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quinta-feira, 31 de dezembro de 2009
Nova década
A todos desejo uma óptima década e, como o melhor é levarmos cada ano de sua vez, que o 2010 vos traga muitas alegrias e renovada vontade e motivos para celebrar a vida!
Economia em 2010: navegação à vista e pouco mais?
2. Não temos orçamento para 2010, só daqui por algumas semanas na melhor das hipóteses.
3. Dispomos é certo das previsões de organismos internacionais, FMI e OCDE, mas estas sugerem uma quase estagnação da economia portuguesa em 2010 relativamente a 2009 o que é francamente insatisfatório – nada a ver com os “sinais claros de retoma” de que o tal “vidente” nos prometia há dias – se nos lembrarmos que em 2009 vamos ter uma quebra da ordem de 3% do PIB, prevista pelo 4R desde o início do 2º trimestre...
4. Um aspecto positivo é a quase certeza de não haver agravamentos de tributação, nomeadamente sobre o rendimento – por insuficiência de quórum na Assembleia da República para tal malvadez - que seriam um verdadeiro flagelo para uma economia profundamente depauperada por um Estado gastador e perdulário que se tem dedicado a aumentar o nível da despesa pública sem qualquer preocupação quanto aos efeitos de tal política.
5. A dívida pública vai conhecer mais um período de forte expansão, resultado do défice reconhecido e do défice não reconhecido (escola grega) - que, apesar de não reconhecido, não pode deixar de ser financiado – em resultado do que o rácio da dívida pública sobre o PIB deve ultrapassar 90%.
6. Talvez fosse interessante que, com a celebração do centenário da República, no próximo dia 10 de Outubro, a dívida pública chegasse a 100% do PIB, oferecendo motivo para uma dupla celebração...
7. Vamos por certo continuar a gastar muito mais do que produzimos, prolongando o enorme desequilíbrio da conta corrente com o exterior que arrastamos há anos e fazendo subir o endividamento externo e global de forma imparável, mas já sabemos que não temos de nos preocupar com isso tal como o Mississípi...
8. Indiferentes aos sinais da conjuntura e dos desequilíbrios fundamentais da economia, vamos continuar a “castigar” os adquirentes de certificados de aforro (cada vez menos, é certo), oferendo-lhes na data da subscrição taxas de remuneração que não chegam a 25% da remuneração que é paga aos investidores, na sua maioria externos, que adquirem dívida pública portuguesa ao prazo de 10 anos...
9. Vamos também continuar, garbosamente, a “investir” em grandes empreendimentos públicos, auto-estradas e mais auto-estradas, TGV, novo aeroporto (?), etc, indiferentes aos sinais dos mercados e tendo como fundamento combater a crise, embora esta seja a final a maior beneficiária deste trabalho...
10. Vamos ter pela frente, muito provavelmente, a discussão do projecto da Regionalização em que tantos depositam esperanças para ultrapassar os problemas estruturais da economia nacional e que poderá proporcionar útil contributo para aumentar ainda mais a despesa pública...embora a Regionalização garanta que a despesa será de melhor qualidade...
11. Vamos, enfim...continuar a navegar à vista, sem faróis, sem bússola e os outros instrumentos quase todos avariados. Mas quem sabe se, no meio deste quase deserto de perspectivas, a visita de Bento XVI nos pode trazer alguma dádiva não esperada...
Santo Onofre nos valha!
Num destes convívios, o parceiro do lado, entre duas garfadas, atira para o grupo: - Vejam lá que estamos a endividar-nos ao ritmo de dois milhões de euros por hora. Olhámos uns para os outros, e eu comecei a calcular que no final de jantar seriam mais seis milhões de euros. Não me tirou o apetite, mas despertou-me a atenção para um pequeno artigo que tinha lido naquela manhã. E quando alguém começa a falar de tragédias, aparece sempre mais um a lançar gasolina no fogo. É típico dos portugueses. E foi o que eu fiz. – Então os senhores já sabem que “entre o aumento de receitas e diminuição de despesas, o Estado Português para reduzir o seu défice anual para os 3% precisa de 10 mil milhões de euros”? Ah! Não sabiam. O pior é que para alcançar esse objetivo teria de subir a taxa máxima de IVA para 35%, ou subir a taxa máxima do IRS para 87% (e as outras em proporção); ou reduzir em 47% os salários da função pública e, esperem aí, eu tenho aqui o recorte da nota do Daniel Bessa. E passei a lê-la. Durante aquele período de tempo, corri o risco de dar cabo do jantar, esfriando o bacalhau. Estava a ver que o jantar ia para o “galheiro” quando uma das colaboradoras, que andava a servir-nos, uma mulher do povo, de língua solta, analfabeta, mas não parva, useira e vezeira da mais pura linguagem vicentina, salvou a situação. – Então Senhor Doutor, está tudo bem? O bacalhau está bom? – Está sim senhora. Respondi. – E o senhor anda bem? – Ando, felizmente. E a Maria? – Eu também ando, nem dinheiro me falta desde que arranjei um Santo Onofre. -!!! Arranjou o quê? – Um Santo Onofre! – Sim. Arranjei um Santo Onofre, tirei a parte de baixo, que era de madeira, enfiei-o numa taça com aguardente até os joelhos do santo e coloco todos os dias um euro. – Explique-me bem, que eu não estou a perceber. - O Santo Onofre é o santo da prosperidade. Coloca-se um euro, diariamente, e reza-se uma oração durante 21 dias. Ao lado direito do santo põe-se um copinho de água com um raminho de salsa. Foi então que lhe disse: - Já que está enfiado em aguardente até aos joelhos, a água deve ser para a ressaca! - Mas olhe que a aguardente desaparece todos os dias. Veja lá que no primeiro dia, o gajo, que é “bêbado que nem um caraças (esta do caraças é a versão soft)”, bebeu toda a aguardente. Todos os dias tenho que botar mais.
A conversa continuou e fiquei a saber que teve de o esconder, porque o homem, que anda sempre “teso”, foi-lhe um dia ao santo. Descoberto pela mulher, desabafou, dizendo que, afinal, o santo tem mais sorte do que ele, não anda “teso”, dão-lhe dinheiro e ainda por cima “bebe” aguardente. A partir daqui a conversa tornou-se mais vicentina, ficando a conhecer o percurso da imagem, que até foi enviada para a capital para ser benzida. Nesta altura, alguém lhe perguntou: - Compraste o santo e mandaste-o para Lisboa para ser benzido?! E foi sozinho? – E não teve medo! Ripostou de imediato em tom de escárnio.
Independentemente dos aspetos mais caricatos da conversa, a senhora é mesmo devota, acredita piamente naquilo que faz, ao ponto de me prometer que, no dia seguinte, iria lá a casa mostrar o santo. Foi então que eu comecei a engendrar uma solução para a crise do país. O governo da República deveria arranjar muitos Santos Onofres, mergulhados em taças cheias de aguardente até aos joelhos, onde os diferentes ministros lançariam diariamente não um euro, claro está, mas uns bons milhões. E a mesma medida também podia ser adotada à porta da maioria das câmaras municipais do país. Aguardente é coisa que não falta por aí e enquanto for o santo a “beber” não virá mal aos fígados nacionais. Onofre, como é santo, deve ter maneira de proteger o seu! No final, o país até poderia ficar mais próspero.
No domingo de manhã, tal como me tinha sido prometido na véspera, o Santo Onofre da vizinha entrou-me em casa numa taça com aguardente e cheia de moedas de um euro. Peguei numa moeda e fiquei com a mão impregnada do seu cheiro. Pus-me a pensar: - No dia em que tirar notas de euro da minha carteira a cheirar a aguardente, então, o país já estará salvo! A não ser que, entretanto, a bebam toda...
quarta-feira, 30 de dezembro de 2009
Só circo, sem pão
Hoje, chovem as queixas. Diz o Público de hoje que só o estádio de Leira custa 5 000 euros por dia na manutenção e que a Câmara está arruinada, mas também Aveiro, Coimbra e Loulé (lembram-se de Loulé, com uma capacidade absurda?) e dizem que “a taxa de ocupação é irrisória para a dimensão que têm”. Soluções? Pois parece que queriam vender, não sei a quem, mas que essa hipótese não é legalmente possível, o que acredito, pois na altura não passaria isso pela cabeça de ninguém, vir a vender manás. Além disso, os abençoados e imperdíveis fundos comunitários teriam que ser devolvidos, nestas coisas não há direito a enganos, a candidatura está lá e é para valer.Também parece que não podem “ceder, trocar ou dar de exploração, no todo ou em parte”, porque o contrato o impede. Há quem pense em alugá-los para festas de casamento e baptizados, quem sabe mesmo se de aniversários ou quermesses, ou reuniões de condóminos, quem sabe? qualquer ajuda é bem vinda. E já ninguém se lembra de quem defendeu os estádios, ou fez os estudos infalíveis, ou previu o impulso de desenvolvimento em Loulé.
O economista Augusto Mateus aponta o caminho: “-Não vejo grandes soluções além de demolir e fazer outra coisa no seu lugar” e, questionado sobre porque razão não se viu logo isto tudo na altura, respondeu pragmático. “_ Quando estamos muito entusiasmados com o circo, tudo parece fácil”.
Pois é, o pior é quando, para haver circo, deixa de haver pão.
Azares e responsabilidades
A festa da vida...
Morre lentamente quem não viaja, quem não lê, quem não ouve música, quem destrói o seu amor-próprio, quem não se deixa ajudar.
Morre lentamente quem se transforma em escravo do hábito, repetindo todos os dias o mesmo trajecto, quem não muda as marcas do supermercado, não arrisca vestir uma cor nova, não conversa com quem não conhece.
Morre lentamente quem evita uma paixão, quem prefere o “preto no branco” e os “pontos nos is” a um turbilhão de emoções indomáveis, justamente as que resgatam o brilho dos olhos, sorrisos e soluços, coração aos tropeços, sentimentos.
Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho, quem não arrisca o certo pelo incerto atrás de um sonho, quem não se permite, uma vez na vida, fugir dos conselhos sensatos.
Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da má sorte ou da chuva incessante, desistindo de um projecto antes de iniciá-lo, não perguntando sobre um assunto que desconhece e não respondendo quando lhe indagam o que sabe.
Evitemos a morte em doses suaves, recordando sempre que estar vivo exige um esforço muito maior do que o simples acto de respirar.
terça-feira, 29 de dezembro de 2009
A magna questão dos feriados
Mesmo percebendo muito pouco – cada vez menos – das regras ditadas pela economia, não vejo como esse tema possa ter qualquer urgência, para não dizer sensatez, e o que me parece é que surge aos olhos das pessoas como um aproveitamento do clima geral de pânico, que propicia a que se ponham em cima da mesa, como se fossem vitais, todas as propostas que, noutro contexto, mereceriam viva contestação. Em suma, estamos por tudo, vale tudo menos algum respeito pela inteligência e pela debilidade dos que sofrem a ameaça da perda de emprego.
Não sei se temos feriados a mais ou a menos, ou se os feriados deveriam passar a ser às 2ªas feiras, como acontece em muitos países da Europa. Mas não percebo qual é a importância real dessa pretensa “poupança de folgas”, que apagarão do mapa algumas referências históricas ou religiosas que ainda são marco na nossa memória colectiva, quando o problema é falta de emprego, é falta de encomendas, é falta de mercado, e não falta de vontade de trabalhar.
Esta iniciativa gera desconfiança e cria uma sensação de abuso do estado de necessidade de muitos que ainda conservam os seus empregos, fazendo lembrar a expressão tão popular de “coitado de quem precisa”…
A insustentável leveza da democracia socialista
O Orçamento: Dose III
segunda-feira, 28 de dezembro de 2009
Confusão legislativa...
Mas não foi este o entendimento do Tribunal da Relação do Porto que determinou que o condutor tem o direito de recusar, não havendo crime de desobediência.
Segundo entendi há inconstitucionalidade porque a não previsão de recusa do direito não é competência do governo mas sim da Assembleia da República.
Vai continuar a ser possível a um condutor recusar-se a fazer o teste de recolha de sangue, invocando junto de um tribunal que tal comportamento constitui um direito e não um crime de desobediência. Pode acontecer, no entanto, que o tribunal que julgar o caso venha a ter um entendimento diferente do Tribunal da Relação do Porto.
Pergunto: se é importante em termos de prevenção rodoviária precaver a recusa do teste de recolha de sangue por parte de um condutor porque é que a lei não é alterada? Para que serve uma lei que pode ter entendimentos diferentes por parte dos visados e estar sujeita a interpretações distintas por parte dos tribunais, impedindo assim que a sua aplicação seja universal? Uma dúvida tão importante parece estar instalada desde 2005, ano em que foi aprovado o novo Código da Estrada.
Fazer leis é uma actividade em que nos especializámos, em particular quando se trata de cuidar dos aspectos formais. As formalidades têm a sua importância, com certeza, mas não menos relevante deveria ser a eficácia das leis que produzimos.
Trichet troca-nos as voltas?...
2. Esta tese de Trichet deve ter apanhado de surpresa os responsáveis governamentais, que não tiveram qualquer tipo de reacção (que se conheça), habituados que estavam à ideia de em 2010 não terem de fazer nada ou quase nada, deixando para 2011-2013 o principal trabalho de saneamento dos défices excessivos....claramente à espera da boleia da recuperação económica que torne esse trabalho menos ingrato.
3. A posição de Trichet deve partir de uma desconfiança em relação a planos de correcção dos défices excessivos que esperam a ajuda do ciclo económico e que por isso não atacarão, como o BCE desejaria, o excesso de despesa que está subjacente aos desequilíbrios orçamentais correntes.
4. Por outro lado, o adiamento do processo de ajustamento para 2011, 2012 ou 2013 tornará mais difícil a vida ao BCE no que se refere à retirada gradual das medidas excepcionais de acomodação monetária que estão em curso e que deverão ser eliminadas ao longo do próximo ano.
5. Entre essas medidas avultam as linhas de crédito facilitadas aos bancos da zona euro com caução de títulos da dívida pública. A redução destas linhas de crédito irá certamente ter impacto negativo na procura de dívida pública por parte dos bancos tendo como natural efeito uma subida da respectiva taxa de juro e maiores encargos orçamentais.
6. Esse efeito poderá ser agravado pelo facto de as necessidades de financiamento dos défices orçamentais deverem atingir valores “record” em 2010, dificultando ainda mais os esforços de correcção dos défices.
7. Este problema é especialmente delicado para os países do “arco da dívida”, com a Grécia à cabeça, que poderão ver os encargos com a dívida pública subir muito acentuadamente em 2010 e seguintes, tornando o esforço de ajustamento orçamental especialmente penoso e de resultado muito contingente...e exigindo eventualmente aumentos da carga fiscal que seriam um verdadeiro flagelo para economias frágeis e ainda mal curadas da crise.
8. Daí a advertência que Trichet deixou a alguns países que, na sua opinião, deveriam começar já em 2010 um esforço muito especial de ajustamento...nesta advertência Trichet tinha certamente em vista estes países do “arco da dívida” ao qual nos podemos orgulhar de pertencer.
8. Esta posição de Trichet é compreensível e aparentemente sensata...só que vem ao desencontro dos planos de (pelo menos alguns) líderes políticos que esperavam ter folga para iniciar o “trabalho de casa” e até para se envolverem em adicionais aventuras despesistas de grandes obras públicas (em nome do santo combate à crise, claro), como bem sabemos...
9. Percebe-se, a esta luz, o silêncio dos políticos em relação às declarações de Trichet, mas esse silêncio não poderá durar sempre – e vai ser curioso avaliar as suas reacções, sobretudo daqueles que estão em atraso na apresentação das propostas orçamentais para 2010...Trichet troca-nos as voltas?
O Orçamento-Dose II
Não se vê assim qualquer justificação para a dramatização que o Governo vem fazendo à roda da aprovação do OE para 2010.
Se o Governo pretendesse em 2010 diminuir a despesa e conter o défice, política correcta, poderia fazê-lo à vontade. Mas, a avaliar pelo passado e pelo presente, não será essa a política do Governo.
A dramatização é feita, porque a política governamental se esgota no aumentar ainda mais a despesa, pelo que a contenção do défice e da dívida pública só se fará com mais impostos.
Sejam eles os do Código Contributivo ou e outro qualquer Código.
Portanto, quem tem que dramatizar é a populaça, não o Governo. O Governo, com mais impostos, deixa de fazer o trabalho de casa e fica descansado. O descanso para o Governo, a tragédia para os portugueses!...
domingo, 27 de dezembro de 2009
Peripécias de natal II
Jantámos e conversámos longamente até que, já passadas as 2h da manhã, começaram as despedidas e as combinações do costume, quem é que leva a mãe, a tia não pode ir sozinha a estas horas, enfim, tudo se compôs e partiram todos.
Uma boa hora depois, já tínhamos nós detectado quais os sacos que se tinham extraviado e ficado por cá ou sido levados por engano, toca o telefone e era um elemento da família que mora em Cascais e que amavelmente tinha acompanhado a tia, - que vive sozinha e tem 78 anos mas que guia o seu carro e é muito independente, - à casa dela, em Benfica, enquanto o marido seguia no carro atrás. Deixou-a à porta da garagem, agarrou no monte de sacos que lhe cabiam, mudou-se para o carro dela e lá seguiram para Cascais, onde chegaram depois de filas intermináveis para passar as portagens. Mal chegou a casa reparou que, no meio da balbúrdia de sacos, tinha agarrado na carteira da tia!, que assim teria ficado certamente à porta da garagem, no meio da noite, sem chaves, nem telefone, nem nada. O que fazer? Voltar para Lisboa e ir ter com ela? E se ela tinha decidido vir aqui ter a minha casa, na esperança de que eu tivesse sido entretanto alertada para o drama? Grande alvoroço e já estávamos de casaco vestido para ir a Benfica, na esperança de ela aí se ter mantido à espera de socorro, quando tocam à porta. Era a tia, toda nervosa, que não sabia da carteira, talvez tivesse caído ao entrar no carro, talvez tivesse ido no meio dos sacos para Cascais, enfim, suspirou de alívio por ver confirmada esta última hipótese nas não podia entrar em casa e queria mesmo era ir dormir em paz e sossego à sua casa, depois de tanta confusão.
Por pura sorte, lembrei-me que há uns anos ela me tinha confiado uma chave de casa, quando ficou viúva e sozinha. Já nem se lembrava, por isso considerou um milagre da quadra quando desencantei a chave com o nome dela no meio de um molho enorme, numa caixa onde vou deixando todas as chaves que encontro no caminho, porque detesto chaves e portas fechadas.
Fomos então em caravana a Benfica, eu com ela no carro e a preciosa chave no bolso, mas desta vez quis deixá-la em segurança dentro de casa. Foi sorte, porque mora num daqueles prédios modernos onde a garagem é no 6º piso da cave e tem cancelas por todo o lado que exigem um cartão que estava na carteira, em Cascais. Foi preciso chamar o guarda que, pelo intercomuncador, foi abrindo as cancelas mágicas, uma a uma. Finalmente, uf!, saímos do carro e, nas profundezas do prédio, tirámos os sacos dela e acartei tudo para a porta do elevador. Aí, com a voz muito sumida de angústia, diz ela: - “Ai, não podemos entrar, é preciso voltar tudo atrás e ir à entrada do prédio! É que o elevador também só se chama daqui com a chave!”
Olhei os sacos, a tia, o telemóvel sem rede e a escadaria de emergência, única salvação possível para chegarmos a bom porto. Mas era impossível, mesmo sabendo que talvez no 1º andar, ou seja, sete andares acima da cave, já se encontrasse um diabo de uma porta que não estivesse trancada.
Tive então a brilhante ideia de esperarmos que a noite de consoada trouxesse algum retardatário àquele poço e ali ficámos as duas, dentro do carro, até que ouvi, como música, o ruído de um motor a aproximar-se. Eram uns providenciais vizinhos, desconhecidos, claro, porque a garagem enorme é de vários prédios, mas que nos abriram a porta do elevador mesmo antes de morrermos geladas naquela escuridão.
Deixei-a em casa, já sossegada, e ainda tive que ouvir um raspanete quando cheguei ao nosso carro, por ter demorado tanto e não ter avisado…
Tudo está bem quando acaba bem, abençoado espírito de Natal!
Peripécias de Natal I
À medida que a família foi crescendo, e sobretudo quando a nova geração já era de mais de uma dúzia e todos com menos de 6 anos, decidimos que já não abríamos as prendas em casa dos avós, no ano em que houve uma tal zaragata dos mais pequenos à volta do monte dos presentes, que mudámos de estratégia e passámos a acartar com os sacos para se abrirem só no dia 25, em casa de cada um.
Passou então a haver a complexa troca de sacos. Cada núcleo leva devidamente identificados os sacos com as prendas destinadas a cada um dos outros núcleos (7, incluindo o dos avós e das tias avós) mas, como há grupos numerosos, os sacos multiplicam-se e é certo e sabido que o dia 25 amanhece com o telefone a tocar, tu levaste o meu saco? A mãe ficou com as vossas prendas, afinal ficou aqui o teu monte, etc,etc, até que ao almoço, onde nos juntamos de novo, se repõe tudo na devida ordem, depois de acaloradamente apurado de quem foi desta vez a culpa da confusão.
Houve um ano, ainda as crianças eram pequenas, em que chovia imenso à saída e o meu marido foi buscar o carro, que era na altura uma Diane com capota de pôr e tirar, e parou-o à porta, no meio da rua estreita, para eu poder sair equilibrando milagrosamente as duas garotas ensonadas e os sacos que nos cabiam, sem ficarmos encharcadas. Com a pressa, atirou com a porta e correu com o chapéu de chuva aberto para nos abrigar da chuva mas, quando chegámos ao carro, o fecho tinha encravado e a chave estava lá dentro! Enquanto ele se desesperava a tentar desencravar a porta, eu recolhi de novo as meninas e os sacos e os que ainda estavam em casa, à espera de vez para sair, vieram todos dar palpites na maior excitação. O pior é que a rua tinha eléctricos e em pouco tempo já havia uma fila de eléctricos parados atrás da Diane, as pessoas a sair para seguir a pé, imbuídas do pacífico espírito natalício, e os guarda freios, muito amáveis, a propor que se partisse um vidro do carro com uma matraca.
Até que alguém se lembrou de ir buscar um dos sobrinhos pequenos, que era magrinho como um fio e que, empoleirado às cavalitas no pai, conseguiu fazer passar o bracito esquelético numa folga da capota e chegar com um arame ao trinco do carro.
Esse Natal foi emocionante, mas também houve um em que nós é que tínhamos ficado de levar as batatas palha para acompanhar o perú, com muitas recomendações de que era essencial porque para muitos são o melhor que o peru tem. Depois de várias tentativas para encafuar tudo na mala do carro sem esmigalhar as batatas fechámos a mala e ops!, a chave lá dentro! Tivemos que ir noutro carro, muito atrasados, sem batatas nem presentes, e a nossa chegada à festa foi um verdadeiro fiasco, ainda hoje me falam nisso.
E comecei aqui a lembrar-me de algumas peripécias passadas quando o que queria era mesmo contar a deste ano. Lá terei que encetar outro post…
O Orçamento: Dose I
Se um membro da família se apropria da riqueza da família e a desbarata, a família fica mais pobre.
Se o Estado se apropria anualmente de uma parte cada vez maior da riqueza do país e a gasta por grosso, ao desbarato e sem critério, é o país que fica mais pobre.
Assim vem acontecendo em Portugal: cada vez mais despesa, mais impostos, menor crescimento.
Para sustentar a actividade económica e sem orçamento não haverá crescimento, dramatiza Sócrates, mas penso que é uma treta.
Para empobrecer mais o país, digo eu, porque a teta não dura sempre...
sábado, 26 de dezembro de 2009
4R e 2009 - 12 excelentes textos
sexta-feira, 25 de dezembro de 2009
O Menino Jesus dos pequenitos
Ele baixou os olhos e corou,
e toda a gente julgou
que quem fez a maldade foi Jesus.
E todos lhe perdoaram.
- Obrigado, Menino! Mas agora
tira os olhos do baile e vem brincar,
que eu prometo, p’ra não te ver corar,
já não fazer das minhas.
Anda jogar, ao pé das flores, no chão,
comigo, às cinco pedrinhas...
anda jogar, p’ra não esqueceres
o preço do meu perdão.
Sebastião da Gama
Um Natal para todos
quinta-feira, 24 de dezembro de 2009
Bom Natal a todos!
É claro que para muitos esta época faz sentir especialmente o abandono, a pobreza ou a ausência dos entes queridos que já não se sentam à mesa enfeitada a preceito. Mais uma razão para que os mais felizes possam dar graças pela abundância, pelo prazer de poder escolher e comprar, pela felicidade de ouvir uma voz amiga ou de acolher em casa todos os que têm lugar especial na nossa vida e no nosso coração. E sentir saudades dos que entretanto partiram também pode ser um sentimento de doçura e paz quando finalmente aceitamos o irremediável e decidimos reservar-lhes um espaço na memória das coisas boas que nos foram concedidas.
Gosto de confirmar, uma vez mais, que a vida tem sido generosa para comigo e que não trocaria por coisa nenhuma tudo o que tive, que nada de essencial me faltou até hoje e que é tudo o que uma pessoa feliz podia desejar. Aos meus amigos e a todos os que, de uma forma ou de outra, fazem parte da minha vida, os meus votos calorosos de um Natal celebrado em Paz, com afecto e gratidão por tudo o que nas vossas vidas vos deu alegria e coragem para continuar. E que cada ano que chega vos confirme e acrescente essa Felicidade.
quarta-feira, 23 de dezembro de 2009
"Tell me why"...
Aqui há tempos uma das minhas sobrinhas, uma jovenzinha, enviou-me por e-mail este vídeo que trazia uma mensagem em que ela me dizia que visse, que não apagasse, porque iria gostar de tudo.
O jovem cantor, ainda com um rasto de voz de criança, a melodia, a letra e a coreografia passam uma mensagem forte sobre o porquê de vivermos num mundo de tantas injustiças que não resolvemos. No Natal, em que a fraternidade e a solidariedade despertam em nós mais atenção, ainda sabe melhor ouvir e sentir “Tell me Why”.
De facto, o vídeo é muito bonito e harmonioso, em claro contraste com o mundo em que vivemos. A minha sobrinha tinha razão. É esperançoso ver que a juventude também sente o que é o mundo...
Sempre ao serviço da dama!...
Cimeira de Copenhaga - o insucesso e a interrogação fundamental para lá do clima
A verdade é uma, e é insofismável por muito que se queira dar a entender que os resultados não foram maus de todo. Este modelo de discussão de grandes questões internacionais dá evidentes sinais de esgotamento. Dificilmente se consegue, numa cimeira à escala planetária, superar as diferenças e divisões entre os novos blocos surgidos neste século XXI, num crescente movimento de regionalismo internacional que parece contrariar a tendência para a globalização. Curiosamente, a última vez que uma conferência internacional alcançou sucessos visíveis, convocada pela ONU e de acordo com este modelo, decorreu também sob a égide da emergência ambiental universal. Foi há 17 anos, tratou-se da Cimeira da Terra realizada no Rio de Janeiro, e foi responsável pelos mais relevantes instrumentos de regulamentação internacional em vigor sobre ambiente e biodiversidade.
O ´Público´ na sua edição de hoje, lança uma interrogação fundamental, que é afinal a interrogação que suscita o fracasso de Copenhaga depois do anterior flop que constituiu a conferência convocada sobre o combate ao racismo ou perante incapacidade manifesta de liderança na erradicação do terrorismo: estaremos a caminhar para a irrelevância da ONU tal como a conhecemos?
terça-feira, 22 de dezembro de 2009
Aeroporto de Beja e a governabilidade do País
2. Com a devida vénia ao Pinho Cardão, retomo este tema que na minha perspectiva assume um significado muito particular nestes tempos conturbados que estamos vivendo, como paradigma do gasto sem nexo de recursos públicos e de consequente endividamento.
3. Começo por recordar que, como é de norma, este “investimento” foi anunciado há pouco mais de 2 anos pelo incumbente PM, em grande estilo, como um caso de “Baixo investimento para um grande benefício”...
4. O “baixo” investimento já se conhece: terão sido € 33 milhões, números redondos, depois das habituais derrapagens...
5. O “grande benefício” é que não se descortina:
- Não existem operadores interessados...
- Vai ser utilizado como parque de estacionamento de aviões inactivos que estarão a ocupar espaço noutros aeroportos, em que o parqueamento será mais caro, em Beja devem beneficiar de “desconto de promoção”...
- Quanto a tráfego só lá para 2014, na melhor das hipóteses, mesmo assim sem qualquer estudo que dê credibilidade à previsão...depois de ter sido anunciado há pouco tempo, também sem qualquer fundamento, o início do tráfego para Setembro de 2010...
6. A EDAB, SA, empresa quase-pública (97,5% do capital pertence ao Tesouro e outras entidades públicas) que desenvolveu este projecto, para o qual contou com generosos fundos públicos, tanto do FEDER como do PIDDAC – e mesmo assim não pode deixar de se endividar - estará agora a preparar-se para entrar na fase de “engorda” do endividamento pois vai ter de financiar os défices de exploração.
7. Curiosamente, já no relatório anual desta empresa para 2008 se podia ler, no tocante as expectativas do negócio, que “As melhores perspectivas de tráfego para o Aeroporto de Beja apontam para um arrastamento de mais 3 a 5 anos até se poder atingir um EBITDA positivo na nossa actividade...”.
8. Deve notar-se que em 2008 e 2009 ainda terá sido possível disfarçar o problema, contabilizando como encargos de investimento muitas despesas que a partir do fecho da obra passarão a ser despesas de exploração, afectando directa e negativamente os resultados e gerando necessidades de endividamento (já não haverá fundos públicos)...
9. Como aqui no 4R temos persistentemente chamado a atenção, estamos defrontados com uma total ausência de cultura de rigor na gestão dos escassos recursos públicos. Os maus exemplos sucedem-se e, no final, é sempre aos cidadãos que cabe pagar a factura...
10. Parece ser este, que não outro, o verdadeiro cerne da tão badalada (por razões fátuas) governabilidade ou ingovernabilidade do País... Com a sucessão de episódios como este - outros de resto em escala muito maior nos esperam - o País dificilmente poderá ser governável, pela razão bem prosaica de que não haverá dinheiro para os pagar...
A nostalgia do Natal
Para muitos, para mim, o Natal constitui talvez a maior e mais grata memória de criança. Misto de saudade e de nostalgia, de mistério e de claridade. Tempo de ternura, como todo aquele em que se contempla um menino no berço, de mais a mais um menino que, nos era dito, vinha para nos salvar e proteger.
Tempo em que colocar o sapato na chaminé da lareira significava dúvida e esperança, mas certeza, na manhã seguinte, de que o Menino, tão bom e tão terno, se tinha lembrado de nós.
Tempo em que as prendas eram lembranças do Menino Jesus, que nos acompanhava e que gostava que também nos lembrássemos dele. Tempo em que o Pai Natal substituía o Menino em casos de grande cansaço, ou quando o seu braço pequenino não alcançava as altas chaminés.
Tempo de fazer o presépio e de o decorar com o musgo fresco e molhado colhido nos muros que corriam à beira dos caminhos.
Tempo em que a árvore de Natal era um pinheiro e os pinheiros floresciam e cresciam, porque a terra era habitada e o mato e o tojo do pinhal eram colhidos para adubar as próximas colheitas.
Tempo da consoada, mais pobre ou mais rica, mas alegremente vivida por toda a família.
Tempo do caminho para a Missa do Galo, no escuro da noite iluminado pela “pilha” de mão, ou pela luz do luar, e da Igreja gelada, mas cheia de calor humano. Tempo da pequenada inquieta e dos rostos velhos e encarquilhados, mas radiantes da Boa Nova que se anunciava. Porque o homem precisa de esperança e o ritual de Natal a todos irmanava na esperança de dias melhores que o Menino traria para todos.
Tempo de beijar o Menino, sem medo de vírus portadores de novas doenças e calamidades, mas como agradecimento do bem já recebido ou penhor do bem a receber.
Tempo das canções das Janeiras, que entravam dentro de casa e eram momento de convívio e festa, à roda da lareira, do salpicão ou do chouriço assado e do vinho novo que vinha directamente do espicho.
Tempo em que o Natal era todo ele um ritual único que fazia vibrar o mais íntimo das pessoas, tinha forma, e cor e espírito e por isso se recorda.
Esse espírito que os grandes poetas e escritores cantaram em hinos de verso e prosa, o espírito gravado na pedra e na tela por modestos artesãos e insignes artistas, o espírito que nos legou as verdadeiras obras-primas dos presépios italianos e de Machado de Castro, o espírito que inspirou a grande música dos corais da natividade e a sentida e sublime harmonia da Stille Nacht, era o espírito que condensava o simbolismo bem presente no Natal.
Desaparecido o símbolo, por razões do politicamente correcto e em nome de uma estúpida e falsa inclusão que até eliminou o presépio dos postais de Boas Festas, logo o espaço foi ocupado pelo marketing agressivo que tudo vende, mercadoria e preconceitos e reduziu o Natal às renas importadas do norte gelado, aos Pais Natal feitos consumos correntes ou às prendas que se tornaram triviais, hoje recebidas, amanhã abandonadas, senão mesmo criticadas.
Por isso, não vejo que Natal poderão os pequeninos de agora um dia recordar. Faltar-lhes-á para sempre a terna e mágica referência do velho, simples e puro Natal português.
segunda-feira, 21 de dezembro de 2009
Bom Natal
Nem vejo por que se comemora o Natal, ignorando esse Natal.
As melhores Boas Festas para todos os autores, comentadores e leitores do 4R. Crentes, agnósticos ou não crentes. Homo e hetero. Casados, solteiros, divorciados, em união de facto ou potencialmente em união civil registada. Portistas, benfiquistas, sportinguistas, braguistas e gente de todas as cores e furta-cores. Todos somos irmãos do Menino!...
O que é a vida!
Era um homem só, abandonado na velhice à sua própria sorte, no desamparo da inexistência de família e na quase ausência da protecção social não fora a pensão mínima que lhe tinha sido atribuída depois de dezenas de anos de trabalho.
Com a sua diminuta pensão assegurava um tecto numa residencial de uma estrela, algures situada no Bairro Alto, na qual encontrava o conforto do repouso do corpo já velho e o abrigo para o frio e o deserto da noite. Diariamente percorria a pé as ruas que ligavam a residencial ao local do seu sustento e da convivência com o mundo lá fora. Permanecia, então, junto à porta de um modesto restaurante de bairro. Era um restaurante acolhedor e despretensioso que servia refeições caseiras, variadas e frescas, confeccionadas com qualidade, em que a simpatia do pessoal era um aspecto reconhecido e valorizado por quem o frequentava. O serviço rápido e a factura relativamente em conta, a juntar a tudo o resto, fidelizavam uma clientela sem vontade de experimentar outra alternativa.
Chegava por volta das 11h, para depois regressar por volta das 16h. O restaurante e os clientes eram a sua casa e família. A refeição principal, o almoço, era oferecida pelo dono do restaurante - um homem relativamente novo, natural de Viseu, que tinha vindo para Lisboa à procura de uma vida melhor - antes de abrir a porta aos clientes. Era um gesto de solidariedade que fazia questão de manter com descrição.
Numa mesinha prontamente arranjada, que em nada destoava das outras, era-lhe servida uma refeição completa - uma sopa, um prato do dia e fruta - sempre acompanhada de um copinho de vinho tinto porque o dono do restaurante sempre dizia que mal não lhe fazia, portanto só lhe poderia fazer bem. Terminada a refeição, amparava-se de baixo do toldo do restaurante para aí ficar algumas horas. A poucos metros encontrava-se uma pequena tabacaria que diariamente lhe oferecia um ou outro jornal. Uma ajuda para ocupar, no regresso à residencia, o muito tempo de espera até a noite chegar.
Os fins-de-semana não faziam qualquer sentido para este homem. Não precisava de descansar e a solidão vinha mais forte nesses momentos. No verão, ocupava-os sentado num banco de um jardim virado ao Tejo, imaginando, porventura, muitas outras vidas que lhe poderiam ter sorrido, enfrentando um futuro incerto, sem ilusões. No Inverno, não sei como fazia.
As pessoas gostavam dele, educado e sempre esboçando um sereno sorriso. Nunca lhe notei qualquer palavra amarga ou contrariada. O pouco que tinha era-lhe oferecido, mas faltava-lhe muito mais. Vivia no medo de as parcas condições que lhe ditavam uma sobrevivência já de si muito difícil pudessem desaparecer e a saúde que não tinha era um mal menor quando lhe ocorria o abandono a que seria devotado se tivesse que ser levado para um hospital.
Era um homem, como tantos outros, esquecido pela sociedade e ignorado pela segurança social. A pobreza e a exclusão ditaram-lhe durante muitos e muitos anos a privação de bens essenciais a uma vida digna.
Quatro anos antes de partir, o milagre aconteceu. Foi acolhido num lar para idosos, numa cidade perto de Lisboa. À dor juntou-se-lhe a alegria do inesperado. Finalmente estava em segurança, tinha quem se preocupasse com ele, tinha de novo o bem-estar que o infortúnio da vida e do mundo lhe tinha apagado da memória. Foram anos de muito aconchego para ele e, também, para quem com ele conviveu mais de perto. Era um homem simples e bondoso que durante os últimos anos de vida ganhou ânimo para também dar alguma coisa aos outros. Era quem diariamente, depois do jantar, fazia a leitura de um conto ou de uma história que todos gostavam de ouvir antes do deitar…
Um funeral na aldeia
Estava um dia escuro e frio e pelo caminho contavam-se pelos dedos as pessoas que andavam nas ruas em cada povoado, as aldeias tão bonitas parecem desertas e só aqui e ali se via o fumo a sair da chaminé como parco sinal de habitantes.
No entanto, para o funeral juntou-se muita gente, em homenagem sentida a uma pessoa estimada e respeitada na sua aldeia e arredores. A pouco e pouco, silenciosamente, sem ruído de automóveis nem conversas de sociedade, foram chegando à igreja gelada, primeiro as mulheres, que iniciaram a reza do terço, num ritual lento e conformado, uma tomou o comando num gesto natural, as outras respondiam num coro monótono e organizado. Depois, para a missa, chegaram os homens, vindos do trabalho com botas grossas e roupas fortes, que se amontoaram na parte de trás da igreja.
Flores, havia de duas espécies. Apesar da importância da família enlutada, só duas coroas enviadas de amigos de Lisboa. Ficaram ali deslocadas no seu aspecto luxuoso e arrogante, assim armadas por cores e feitios, feitas por mãos desconhecidas para cumprir uma encomenda. As outras vinham em raminhos muito simples, amachucadas, acabadas de apanhar nos canteiros batidos pela chuva e pelo vento, mal seguras nas mãos enrugadas das mulheres que as chegavam ao peito num movimento para se proteger do frio.
Depois a subida a pé até ao cemitério, em silêncio de palavras, só o ruído do caminhar a arranhar a estrada sem bermas num compasso triste, uma fileira de gente envelhecida, visivelmente pobre, com as suas roupas gastas, os xailes grossos e pretos, os sapatos gastos e deformados que uma vez mais calcorreavam a ladeira na despedida de um dos seus.
Impressionou-me aquela timidez respeitosa perante a solenidade da morte, e ao mesmo tempo a naturalidade dos gestos a aceitar que essa é uma parte da vida, tão contrastante com o medo disfarçado e incómodo com que se cumpre o ritual da morte na cidade.
À noite, já em casa, estive a ouvir na televisão um debate político e não pude deixar de me perguntar o que é que aquele palavreado todo, tão rebuscado e cínico, tem que ver com aquela gente que encontrei durante o dia. Ali, na sua aldeia, na sua pobreza, no seu isolamento, a enfrentar uma velhice sem jovens, sem famílias, sem trabalho que os sustente, devem abrir a televisão e perguntar, pasmados, em que momento é que o mundo deixou de chegar até eles.
domingo, 20 de dezembro de 2009
Pois é: parabéns merecidos...
Pobretes mas alegretes
Direito à indignação
A estas palavras que, estou certo, obtêm a concordância de toda a população sensata do país, ripostou um meninó do Partido Socialista, que, entre outras asneiras solenes, disse que o PR "não pode intrometer-se na agenda política do partido que suporta o Governo, sob pena de estar a contribuir para a dramatização da vida política nacional" e "quer goste quer não goste, essa é a barreira que o Presidente da República não pode franquear".
Um meninó, pelos vistos, a quem o desemprego não apoquenta, muito menos o endividamento do país, ou as contas públicas, ou a produtividade ou a competitividade da economia. Porque, tanto quanto é público, esse meninó tem passado a vida entre dirigente de uma juventude partidária, deputado europeu ou deputado à Assembleia da República. De produtividade e competitividade nada sabe, de desemprego muito menos, da vida real, nada, que os seus ambientes são os ambientes liofilizados de Bruxelas e de S. Bento.
Um meninó cujo projecto de vida será aparecer na capa dos jornais ou nos écrans das televisões e que viu nos temas fracturantes o seu nicho de mercado e o meio de exibição pública.
Um meninó que pretende definir os temas sobre os quais o Presidente se deve preocupar ou despreocupar.
Um meninó que, no fundo, pretende censurar a boca do Presidente e definir os temas convenientes e apropriados sobre que deve falar aos portugueses.
Um meninó que eu pensei representar-se apenas a si próprio, mas do que começo a duvidar, perante o silêncio do partido a que pertence.
Este post sai do que tem sido regra nos meus escritos e neste blog. Mas todos temos, um dia, direito à indignação.
sábado, 19 de dezembro de 2009
Aeroporto para aviões que não voam
O aeroporto está praticamente pronto e a partir de agora o objectivo prioritário é saber que uso pode ser dado ao assim designado Aeroporto do Alentejo.
Solução? Usar a estrutura para parque de estacionamento de aviões inactivos.
Ora aí está um belo exemplo de investimento público. Só me resta saber como é que aviões inactivos lá vão aterrar!...
Afinal quem é que tem razão?
Mas mal a medida tinha sido anunciada e logo a classe médica veio a terreno dizer que não há falta de médicos e que estamos a formar médicos que irão engrossar o desemprego.
Há aqui, como sempre houve, qualquer coisa que não bate certo. A realidade mostra-nos, de há muitos anos a esta parte, que há falta de médicos. De acordo com um estudo recente da DECO há 700.000 portugueses sem médico família e a própria Ministra da Saúde já reconheceu que há falta de médicos nas especialidades de urologia, obstetrícia, pediatria e anestesia. E outras, por certo, haverá. Todos conhecemos casos próximos que confirmam estas situações.
Mas ao mesmo tempo que se anunciam novos cursos de medicina há estudantes portugueses que por não terem vaga nas universidades vão fazer o curso de medicina no estrangeiro. Em simultâneo, o Ministério da Saúde procura médicos estrangeiros para virem suprir as necessidades do SNS.
Governos e médicos não se entendem. Não é de agora! Mas afinal quem é que tem razão? E afinal quais são realmente as necessidades presentes e futuras?
A falta de profissionais de saúde é mais um daqueles problemas que se prendem com a falta de planeamento de médio e longo prazo, exercício a que não damos a necessária atenção.
Falhamos, também, porque não planeamos. Não prevemos e não desenvolvemos políticas inter-temporalmente coerentes e sustentáveis.
A falta de planeamento é um défice que há muito está diagnosticado. É um erro histórico em muitos domínios que é importante corrigir.
Informar com rigor e transparência o País sobre as reais necessidades, os objectivos e o programa de medidas políticas para resolver os problemas e dar sustentabilidade ao SNS e ao sistema de saúde em geral deveria ser uma preocupação dos governos.
Continuar por um caminho de agora avança, para depois parar, recuar ou mudar de direcção não nos pode deixar sossegados e não pode, como parece ser óbvio, dar bom resultado. Afinal, em que é que ficamos?
Volta, Quique, campeão de inverno!...
sexta-feira, 18 de dezembro de 2009
Grupo Excursionista de Copenhague
O casaco de Inverno
Depois da morte do marido saiu vários dias com a roupa errada, ora muito quente, ora demasiado leve, faltava-lhe aquele cuidado tímido, percebia agora que era uma forma discreta dele se preocupar com ela, de velar por que se agasalhasse, talvez mesmo de a proteger ao longo do dia, enquanto cada um trabalhava sem tempo para se encontrarem antes de anoitecer de novo.
Vai estar frio, pensou, aquele cinza metálico não engana, repetia as palavras dele, tal e qual, surgiam-lhe na memória com aquela nitidez e, no entanto, julgava que sempre as tinha ouvido ao longe, sem prestar atenção, tomava-as na altura mais como um monólogo do que como um conselho atento que lhe era dirigido. Mas as palavras dele voltavam e ela sorria com gratidão, como se lhe respondesse no diálogo secreto que só agora desvendava com clareza.
Abriu o armário para tirar o casaco de fazenda forrado a pele sintética, o mesmo que há mais de dez anos vestia no pino do Inverno. Olhou-o com desânimo, os ombros já esbatidos, aqui e ali um fio puxado, os botões mal presos nas linhas gastas. Sentiu frio na decrepitude do tecido. Quando o comprou foi por insistência do marido, na altura era um luxo e ele insistiu, dura-te vários anos e acaba por sair em conta se o estimares bem, vais ver que te faz jeito. E lembra-se também de como as colegas lhe disseram como ficava elegante, durante uns tempos esperava ansiosa que as manhãs se anunciassem frias só para se sentir tão bem no seu casaco novo. Mas depois os filhos precisaram de ajuda para fazerem as suas vidas, a seguir veio a doença do marido, o dinheiro a rarear, a casa a pedir remendos, e passou a poupar o casaco com a ideia de o fazer durar até poder comprar outro, logo que a saúde dele lhes desse folga para outras despesas. Havia de comprar outro, pensou desgostosa, a antecipar o olhar de desdém com que as colegas iam reparar na sua pobreza.
Punha-o agora nos ombros e ajustou a gola, para lhe devolver a forma antiga. Talvez com o cachecol de lã ficasse melhor, é isso, era assim que ele gostava, parece que são as mãos dele de novo a abrir o tecido, a alisá-lo e a compor o conjunto, curioso, também isso ela tinha esquecido, como ele era atencioso sem se fazer notar, ficava à espera que ela estivesse pronta, deitava-lhe um olhar aprovador e depois um beijo leve a roçar os lábios, até logo, chego às 8, pegava na pasta e saía, com o sobretudo pesado que sempre lhe conhecera.
Olhou-se ao espelho, o casaco agora abotoado a aconchegá-la muito junto, sentia-o de novo suave e quente, tão familiar como a presença atenta e carinhosa do marido, como se só agora se reconciliasse com a morte dele e com a solidão zangada em que se instalara com azedume.
Saiu para a rua a passo firme e, nessa manhã fria, esperou sem pressa pelo autocarro, sentindo-se abrigada de todas as intempéries ao abraçar-se no casaco velho com a ternura de quem retém um ente querido.
quinta-feira, 17 de dezembro de 2009
Jorge faz corar Lacão!...
Mas o Governo é competitivo. A Ministra da Saúde , Ana Jorge, não quis ficar atrás e hoje brindou-nos com mais uma pérola, que deixa Lacão corado de vergonha!...Ora vejamos:
“Não conheço esse relatório da saúde oral. Lamento que isso seja posto, dado que há todo um estudo e todo um… hum… para se ter chegado àqueles valores de quem foi a proposta, houve obviamente um base naquilo que já era conhecimento e daquilo que foi feito um estudo sobre isso, sobre esse processo. É um processo que também pela primeira vez, este contrato que fizemos de saúde oral permitiu que chegámos a ter saúde oral na, principalmente, primeiro para grupos de risco, foram as grávidas e os idosos com complemento solidário de idoso e depois às crianças progressivamente. Portanto, pela primeira vez nós estamos com esta possibilidade de dar saúde oral a alguns portugueses e, portanto, progressivamente abrangendo mais população, penso que isso é muito positivo".
Pois é: Jorge & Lacão com gritante falta de saúde na expressão oral!...
Tiro-lhe o meu chapéu...
"A comunicação social portuguesa beneficia e, simultaneamente, comparticipa do centralismo de poderes, típico no nosso país. Daí que, salvo uma única excepção na imprensa escrita, tudo o resto se localiza no mesmo espaço metropolitano, com o mesmo conjunto de actores comentando as mesmas notícias e transmitindo para o resto do território opiniões nuclearmente formatadas"
E disse mais, sabendo bem o que estas suas palavras vão convocar, o que só abona pela coragem de quem as proferiu:
Aquilo que "era impensável há décadas é hoje um acontecimento banal: jornalistas transformados em comentadores vão-se revezando no tratamento repetitivo do assunto que estiver na ordem do dia, expulsando cada vez mais os especialistas da matéria".
O meu aplauso.
Grécia continua a resvalar para...e nós para a Regionalização?
2. Em resposta a estes anúncios os mercados vão agravando as condições de financiamento da Grécia, sendo já anormalmente elevado o custo de cobertura do risco de “default” da dívida grega, que segundo notícias ontem divulgadas estaria ao nível da do Cazaquistão...
3. O novo Governo socialista grego, chefiado por um membro da família Papandreou como não podia deixar de ser, não consegue convencer os mercados da firmeza das suas intenções de reformar as finanças públicas gregas, apesar da sua retórica contra a corrupção e promessas de combate à evasão fiscal...
4. A Grécia terá que emitir qualquer coisa como € 55 mil milhões de dívida nova em 2010, para financiar o défice e para refinanciar dívida que se vai vencer ao longo do ano, mas pelas indicações que o mercado está dando esse programa não vai ser fácil de executar e, em qualquer, caso, irá resultar num aumento muito considerável dos encargos da dívida.
5. Segundo as notícias de hoje, a Grécia teve agora que recorrer a um empréstimo negociado com 5 bancos, de € 2 mil milhões, face à aparente dificuldade em colocar obrigações no mercado nesta altura.
6. Ao mesmo tempo, as principais empresas europeias fornecedoras de medicamentos apresentaram uma queixa em Bruxelas contra os enormes atrasos de pagamento dos fornecimentos por parte do Estado grego – segundo notícia em destaque na edição do F. Times de hoje, essas dívidas em atraso totalizariam quase € 7 mil milhões, verba que provavelmente vai agravar as necessidades de financiamento acima mencionadas.
7. Esta situação, se não for atacada com medidas concretas e não apenas com retórica, pode ir agravando as condições de financiamento da Grécia até à implosão...mas em contraponto, os Sindicatos gregos, sentindo o “cheiro” a austeridade, estão mobilizando as suas “tropas” para iniciarem uma série de greves gerais...
8. Por cá parece que vem aí finalmente a Regionalização, uma “bela” ideia não fosse o plano inclinado em que nos encontramos a caminho de uma crise financeira que, não tendo certamente e por ora as proporções da grega, desta se aproximará inexoravelmente se nada for feito para travar a evolução dos últimos anos...
9. Não se perceberá que um projecto como a Regionalização pode vir a ter um efeito relevante de rigidificação da despesa pública, criando expectativas de maiores apoios do Estado às Regiões e tornando cada vez mais difícil o saneamento da débil situação das finanças públicas?
10. Ou me engano muito ou estas opções de política, desde as grandes obras públicas à dita Regionalização, ainda nos vão trazer enormes dores de cabeça...
quarta-feira, 16 de dezembro de 2009
O empurrão para o abismo
Pior do que responder ao fogo, deitando-lhe gasolina. E mais uma prova de que o abismo chama o abismo.
Assim falou Lacão
terça-feira, 15 de dezembro de 2009
Quanto mais inexistente...melhor!...
Como a economia é coisa que o enfada, Vieira da Silva, dito Ministro da Economia, prefere falar de moções de confiança.
Como a economia é coisa que o enjoa, Vieira da Silva, virtual Ministro da Economia, prefere falar de regionalização.
Vieira da Silva fala de tudo, menos de economia. E, sendo tão falador, se não fala de política económica, certamente é porque não tem.
E porque tem sido inexistente na área, Vieira da Silva até está a ser um bom Ministro da Economia. E quanto mais inexistente, melhor.
ALERTA AMARELO
- Quem até há pouco dizia cobras e lagartos do parlamento e da classe política por atacado, apresenta-se agora a vergastar sem dó nem piedade aqueles que criticam estes políticos e este parlamento.
- Quem passou os últimos anos a censurar o PSD, numa lógica de desgaste contínuo de imagem fosse qual fosse a direcção ou o líder, desembaínha agora a espada pronto a trucidar qualquer crítico, qualquer inimigo da unidade.
- Quem se apresentava há uns tempos como o paladino da estabilidade governativa com um bem em tempo de crise, aparece agora a invectivar quem julga estar certo quando defende que uma solução de consensos essenciais que acorra à situação de dificuldade nacional, social e económica, que cada dia se agrava.
- Quem se incomodava com as persistentes violações dos mais elementares direitos da personalidade, em especial contra a banalização dos ataques gratuitos à privacidade e ao direito ao bom nome ou a imagem, é agora o arauto da divulgação de tudo ou mais alguma coisa em nome do superior interesse do Estado.
Tamanha mudança faz recear o pior. Protejamo-nos!
segunda-feira, 14 de dezembro de 2009
Casa onde não há pão...
A conclusão disto tudo parece ser a de que o episódico controlo do défice se fez à custa do aumento de receitas e não da redução da despesa e que agora o que é preciso é…reduzir os salários dos funcionários, seguindo o exemplo da Irlanda e talvez da Espanha! O que me surpreende é que, perante um défice de descalabro, se fale na mesma receita, em termos ainda mais drásticos, sem que se explique porque é que o que se fez até agora não resultou. É que uma coisa é reconhecer que pura e simplesmente o Estado está falido, não há dinheiro para pagar aos seus trabalhadores, outra é falar disso como se fosse uma grande decisão, muito pensada, como um factor que até agora não foi considerado e que será a causa de todos os nossos problemas. É que não basta comparar medidas em cada momento, convém ver o caminho que cada País cumpriu até chegar onde está e o que para uns são medidas de excepção para outros, como nós, é mais do mesmo.
Quando o senso é grande, o pobre desconfia...
É uma verdade de há séculos, uma afirmação lapalissada, creio que Almeida Santos também aqui não descobriu a pólvora. Mas parece que sim, a avaliar pelas insistentes e contínuas notícias de ontem.
Almeida Santos encheu-se então de brio e bom senso e apelou ao bom senso. Muito bem!...
Porventura para compensar a total falta dele, quando considerava que a construção do novo aeroporto em Alcochete era perigosa, "já que há sempre a necessidade de uma ponte..."
Também aqui, quando o bom senso é grande, o pobre desconfia...
Pelo que, em tanto bom senso, desconfio de uma ferroada sem senso no Presidente da República...
Memória curta e falta de senso é o que dá!...
Tragédia Grega e o nosso TGV
2. A dívida pública da Grécia tem sido fortemente penalizada pelos mercados financeiros nas últimas semanas, suportando nesta altura um custo que é superior em 2/3 ao da dívida alemã para prazos semelhantes – no prazo mais representativo, dos 10 anos, a dívida alemã paga 3,20% e a dívida grega 5,30%.
3. Por mais extraordinário que possa parecer, o custo de cobertura do risco de “default” da dívida da Grécia é, nesta altura, superior ao da cobertura de similar risco da dívida de países como a Hungria ou o Vietname...
4. As pressões para que o governo grego adopte medidas drásticas de redução das despesas públicas repetiram-se ao longo da semana, nomeadamente de responsáveis da União Europeia e do BCE, para além de diversas fontes internas.
5. Não se sabe ainda o que o governo grego vai ou não fazer, para já terá admitido reduzir o défice para cerca de 9% do PIB em 2010, dos quase 13% do corrente ano,mas ao que parece à custa de medidas de combate à evasão fiscal de resultado muito incerto...de cortes na despesa por enquanto nem se fala.
6. A situação é agravada pela dificuldade que qualquer governo grego tem em reduzir despesa pública sem enfrentar uma feroz oposição dos sectores instalados...e o actual governo (de maioria socialista) encontra-se numa posição especialmente incómoda pois, no poder há cerca de 2 meses, terá conduzido uma campanha eleitoral, de fresca memória, a prometer facilidades e maior despesa...
7. A redução do défice dos actuais 13% para 3% do PIB até 2013 faria apelo a medidas que, a serem aplicadas, colocariam a sociedade grega em polvorosa, quem sabe mesmo se em insurreição generalizada, sabendo-se como os gregos reagem violentamente a qualquer política de austeridade...a Grécia não é a Irlanda...
8. Enquanto esta Tragédia Grega se desenrola, nós por cá vamos continuando indiferentes a estes sinais dos mercados de que existe um limite para o endividamento, "mesmo" em moeda única.
9. Foi agora anunciado o arranque do TGV, projecto emblemático de uma política de assunção de enormes compromissos financeiros sem olhar à qualidade da despesa...este projecto é um daqueles com aptidão para agravar sempre a dívida, na fase de execução e também de exploração, pelos “cash-flows” negativos que deverá gerar durante um longo prazo e que exigirão mais dívida, sempre mais dívida...
10. Mas isso é feito em nome de um singular combate à crise económica, segundo o qual é preciso gastar para contrariar o abrandamento da actividade...
11. Nem reparamos que em cima da crise económica os países do “arco da dívida” enfrentam agora uma outra que consiste na realidade (caso da Grécia) ou iminência (casos de Portugal e Espanha) de um forte constrangimento financeiro que pode impor, de um momento para o outro, alterações drásticas de prioridades...
12. Ou seja, “combatemos” uma e apressamos a outra...
Os galifões
Se um diz, o outro contradiz; se um afirma, o outro nega; e se um declara e o outro cala, logo os microfones desancam quem não reagiu nem falou. Por isso, todos berram, todos se insultam, todos se torturam, todos se ferem.
É uma luta de galos, em que cada um porfia por ter as lâminas mais afiadas. Não se lembram que, por norma, nenhum sai inteiro da arena.
Advocacia subordinada = advocacia de sujeição?
sábado, 12 de dezembro de 2009
Somos dotados de inteligência (...)
“Ora meus amigos, acho que todos pensamos que se alguma coisa houver neste mundo que possamos ajudar a corrigir, não será certamente mordendo as orelhas uns aos outros,mas sim discutindo aberta e sériamente as questões e sobretudo voluntariando-nos (não sei se é assim que se escreve) para participar nos projectos.Somos dotados de inteligência para que possamos entender-nos e não o contrário.”
Caro Bartolomeu
A falta de tolerância que lhes é particular retira-lhes a tranquilidade necessária para escutarem os outros, respeitarem as suas posições e trazerem para o debate as suas opiniões defendendo-as e fazendo valer os seus pontos de vista.
A tolerância não é um sinal de fraqueza, é antes um sinal de inteligência que nos permite gozar da tranquilidade necessária ao bom convívio com os outros.
Aqui no 4R a tolerância é um valor apreciado e valorizado, capaz de fazer deste espaço um local saudável, com uma marca “cultural” em que a participação acontece de forma voluntária, plural, aberta e séria. E é assim que vamos continuar...