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quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

ENVC: Grande pessegada em perspectiva?

1.Tive desde logo a percepção (disse-o a algumas pessoas das minhas relações) de que o Governo actual cometeu um sério erro, quando logo nos primeiros dias de funções resolveu recuar em relação à decisão que já havia sido tomada pelo anterior executivo no sentido de efectuar um significativa operação de “downsizing” na estrutura dos ENVC...
2....tendo cedido face à onda de contestação que envolveu as habituas forças vivas da cidade de Viana do Castelo, que não queiram ver afectada, num cabelo que fosse, uma empresa que pertence ao “património cultural” da cidade mas que só subsiste se puder contar com a generosa contribuição dos nossos impostos...
3. O plano que o anterior CA da Empresa já tinha aprovado e recebido chancela ministerial, reduzia os efectivos da empresa em qq coisa como 750 pessoas, ficando com uma dimensão muito mais pequena e custos operacionais muito reduzidos, compatível com o baixíssimo nível de actividade que hoje mantém...
4.Interroguei-me na altura sobre as razões do recuo do Governo, que não consegui perceber uma vez que se tratava de uma decisão tomada, obviamente imputável ao executivo anterior, o novo Governo teria apenas que dizer tratar-se de uma decisão já tomada, que certamente tinha sido devidamente estudada e pela qual o CA ainda em funções respondia.
5.Os meses passaram, foram publicamente alvitradas muitas hipóteses de solução, mas ao cabo e ao resto parece que nenhuma solução em concreto foi possível estruturar e hoje surgem novamente notícias que dão conta da situação desesperada da empresa e da necessidade de, urgentemente, o Estado nela “enterrar” (é o termo mais apropriado) mais € 57 milhões de Euros, dos quais € 37 milhões em capital social e mais € 20 milhões em injecção de tesouraria pura (donativo? indemnização compensatória? empréstimo da inevitável CGD com garantia do Estado?) para que a empresa não caia em ruptura de tesouraria já em Janeiro...
6.Os números divulgados são elucidativos:
(i)Passivo de € 263 milhões no final de 2011 (era de € 240 milhões em final de 2010 e entretanto o Estado deve lá ter aplicado, a fundo perdido, mais alguns milhões sem o que o passivo certamente já estaria próximo de € 300 milhões);
(ii)Prejuízos de exploração de € 41 milhões em 2011;
(iii)Encomendas reduzidas a € 20 milhões, há um ano seriam de € 40 milhões;
(iv)Capitais próprios negativos de € 96 milhões, isto admitindo que a valorimetria dos activos merece alguma credibilidade, a situação pode até ser bem pior...
7.Pelo caminho ficou a história rocambolesca de um ferry que os Açores rejeitaram, que depois de várias tentativas parece que mais ninguém quer, e que provavelmente ficará a apodrecer nos ENVC...mas que terá custado à empresa a módica quantia de € 57 milhões!...
8.O porta-voz da Empordef, Holding estatal que controla esta empresa, admite agora muito timidamente algumas hipóteses de solução deixando entender que não serão muito mais do que quimeras...e pelo caminho volta a colocar “em cima da mesa” a hipótese de encerramento ou de quase encerramento acima referida mas que o Governo há 6 meses não quis considerar, tendo cometido, muito provavelmente, um erro de palmatória...
9.ENVC: uma grande pessegada em perspectiva para a rentrée do novo ano?

18 comentários:

Pável Rodrigues disse...

Foi sem dúvida a primeira hesitação do Governo, ou melhor dizendo, o primeiro sintoma de que o aproveito oportunístico de situações que rendessem (?) popularidade não seria enjeitado, independentemente dos interesses económicos e financeiros em causa. Não me lembro de alguém na altura ter levantado o problema, e foi pena. Mas, mais vale tarde do que nunca. As minhas felicitações ao autor do post.
Já agora aproveito para trazer à colação algo que ultimamente tenho detectado na governação e que me traz deveras preocupado.
Será impressão minha, ou o Dr. Passos Coelho está a criar na figura de M. Relvas um sucedâneo do Dias Loureiro do tempo de Cavaco Silva? Depois da gestão do processo RTP, entrega-lhe agora a gestão de outro processo sensível e milionário, como é caso do Plano de Ordenamento para a Margem Ribeirinha! Aqui há gato...mas oxalá eu esteja enganado.

Tonibler disse...

A Empordef também deve ter uns números consolidados engraçados. Mais que um grupo empresarial, aquilo é um aterro....

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Dr. Tavares Moreira
A despesa já estava feita! Também me interroguei sobre o recuo. Ainda assim pensei que a viabilidade económica da empresa poderia passar por parcerias estratégicas que garantissem uma carteira de encomendas, mas com implicações ao nível do redimensionamento da estrutura de custos. Muito provavelmente este trabalho já teria sido feito, mas sem resultados positivos.
Não vejo como podem os contribuintes continuar a pagar impostos para manter uma empresa afundada em custos e dívidas que não tem futuro.

Joao Jardine disse...

Caro Tavares Moreira

A questão fulcral que os números financeiros reflectem encontram-se, precisamente, no ferry que foi rejeitado por todos.
O ferry, de acordo com os argumentos do comprador inicial não cumpria o básico do caderno de encargos em quase dois nós horários, de velocidade de cruzeiro.
Pode parecer pouco,( não chegam a 4kms hora) mas fazia toda a diferença para o armador, dado que sem esse requisito não conseguia cumprir o trajecto inter ilhas de modo a ser comercialmente rentável.
Quando um estaleiro não consegue "fazer" um casco adequado, algo anda mal na "alma" do mesmo.
Por isso, não me parece que estamos perante uma "pessegada", mas diria antes, perante uma grande "rolhada".
Ora, como sabe, a rolha flutua mas, infelizmente, não nada.....
Cumprimentos
joão

Wegie disse...

Enfim, citando o Camarada Duarte Marques: ‘Chegámos ao fim do ano mais importante dos últimos tempos e entramos no ano mais decisivo da próxima década.’

Tavares Moreira disse...

Caro Pavel Rodrigues,

O mais provavel é que continuemos a não ouvir falar deste tema - pelo menos nos areópagos do regime - pois ninguém quererá dizer que o rei vai nú...
Uns por uma razão, os outros por outra, todos estarão unidos na contemplação beatífica de mais uma indescritível hemorragia de dinheiros públicos...

Caro Tonibler,

A própria denominação Empordef sugere algo de vocacionado para as pessegadas e o subsequente consumo de fundos públicos...Emp(empresas) or (ordinariamente)def (deficitárias) - não será?

Cara Margarida,

A minha querida amiga não vê como, eu tb não vejo como, tenho a certeza que o Tonibler tb não vê como, mas a verdade, a santa verdade é que continuamos ap pagar para manter estes elefantes brancos...e se protestamos muito ainda poderemos ser suspeitos de atentar contra a sensibilidade social...

Caro João Jardine,

O episódio do ferry é um hino à incompetência e à irresponsabilidade...
E o ferry lá vai ficar para a posteridade, uma relíquia industrial...
€ 57 milhões lançados ao mar...sem retorno!...

Anónimo disse...

Caros Amigos,

Antes de mais concordo em pleno com o nosso anfitrião Tavares Moreira nas acepções que faz quanto aos ENVC. A decisão do actual governo não tem pontas por onde pegar.

Agora o ferry. O erro original foi ter-se acometido aos ENVC a construção dum ferry de passageiros. Há 40 anos que os ENVC não se metiam na construção de navios de passageiros. A bagagem técnica para isso já se foi há muito e, por isso, não tiveram alternativa senão comprar o projecto a um construtor russo. Ora, entre falhas do projecto original e incapacidade técnica dos ENVC para as solucionarem deu no que deu. Mas, enfatizo, o erro original foi ter-se posto os ENVC a construir um ferry de passageiros. É muito certo que tanto um ferry como um navio para carga geral, ambos flutuam. A construção e o que se requer de ambos é que é muito diferente e os ENVC hoje em dia não têm a bagagem técnica para desenhar e construir navios de passageiros.

Tavares Moreira disse...

Caro Zuricher,

Quando diz que o erro original "foi ter-se posto os ENVC a construir um ferry de passageiros", duas coisas pelo menos ficam por esclarecer:
- Quem é que tomou essa decisão uma vez que não fui eu nem, presumo, o caro Comentador (muito menos o Tonibler)e porque é que essa decisão foi tomada;
- Porque "carga d'água" os ENVC, sabendo que não estavam preparados para tal tipo de obra, a aceitaram? Por desespero típico do inactivo ou sub-ocupado?
Se nos puder ajdar a decifrar estes pontos, seria excelente!

Fartinho da Silva disse...

Caro Tavares Moreira,

Não há problema nenhum. Se algo correr mal, cortam-se os salários aos funcionários públicos, as reformas a quem não trabalhou no sistema financeiro, aumentam-se os impostos e cobram-se portagens nas passadeiras obrigatórias.

É o mundo novo da irresponsabilidade, que o diga o outro que está a estudar em Paris.

Tonibler disse...

Caro Fartinho,

então a asneira não é toda feita no estado? Pois que fique toda no estado. Do dinheiro que o país DEVE dar para o funcionamento do estado, o estado que faça a gestão da melhor forma que souber. Se entender construir navios, constrói, se quiser pagar salários, que pague.

Tavares Moreira disse...

Caro Fartimho da Silva,

Num ponto tenho de lhe reconhecer razão: se tem de haver dinheiro para tapar buracos como os dos ENVC e quejandos, então pode não chegar para pagar aos funcionários públicos e, nesse caso, não haverá outro remédio que não seja reduzir-lhes os salários...
Noutro ponto não lhe posso dar razão:pelo menos as reformas dos empregados da CGD, que pertencem como sabe ao sector financeiro, vão ser laminadas em condições idênticas às dos funcionários públicos...
Daí que não se entenda a sua referência às "...reformas a quem não trabalhou no sistema financeiro", se as deste tb são afectadas...

Anónimo disse...

Caro Tavares Moreira, do que me lembro do assunto, a entrega da construção do ferry para os Açores aos ENVC foi uma questão meramente política motivada pela falta de trabalhos dos estaleiros. Como não tinham trabalho, pois mandaram-nos fazer qualquer coisa e por fim o resultado foi o que se viu. Do outro lado da moeda está a posição dos ENVC que aceitaram o encargo (não sei sequer se o CA dos ENVC teria margem de manobra para outra resposta) precisamente pelo que aponta, o desespero da inactividade.

São decisões políticas com custos muito altos e que não são mais do que empurrar com a barriga o inevitavel encerramento. Nada, aliás, que não tenha sido já visto noutras empresas, enfim...

Fartinho da Silva disse...

Caro Tavares Moreira,

Não me refiro apenas ao corte dos salários, mas também aos impostos. A carga fiscal é avassaladora.

Refiro-me à transferência ruinosa (mais uma) das pensões da banca para a segurança social.

Fartinho da Silva disse...

Caro Tonibler,

Acho que só leu uma parte do meu comentário...

L'Avvocato disse...

Caro Tavares Moreira,

Gostaria de o desafiar a fazer um post em que abordasse o que no meu ponto de vista é o grande problema da crise na Europa e USA e que muito pouca gente parece realmente interessada em discutir e muito menos em resolver: modelo económico, relações de comércio mundial e mercados financeiros globalizados.

Falo obviamente do que é do meu ponto de vista uma globalização em sentido único, ou seja, tudo de bom para China e afins (Brasil, india, e outros, grandes multinacionais e mercados financeiros) e tudo de mau para Europa e USA (populações e economia real).

Se não for pedir muito gostaria que abordasse alguns pontos que me parecem pertinentes debater (á primeira vista podem parecer radicais mas cheira-me que chegaremos lá mais cedo do que muitos imaginam):

- relação comercial com a China e afins (taxas, barreiras alfandegárias, subsidiação de empresas e matérias primas, direitos de trabalho, desrespeito por patentes e trademarks, espionagem industrial).

- mercados financeiros: investimento vs especulação (taxação de operações, fim do short-selling, impor apenas compras a 1, 6 e 12 meses, dividendos por antiguidade de investimento, fim dos mercados de futuros e intermediação de matérias primas)

- offshores (para quê a sua manutenção ?)

- limitar a banca á sua actividade de base (banca de retalho) e proibir que detenham quaquer tipo de posição em outro segmento de actividade.

- modelo social europeu vs paises de 3º mundo (o benchmark terá de ser a China como modelo social e económico ao qual nos temos que adaptar ou o contrário ?).


Aguardo ansiosamente o seu comentário.

Melhores Cumprimentos

Tavares Moreira disse...

Caro Fartinho da Silva,

Quanto ao nível avassalador da carga fiscal, estamos absolutamente de acordo.
O País tem de criar condições para uma redução da carga fiscal sobre os rendimentos, o mais rapidamente possível, sob pena de a economia afundar sem remédio nem retorno...
Em 2015, que terá sido a meta indicada pelo PM se estou bem recordado, é muito tarde na minha opinião: se não puder ser antes, que comecem a reduzir em 2014 concretamente na lei do O/E para esse ano, ou seja com efeitos nas expectativas já em 2013), mas não mais tarde...
Quanto às transferências de fundos de pensões da banca e de outros para a alçada da Segurança Social, se é ou não ruinosa não indaguei (e para quem?)...
O que sei é que essas transferências representam um retrocesso absolutamente lamentável no movimento de diversificação das formas de segurança social de que há alguns anos (cerca de 20) fui um dos promotores e incentivadores...

Caro Avoccato,

Lamento não poder satisfazer a sua ansiedade por agora; os temas que sugere são deveras interessantes, provavelmente teremos divergências profundas de opinião sobre alguns desses temas (o que é sempre salutar), mas só para 2012 é que poderei aceitar a sua encomenda uma vez que já tenho uma agenda de trabalho bloguístico e profissional extremamente carregada para as próximas semanas...
Espero merecer a sua compreensão...

L'Avvocato disse...

Caro Tavares Moreira,

Aguardarei com toda a paciência.

Até lá boas entradas e os sinceros desejos de um 2012 cheio de sucesso.


Cumprimentos

Tavares Moreira disse...

Caro L'Avvocato,

Agradeço e retribuo seus amáveis votos para o Novo Ano.
Tal como tenho dito a alguns amigos, contentar-me-ei com os desejos de que cheguemos ao final de 2012 salvos e relativamente sãos...
Pedir mais pode ser quimérico ou, quem sabe, sujeito a tributação...