Eu não percebo nada de economia nem sei como é que se gerem expectativas, que é uma forma mais elaborada de dizer que é preciso suscitar e manter a confiança das pessoas na actividade económica.
Mas o que sei, como cidadão que procura gerir os seus haveres com alguma sensatez, é que não se percebe mesmo nada dos sinais que recebemos.
Tudo isto começou com uma bolha lá longe, qualquer coisa que tinha que ver com o imobiliário na América, a valorização sucessiva das casinhas a permitir créditos cada vez maiores, até que um belo dia alguém gritou o rei vai nu, isto é tudo inventado, e pronto, o desmoronar com estrondo que se seguiu.
Em simultâneo, o preço do petróleo chegou a picos históricos em poucos meses, e o preço dos bens alimentares deu o alarme logo atribuído à escassez dos produtos, seja por causa das energias limpas, seja lá pelo que fosse.
Diziam os entendidos que era o fim da era da energia barata e dos alimentos ao preço da chuva. Frio, fome e escuridão, ao menos na próxima década, era mais que certo.
Passou-se então para a crise financeira, os bancos vendiam ou compravam valores que não valiam nada, de ficção em ficção passou-se de milhões de lucros e de exemplos de sucesso a bolsas vazias e a gestores perseguidos.
Depois seguiu-se o terramoto que ainda abana violentamente todo o sistema bancário, não havia crédito, não por falta de dinheiro mas por falta de quem o quisesse emprestar por não se saber se quem pedia tinha ou não condições para pagar.
Grande balbúrdia, cenários de catástrofe, a América a nacionalizar, a Europa a socorrer, de casos especiais passou-se a quase todos, já ninguém se lembra que o petróleo afinal está a preços históricos mas na linha de baixo, e que afinal há excesso de produção de matérias primas, que coisa estranha, o trigo e o milho a crescerem assim de um dia para o outro e ninguém sabia.
O que vale é que todos se mobilizaram para acorrer à desgraça. O pobre cidadão já habituou o ouvido ao anúncio de números astronómicos que nem consegue bem contabilizar na escala conhecida, milhares de milhões são biliões? Centenas de milhões soam mais ou menos que mil milhões? E as linhas de crédito são dinheiro ou só promessas?
Os governos lançam das alturas rios de dinheiro a ferver, como defensores de castelos a combater os invasores, mas de onde vem tanto dinheiro, para onde se escoa que não se sente?, os bancos não descolam do seu mutismo, as empresas agradecem todos os dias na televisão os apoios fantásticos que as irão sustentar em pé, mas tudo isso alterna com outros números astronómicos, milhares e milhares de despedimentos, centenas de empresas a fechar, milhões de desempregados no mundo, só na América, talvez na Europa, enfim a globalização também juntou os números, é impossível fixar a que zona se referem tantos euros a rodar e tantos pobres a crescer.
Então e o pobre cidadão?, aquele de quem esperam que vá ao banco pedir emprestado, que compra ou venda a sua casinha, que crie compromissos, enfim, que se mova, caramba, senão isto para!
Esse pobre cidadão ouve falar um dia em menos crescimento, no outro em estagnação, logo a seguir em recessão e a última novidade é a deflação, tudo acompanhado de todas as trombetas da desgraça.
E, o que é pior, tudo desmente o que foi garantido, jurado juradinho bem na véspera, quando estoiraram os foguetes das soluções concertadas, das políticas comuns, das decisões históricas que iam salvar o mundo do dia do Juízo Final.
Os juros que eram tão meticulosa e cientificamente calculados agora parecem um cão louco a morder a própria cauda. E estão tão baixos que nem vale a pena por o dinheiro no banco, não rende nada. Mas também não se pode comprar nada, porque os preços vão descer. Nem se pode consumir, porque o futuro é incerto, o melhor é mudar de hábitos, a começar já este Natal, não compre, não olhe, compre, leve, é barato, não preciso, ajude o comércio, dê aos pobres, poupe, gaste, aplique, desconfie, contrate, despeça, arrisque, prudência…
O que eu não percebo é que expectativa é que afinal querem gerir.
Mas o que sei, como cidadão que procura gerir os seus haveres com alguma sensatez, é que não se percebe mesmo nada dos sinais que recebemos.
Tudo isto começou com uma bolha lá longe, qualquer coisa que tinha que ver com o imobiliário na América, a valorização sucessiva das casinhas a permitir créditos cada vez maiores, até que um belo dia alguém gritou o rei vai nu, isto é tudo inventado, e pronto, o desmoronar com estrondo que se seguiu.
Em simultâneo, o preço do petróleo chegou a picos históricos em poucos meses, e o preço dos bens alimentares deu o alarme logo atribuído à escassez dos produtos, seja por causa das energias limpas, seja lá pelo que fosse.
Diziam os entendidos que era o fim da era da energia barata e dos alimentos ao preço da chuva. Frio, fome e escuridão, ao menos na próxima década, era mais que certo.
Passou-se então para a crise financeira, os bancos vendiam ou compravam valores que não valiam nada, de ficção em ficção passou-se de milhões de lucros e de exemplos de sucesso a bolsas vazias e a gestores perseguidos.
Depois seguiu-se o terramoto que ainda abana violentamente todo o sistema bancário, não havia crédito, não por falta de dinheiro mas por falta de quem o quisesse emprestar por não se saber se quem pedia tinha ou não condições para pagar.
Grande balbúrdia, cenários de catástrofe, a América a nacionalizar, a Europa a socorrer, de casos especiais passou-se a quase todos, já ninguém se lembra que o petróleo afinal está a preços históricos mas na linha de baixo, e que afinal há excesso de produção de matérias primas, que coisa estranha, o trigo e o milho a crescerem assim de um dia para o outro e ninguém sabia.
O que vale é que todos se mobilizaram para acorrer à desgraça. O pobre cidadão já habituou o ouvido ao anúncio de números astronómicos que nem consegue bem contabilizar na escala conhecida, milhares de milhões são biliões? Centenas de milhões soam mais ou menos que mil milhões? E as linhas de crédito são dinheiro ou só promessas?
Os governos lançam das alturas rios de dinheiro a ferver, como defensores de castelos a combater os invasores, mas de onde vem tanto dinheiro, para onde se escoa que não se sente?, os bancos não descolam do seu mutismo, as empresas agradecem todos os dias na televisão os apoios fantásticos que as irão sustentar em pé, mas tudo isso alterna com outros números astronómicos, milhares e milhares de despedimentos, centenas de empresas a fechar, milhões de desempregados no mundo, só na América, talvez na Europa, enfim a globalização também juntou os números, é impossível fixar a que zona se referem tantos euros a rodar e tantos pobres a crescer.
Então e o pobre cidadão?, aquele de quem esperam que vá ao banco pedir emprestado, que compra ou venda a sua casinha, que crie compromissos, enfim, que se mova, caramba, senão isto para!
Esse pobre cidadão ouve falar um dia em menos crescimento, no outro em estagnação, logo a seguir em recessão e a última novidade é a deflação, tudo acompanhado de todas as trombetas da desgraça.
E, o que é pior, tudo desmente o que foi garantido, jurado juradinho bem na véspera, quando estoiraram os foguetes das soluções concertadas, das políticas comuns, das decisões históricas que iam salvar o mundo do dia do Juízo Final.
Os juros que eram tão meticulosa e cientificamente calculados agora parecem um cão louco a morder a própria cauda. E estão tão baixos que nem vale a pena por o dinheiro no banco, não rende nada. Mas também não se pode comprar nada, porque os preços vão descer. Nem se pode consumir, porque o futuro é incerto, o melhor é mudar de hábitos, a começar já este Natal, não compre, não olhe, compre, leve, é barato, não preciso, ajude o comércio, dê aos pobres, poupe, gaste, aplique, desconfie, contrate, despeça, arrisque, prudência…
O que eu não percebo é que expectativa é que afinal querem gerir.
6 comentários:
Suzana, este é o mais triste, ou para utilizar os seus termos, o mais desesperante dos cenários. É que não há expectativas para gerir. As análises, os discursos e as medidas (sobretudo estas últimas) parecem-me reveladoras do maior desconcerto. O Professor Massano que me perdoe o exemplo clínico, mas a situação da economia é semelhante á daquele doente afectado por uma profunda infecção bacteriana. Para a debelar vão-se experimentando vários antibióticos. Sem que porém se vejam melhoras no doente, que a tudo vai assistindo sem saber do amanhã.
Os médicos vão discutindo entre si, alguns com vísivel gozo intelectual, causas e sintomas. Enquanto isso o doente definha, e mesmo que sobreviva, não sabe como será a sua vida futura.
Ferreira de Almeida, o primeiro exemplo de que me lembrei foi o de comparar com uma doença, mas a que me ocorreu foi bem pior do que a que apontou, de modo que resolvi adoptar um tom menos pessimista...Lamentável que não se tenha insistido na prevenção e que se tenham negligenciado os sinais.
Suzana
O mundo está virado do avesso, totalmente desconcertante. Não admira que esteja instalada a total desconfiança em relação a tudo e a todos, com especial direcção para os governos e a classe política.
No meio de tantas descobertas que ninguém imaginava fazer, casos que a ficção mais vanguardista não vislumbrava que fosse possível acontecer, como pode o cidadão comum acreditar no que quer que seja?
Os governos são apanhados em cada minuto a "mentir" porque em cada minuto uma novidade surge, uma previsão foi por água abaixo, uma expectativa ontem anunciada já foi ultrapassada pelos recentes acontecimentos, a mentira transforma-se em verdade à velocidade da luz e a verdade custa a explicar e uma nova verdade é preciso rapidamente descobrir. Enfim, é uma verdadeira descida ou subida ao "inferno"!
Perdoe-me cara Drª. Suzana, o atrevimento de vir "meter" a colherada em assunto tão sensível e específico.
Na otica de cidadão comum, mas tambem trabalhador, pagador de impostos, parte integrante de uma sociedade e, eleitor votante, considero tambem que vivemos uma fase de absoluta desorientação, desorganização social, económica, financeira e governativa.
Tal como demonstra no seu texto "até que um belo dia alguém gritou o rei vai nu, isto é tudo inventado, e pronto, o desmoronar com estrondo que se seguiu" e
"Os governos lançam das alturas rios de dinheiro a ferver, como defensores de castelos a combater os invasores", tambem verifico que as grandes crises se iniciam "sempre" quando alguem grita "o rei vai nu!", é como se uma forte descarga electrica atingísse aquela sociedade e todos de um momento para o outro começassem a sentir o chão a fugir-lhes debaixo dos pés, sem terem solo fixe à vista para se protegerem. Esta sensação descamba naturalmente na consequente descapitalização dos valores humanos. Assitimos depois a um fenómeno interessante: essa descapitalização não se observa com a mesma intensidade nem da mesma forma homogenea por toda a sociedade. Em pontos que anteriormente eram aqueles que se identificavam como os mais "atrasados", menos desenvolvidos, mais ostracizados, onde as novas tecnoligias não tinham ainda ganho espaço, em suma, aqueles estratos da sociedade mais genuinamente rurais, verificamos com alguma surpresa que são os que mais consistentemente emergem deste mar de vagas alterosas. E tudo porque o capital humano que os constitui se mobiliza, se concerta e age.
A minha conclusão é que o capital humano é sempre a solução para toda e qualquer crize, nesse sim, nesse é que os governos têm de apostar, com projectos concretos, muita verdade e olhos-nos-olhos.
Cara Dra. Suzana Toscano:
Faz um retrato excelente da estupefacção que perpassa no espírito dos portugueses em geral.
Depois deste terramoto ficámos com a sensação de que nada é seguro, e até as nossas referências de estabilidade social nos suscitam dúvidas. Os que ontem falavam e a bolsa tremia, estão hoje mudos e quedos, mais parecem “voyeurs” à espreita para depois, com a sua auréola de profetas, contar-nos aquilo que já sabíamos…
Eu pouco ou nada sei de “empirismo”, mas estou tentado a tirar uma licenciatura nesta área, pois está visto que promete!…
Cara Drª. Suzana:
Acho muito interessante o facto de procurar fazer uma análise dos tempos presentes baseada nas tão propaladas expectativas e na forma como nos tentam “vender” esse magnífico conceito que os economistas inventaram para justificar os factores de incerteza que deitam por terra as suas análises e projecções – “a Gestão das Expectativas”.
Se me permite, eu penso que seria muito interessante analisar este conturbado período numa perspectiva do modelo social que deve ser adoptado pela nossa sociedade e que devia ser objecto de uma profunda reflexão política por parte dos nossos eleitos e em quem a generalidade da população possa encontrar uma referência, uma farol, um projecto, enfim alguma “confiança” que não se traduza em paliativos e analgésicos para aliviar o sofrimento do presente, mas sim, na verdade, na honestidade e acima de tudo nos valores que ajudem a construir os novos alicerces de um futuro que necessita de ser reconstruido.
A análise que proponho tem de passar obrigatoriamente por um debate mais amplo que questione os modelos liberais e neo-liberais em que o “mercado” é o centro de gravidade e em que os valores fundamentais são a ganância e o lucro a qualquer custo assente num sistema financeiro que usa o cidadão como instrumento para atingir os objectivos de um pequeno grupo de grandes interesses à escala planetária.
Agora todos sabemos que na génese da concepção destes modelos estava previsto a existência de mecanismos de regulação que deviam salvaguardar quaisquer danos que fizessem perigar o sistema e muito eufemísticamente salvaguardar os interesses dos cidadãos. Infelizmente ninguém se lembrou, ou pior, não interessava lembrar que os homens não são seres perfeitos que a ganância, a falsidade e a desonestidade florescem sempre que as condições o propiciam e os mesmos que hoje fazem as Leis e tomam decisões em nome de um bem comum, amanhã são os interessados nos resultados das decisões e das Leis aprovadas.
Depois de reler estas palavras que escrevi acabei perguntando a mim mesmo: E qual a solução preconizada?
Em primeiro lugar gostaria de deixar claro que o modelo liberal tem muitas qualidades e que dos conhecidos é o que melhor responde à evolução da sociedade do ponto de vista humano e social. Partindo desta base ideológica, penso que todo o sistema político deve ser reformulado com base nas seguintes premissas:
- Uma reforma do sistema político de forma a aproximar os eleitos dos eleitores.
-Definição de um conjunto de regras e princípios deontológicos para todos os titulares de cargos públicos mais transparentes e com consequências penais e criminais agravadas para os prevaricadores.
-Uma redefinição do sistema financeiro em que não seja possível juntar as que apostam em produtos de alto risco e especulativos com as de referência que apostam em crescimentos sustentados e alicerçadas na economia real.
-Informar e responsabilizar os investidores dos riscos envolvidos – não é mais sustentável que investidores recolham os benefícios de altos dividendos em fases ascendentes dos mercados e quando existem quebras estas sejam garantidas à custa dos cidadãos através dos seus impostos.
-Revisão e reforço dos mecanismos de regulação dos vários sectores da economia de forma a antecipar desvios e comportamentos que comprometam o sistema – estas medidas devem ser coordenadas e implementadas ao nível nacional e mundial.
-Procura de um novo modelo de apoio e coesão social que apoie efectivamente quem precisa e não crie condições para fomentar a inactividade e a subsidio-dependência a que uma crescente camada da sociedade se vai acomodando.
Com tudo isto, o que eu pretendo dizer é algo que à primeira vista pode parecer utópico com os protagonistas de hoje, mas que será certamente uma das poucas alternativas que temos para rapidamente podermos encarar o futuro dos nossos filhos e netos com alguma esperança e mais importante que tudo, podermos viver com dignidade numa sociedade justa e humanizada.
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