Sim, há na sociedade portuguesa quem defenda a prisão perpétua que a Constituição proíbe. Há quem não aceite políticas de inclusão, quem seja contrário aos novos costumes, quem veja nos direitos fundamentais de nova geração uma heresia, quem entenda que devem ser colocados rígidos limites ao multiculturalismo como forma de afastar o que consideram ser ameaça à civilização. Quem combata a globalização em nome da afirmação de nacionalismos e identidades de raça. Há quem julgue, convictamente, que Portugal não deve ser um país aberto ao acolhimento, que a Europa é a nossa desgraça, quem abnega o parlamentarismo, quem julgue a opinião livre um abuso. Quem gostasse de ver o sistema político transformado num conjunto de instituições de poder musculado. Estão entre nós, fazem parte da sociedade que nos integra, ouvimo-los nos cafés, nas escolas, nos nossos locais de trabalho, às vezes em nossas casas. Poucos? Muitos? Alguns. Mas quase todos sem verdadeira representação no idiossincrático espetro luso de mediação partidária.
Esta ausência de grupo representativo que enquadre estes portugueses tem feito mal aos partidos tradicionais do centro e da direita pois têm sido evidentes as tentativas de disseminação no seu seio daquelas ideias, mostrando-se irresistível a tentação de atrair o capital eleitoral gerado pelo descontentamento de gente que não se revê nos sincretismos ideológicos ou nos compromissos pragmáticos em que vai assentando a vida política portuguesa.
Não sei se é golpe publicitário para promoção pessoal, mas as parangonas anunciam a intenção de criar partido político defensor de pelo menos algumas daquelas ideias por parte de quem se fez notado por as defender. Estranhamente – ou não! – são muitos os sobressaltos por este anúncio. Eu aplaudo. Aplaudo desde logo porque acredito na força da razão, crendo firmemente que parte daquelas ideias explora descontentamentos e frustrações, exacerba sentimentos de quem não encontra resposta num sistema correto na afirmação dos valores mas falhado na sua vivência. Mas aplaudo também por estar convencido que o surgimento de um partido que reflita outras maneiras de ver o mundo, liberta o centro político das peias e equívocos ideológicos que o têm contaminado. Aplaudo porque contribuirá para mostrar que o equilíbrio e a moderação não dependem de uma esquerda sumamente hipócrita nos valores que afirma mas que não pratica, para mais apoiada no poder por uma extrema-esquerda que neles não acredita, constituída por gente bem instalada, professores de utopias caras cuja preço a pagar será fatalmente cobrado às gerações que aí vêm.
Portugal sempre beneficiou da preponderância da moderação e da liderança por gente inteligente, sensata e equilibrada. Para isso importa que se revelem e afirmem os extremos. Que não se entrincheirem. A criação de um partido à direita da direita atual é, por isso, virtuosa. E não há que temê-la. Pelo contrário.
2 comentários:
Ultimamente têm surgido propostas de criação de novos partidos, algumas delas como erupção de arrogância desprovida de sentido. Há nessa criação, possível cisão ou cisma, quase “vendetta”, sem que se estribe em ideologia semelhante à que o Dr. José Mário Ferreira de Almeida aqui tão bem aponta. Há, nestes casos, um não sei quê de ruptura bravia e elementar, possivelmente em resultado de amuos não ideológicos (que seriam curiais), criando-se uma espécie de patriarcas, cujo peso político resulta de algumas intervenções nos media. É com estes que tais que se pretende encher o espectro partidário português?
Como é lógico e razoável, não digo que sejam todos os casos um caso único; nem aponto formações próximas ou futuras neste âmbito, muito embora me pareçam resultado do que eu escrevi antes.
Onde se encontra a ideologia? O alinhamento à direita ou à esquerda? Forma-se um partido para formalizar retalhos de alteração constitucional, tais a da condenação perpétua? Ou simplesmente para se saber de quantos amigos e indiferentes se recolhem as assinaturas atinentes à formação?
“Venham eles”, sim, concordo plenamente consigo. Não surjam, pois, como impulsos transvertidos de mudança, quando se formam dentro da mesma linha política do partido que se abandonou para formar um outro. Lá diz o rifão: “não pode o corvo ser mais negro que as asas”.
Que outra coisa não seja, julgo que o aparecimento a granel e a trouxe-mouxe de formações partidárias, não resolve os problemas essenciais de um país. Pelo andar da carruagem, não me admira que possa surgir um partido á direita da direita actual
De qualquer forma, fez bem fazer esta peça. Se teve por fim oxigenar a cidadania, sacudir a melancolia e modificar o “status quo” político, fica-lhe bem empregue este seu trabalho. Parabéns.
Santos Costa
1.- Os denominados “populismos de direita” têm tido sucesso por três razões: a sobranceria moral da gente que domina literalmente o discurso político há mais de trinta anos (conceitos de “pessoa melhor” apareceram nas campanhas de Clinton, Haddad, p. ex.), a pretensa universalidade de razões de alguns (o politicamente correcto, p. ex.), e o facto de não se reconhecer em qualquer esquerda projecto.
2.- Em Portugal, a extrema direita não vai longe porque é país pobre (não há fascismos em países sem trabalho/produtividade/riqueza) e sem qualquer inteligência colectiva (mobilização de uma parte da sociedade civil em torno de projectos (à esquerda ou à direita): como no sec. XX na década de 50, ou em 1975.
3.- Ora, a riqueza da discussão (o quê, e nunca o "quem", ou o "estado de alma"), a cultura e a menor paroquialidade, são água para o cultivo saudável da democracia.
4.- tudo muito bonito, mas perante uma sociedade civil que já deu maiorias absolutas a gente fútil e sem alcance do tempo (intriguismo, tacticismo, visão anti-cultura)... só tem virtude, uma única: pobres, pobrezinhos, ...mas com nadólogos a governar e chefiar o país.
A deficiência mental colectiva também tem vantagens...
No mais, aplaudo o signatário.
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