado como motivo de optimismo?...Só mesmo um violento terramoto talvez...ou nem mesmo isso?
4. Este episódio do F. Times trouxe-me à memória um outro, de há alguns anos, com outro suplemento, neste caso dedicado à Guiné-Bissau ao tempo em que Kumba Ialá era Presidente.
5. Como habitualmente o suplemento começava com um texto de apreciação geral da situação do País, nesse caso um texto com conclusões devastadoras, de um País em extrema dificuldade e penúria, cuja leitura faria qualquer mortal tremer de angústia caso tivesse de encarar algum risco de investimento no País.
6. O mais curioso é que por baixo do texto do suplemento, na mesma página, aparecia uma imagem sorridente do Presidente Ialá, com o seu tradicional barrete vermelho, subscrevendo uma declaração carregadas de tons optimistas e, claro, convidando a comunidade internacional a investir no País uma vez que esse investimento, assegurava, oferecia as melhores perspectivas de um futuro pleno de rentabilidade!
7. Ao confrontar estes episódios, salvaguardadas as devidas distâncias, parece oportuno citar a observação que Bernard Shaw fez acerca de Hegel: “Hegel estava certo quando disse que o que nós aprendemos com a história é que o homem nunca consegue aprender com a história...”.
8. De facto e neste caso, por muita história que se faça, parece cada vez mais claro que há optimismos que resistem a todas as lições da história...e com os resultados que se conhecem!
9. Uma última nota para dizer que pessoalmente nada tenho contra os optimistas, por mais inveterados que sejam ou se declarem...mas tenho muito contra esse optimismo quando acaba por nos vir ao bolso, em sucessivos aumentos de impostos...bem como por arrastar contínua perda de qualidade de vida de tantos e tantos cidadãos...

"Sabes que podes sempre contar comigo!"

Vai ser a frase que mais vezes sairá boca dos dirigentes da Administração Pública no diálogo com os seus subordinados quando chegar a hora da avaliação daqueles, caso venha a ser aprovada esta medida.

Também se ouvirá:

" - Quando é que apareces lá por casa para provar um pitéu e experimentar a piscina, pá?"
" - Lembrei-me agora do empréstimo que te fiz. Mas não precisas de te preocupar..."
" - Sempre achei que o futuro deste serviço passará um dia por si, meu caro"
" - Se não fosse você, este departamento era uma completa balda"
" - Há dias em conversa com o Director-Geral falei no seu caso. Uma injustiça, o que lhe fizeram!"
" - Estive a ver a informação que me deixou na secretária, ó Antunes. Grande densidade!".
" - Se metade dos funcionários aqui da Divisão fosse como você, Deolinda, podía o Estado poupar o que paga à outra metade..."

(...)

Afinal a notícia da ruína da Estradas de Portugal era uma brincadeira

Ainda bem. Não gostamos de empresas arruinadas e muito menos ruinosas, sobretudo aquelas que pela natureza do produto que colocam no mercado contribuem para o aumento da riqueza nacional, como se sabe ser o caso da produção das Estradas de Portugal, S.A..
A aflição manifestada por recente carta dirigida ao presidente do CA da Estradas de Portugal, SA ao Ministro das Obras Públicas dada a conhecer há poucos dias, afinal não tinha qualquer razão de ser. A partir de uma informação prestada aos media pela própria EP, soube-se hoje que esta empresa está bem e recomenda-se. É até, imagine-se, das poucas em Portugal que se pode gabar de ter um lucro de dezenas de milhões de euros.
Os fornecedores e demais credores da Estradas de Portugal, S.A., exultam. Lendo no Diário Económico que "o lucro da Estradas de Portugal (EP) subiu 39,8% em 2009, face ao ano anterior, para os 74,5 milhões de euros", esperam vir a receber muito em breve o que é seu por direito, dada a boa nova não só da solvência, mas sobretudo da saúde da empresa!
Por outro lado, tratando-se de uma sociedade de capitais exclusivamente públicos, acredito que parte destes lucros revertam a favor do seu único accionista, o Estado, contribuindo assim a EP, positivamente, para o esforço de redução do deficite das finanças públicas, engrossando as receitas. Aliás, se existissem mais umas tantas empresas como esta, estava encontrado o remédio para parte dos problemas resultantes da recorrente falta de meios do Estado. 
Como é que ainda se não lembraram?

terça-feira, 13 de julho de 2010

“Da nobreza e da excelência do sexo feminino”

Certas notícias obrigam-me a fazer associações. Foi o que aconteceu mais uma vez. Uma notícia, “As mulheres vão poder ser bispo na Igreja Anglicana” e um livro. É certo que já podem ser ordenadas desde há alguns anos, mas agora vão ser “bispas”. Claro, confusão e estremeções em certos círculos conservadores.
Acabei de ler, há dois ou três dias, o livro de Cornelius Agrippa, “Da nobreza e da excelência do sexo feminino”. Notável. No entanto, desconfio que Cornelius andou a “dar graxa” a Margarida de Áustria por causa da sua situação financeira. Ele diz que não, que não foram essas as motivações, e no próprio livro! Hum! Desconfio de Cornelius, mas não deixo de considerar que a obra é excelente, um verdadeiro e profundo elogio à condição feminina feito há quinhentos anos. Vale a pena lê-lo. E como estamos a falar da ascensão religiosa das mulheres não resisto a transcrever uma breve passagem:
O homem não é pois, a bem dizer, senão a mais bela obra da Natureza, mas a mulher é a mais perfeita produção de Deus. Por isso é a mulher vulgarmente mais capaz do esplendor divino que o homem. E está amiúde repleta dele, toda resplandecente. É o que se pode ver pela propriedade e pela beleza admirável da mulher. Pois não sendo a beleza outra coisa que o brilho, que o esplendor da face e da luz de Deus, impressa nos seres materiais, e que neles reluz por essa perfeição natural, a que chamamos beleza, dai se deve tirar uma consequência clara, certa, evidente é que Deus, em prejuízo e para rebaixamento do homem, escolheu a mulher, para permanecer nela, e para a preencher mui abundantemente.”
A feminização é uma realidade a todos os níveis. Apesar de ser muito jovem, perspectiva-se - pelo andar da carruagem -, que ainda iremos assistir a fenómenos impensáveis há muito pouco tempo, quanto mais no tempo de Cornelius, embora este grande humanista tivesse previsto coisas que deverão ter seduzido Margarida, obtendo proventos nada desprezíveis, tamanhas eram as suas dívidas. Mas que os homens têm grandes dívidas para com as mulheres, lá isso têm, e no que respeita às igrejas...

Imunidades

No barbeiro, ou melhor, no cabeleireiro de homens, já preparado para o corte mensal (curioso que os meus cortes de cabelo coincidem com os dias dos anúncios ou dos cortes das agências de rating...), assistia na TV ao rocambolesco da entrevista de uma jovem mulher de etnia cigana que explicava o que causou o tiroteio ocorrido ontem entre membros de famílias ciganas. E o que se passou foi que a pobre mulher descobriu que o marido era "homem-sexual", "gay", e não viu outro modo de solução para a desonra que não a separação. Se a infelidade fosse cometida com uma mulher, não havia problema nenhum. Agora assim...

Os sorrisos dos circunstantes naquela barbearia depressa desapareceram quando, perguntada se o tiroteio entre as famílias iria continuar, a jovem cigana respondeu que não, porque a outra família (presumo que a do marido ofensor) "era mais forte", "tinha mais armas".
Isto dito publicamente, num telejornal, para quem quis ouvir.
O bairro está identificado, é em Lisboa. A polícia estava lá e não creio que desconhecesse o que aquela mulher revelou perante as câmaras da televisão.
É aterrador pensar o que pode acontecer quando em Portugal existem pessoas e grupos organizados, identificados ou identificáveis, que possuem verdadeiros arsenais, que anunciam detê-los e já provaram que não  hesitam em usá-los para resolver questões como a que fez as delícias do editor do telejornal e os sorrisos dos clientes da barbearia.
Há algo de profundamente errado na política de segurança deste País, descansado na ideia dos brandos costumes. Oxalá não choremos um dia, amargamente, por algum trágico efeito desta imunidade tacitamente concedida, desta impunidade consentida ou desta incapacidade de o Estado ser Estado, perdido na moleza do discurso politica e socialmente corecto. Oxalá...