Número total de visualizações de páginas

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Diz-nos que é economista...

António Mendonça
... e veio explicar-nos que sabe o que anda a fazer.
No meio de tanta competência será que ainda resta algum bom senso ao Sr. Ministro das Obras Públicas ?

O ataque especulativo

Pronto, Sócrates arrumou o assunto, hoje, no Parlamento. O que houve foi um ataque especulativo.
A economia está a crescer. O que houve foi um ataque especulativo.
O desemprego subiu para 10,5%. O que houve foi um ataque especulativo.
O programa de investimentos públicos irá prosseguir. Porque o que houve foi um ataque especulativo.
A política seguida com vista à recuperação económica e luta contra o desemprego está correcta. Não crescemos ? Mas o que houve foi um ataque especulativo.
Não temos problema nem com o défice, nem com a dívida pública. O que houve foi um ataque especulativo.
Os credores aumentam as taxas de juro? O que houve foi um ataque especulativo.
Na quarta-feira, depois da conversa de Sócrates com Passos Coelho, fiquei optimista. Também eu fui vítima de forte ataque especulativo.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Adivinhem

De manhã o ministro das finanças anunciou que a gravidade da situação obrigava a reponderar os grandes investimentos públicos e a agravar (de novo) os impostos. Pela voz do ministro das obras públicas soubémos ao final da tarde que a única reavaliação dos mega investimentos programados é a de alguns troços da chamada auto-estrada do centro. O resto é para continuar e, na opinião do ministro, tudo é investimento indispensável e virtuoso.
Adivinhem qual das medidas que o ministro das finanças disse estar a ponderar se vai mesmo concretizar...

Uma mensagem de esperança...


- Centro Histórico - Salvador da Bahia -

Salvador da Bahia é uma cidade plena de beleza, a história, as gentes e a natureza fazem dela um local mágico. O “Brasil dos Portugueses” foi aqui que começou em 1549, quando o seu primeiro governador, Tomé de Sousa, chegou a Salvador com os seus primeiros colonos, oficiais e padres jesuítas.
Salvador é um dos principais destinos turísticos do Brasil e é visitada por turistas vindos de todas as partes do mundo. A arquitectura, as igrejas, as casas antigas e as ruas do centro histórico de Salvador - classificado, desde 1985, Património da Humanidade - e alguns costumes e tradições retratam o tempo da colonização.
Faz bem à alma e enriquece-nos o contacto com pessoas de outras culturas, com outros percursos históricos, com outras realidades económicas e sociais, que também vivem problemas e procuram encontrar soluções que permitam extrair o que de melhor os seus recursos humanos e recursos naturais têm para dar. No caso do Brasil, “país irmão”, esta vontade é ainda maior.
O que me tem despertado a atenção nas últimas viagens que fiz ao Brasil é a mobilização geral da sociedade brasileira em torno de um projecto, uma sociedade confiante e esperançosa num futuro melhor, consciente dos problemas e das dificuldades e motivada para trabalhar afincadamente no progresso.
Num país em que a pobreza é uma dura realidade e é grande o fosso entre ricos e pobres é difícil fazer o que o Brasil está a conseguir fazer, que é, simultaneamente, registar crescimento económico sustentável e reduzir as assimetrias de rendimentos. Os significativos recursos naturais de que dispõe não garantem só por si a prosperidade. É preciso saber como os utilizar e transformar em reais benefícios económicos.
A liderança política e o consenso das principais forças políticas em torno de uma estratégia nacional de desenvolvimento sustentável explicarão o bom caminho que o Brasil está a seguir. São factores de credibilidade política que se revelam essenciais para conquistar a confiança dos cidadãos na governação e nos resultados das políticas desenvolvidas.
Ao escrever este pequeno testemunho, não deixo de com ironia olhar para Portugal e pensar nos erros que temos cometido e nos becos estreitos com que frequentemente somos confrontados e que teimamos em repetir.

A minha contribuição: uma urgente medida extra-PEC

Há muitos factores que explicam a aflição da situação presente, que, como temos sublinhado aqui, vêm de longe, têm causas bem mais profundas do que as que se acham na espuma das conjunturas. Porém, o agravamento das condições em que o País tem de enfrentar as dificuldades deve-se também à total falta de credibilidade dos principais protagonistas das políticas económica e financeira do presente e do passado recente.
Se não se vê meio de mudar rapidamente de primeiro-ministro, apesar de ser hoje claríssimo que venceu as eleições à custa da ocultação da verdade sobre a situação do País, exige a elementar sensatez mandar descansar os ministros que longe de ajudarem à recuperação acentuam a desconfiança nas medidas. É assim com o ministro das finanças. É assim, também, com o ministro da economia.
Se a crise é também e sobretudo de credibilidade, uma substituição por responsáveis mais clarividentes, realistas, confiantes e confiáveis, não seria factor de instabilidade mas exactamente o contrário.

Os azares de uma cidadã em campanha

Vi há pouco no telejornal uma cena incrível, bem representativa da insensibilidade dos repórteres que acompanham os políticos, ávidos de episódios ridículos ou escandalosos que “marquem” as campanhas.
Gordon Brown saiu em campanha e foi abordado por uma senhora que se queixou de qualquer coisa relacionada com os imigrantes, não sei bem o quê mas era uma daquelas histórias da vida comum e a senhora reteve o candidato até conseguir contar-lhe a sua preocupação. É claro que ele parecia estar a ouvi-la atentamente, como manda a educação e a simpatia de um interessado no voto. No entanto, já dentro do automóvel, Brown desabafou a sua impaciência por aquele encontro, criticando a organização por ter permitido que a senhora o abordasse com aquele história. Ouviu-se tudo porque ele se esquecera de desligar o microfone transmissor, e a sua impaciência mal humorada, qualificando a cidadã de “uma fanática qualquer” soou em alta voz a todos os jornalistas que aguardavam que o carro seguisse viagem.
Enfim, seria normal que o episódio fosse divulgado e corresse mundo, como é costume, mas o que me chocou foi que os jornalistas correram atrás da senhora e contaram-lhe tudo. Um belo “directo”, pensaram os profissionais, o choque da cidadã enganada. Pareciam miúdos sonsos, a fazer uma maldade com ar inocente. Foi visível o jogo facial da mulher, primeiro perguntaram-lhe se ela sabia o que o Primeiro Ministro tinha dito dela e o seu olhar brilhou “ai sim? Ele falou de mim? O que é que disse?”, muito excitada com a importância que ele lhe tinha dado, mas logo o jornalista lhe tirou as ilusões relatando cruamente o insulto e a impaciência. O olhar da mulher esbugalhou-se, ficou hirta, mal conteve as lágrimas com a humilhação e a vergonha a que estava a ser exposta.
A notícia acabava com a conclusão, muito satisfeita, de que Gordon tinha perdido um voto e todos devem ter ido para casa a rir-se muito com a marotice. Mas a senhora, coitada, que ia tão contente com a sua proeza para contar às amigas, deve levar muito mais tempo que o candidato até recuperar do desgosto que lhe deram. Apesar dos pedidos de desculpa imediatos que mereceu do seu ex-ídolo...

quarta-feira, 28 de abril de 2010

As sombras de Katyn


A Rússia divulgou hoje mais documentos oficiais que comprovam que massacre de Katin foi ordenado por Estalin. No final da semana passada a RTP 2 passou o filme O Massacre de Katyn, de Andrzej Wajda, um filme polaco de 2007 que conta a tragédia do povo polaco, primeiro às mãos dos nazis, depois às mãos dos soviéticos. Baseado em documentos históricos e tendo como personagens principais as mulheres, mães e filhas dos cerca de 20 000 oficiais e militares polacos que foram feitos prisioneiros pelos soviéticos, em 1940, e depois executados, um a um, com um tiro na nuca, na floresta de Katyn, o filme mostra com uma clareza aterrorizadora a monstruosa acção e a diabólica teia de mentiras urdida em torno da sua autoria. Impressionante o discurso do general às suas tropas aprisionadas, sem saberem que destino os esperava mas com a certeza de que “a Europa” não os ia abandonar, era impossível, mais cedo ou mais tarde ainda haviam de rir-se daquele episódio… Pouco depois começaram a chamá-los, grupo a grupo, pensavam que iam ser libertados, mas desembarcavam numa floresta gelada onde, numa gigantesca vala aberta, já se amontoavam os cadáveres dos que tinham sido chamados antes deles.
Só em 1943, quando a Alemanha invadiu a URSS, se soube do trágico destino dos milhares de oficiais de quem nunca mais se tinha sabido nada. As famílias começam a ser avisadas e os soviéticos acusados do massacre recusam essa autoria e devolvem a acusação aos nazis. Na Polónia ocupada soavam nos altifalantes os nomes da interminável lista de mortos e o massacre foi utilizado na propaganda contra os soviéticos. No entanto, no final da Guerra, quando a Polónia ficou sob influência soviética, a verdade foi substituída por outra verdade, a “verdade oficial”, que decretou que o massacre tinha afinal sido cometido pelos nazis, com o intuito de incriminarem os soviéticos. Contra todas as evidências, incluindo a das datas, os polacos foram obrigados a aceitar esta versão, tendo sido mortos, presos ou perseguidos os que ousavam pôr em causa a inocência dos soviéticos.
O filme consegue mostrar com um realismo impressionante o ambiente de terror, de dúvidas e angústias, de revolta abafada dos que já não sabiam dizer de que lado viria o maior perigo para a sua liberdade e para as suas vidas atormentadas. Já não conseguiam acreditar ou confiar em nada, aprenderam que tudo era possível, mesmo o inacreditável. Numa cena final, a viúva de um general assassinado em Katin, que tinha sofrido o horror do domínio nazi e assistia agora às mentiras e perseguições dos novos dominantes, encontrou um soldado do exército do marido que tinha escapado ao massacre e que agora integrava o exército soviético. Ele aconselhou-a a esquecer, em nome da sobrevivência, a não teimar na verdade e a aceitar a versão oficial, porque os soviéticos tinham ideias diferentes dos nazis e isso era melhor para a Polónia. E ela respondeu-lhe: -“De que serve pensarem de maneira diferente se os actos que praticam são os mesmos?” E afastou-se com desprezo, até a sua silhueta se diluir no nevoeiro espesso que caía no horizonte.
A verdade oficial só cedeu depois da queda do muro de Berlim. Em 1990, Gorbachov reconheceu pela primeira vez a responsabilidade soviética pelo massacre de Katyn, demasiado tarde para todos os que foram sacrificados à importância política da mentira.

Estado de necessidade

Pensando no interesse nacional, e nos partidos isso é difícil, Pedro Passos Coelho prometeu hoje, depois da reunião com o 1º Ministro, que o PSD vai cooperar com o Governo, assegurando «um quadro de estabilidade» para o cumprimento dos compromissos de redução do défice e da dívida assumidos por Portugal.
Também Sócrates referiu que o Governo e o PSD vão trabalhar em conjunto de forma a atingir essa finalidade.
Por sua vez, o PS disse que "parece positivo que o PSD se tenha preocupado em apresentar alternativas de natureza política, porque um partido com objectivo de apresentar alternativas está também disponível para estabelecer alguns grandes consensos nacionais".
Muito bem. Acontece que o PSD tem apresentado, ao longo da governação socialista, várias alternativas, tanto no que se refere à política financeira do Estado, orçamento e finanças públicas, como no que se refere às políticas económicas. Todas liminarmente rejeitadas.
Aliás, há oito dias, no dia 21 de Abril, o PSD apresentou no Parlamento uma proposta de redução da despesa no valor de 1,7 mil milhões de euros. Se cortes orçamentais são sempre politicamente difíceis, o Governo teria melhores condições para os executar, face ao apoio do maior partido da Oposição.
Todavia, o Ministro da Economia, de forma tão arrogante como irresponsável, de imediato rejeitou o plano, classificando-o como “uma mão cheia de nada”.
O mesmo plano agora aceite por Sócrates para discussão.
Oxalá o bom senso comece a prevalecer. É tarde, mas mais vale tarde que nunca. Mesmo que tenha sido um estado de necessidade a obrigar a tal.

"Especuladores" não serão tão inimigos assim...

1. Como deixei anotado em textos recentes neste Blog, a hipótese de recurso a um Orçamento Rectificativo podia colocar-se antes mesmo da erupção do actual período de turbulência financeira que muitos comentadores, por ingenuidade natural ou por conveniência, teimam em classificar como resultado de um ataque especulativo, insidioso, prenhe de malvadez, perpetrado pelos "hordas" dos mercados...
2. Nesse anterior quadro, a necessidade de um O. Rectificativo decorria da manifesta insuficiência dos dados já divulgados quanto à execução orçamental nos primeiros meses do ano, deixando antever a necessidade de alterar os pressupostos do OE aprovado há apenas ½ dúzia de dias.
3. Neste momento e num quadro de aflição aguda - com os especuladores à porta tentando destruir as nossas já tão fragilizadas defesas financeiras - que até determinou a realização de uma reunião inédita entre o principal responsável do Governo e do maior Partido da oposição para discutir medidas a tomar, tudo parece indicar que a apresentação do um Orçamento Rectificativo poderá ter ganho novos contornos...
4. Co efeito, antecipar medidas do PEC, como foi mencionado pelos dois responsáveis políticos hoje reunidos, significa na prática aplica-las já em 2010, em vez de aguardar para 2011 ou 2012, o que terá obviamente implicações orçamentais significativas...
5. Nomeadamente importará mostrar ao Mundo, para ver se os “especuladores” nos largam a porta de vez(?), que estamos prontos para reduzir o défice mais do que estava previsto no OE/2010 (ainda bebé mas já tão gasto...) e que para esse efeito se prepara um novo Orçamento mais ambicioso – que é para cumprir...
6. Assim, pois, o Governo tem a possibilidade de apresentar um O. Rectificativo integrado numa estratégia de verdadeira “salvação nacional” sem a carga negativa que teria se fosse apresentado num contexto de simples remendo, em que não existisse a “colaboração” dos "especuladores" do mercado...
7. ...E pode aproveita-lo para introduzir alterações que mais tarde ou mais cedo teria de reconhecer face à insuficiente execução orçamental caso esta se prolongue como não é de excluir...
8. Será que vamos ter proposta de O. Rectificativo antes mesmo das férias parlamentares? Não me surpreenderia; e então os “especuladores” não serão, a final, tão inimigos assim...

Continuem, pois, a ouvi-los!...

Infelizmente, a crise continua instalada e a agravar-se, agora devido ao downgrading da Standard & Poors.
Em Junho do ano passado, em resposta ao Manifesto de 28 Economistas que propunham uma reavaliação do Programa de Investimentos Públicos, logo surgiram dois Contra-Manifestos de economistas, ditos economistas e equiparados, professores de economia, catedráticos ou aspirantes, sociólogos e jornalistas, cientistas políticos e etc, o Manifesto dos 52, e o Manifesto dos 31. Que defendiam a inadiável continuação dos grandes projectos de investimento público, necessários para infraestruturar o país e, sobretudo, nesta época de crise.
Entre os 52 e os 31 estão figuras que todos conhecemos pela ciência económica, e não só, que todos os dias sabiamente nos debitam nos jornais, rádios e televisões.
A economia real, todavia, sempre lhes tem negado a doutrina que empertigadamente defendem, e que nos levou à maior crise das últimas décadas, ao maior endividamento de sempre, às mais altas taxas de desemprego e ao maior défice. O que não impede de continuarem a ser, neste país onde se negam as evidências, autoridades na matéria.
Suportaram, com fraca teoria e propaganda grosseira, as decisões do governo. Mas, ao contrário do governo, que mais tarde ou mais cedo cairá, eles continuarão, impantes e sem vergonha, a aparecer na casa das pessoas. Defendendo o que defendiam ou, se nisso virem vantagem, o seu contrário.
Mesmo que a realidade sempre os contrarie, eles são a suma autoridade. Continuem, pois, a ouvi-los!...

Cuidado com as "misturas"...

A revisão do regime do subsídio de desemprego está prevista no Plano de Estabilidade e Crescimento e será brevemente discutida em concertação social, tendo o Governo solicitado propostas aos parceiros sociais.
Trata-se de uma matéria muito delicada, que interfere com a protecção social dos trabalhadores na eventualidade do desemprego visando assegurar a substituição do rendimento de trabalho ou parte dele.
Foram alvitradas várias alterações, desde terminar com o valor mínimo do montante do subsídio de desemprego, passando pela penalização gradual do montante do subsídio em função do tempo decorrido, até ao alargamento dos prazos de descontos para aceder ao subsídio.
Há quem defenda que o regime do subsídio de desemprego é demasiado generoso e que não incentiva ao trabalho, assim como há quem entenda que o regime deveria cobrir os trabalhadores com menos tempo de descontos e reduzir os períodos máximos de garantia.
Mas seja qual for o juízo que se possa fazer da maior ou menor generosidade do actual regime, certo é que o subsídio de desemprego é um seguro social financiado pelas contribuições das entidades patronais e dos trabalhadores, através da taxa social única que incide sobre o rendimento do trabalho.
Uma notícia que hoje li dava conta que a Confederação do Turismo defende que só deve ter acesso ao subsídio de desemprego quem não tem outras formas de subsistência. Uma posição que perverte totalmente a actual função do subsídio, que se destina a substituir rendimento de trabalho na eventualidade de desemprego, sendo o seu custo financiado pelo "segurado". Quando não existem outras formas de subsistência aplica-se outro tipo de apoios, que se inserem na função redistributiva e que por isso mesmo são financiados pelos impostos. É o caso, por exemplo, do rendimento social de inserção, que é atribuído mediante condição de recurso.
Tratar o acesso ao subsídio de desemprego da mesma forma que o acesso ao rendimento social de inserção é confundir direitos e obrigações, é confundir realidades diferentes. É o mesmo que dizer a quem paga um seguro para cobrir um risco que em caso de acidente não tem direito ao mesmo. Assim, sim, desincentiva-se o trabalho porque não trabalhando e sem meios de subsistência o rendimento social de inserção, pago pelos impostos dos contribuintes, aí está para resolver o problema. Não resolve porque as prestações são baixas, mas o incentivo está lá.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Os desempregadores

Hoje de manhã, no Programa de diálogo com os ouvintes da Antena 1, e a propósito da greve dos transportes, ouvi um comentário, cruel, mas bastante bem explicado, que dizia que o Secretário-Geral da Intersindical, Carvalho da Silva era o maior Desempregador deste país.
De facto, decretar uma greve dos transportes, neste momento crítico, é um acto de enorme insensatez. Aliás, nem se sabe contra quem é que a greve se faz. Se é contra o patronato, é contra nós todos, que as empresas são públicas. Se é contra o Governo, é uma greve política e isso não foi assumido. Contra o capital não é, seguramente, que as empresas de transportes estão descapitalizadas e falidas.
A verdade é que, com lutas como a de hoje, os sindicatos estão a cavar definitivamente o seu descrédito. Cada vez há menos trabalhadores sindicalizados e apenas na função pública ou em empresas do Estado os sindicatos conseguem mobilizar as pessoas para a greve.
Claro que são precisos sindicatos fortes, lutadores, determinados, mas sindicatos do tempo presente, com mensagens apropriadas à realidade económica das empresas e do país, e utilizando formas de luta compreensíveis e aceites pela generalidade dos trabalhadores. Conhecedores do funcionamento da economia e atentos à realidade dos ciclos e das conjunturas .
O contrário dos sindicatos actuais, que ainda procuram, a todo o transe, transportar para o campo laboral as reivindicações e os ideais políticos dos seus dirigentes, cada vez mais afastados, pela usura do tempo e pela alteração dos modos de produção, dos problemas reais da economia.
Tal como se comportam, nesta era de globalização, em que não sobreviverá emprego se não nos adaptarmos aos novos tempos, os Dirigentes Sindicais têm muitas vezes sido fomentadores do desemprego neste país. Lamentavelmente; talvez como nunca, precisávamos de sindicatos fortes e esclarecidos.

Será que PSD "virou" pronto-socorro?

1. Após a divulgação esta tarde da decisão da Standard & Poor’s de baixar drasticamente o rating da dívida portuguesa e no meio de uma manifestação de pânico dos investidores que vendem a qualquer preço não só dívida pública portuguesa mas outros activos mobiliários de empresas portuguesas, o Ministro das Finanças terá declarado que “agora é que PS e PSD terão de se entender”...
2. Não deixa de ser curiosa esta afirmação, depois de na semana passada o Governo e o Partido que o apoia terem desdenhado – duma forma que globalmente me pareceu pouco perspicaz e num caso ou noutro até pouco elegante – uma proposta do PSD para reduzir a despesa pública, em rubricas devidamente especificadas, em cerca de € 1,7 mil milhões.
3. Confesso que caso estivesse na pele do Governo (salvo seja), teria recebido essa proposta de redução da despesa pública, vinda de um partido da oposição, com as duas mãos: vamos lá reduzir essa despesa como propõem, vamos até criar uma Comissão paritária para acompanhar esse exercício...
4. No espaço de uma semana, com a casa "a arder", parece que tudo muda – será pois que o PSD, depois de ignorada a sua proposta, assume agora o papel de pronto-socorro?

Genial e patriótica política!...

Para se financiar, o Governo paga uma taxa inicial de 0,794% aos subscritores Certificados de Aforro, na enorme maioria pequenas poupanças nacionais de médio e longo prazo. Claro que os as novas subscrições não compensam os reembolsos.
Para se financiar a médio e longo prazo, o Governo pagou, na última emissão de Abril, uma taxa média de 4,34% aos subscritores Obrigações do Tesouro, na maioria bancos e estrangeiros. Não pagando um pouco mais pelos Certificados de Aforro nacionais, passa a pagar muitíssimo mais ao estrangeiro pelas Obrigações do Tesouro. Aumentando ainda a pressão sobre a dívida externa.
E, mesmo para se financiar a curto prazo, o Governo pagou, na última emissão de Março, uma taxa de 1,046% aos subscritores Bilhetes do Tesouro, na enorme maioria entidades bancárias. Mais do que paga pelos Certificados de Aforro.
Genial e patriótica política, esta do Ministério das Finanças!...

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Cuidado com os extraterrestres!

Hawking é um dos mais sofisticados pensadores, senão mesmo o maior da humanidade. Tem-nos ajudado a esclarecer muitos problemas e consegue transmitir de uma forma simples o que é bastante complexo.
Há tempos, alertou que a humanidade tem de se preparar para começar a sair do planeta a fim de garantir a sua sobrevivência. Tem de arranjar maneira de encontrar um planeta semelhante ao nosso, algures. Também acredita que a vida, embora muito rara, exista por esse universo fora sob várias formas, a maioria simples, enquanto as inteligentes serão muito raras porque tendem para a autodestruição.
Há quem defenda que a vida inteligente só deverá existir neste planeta porque é de tal modo complexa que só pode ter ocorrido apenas uma vez no universo! A defesa desta ideia baseia-se mais numa crença do que na ciência, aproximando-se da religião e “justificando” a falta de comunicação com as “vidas inteligentes” ou destas com a da Terra. Das três uma, ou não há mais nada no universo, o que seria um desperdício, deixando-o à nossa mercê, fazendo-me recordar o provérbio “deitar pérolas a porcos”, ou, então, existem mas não conseguem entrar em contacto connosco, porque têm outras formas de comunicação, ou já sabem que existimos mas fogem de nós como o diabo da cruz. Eu perfilho esta última, porque é uma atitude deveras inteligente. Sendo assim, não sei qual a razão de Hawking ter feito a advertência de que deveríamos evitar contacto com os seres extraterrestres porque estes poderiam aparecer aí um dia destes para roubar os nossos recursos e depois pirarem-se! Com franqueza! Antes dos alienígenas conseguirem roubar os nossos recursos já a rapaziada terá dado cabo do planeta ou para lá caminhará e, nos “entretantos”, até se divertem a roubar uns aos outros. Afinal não são precisos encontros imediatos do primeiro grau, os que cá andam já fazem, e muito bem, esse papel.
Entretanto, e fazendo fé no episódio atribuído a Enrico Fermi, que um dia manifestou uma profunda irritação por podermos estarmos sozinhos no Universo, é muito provável que a vida inteligente não tenha futuro porque tende para a autodestruição.
Na década de quarenta, Enrico Fermi desceu as escadas do seu escritório em Los Álamos e perguntou aos seus colegas: - Onde estão eles? Onde estão eles? Esta pergunta ficou famosa já que se referia aos extraterrestres. A análise, segundo a qual a vida evoluiu muito rapidamente na Terra, levou os cientistas a perguntar por que razão uma inteligência extraterrestre não colonizou a Galáxia, que comporta 100 mil milhões de estrelas, já que houve tempo mais do suficiente. Se a inteligência extraterrestre é assim tão comum, por que é que ainda não entrámos em contacto com eles ou eles connosco?
Os teóricos afirmam que a nossa ciência pode estar a sobrestimar a frequência da inteligência extraterrestre, ou, então, a evolução da inteligência tem tendência para se autolimitar, se autodestruir ou liquidar-se umas às outras. Às tantas devem estar mas é viciados em computadores, a entreterem-se num frenético consumismo e num narcisismo virtual, esquecendo-se de enviar sinais de rádio ou de colonizar o resto da galáxia. Provavelmente passam o tempo a estimular o seu equivalente de dopamina, numa permanente satisfação.
O que me incomoda é o facto de podermos estar sozinhos neste universo. Um desperdício! Será que uma espécie como a nossa é “merecedora” de tanto? O mais certo é haver outras inteligências. O que elas fazem? Sabe-se lá! Podem estar entretidas com muitas coisas, terem-se esquecido de enviar sinais, ou, então, sabem que nós existimos mas não querem nada connosco. Lá devem pensar: - O melhor é não lhes ligar patavina, senão dão-nos cabo do nosso sossego e juízo. Como pensam que devem estar sozinhos, e têm uma elevada capacidade de autodestruição, talvez possamos passar despercebidos…
Sendo assim, o melhor é dizer a Hawking para não ter receio. Os “outros” é que devem acautelar-se connosco!

A vida para além do défice

"É justamente a vida que Portugal está a viver. Uma vida de elevado desemprego, de crescimento económico nulo, de crescente endividamento, de maior insegurança urbana, de desprestígio internacional, de permanentes ameaças dos mercados que insistem em nos equiparar à Grécia e de portugueses a sofrer dificuldades e com fraca esperança no futuro".
Rui Rio, ontem, dia 25 de Abril.
Perfeita e poderosa síntese.

Empréstimo à Grécia: Parlamento vai discutir o quê?!

1. Foi anunciado que o Governo tenciona levar ao Parlamento – supostamente para discussão e não se sabe o que mais – a decisão de emprestar à Grécia € 774 milhões, fatia que nos foi atribuída na operação de apoio de emergência à Grécia aparentemente decidida pelos governos dos países da Zona Euro.
2. Quando li esta notícia, interroguei-me sobre o que vai o Parlamento discutir (e votar?) sobre esta matéria, uma vez que, quanto nos parece, já está tudo decidido (falta a Alemanha dizer finalmente o que pensa, claro) sobre este empréstimo...
3. Será possível ao Parlamento alterar a decisão de conceder o empréstimo depois de todos os países e do FMI terem anuído em princípio na sua concessão? É claro que não...
4. Será possível ao Parlamento alterar as condições de tal empréstimo – montante, prazo, taxa de juro? É claro que não, essas condições são “standard”, todos os países mutuantes acordaram quanto às mesmas, está excluída também essa possibilidade...
5. Será que o Parlamento pode ao menos alterar a condicionalidade, muito dura provavelmente, que vier a ser acordada entre Atenas, o FMI e a Comissão Europeia, como ponto prévio – seguramente que sem isso a Alemanha & Cª jamais aceitarão conceder qualquer apoio – para o funcionamento/activação do apoio financeiro de emergência? É ainda mais óbvio que não, seria um absurdo se o Parlamento português se fosse intrometer em tal matéria...
6. Ou será que o Parlamento vai discutir as condições do empréstimo de € 774 milhões que Portugal terá de obter para depois re-emprestar à Grécia, uma vez que, como bem se sabe, não dispomos de fundos para cumprir tal gesto de solidariedade sem a colaboração estreita dos credores? É também claro que não, o Parlamento não tem que discutir e muito menos aprovar operações de empréstimo individuais...
7. Sendo assim, o que resta ao Parlamento discutir sobre este assunto, que não seja aplaudir ou lamentar a decisão?
8. Então, qual o motivo de submeter este assunto ao Parlamento, cumprindo uma diligência que à partida se afigura absolutamente supérflua?
9. Será que por trás de tal diligência estará mais uma vez a mania do “show-off” – mais publicidade para cima deste assunto - com o objectivo de convencer os contribuintes que somos tão diferentes da Grécia que até lhe emprestamos dinheiro?
10. Pode ser que não, que exista alguma razão sibilina que escape à minha percepção...mas se for isso parece-me de mau gosto, até porque não será por aí que nos podemos distinguir da Grécia...
11. Pior ainda quando operações como a que envolve a Parpública e o Estado, hoje noticiada, “fabricando” receitas para o Orçamento com base no agravamento de dívida pública tornam bem mais difícil convencer os especialistas dessa diferença...

A dança, a festança...e a contradança...

A opinião do Prof. Ferreira do Amaral, no Público de há dias, sobre a situação das nossas finanças públicas projectou uma luz intensa e clarificou definitivamente o meu espírito.
Pensava eu que a política seguida de mais e mais despesa pública, dita para potenciar crescimento económico, não só não trouxe qualquer crescimento, como implicou um endividamento externo nunca visto e uma carga fiscal castradora de qualquer iniciativa. Política essa a grande responsável, se não mesmo a única, pela calamitosa situação em que nos encontramos, com os credores a temerem o risco Portugal e a elevarem as taxas de juro e os analistas a vincarem o nosso efectivo descalabro. Tanto mais que, em 2013, no fim do PEC, a dívida pública ainda será maior do que a actual.
E pensava eu também, no meu pouco preparado intelecto, que admitir estes factos e reconhecer culpa própria seria a primeira e essencial condição para se tomarem as medidas necessárias à gradual resolução do problema. Porque, também eu pensava, erradamente, claro, que o problema era nosso, que seríamos nós que o teríamos que resolver e que ninguém o iria resolver por nós.
Mas deixei de pensar assim, iluminado que fui pelo Economista Doutor Ferreira do Amaral. O Prof. Ferreira do Amaral, estrénuo defensor da virtuosidade da despesa pública para gerar crescimento, concede que também está preocupado com a situação. Mas, para o Professor, as preocupações vêm de fora, já que “o problema não é Portugal”. Para Ferreira do Amaral, o verdadeiro problema está na Zona Euro. Simplesmente porque “ a Zona Euro não foi criada de forma minimamente sólida e não está preparada para situações destas". Como a portuguesa, claro!...
Fiquei esclarecido. Podemos pois continuar a festa, o desperdício, a festança e a dança. Estamos fortes e sólidos. A zona euro é que não está preparada para entrar na contradança. Problema seu!...
E se é o Prof. Doutor Ferreira do Amaral a dizê-lo, quem sou eu para não acreditar?

domingo, 25 de abril de 2010

O ritual

Mais um ano, e mais uma vez se cumpriu a comemoração do 25 de Abril. Trinta e seis anos passados, o aniversário pouco ou nada diz a grande parte da população portuguesa, já que só cidadãos acima dos quarenta e cinco anos têm memória vivida do período anterior.
Admito que quem tem menos do que essa idade se interrogue agora, como eu, antes do 25 de Abril, me interrogava sobre as comemorações do 28 de Maio de 1926, dia da chamada Revolução Nacional.
Para quem nasceu depois das revoluções, e dentro do regime instalado, pouco diz o que aconteceu no passado. Até porque ele é normalmente apresentado com grande controvérsia e na exclusiva versão dos vencedores. Interessa-lhes sobretudo o presente e o futuro.
Mas é próprio dos regimes justificar a sua existência e os rituais, agora como sempre, são as melhores formas da sua consagração. Poderão nada significar, mas os dirigentes sentem, porventura com razão, que os povos ainda não sabem viver sem rituais.
Comemorou-se pois o 25 de Abril na Assembleia da República. Mas onde eu esperava o enaltecimento da data, nomeadamente por quem dela pretendeu ter a exclusividade, só ouvi críticas e desilusão. Para o PC e para o Bloco, o regime saído do 25 de Abril só trouxe desgraça e desespero. Se algum não iniciado ouvisse os discursos, ficaria perplexo, ao ver a contradição de participar no ritual jubiloso de uma comemoração e nada encontrar para exaltar e tudo ver para criticar e demolir.
Também para eles, as comemorações são totalmente vazias de sentido. Constituem um mero ritual.

Eneacampeões!...



Somando o penta ao tetra do futebol, agora o enea do hóquei em patins do FCPorto.
Para além do mérito do título, o mérito de ensinar aos portugueses de todas as cores como se diz campeão por nove vezes seguidas: eneacampeão!...
Parabéns e venha o Deca!...

A escrita da expressão facial...

A propósito de um artigo que li sobre a síndrome de Moebius, uma doença congénita causadora de paralisia facial, lembrei-me como é importante na socialização o movimento facial. A bem dizer, a expressão facial é muitas vezes o "cartão de visita" da própria pessoa.
A expressão facial é realmente essencial na interacção social, no relacionamento que se estabelece entre as pessoas, porque é através dela que expressamos sentimentos e emoções, como simpatia e alegria, antipatia e tristeza, empatia ou distanciamento, aceitação ou repulsa, surpresa e espanto ou nem por isso, compreensão ou revolta, dúvida ou confiança, e por aí fora. A revelação do que nos vai na alma e na cabeça é normalmente reflectida, de forma inconsciente, através da expressão do olhar. O movimento dos olhos, um piscar de olhos ou o franzir de sobrolho têm cargas comunicativas importantes e significados emocionais próprios. Há olhares que falam por si, dispensando quaisquer gestos faciais ou outros. Há circunstâncias que desvendam o que diz ou quer dizer um olhar, ainda que não querendo ou porque querendo tudo nele está dito e escrito
Mas há pessoas que conscientemente controlam a sua expressão facial e, também, os gestos e a própria postura corporal, tornando-se por assim dizer umas múmias, impedindo qualquer penetração por parte dos outros sobre as suas reacções, tornando a comunicação difícil e não raras vezes agreste.
Tenho conhecido ao longo da minha vida profissional pessoas, poucas devo dizer, que revelam um extraordinário auto-controlo das suas expressões, normalmente para defesa própria, embora possa também acontecer por timidez ou porque é da sua própria natureza. No primeiro caso, uma tal estratégia parece surgir como sendo crucial na discussão ou na negociação de um assunto. São normalmente pessoas pouco naturais, de jogos de expressão fabricada que exigem dos outros cuidados redobrados. Nunca se sabe o que vai nas suas cabeças, como vão reagir.
Há por aí cursos que ensinam a desenvolver essas "competências" e que se vendem como algo absolutamente necessário para vencer. Parece que têm procura.
Pela minha parte prefiro as pessoas espontâneas, ou seja, cuja expressão facial é um espelho reluzente das suas emoções e pensamentos. Sabemos com o que podemos contar, não enganam, e havendo vontade de partilha é mais fácil.

sábado, 24 de abril de 2010

Mestiços

Nos princípios do século XVIII, um jesuíta escreveu, sob o pseudónimo de André João Antonil, uma interessante obra na qual fez a seguinte afirmação: “O Brasil é o inferno dos negros, o purgatório dos brancos e o paraíso dos mulatos e mulatas”. No tocante às mulatas não foi parco ao realçar a sua sensualidade e atração. Afinal, desde o momento da sua “criação” já se conhecia que eram bastante atraentes. Nada de novo, portanto, o anúncio de um trabalho recentemente alvo de divulgação pública segundo o qual os mestiços são mais atraentes e sobem mais depressa a altos cargos. O que começa a ser discutível são algumas designações impróprias e a ideia de que a mistura de “raças”, aqui está uma imprecisão, possa reforçar a capacidade de adaptação ao meio ambiente.
O conceito de raça não existe na nossa espécie. No entanto continuamos a classificar os humanos em raças com base na cor da pele. A diversidade genética fortemente citada deverá ser tão ampla dentro das diversas “cores” como nos casos em que ocorra miscigenação. É certo que existem algumas associações entre determinados genes e a cor da pele, podendo desta forma explicar alguma variação e predisposição para algumas patologias. No fundo, o ambiente molda a frequência de genes mais aptos para uma determinada região.
A este propósito, “raças”, tive há algum tempo uma discussão com uns colegas, a propósito da criação de bancos de gâmetas, em que há necessidade de elaborar um inquérito que permita caracterizar os dadores. Insurgi-me contra a introdução do conceito de “raça”, que, além de não existir, não ia ser autorizado. Discutiu-se como ultrapassar o problema. Foi proposto “etnia”. E agora, quais etnias? Começamos a elencar algumas, com base na vivência norte-americana, africana, asiática, europeia ou caucasiana, ameríndia, afro-americana, asiática, polinésia, inuit (esquimós) e sabe-se lá que mais. Tudo bem, depois logo se vê qual a melhor solução a adotar entre nós.
Faz todo o sentido que os casais que procuram gâmetas para a procriação medicamente assistida os escolham com base em características semelhantes às suas. Mas não é tão linear como isso. A mim não me repugna, por exemplo, que escolham gâmetas ou embriões oriundos de outras “cores”. O que é que fui dizer!
A notícia de que os mestiços são mais atraentes levou um antropologista, que sabe muito sobre a matéria, a criticar de forma demolidora o conceito de raça e de que os mestiços são mais atraentes. Não sabe onde está a fronteira entre brancos e pretos e o que é a mestiçagem. Quanto à diversidade genética, tudo aponta para que a variação intra “cor” seja maior do que a variação inter “cor”. Este é um breve resumo do seu pensamento demolidor. Em termos biológicos não podemos deixar de lhe dar razão, mas em termos sociais as coisas são muito mais complicadas.
A notícia de que os mestiços são mais atraentes levou um antropologista, que sabe muito sobre a matéria, a criticar de forma demolidora o conceito de raça e de que os mestiços são mais atraentes. Não sabe onde está a fronteira entre brancos e pretos e o que é a mestiçagem. Quanto à diversidade genética, tudo aponta para que a variação intra “cor” seja maior do que a variação inter “cor”. Este é um breve resumo do seu pensamento demolidor. Em termos biológicos não podemos deixar de lhe dar razão, mas em termos sociais as coisas são muito mais complicadas.
O que é aconteceria se o tal professor de antropologia tivesse que se socorrer de um banco de gâmetas? Aceitaria o que lhe “dessem”, sem mais nem menos, um gâmeta qualquer, incluindo um oriundo de África, ou pedia o “catálogo” para ter a probabilidade de que o produto final fosse semelhante em termos fisionómicos aos seus? Não sei responder, mas considero como pouco provável que escolhesse gâmetas africanos!
O exercício prático duma circunstância supera, e muito, as considerações teóricas sobre o tema. Entretanto, e “como não quer a coisa”, o melhor é dar umas olhadelas às mulatas e ver até que ponto são mesmo atraentes. É um exercício fácil de fazer, rápido e muito barato. São ou não atraentes? São! Mas as outras também são, desde as mais leitosas de cabelo doirado até às morenas de olhos negros...

Peso insalubre

Recordo de em pequeno seguir a luta dos negros norte-americanos contra a discriminação brutal de que eram alvo. Não conseguia compreender a razão da segregação naquele país e tão pouco o tratamento dado aos negros da África do Sul. Negros e mestiços, sempre ouvi esta designação. Na minha família não faltam parentes frutos da luso mestiçagem. Não sei o que é que tem de mal dizer negros ou mestiços, mas nos Estados Unidos lembraram-se de passar a designar os negros como afro-americanos. Não sei porquê! Parece que é considerado como ofensivo ou carregado de algo depreciativo. A este propósito, li há algum tempo que um moçambicano, naturalizado americano, ao preencher as fichas no campo da etnia coloca afro-americano, mas é branco. Os negros, ou melhor, os afro-americanos ficam ofendidos com esta atitude, mas o rapaz é de facto afro-americano, nasceu em África e é americano.
Em certas situações até pode haver alguma justificação em proceder à substituição como aconteceu com mongolismo, designação dada à síndrome de Down (trissomia 21), pelo facto de ter adquirido um sentido pejorativo e mesmo ofensivo.
Também começou a ser considerado como ofensivo, sobretudo para os familiares dos doentes, alguns epítetos que certas pessoas gostam de disparar contra os adversários ao chamarem-lhes autistas ou esquizofrénicos.
Mandar alguém abaixo de Braga, forma erudita de uma expressão mais corriqueira, não deve ser muito agradável para os bracarenses, lá que digam “Ver Braga por um canudo”, vá que não vá, mas conotá-la com guano não é coisa bonita.
Em todos estes processos está presente o conceito de ofensa ou sentido pejorativo. Se nalguns casos é justificável, noutros é muito duvidoso, tal como chamar aos negros dos Estados Unidos afro-americanos. Quem sabe se um dia os negros portugueses não passarão a designar-se por afro-lusitanos? Se o vírus aparecer por aí nunca se sabe. Nem sei se os ciganos não exigirão ser chamados de outra forma, egípcios?, como acontece nalguns países. Resta saber se os verdadeiros egípcios aceitarão esta mudança. Como toda esta algaraviada já vai longa – espero que os algarvios não se importem com o termo -, o melhor é focar a razão desta reflexão.
Li que o Conselho Municipal de Liverpool vai propor a proibição do uso da palavra “obesidade” nos materiais informativos destinados a crianças porque acreditam que o termo é ofensivo e, deste modo, poder ser prejudicial nas campanhas. Por este motivo propõem a substituição do termo "obesity" por “unhealthy weight”, que os brasileiros se apressaram a traduzir por “peso insalubre”, e que nós, os portugueses poderíamos optar por “peso não saudável”. Se for avante aquela designação, então, é muito provável que, com o tempo, os adultos venham também a usá-la, passando os obesos, que já não suportam que lhes chamem gordos, a serem considerados como sofrendo de “peso insalubre”!. Quem sabe se, um dia, chamar obeso a alguém não será considerado pejorativo ou mesmo um insulto, e, a partir de então, não se sabe o que mais poderá acontecer.
Já estou a ver alguns diálogos interessantes. – Então, como vai o seu peso? - Um pouco “insalubre”. – Ah! Nota-se muito bem. De facto, está cada vez mais pançudo...

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Obrigado Grécia

Nenhum governo fez tanto pelo futuro de Portugal como o que foi liderado pelo primeiro-ministro Konstantinos Karamanlis, na Grécia, desde Março de 2004 até Outubro último.

De facto, não fora a total irresponsabilidade do seu executivo na condução e reporte da política orçamental, nunca as finanças públicas gregas teriam chegado ao estado calamitoso em que estão. Sem esse desvario, os mercados internacionais não teriam “provocado” uma crise financeira na Grécia.

Mas em que é que isso contribui para o futuro de Portugal?

É que sem a crise grega, o governo português teria certamente prosseguido a política de incremento do peso do estado na economia, de agravamento dos défices orçamentais e de aumento exponencial da dívida pública. Com a crise grega, porém, o sentido da política orçamental portuguesa sofreu uma significativa inversão, o que constitui a nossa melhor possibilidade de evitar um colapso da economia.

Considerando eu, que a intervenção excessiva do estado na economia constitui o principal constrangimento ao desenvolvimento de Portugal, estou em crer que a necessidade imperiosa de consolidação orçamental e o consequente recuo do estado acabará por estimular a economia de forma muito substancial e relativamente célere.
O contributo da Grécia para o bem-estar futuro dos portugueses não deve ser minorado; só é pena ter sido tardio.

A lacuna de Inês

Inês de Medeiros, residente em Paris, mas eleita Deputada por Lisboa, viu satisfeita a sua reclamação de ter direito a uma viagem semanal a Paris, paga pela Assembleia da República.
Como a lei não previa tal direito, foi decidido que o problema do pagamento não era de Inês, mas era da lei. A lei estava assim contaminada de grave lacuna, pelo que urgia levantá-la com rapidez. E pagar as viagens. Decisão, aliás, tão justa e tão adequada que não serve de exemplo para outras, segundo os próprios decisores.
Mas eu, sinceramente, gostei da decisão. Vou também reclamar uma grosseira lacuna na lei a propósito de eu, cidadão Pinho Cardão, não estar isento de impostos. E não me importo que a isenção apenas abranja o tempo da lacuna que contemplou Inês.
Comecei já a elaborar o requerimento.
Nota: Não condeno Inês. Em tempos, a Deputada referiu que, no momento de aceitação da candidatura, lhe tinha sido prometido o pagamento das viagens. Face ao compromisso, caberia então ao PS pagar-lhas. Não a nós.

Acções de marketing e julgamentos populares

Cada vez mais proliferam os julgamentos populares patrocinados pelos media que, obviamente com pouco rigor, apresentam ou interpretam, a seu modo, a acusação, a réplica e a tréplica, induzindo o povo a condenar o réu sem apelo nem agravo.
Ao longo de quatro anos, o empresário Domingos Névoa foi sistematicamente acusado nos jornais e telejornais pelos irmãos Sá Fernandes como tendo praticado o crime de suborno, pela tentativa de oferecer 200 mil euros ao vereador José Sá Fernandes, através do seu irmão Ricardo, em troca de vir a favorecer um negócio de terrenos entre a Bragaparques e a Câmara de Lisboa.
Se os contornos, a natureza e consequentemente a gravidade do crime tão publicamente publicitado pelos irmãos Sá Fernandes só parcialmente foram acolhidos pelo Tribunal de Primeira Instância, que condenou o empresário a pagar uma multa de cinco mil euros por tentativa de corrupção, agora é o próprio Tribunal da Relação de Lisboa a absolver o “réu” Domingos Névoa.
Absolvição virtual, porque o homem já há muito foi condenado pela opinião pública que, em contrapartida, vai erigir como heróis os irmãos Sá Fernandes.
Claro que nenhum Tribunal pode competir com os telejornais. O Tribunal tem que ser discreto nas sentenças e, bem, não pode nem deve aparecer a justificar publicamente a sua fundamentação. Mas a contestação da sentença por quem fez a campanha da condenação é, de imediato, notícia de primeira hora e devidamente sustentada nos dias seguintes.
E chegámos à inquisição dos nossos dias: mesmo depois de inocentado, o “réu” continua a ser queimado em lume brando.
Situação que pode fazer esquecer que a corrupção é crime demasiado grave para servir a alguns de pretexto à exibição pública de virtudes que deveriam ficar no foro do privado.
Nota: Entre procedimento não ético e desconformidade com a lei vai diferença substancial. Nem tudo o que parece ilegal, no final de contas o é. Ao Tribunal compete ajuizar da conformidade com a lei. A outros, competirá aproximar a lei da ética.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Um governo de negação

O PSD apresentou ontem no Parlamento uma proposta de redução da despesa no valor de 1,7 mil milhões de euros. Um Governo decente e responsável tinha por obrigação analisar e discutir a proposta, sobretudo numa situação difícil, como a actual. E, se cortes orçamentais são sempre politicamente difíceis, teria melhores condições para os executar, face ao apoio do maior partido da Oposição.
Acontece que o Governo, de forma tão arrogante como irresponsável, de imediato rejeitou o plano, classificando-o como “uma mão cheia de nada”. E logo tratou de usar os clássicos, tão abomináveis como detestáveis, processos de intenção, de forma a transferir a discussão para outras áreas. Então, a verdadeira proposta do PSD não era a que tinha sido apresentada; a verdadeira proposta era uma "agenda escondida", que tinha a ver com despedimentos na função pública, com o fim do SNS, com o fim da segurança social pública.
Enfim, o Governo e o Partido Socialista criticaram uma proposta virtual por eles próprios criada, de modo a evitarem a discussão de uma proposta concreta, aproveitável ou rejeitável, mas depois de devidamente estudada e analisada.
O Governo e o Partido Socialista não se deram ainda conta da situação crítica do país para a qual as suas políticas abundantemente contribuíram. E persistem em apelidar sumariamente de ignorantes ou disparatadas ou preguiçosas, por falta de trabalho de casa, tanto reputadas vozes internacionais como a voz do maior partido da Oposição.
Um Governo de negação, como tão bem um seu ministro foi qualificado pelo ex-economista chefe do Fundo Monetário Internacional, Simon Johnson.
Que terá o fim lógico e óbvio de ser rápida e definitivamente negado pelos portugueses.

O que terá acontecido?

Porque é que em Portugal as coisas não funcionam? Funcionam lá fora, mas cá não…
Não deixa de espantar que a exposição “Encompassing the Globe” realizada em Washington tenha sido fortemente patrocinada por mecenas portugueses, ao contrário do que aconteceu em Lisboa.
Quer dizer, a mesma exposição em Washington - realizada entre Julho e Setembro de 2007 - foi financiada em parte (segundo a notícia, num montante de 1,2 milhões de euros) por mecenas portugueses, de entre os quais estão a Fundação Gulbenkian, a CGD, o BPI, o BES, os investidores Joe Berardo e André Jordan, as Águas de Portugal, as Pousadas de Portugal, REN, FLAD e EDP. O Ministério da Economia também consta, através do Turismo de Portugal, da lista das entidades financiadoras.
Por cá, a “Encompassing the Globe” que decorreu no Museu Nacional de Arte Antiga - entre Julho e Novembro de 2009 - precisou de mais de 2 milhões de euros, pagos com dinheiros públicos, e apenas teve um patrocinador, a Fundação Gulbenkian, que avançou com um montante de 55 mil euros.
Segundo a notícia – lembro-me aliás de ter ouvido isso mesmo quando do anúncio da iniciativa – o ex-Ministro da Cultura do anterior governo informou que a Exposição seria realizada sobretudo com recursos a fund raising e que ele próprio se encarregaria de desenvolver os contactos de angariação de patrocínios junto das empresas portuguesas.
Olho para este caso com espanto, mas ao mesmo tempo com um sentimento de que já nada nos deve admirar. A ser verdade o que agora vem a público, é um absurdo o que se passou por cá com a organização desta emblemática e importante Exposição, dedicada à presença de Portugal no Mundo nos séculos XVI e XVII.
Mais uma vez se conclui que nem sempre os problemas são de natureza financeira, mas encontram explicação noutras causas, não menos importantes, uma delas que dá pelo nome de “organização”.

Banco de Portugal: Um homem com currículo

Num dos noticiários televisivos da manhã, um jornalista comentava a nomeação do Dr. Carlos Costa para Governador do Banco de Portugal. Apontando embora alguns aspectos positivos do seu currículo, salientava duas manchas negras: não ser conhecido do grande público e não ter experiência da supervisão bancária. Conhecido o modo como são replicados os comentários feitos nas televisões, a figura em questão corre o risco de ficar a ser conhecida não pelos seus méritos substanciais, mas pelos deméritos virtuais que o comentador lhe atribui.
Ser conhecido do grande público, em todo o lado e nomeadamente no sector financeiro, não é qualidade que corresponda a competência. Tirando os Presidentes dos grandes Bancos, por razões de ofício, mais ninguém é conhecido do grande ou do pequeno público. Mas o sector financeiro português é um dos mais modernos a nível mundial, o que atesta a competência dos seus gestores e quadros.
Ora o Dr. Carlos Costa tem um vasto, rico e bem qualificado currículo, quer como quadro e director do antigo Banco Português do Atlântico, como negociador e membro da representação permanente de Portugal na antiga CEE, como director de organizações comunitárias internacionais, como director-geral do BCP, como administrador da Caixa Geral de Depósitos e de outros bancos, ou vice-presidente do banco europeu de investimentos.
Entre tal currículo e ser conhecido do grande público, mesmo sem currículo, o atributo recomendável para esta sociedade virtual mediática seria o segundo. Claro que muita gente, por esta via, se torna competente e qualificada de um dia para o outro: meia dúzia de presenças na televisão e aí está um sujeito considerado e com opinião. Nesta ordem de ideias, também a ausência de currículo na área da supervisão seria um óbice, como se alguém o tivesse, a não ser que tivesse feito carreira, em tal área do Banco.
Não é por falta de currículo que o Dr. Carlos Costa não vai ser um bom governador do BP e, muito menos, pela ausência do que lhe foi apontado. A tal currículo profissional alia ainda um perfil e um conjunto de qualidades humanas que traduzem uma boa escolha.
Por uma vez, e não me lembro de muitas, o Ministro das Finanças pode ter acertado!...
Declaração de interesse: Conheci e fui colega do Dr. Carlos Costa no BCP, com quem fiz amizade.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Quase morte

Os fenómenos de “quase morte” aliciam qualquer um, sobretudo devido aos relatos de algumas pessoas que os contam e vivem com particular intensidade, uma luz maravilhosa, um túnel no fim do qual vislumbram luminosidades difíceis de explicar, traduzidas como sendo receções ou portas divinas para o paraíso. Já ouvi alguns relatos. Um deles marcou-me, porque foi contado com um sentimento de revolta por o terem ressuscitado, impedindo-o de ir para aquele espaço deslumbrante. Quando o ouvi, num programa televisivo, fiquei estupefacto pela forma como o ex-doente e quase morto criticava os que o salvaram. Este episódio fez-me recordar várias coisas, as razões destes tipos de fenómenos e um caso ocorrido comigo há muitos anos.
Numa noite, nas urgências do velho hospital, vi um senhor com graves dificuldades respiratórias. Solicitei uma radiografia do tórax, que se fazia na última sala. Não tinha decorrido muito tempo quando me chamaram. O senhor acabava de entrar em paragem cardíaca. Estava ainda na maca e comecei a tentar ressuscitá-lo sem convicção, porque de todas as vezes que o tinha feito, morreram todos. Era muito novo e voluntarioso. Os enfermeiros que me seguiram, ao fim de algum tempo de manobras de reanimação disseram-me: - Está morto, senhor doutor. Já está morto! Não me intimidei. Continuei com as manobras e, subitamente, verifiquei que o coração retomava os batimentos. Fiquei atrapalhado, porque não estava à espera. E agora? Agora tenho que o intubar, porque as dificuldades respiratórias mantinham-se. O pior é que nunca tinha feito essa manobra. A noite começava a ser cumprida e pedi que chamassem o colega da reanimação. Mas podia demorar e por isso tinha que avançar. Naquele tempo as coisas eram muito diferentes de agora. Já estava, meio nervoso, a iniciar a intubação, e ao mesmo tempo a tentar vigiar a parte cardíaca, quando o meu professor e diretor da reanimação passou, ocasionalmente, pelas urgências. Não estava de serviço. Olhou-me e perguntou face à minha mais do que visível ansiedade: - Oh S. o que é se passa?! Eu expliquei-lhe. Num ápice correu para mim e pediu-me para continuar com a vigilância cardíaca enquanto lhe enfiava o tubo pelas goelas abaixo, o que conseguiu logo à primeira tamanha era a sua experiência. Em seguida comecei a aspirá-lo, intervalando com uma ventilação manual. Não sei quanto tempo se passou, mas foi muito, até estar em condições para ir para o serviço de reanimação. Fiquei exausto. Nem sei como aguentei o resto da noite. Tinha conseguido, pela primeira vez, ressuscitar alguém. Recordo-me de na altura ter pensado: - Se o senhor se safar gostava de lhe perguntar se viu ou ouviu qualquer coisa durante esse período. Mas como muito provavelmente nunca mais o iria ver, dei por terminado este episódio.
Um interessante estudo esloveno efetuado em dezenas de pessoas que experimentaram o fenómeno quase morte revelou que os tais fenómenos, luz intensa e brilhante, “saída do corpo”, sensação de paz e de tranquilidade se devem a elevadas concentrações de dióxido de carbono. O que os autores não sabem é se os altos níveis de dióxido de carbono são devidos à paragem cardíaca ou se já existiam antes da morte iminente. É certo que algumas experiências demonstraram que a inalação de dióxido de carbono pode originar alucinações similares aos casos de quase morte. É uma associação e dificilmente se pode estabelecer nexo de causalidade e nem sei se algum dia poderá ser estabelecido, mas não deixa de ser interessante.
Voltando à minha vivência de há muitos anos, acabei, passados uns dias, ao chegar de manhã à minha enfermaria, de ver o doente numa das três camas que estavam sob a minha responsabilidade direta. Tinha tido alta do serviço de reanimação. Nunca tive a coragem de lhe fazer a pergunta. Achei que não devia. Recuperou e bem. Não sabia que era um paraplégico. Muito amável, educado e discreto. Afinal vivia no meu bairro. Diariamente fazia o seu percurso com a ajuda de familiares e contava a sua história quando tinha morrido às pessoas amigas ou conhecidas. Lembrava-se de, com muita falta de ar, ter ido ao banco e depois ficar tudo negro. Não viu nenhuma luz. Só ouviu vozes: - Está morto. Está morto. É preciso reanimá-lo. É preciso reanimá-lo. Já bate. Já bate. E contava a história repetidamente dizendo que o Salvador tinha sido o seu salvador. Cruzei-me com ele durante alguns anos, mas nunca fui capaz de lhe perguntar o que é que viu ou ouviu. Acabei por saber através de terceiros que, nas conversas do café, recontavam a história uns aos outros sem saberem quem eu era, naturalmente....

Para lá das análises, o interesse da Pátria

Todos os dias se sucedem as análises sobre a preocupante situação da economia portuguesa, vindos de "insuspeitos" analistas internos e externos.

Há muito que por aqui - e não só - se alertou para os erros das políticas de ilusão dos últimos anos. Acabaram-se as ilusões. É por isso chegada a hora para que, para lá das análises e dos diagnósticos, fazer tudo para desiludir os que apostam na ruína do País, estimulando a especulação.

Tem a primeira palavra o governo. Mas não só o governo...

Tarde piaram!...

Agora é o "conservador" economista e Prémio Nobel Joseph Stiglitz que chama a atenção para a vulnerabilidade das finanças públicas e da economia portuguesa, dizendo mesmo que correm o risco de falência.
De facto, face à crítica situação em que nos encontramos, torna-se agora fácil dar este tipo de alertas. Basta olhar para os dados fundamentais das finanças públicas e as conclusões são óbvias, independentemente do maior ou menor alarmismo.
Também muitos "pensadores" e muitos dos "grandes economistas" portugueses, que sempre defenderam e sustentaram a bondade das políticas governamentais, começam a tomar lugar na primeira linha daqueles, poucos, que sempre as contestaram.
Se, na altura oportuna, em vez de suportar os erros e as asneiras do governo, tivessem erguido a voz que agora exibem, por certo as coisas não teriam chegado a este estado.
Piaram tarde e a más horas!...
E não é bonito que, tendo ajudado a arrombar a casa, queiram ser agora ser vistos como os primeiros a meter trancas à porta!...

Criança com duas mães...


É a 1ª vez - Reino Unido: Casal de lésbicas regista bebé com o seu nome. Ambas são pais e mães... http://tinyurl.com/y5hvyau
Agora é uma questão de tempo para se propagar a outros países.
O conceito de família vai sofrer transformações impensáveis há meia dúzia de anos.

terça-feira, 20 de abril de 2010

O 4R Memória I: Desastre mais que previsto!...

Multiplicam-se os sinais de alerta sobre a situação das finanças públicas portuguesas. Hoje, mais um foi lançado por um antigo responsável pelo FMI. Embora por vezes exagerados, não podemos deixar de concordar que eles têm fundamentação substancial, já que os défices públicos são muito elevados e a dívida pública, em 2013, será bastante superior à actual.
O 4R já perfez 5 anos em Novembro passado. Neste Blog, muitos textos previam o desastre que as políticas do governo iriam provocar.
Recordo um excerto de um post meu de há 5 anos, de Abril de 2005, plenamente actual, até porque, na altura, outro Pacto de Estabilidade e Crescimento era apresentado a Bruxelas.
“…Na sequência da revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento, o Primeiro-Ministro e o Ministro das Finanças…já anunciaram as grandes linhas da política orçamental e financeira do Estado para a presente legislatura, que se poderão sintetizar nos seguintes princípios: o défice orçamental ultrapassará os 3% nos próximos anos, o défice de 2005 será de 6%..., o Governo não recorrerá a receitas extraordinárias, a tendência para um défice próximo dos 3% advirá primordialmente do crescimento económico e da luta contra a fraude e evasão fiscal…”.
Estes eram os factos. De que tirei as conclusões que se seguem:
“…Ou me engano muito, ou daqui a quatro anos, com esta política, estaremos em situação pior do que hoje, em termos de défice, e muitíssimo pior, em termos de dívida pública.
Pelo que se conclui da política governamental, a diminuição da despesa pública não assume carácter prioritário: por um lado, o Governo desistiu de um défice dentro do limite máximo do Pacto de Estabilidade, que continua a ser de 3% do PIB e, por outro, o Governo pensa que uma tendência para se chegar a 3% será assegurada automaticamente pelo crescimento e pelo aumento das receitas. Trata-se de um equívoco medonho, que um dia tratarei…”
Escrito em Abril de 2005. Não era preciso ter grandes qualidades de economista para prever o que se iria passar com tais políticas. A crise agravou, mas não pode servir de desculpa para o desastre.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Na esplanada

Àquela hora a esplanada estava vazia. Ele era o único ali sentado, com um prato de tremoços e uma cerveja, a falar alto ao telemóvel para que pensassem que estava a ultimar um assunto urgente.
As poucas pessoas na rua apressavam-se a ir para casa jantar e os colegas do trabalho ainda estavam no escritório, em reuniões prolongadas ou a acabar os trabalhos que sempre sobravam ao fim do dia. Ele também tinha tido esse hábito, chegar tarde a casa, o miúdo já deitado à espera do beijo apressado de boa noite, amanhã vens mais cedo, pai? Eu queria jogar contigo o jogo que me compraste no Natal. E ele, rápido, prometia, talvez, filho, vamos ver, o pai tem muito trabalho mas vamos ver. E o garoto adormecia a fungar, já não acreditava mas insistia sempre, na esperança de que um dia fosse verdade.
Não era capaz de dizer quando é que tudo começou a correr mal, os colegas a esquecerem-se de o chamar para as reuniões, o director a falar-lhe com distância, ele, que tinha sido o mais temido, o mais presente. È verdade que tinha começado a beber, um dia um almoço mais prolongado, depois mesmo antes do almoço, e a seguir também, precisava daquilo, daquele tónico da alma, ao princípio era para se sentir bem, depois já não sentia nada sem aquilo. Chegava a casa com um humor desgraçado, largava aos gritos por tudo e por nada, lembra-se até dos ímpetos de violência, o filho refugiava-se no quarto e já não queria brincar com ele, a mulher perguntava-lhe, o que foi, o que foi, e ele fazia um gesto largo, deixa-me em paz, são preocupações, nada que te interesse, e ia preparar outra bebida.
Por uma ou duas vezes avisaram-no de que era melhor não ir à reunião, da vez que teimou saiu-se tão mal, disparatou, as veias do pescoço salientes e os olhos enevoados do álcool, gostava daquela sensação de que era tudo à distância, de que nada o atingiria, mais um copo e nada lhe importava, só mais um copo.
Quando lhe tiraram o cargo de responsabilidade disseram-lhe que devia tratar-se, era uma pena que se deixasse afundar daquela maneira, que não desse cabo da vida. Começou a sair mais cedo mas não ia para casa, a mulher e o filho não podiam saber, gastava as horas sem saber como e justificava a bebida como sendo o seu consolo e a sua única companhia.
E agora, que no emprego nem davam pela falta dele, agora que ficava a vaguear depois de almoço sem saber para onde ir, agora não podia chegar a casa e abraçar o filho, que ficou a viver com a mãe quando ela lhe arrumou as coisas numa mala e o mandou sair. Disse-lhe assim mesmo, sai, agora, nunca mais te quero ver. Imperiosa, desapiedada, numa fúria fria que não lhe deu espaço para mais nada. Pegou nas coisas, incapaz de se opor, lembra-se agora que até sentiu alívio por poder ir beber um copo sem ouvir recriminações. Ouviu vagamente o choro do filho, lá longe, no quarto, ainda se voltou para lhe ir dar um beijo e prometer que voltava mas esbarrou nela, na determinação daquele olhar duro e inclemente, disse em voz alta, até logo, filho, o pai já vem, e desceu as escadas apressado, como um fugitivo.
Escolheu aquela esplanada porque dali via as janelas da casa, àquela hora já a mulher e o filho estavam em casa, podia saber se estavam na sala ou na cozinha pela posição dos estores, não tardava já acendiam as luzes e até conseguia ver as sombras esbranquiçadas do écran da televisão na parede.
Bebeu o último golo de cerveja e levantou-se, entorpecido, para ir apanhar o metro para o outro lado da cidade. Ao deixar as moedas na mesa de metal manchado, reparou que a mão lhe tremia. São saudades, pensou, não posso continuar assim. Amanhã deixo de beber, vou prometer-lhe que deixo de beber. Boa noite, filho, o pai promete que volta depressa, espera por mim.

Jamais, jamais e jamais!

Então, no prosseguimento da audição a Mário Lino, no âmbito do Inquérito sobre a alegada intervenção do Governo na compra da TVI pela PT, aqueles inocentes deputados perguntaram:
- Sr. Eng., V. Excia abordou alguma vez o processo PT/TVI nas reuniões que manteve com o CA da PT?
-Jamais! "A PT/TVI nunca foi matéria abordada, nem podia ser, porque nunca foi abordada nas reuniões dos Conselhos de Administração e Executivo...", respondeu ainda mais inocentemente Mário Lino.
Claro!...Jamais Mário Lino abordaria questões que previamente tivera que abordar para saber que não tinham sido abordadas, muito menos para sugerir uma qualquer abordagem.
Não, jamais!...

Decisões de política económica: estranha sensação de ligeireza...

1. O episódio recente da mudança de opinião, num curtíssimo espaço de tempo, no tratamento fiscal das mais-valias bolsistas, ilustra bem a leveza com que importantes decisões de política económica são hoje tomadas – e que explicam, em boa parte, o estado de degradação dos indicadores e das expectativas económicas.
2. Devo dizer, para começar, que o facto de a taxa de tributação das mais-valias (líquidas) passar de 10% para 20% não constituiria em si mesmo uma questão muito controversa, em tempos normais.
3. Até posso entender que, sendo a taxa de tributação dos dividendos de 20% e dos juros sobre activos financeiros tais como depósitos e obrigações também de 20%, é capaz de fazer sentido que a taxa de tributação dos ganhos de capital seja alinhada com essas.
4. A questão não é pois essa...a questão é outra e tem a ver com o estado de submissão em que as decisões de política económica hoje se encontram em relação às conveniências mediáticas do momento.
5. Com efeito, a decisão de manter a tributação das mais-valias em 10% tinha sido justificada pelo Governo, há pouco mais de 15 dias, com fundamento na situação do mercado de capitais...só quando o mercado de capitais desse sinais claros de ter superado a crise que o marcou desde há cerca de dois anos, essa questão poderia ser revista - era a posição oficial há 15 dias...
6. Agora, com a situação do mercado de capitais inalterada (na melhor das hipóteses...) decide-se, de um golpe, voltar atrás e aceitar que as mais-valias sejam tributadas em 20%...que sentido faz isto?
7. A principal consequência do aumento da tributação das mais-valias só poderá ser, naturalmente, a de encarecer o custo do capital para as empresas.
8. Não se pensou, ao decidir assim, que o custo do capital (factor entre nós cada vez mais escasso) já constitui hoje uma desvantagem relativa das empresas portuguesas, com tendência de agravamento a curto prazo?
9. Não se pensou que com esta decisão se pode estar a dar aos investidores do mercado de capitais um sinal de que devem procurar outras praças para investir? Chamem-lhe especuladores ou outros nomes, se quiserem, mas a verdade é que o seu menor interesse pelo nosso mercado só nos pode trazer custos adicionais...
10. Nada disto, nem a opinião tão firmemente sustentada há apenas 15 dias, contam pelos vistos: a agenda mediática ditou que agora era mais “bonito” aumentar a tributação das mais-valias, e pronto, aumenta-se a tributação das mais-valias fazendo tábua rasa de argumentos que apenas há 15 dias eram tão importantes...
11. Impressiona bastante esta ligeireza com que se vão tomando decisões de política económica...ao sabor de impulsos mediáticos do momento, neste caso da opinião mais ruidosa de uma facção do espectro político que encara as mais-valias como um alvo a abater...
12. A economia, essa, parece pouco ou nada relevar – depois não se queixem, como já aqui tenho dito...

domingo, 18 de abril de 2010

O Perfil!...

Até hoje, confesso que não percebia bem para que serviam os perfis traçados nos estudos científicos ou em teses de doutoramento em sociologia, normalmente utilizados para ilustrar os temas objecto de estudo. Lamentavelmente, não conseguia ver o alcance do perfil do corrupto, apresentado nos estudos sobre a corrupção, o perfil dos assaltantes a bancos ou bombas de gasolina apresentado nos estudos sobre ladroagem, ou o perfil dos sem-abrigo, inserido nas teses sobre quem dorme na rua. Pensava mesmo que o seu préstimo se esgotava no facto de, à míngua de ideias, dar uma dimensão razoável ao livro ou à tese.
Mas hoje, ao ler uma notícia sobre um trabalho que apresentava o “perfil" do corrupto, tive um clic e fez-se luz no meu mal iluminado espírito. E vi, como a partir daí, se pode acabar com a corrupção.
O perfil científico indicado para o corrupto é o seguinte: homem, casado, entre 36 e 45 anos, sem antecedentes criminais, com vínculo profissional a tempo inteiro.
Ora aí está a forma simples de acabar com a corrupção nos serviços públicos: demitir todos os homens casados dos 36 aos 45 anos, e sobretudo aqueles que não têm antecedentes criminais, por serem os mais perigosos. E membros do Governo com essa idade, nem pensar!... Se, por necessidade inadiável e permanente de serviço, se justificar qualquer excepção, pois que fiquem os que já têm vastos antecedentes criminais, que são os que, face ao perfil, dão maior segurança.
Claro que se o sujeito se divorciar, já deixa de ser casado e perde o perfil. Pode continuar, à vontade, funcionário ou Ministro. Mas, quando perfaz 36 anos, meus amigos, rua com ele. Sob pena de o chefe ficar associado à corrupção!...
Depois disto, até me arrepio ao pensar que um dia pensei que os perfis não serviam para nada!...
Nota: Ah, e altere-se a Constituição: Presidente, casado, dos 36 aos 45 anos, nunca!...

E é só fumaça...!

É uma espécie de jogo da estátua, de repente alguém dá sinal e tudo fica parado na exacta posição em que estivesse quando soou o apito. Interrompe-se a inércia que ia levar ao movimento seguinte, ao que se seguiria naturalmente para recuperar o equilíbrio e continuar a acção até se chegar ao destino e fica-se assim parado, um pé no ar, o braço avançado, o pescoço torcido em posições tão incómodas e arriscadas quanto a liberdade dos gestos que se ousou durante jogo.
A nuvem que tolda a Europa bloqueou os movimentos incessantes, a gigantesca inércia das deslocações, dos transportes, da rapidez e da pressa das agendas. De repente, tudo se suspende, amontoa e bloqueia, como por magia, uma nuvem, imagine-se, ainda por cima vinda dos fundos do mar, parece ficção científica, se houvesse um filme com este tema diríamos que já não se sabe o que mais inventar para atrair multidões. É bem certo que a realidade muitas vezes ultrapassa a ficção.
Já estávamos convencidos de que era possível dominar tudo, controlar tudo, prever quase tudo, e é um espectáculo impressionante ver como não há transição, não há tempo de adaptação, tudo acontece tão depressa que as distâncias que a modernidade já tinha vencido de repente lembram-nos a sua real dimensão.
Não houve mortos nem feridos, felizmente, quase passa despercebida a tragédia do terramoto algures na China, onde o socorro tarda em chegar, aqui é só fuligem e passageira, mas para quem está habituado a viver na organização e na segurança este caos é intolerável. As pessoas estão zangadas e impacientes e reparam assustadas que as respostas tardam e que “não há responsáveis” a quem exigir protecção ou dirigir o pedido de indemnização. Bem vistas as coisas, é apenas uma gigantesca contrariedade, muitas das coisas inadiáveis são adiadas, muitas urgências podiam afinal esperar uns dias, outras passam sem nós, os prejuízos materiais de uns são a galinha dos ovos de oiro para outros. O nosso mundo evoluído e confiante é afinal tão frágil, mas uma nuvem que deixa os aviões em terra é talvez a mais suave das maneiras de nos lembrar o grau de conforto e de liberdade de movimentos com que nos habituámos a viver e de que usufruímos com a naturalidade de uma rotina garantida. De vez em quando, lá vem a natureza lembrar que “o céu nos pode cair na cabeça”…

Uma entrevista para ler...

Gosto de ler as entrevistas de António Barreto. Aprecio a sua independência e liberdade. Embora não concorde com todas as suas opiniões e avaliações, é séria e realista a abordagem sobre os problemas que o País enfrenta, é grande a variedade dos temas tratados - a sociedade, a ética, a política, a justiça, a educação - e interessante a visão sociológica.
Não apresenta soluções. A frase "A situação é muito difícil. Há fragilidades muito grandes nas instituições. As pessoas não têm confiança." tem sido dita e redita. Não tem nada de novo. Está perigosamente velha. Sendo a falta de confiança um grande obstáculo, uma grande questão é saber o que é preciso transformar para recuperar a confiança!

sábado, 17 de abril de 2010

A nuvem que nos assombra!...

Um vulcão na Islândia gelada está a deixar a Europa sem transporte aéreo. As televisões montaram serviço permanente nos aeroportos. De dez em dez minutos os canais de noticias gastam meia-hora a focar as multidões nas salas de espera, apontam às filas para os balcões ocupados e aos écrans com os voos cancelados, registam o número de aviões que não puderam aterrar ou descolar, divulgam dramas pessoais de gente que não consegue chegar ao seu destino, entrevistam tudo o que mexa e lhes passe a um metro de distância.
Os canais generalistas, esses fazem do acontecimento um verdadeiro festival nos telejornais. Passam por todos os aeroportos da Europa, entrevistam cientistas e meteorologistas, pilotos e comandantes, políticos e responsáveis aeronáuticos e mostram-nos aviões e mais aviões em pista e passageiros nervosos. E mostram gráficos e imagens e figurações da nuvem de poeira que avassala os céus europeus.
Eu até admito isto tudo, embora as imagens ou os depoimentos sucessivos não tragam qualquer valor acrescentado em relação ao que anteriormente ficou dito. Mas é a lógica actual da informação, uma informação de encher chouriços. Claro que as pessoas gostam de chouriços.
Mas o que eu não posso compreender é a pergunta repetitiva, constante, permanente, incessante, contínua e massacrante, que os jornalistas das televisões fazem a quem lhes aparece pela frente se porventura a TAP os tem informado devidamente do momento da partida.
Então depois de todo o arrazoado anterior, dos gráficos e dos esquemas da deslocação errática pelos céus de parte de uma boa parte das entranhas islandesas é a TAP que vai dizer onde chegam ou não chegam ou a que horas chegam? E não é que muita gente responde que a TAP não os informa?
Pior que a nuvem islandesa é a nuvem que nos assombra!...

sexta-feira, 16 de abril de 2010

“Seres que outrora foram humanos”

Dizem que os animais não têm alma, só os humanos. Quando é que começaram a ter alma? Quando começaram a usar instrumentos, a planear o futuro, a utilizar a linguagem e a fazer uma série de coisas que os animais parecem não ser capazes? Mas há animais que usam instrumentos, têm uma forma de linguagem e até conseguem planear e antecipar o futuro de tal modo que, hoje em dia, é suficientemente óbvio que a linha que os separa é cada vez mais ténue. Esta perspetiva resulta da aceitação de que alguns animais apresentam capacidades cognitivas ao ponto de alguns cientistas construírem a seguinte interrogação: deverão essas criaturas ser consideradas como pessoas?
Quando um animal mata o seu tratador será que é um ato premeditado? Terá consciência e vontade de o fazer? Animais considerados inteligentes têm tido este comportamento. Afirmam alguns cientistas que estes tipos de animais não têm sentido da moralidade como os seres humanos, mas como classificar muitos homens e mulheres que também não o têm?
O debate sobre se algumas espécies animais deverão ou não ser consideradas como pessoas está em curso e, decerto, irá levantar muita celeuma, mas, no futuro, a posição dos humanos face às outras espécies irá modificar-se radicalmente. Quando e como? Não sei, mas “sente-se” algo nesse sentido. Os próprios direitos dos animais têm vindo a avolumar-se e a intensificar-se nos últimos tempos. Acresce que muitos estudos efetuados em algumas espécies revelam que estamos perante seres inteligentes, com interessantes capacidades cognitivas e até sentimentos que julgávamos ser os únicos detentores.
Em simultâneo com esta apreciação, a leitura de uma obra de Máximo Gorki, “Seres que outrora foram humanos”, levou-me a refletir mais uma vez sobre a natureza humana e a sua tendência. Seres que vivem em condições particulares, ao arredio da sociedade, que os teve e utilizou, mas que o tempo humano despejou numa iniquidade difícil de aceitar, retirando-lhes todas as prerrogativas. Na introdução, Chesterton afirma que “... a perda da humanidade ou a perda aparente da humanidade, para ele (Gorki), não é apenas enorme e lamentável, como também essencial e mística. A linha que separa o homem dos animais é uma das essências transcendentais de cada religião...”. As teologias definem essa linha não como algo esbatido mas sob a forma de um abismo inultrapassável entre o animal e o homem. Mas a história, a reflexão e análise dos homens demonstram, e bem, que o mesmo pode ser ultrapassado. Não há abismos intransponíveis.
São muitas as pessoas que viveram e vivem num contexto idêntico ao descrito por Gorki, meros “seres que outrora foram humanos”. As espécies animais não podem transpor esse abismo, a não ser que consigam ser religiosas, uma grande diferença entre humanos e animais. Que eu saiba não existe qualquer elemento que aponte para uma qualquer religiosidade animal, embora muitos humanos não acreditem e nem necessitem da religião.
De facto, em termos práticos é muito difícil estabelecer a tal linha...

Contrato espontâneo e apoio generoso

"Como apoiante espontâneo e fervoroso, (Figo) quer assinar primeiro o contrato..."
Paulo Penedos, citado no artigo Isto anda tudo um bocado pornográfico, de José Manuel Fernandes, no Público de hoje.

"O apoio que Figo deu ao PS e a mim próprio foi um apoio livre e generoso e independente de qualquer contrato..."
José Sócrates, no Programa de Miguel Sousa Tavares, citado no artigo de José Manuel Fernandes, no Público de hoje.

Os novos 50 anos

É um facto que, dobrados os 50 anos, as conversas nas reuniões entre amigos mudam completamente de temas. Durante os primeiros anos da juventude era o fascínio da mudança, da autonomia, a fantástica experimentação da vida “verdadeira”, acabar os cursos, casar, arranjar emprego, casa, automóvel, o nascimento dos filhos quase todos em poucos anos. Sempre que falávamos, e falávamos sempre, havia imensas novidades, perguntas ansiosas, um entusiasmo cúmplice de quem fazia o caminho a par e passo. Depois foi o tempo dos encontros cada vez mais espaçados, não havia tempo para nada, absorvidos até ao limite com o intenso ritmo de vida.
A fase dos filhos adolescentes é talvez a mais complicada, junta-se com a altura de maior esforço profissional, cada um precisa do seu espaço mas é preciso guardar um espaço comum, um equilíbrio exigente e diário, é preciso dar atenção a tudo e muitas vezes distraímo-nos do que dantes era tão importante, adiando um dia e outro, na esperança de poder retomar o fio quando houver um pouco de sossego.
Então, quase sem repararmos, celebramos os 50 anos, num instante os seguintes, e olham-se as muitas etapas já concluídas, quase todas as que nos consumiram energias, entusiasmo, alegrias e desilusões. Nessa fase da vida já renderam as qualidades e assumem-se sem complexos os defeitos, já se esgotou a paciência para muitas cedências, para nos esquecermos de nós próprios, para esperar oportunidades.
Depois dos 50 há balanços, com o seu cortejo de confirmações e ajustes de contas. Mas o declínio da juventude é hoje mais lento, acredita-se mesmo que é possível adiá-lo, e a necessidade de reajustamento resulta também da ânsia de aproveitar plenamente uma nova fase da vida, que se perspectiva cada vez mais longa.
Se foi possível uma relação afectiva profunda e um estilo de vida em que ambos se sintam bem, esta fase traz o gosto de uma nova liberdade, uma sensação de dever cumprido, que permite que se usufrua do que se construiu ao longo da vida, não só materialmente mas também emocionalmente. No entanto, obriga a que se procurem novos centros de interesses e exige uma espécie de recomeço interior, reorganiza-se o tempo, aceitam-se as diferenças, recuperam-se gostos esquecidos de partilha e companheirismo que preencham numa nova harmonia o vazio e o silêncio que ficou.
Mas outras vezes essa reconstrução não é possível porque o que sobra é apenas um monte de estilhaços que se encara com desânimo e sem fé na sua regeneração. Confrontadas com o tempo que corre veloz, recusam renunciar à felicidade e decidem-se pela mudança radical, partindo para a renovação dos três “cês”, como li há dias numa revista,”casa, carro, cônjuge”, muitas vezes o emprego também, arriscando começar tudo do zero rumo a uma nova vida.
Depois dos 50, seja qual for o lastro de realização ou frustrações com que cada um aí chegue, as conversas entre amigos voltam ao tema das motivações pessoais que determinam o modo como se encara o futuro.

O vulcão da vida moderna...


Vulcão Glaciar Eyjafjallajokull - Islândia

É impressionante como os fenómenos naturais perturbam a globalização, o desenvolvimento económico e social que construímos, como se limites não existissem ou como se as tecnologias que sucessivamente inventamos tudo permitirão controlar ou condicionar. E de repente parece que ficamos como que paralisados. É como se o mundo parasse.
Felizmente que não é assim. Os vulcões continuarão a proporcionar-nos espectáculos extraordinários e perante a sua grandeza resta-nos admirá-los e protegermos a vida das pessoas que vivem perto do seu epicentro.
Nada é absoluto. O que não é bom (ou aparenta não ser) também tem as suas virtudes...

Recuperar o tempo perdido...

Têm surgido vários avisos sobre as dificuldades das famílias, que se poderão agravar, em fazer face às despesas com a educação dos filhos, inclusive tratando-se de escolaridade obrigatória. Mas os avisos são acompanhados de situações concretas que vamos conhecendo. Não é de estranhar que numa fase de dificuldades económicas, em que sobressai um elevado nível de pobreza e a que se junta um significativo aumento do desemprego, a capacidade para fazer face às despesas com a educação se ressinta face a orçamentos familiares mais apertados e em muitos casos insuficientes para satisfazer necessidades básicas.
E as preocupações adensam-se quando o PEC prevê que serão revistos os limites de deduções fiscais em função dos escalões de rendimentos. Se por um lado é justo que as deduções à colecta do IRS sejam diferenciadas em função do rendimento colectável das famílias, é fundamental que os limites sejam realistas tendo em consideração o custo da educação e a capacidade e a elasticidade do rendimento das famílias.
Se pensarmos que Portugal tem necessidade de investir em educação, então o Estado deve preocupar-se com políticas que não aumentem o custo da educação por via fiscal. Muito pelo contrário, é normal que o custo com a educação seja subsidiado pelo Estado, por se tratar de um benefício fundamental para a sociedade, do qual o desenvolvimento económico está dependente.
São inúmeros os estudos que mostram que a educação tem um papel fundamental no desenvolvimento económico e social moderno. A realidade é, a este respeito, uma evidência. Não será o único factor, mas baixas qualificações constituem uma dificuldade para responder aos desafios da inovação. Inovação não apenas no sentido tecnológico, mas em múltiplos aspectos que envolvem, por exemplo, gestão e organização.
Os países que mais progrediram ao longo do século XX foram aqueles que investiram fortemente na educação, tendo proporcionado à população activa níveis de escolaridade elevados e obtido por essa via vantagens competitivas geradoras de desenvolvimento económico, de bem estar económico e social.
Um estudo recente, publicado no Boletim da Primavera do Banco de Portugal – “O Investimento em Educação em Portugal: Retornos e Heterogeneidade” – lembra que Portugal entrou no último quarto do século XX com a população activa menos escolarizada de entre os países da OCDE e que a educação está no primado das decisões individuais, sendo a que tem mais impacto na produtividade do trabalho e no retorno que os trabalhadores obtêm no mercado de trabalho sob a forma de salários mais elevados.
Se é verdade que em Portugal as mudanças tecnológicas nas últimas décadas se acentuaram, fruto da crescente abertura e integração económica mundial, também é um facto que os benefícios daí decorrentes foram apropriados de forma assimétrica pela população activa. É que as oportunidades surgidas no mercado de trabalho estiveram apenas ao alcance de uma reduzida percentagem, constituída pela parte da população activa com maior nível de escolaridade. Esta realidade, segundo o estudo, explica como o crescimento económico em Portugal originou uma maior desigualdade na distribuição do rendimento. Ou seja, o acesso a oportunidades profissionais mais produtivas é condicionado pelos níveis de escolaridade.
Portugal fez importantes progressos, quer em termos de cobertura da população pelo sistema de educação quer em termos de melhoria de qualificações. Apesar desta evolução positiva, “o actual nível de escolarização da população portuguesa permanece particularmente baixo face ao conjunto de países desenvolvidos.” Em 2007, Portugal apresentava de entre os países da OCDE a mais baixa proporção da população activa com o ensino secundário completo e uma das mais baixas proporções de cidadãos com o ensino superior completo.
Este panorama condiciona as mudanças de padrão de desenvolvimento que precisamos de realizar e mostra que é necessário fazer um grande investimento na educação das gerações mais novas e que, ainda assim, os resultados não serão imediatos.
Num tal contexto, o investimento em educação é uma prioridade que o Estado deve acarinhar, olhando para o esforço que é exigido às famílias para fazerem face às despesas com educação, numa perspectiva de que está em causa um bem público sem o qual continuaremos a ter grandes dificuldades em criar riqueza sustentável.

Um país cataplético

Sucedem-se os avisos internos e externos sobre o perigo de Portugal se aproximar do abismo económico e social. As comparações não só com a Grécia mas com a situação extrema que viveu a Argentina há uns anos, repetem-se. Inúmeras vozes autorizadas, algumas pertencentes a insuspeitos apoiantes do partido do poder, apontam que só há uma saída que passa pela criação de condições para um maior crescimento económico, diminuindo a despesa e o endividamento públicos e estimulando o investimento privado gerador de riqueza. Porém, as medidas anunciadas continuam a apontar no sentido contrário. Para a penalização das empresas e das famílias com o aumento de impostos. Na aposta em manter a despesa a níveis que todos têm consciência que se tornaram incomportáveis. Na continuação de políticas de obras públicas que conduzem ao crescimento da dívida, independentemente da sua utilidade económica. Na penalização das condições de financiamento das empresas no mercado a que levará a decisão de tributar as mais-valias. Tudo ao contrário do que seria de esperar.
Entretanto no Parlamento assistiu-se a mais um debate com o PM. O que se ouviu é a prova mais evidente do estado cataplético a que chegámos. Pela parte do chefe do governo tudo continua a estar bem e as medidas que foram aceites por Bruxelas, bastam-lhe. Pela parte dos deputados, o habitual fait divers, o debate oco, os sound bites do costume, patéticas afirmações ideológicas...
Impossível associar a esta situação a imagem de Roma a arder, com o imperador, em primeiro plano, tranquilamente tocando a sua harpa...